Mother escrita por Reptiliano


Capítulo 2
Strangeness And Charm




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Ok! Essa parte eu entendi. É no sexo que os bebês são feitos. Então, você e o papai?

Não, não exatamente. Veja, dois homens ou duas mulheres não podem se reproduzir.

Por que não? Isso é ridículo!

Por causa do nosso corpo, cada um tem uma função diferente na reprodução. O homem tem um tipo especial de “semente” que ele produz e é liberada no sexo e a mulher é quem “cuida” da semente enquanto ela cresce e se transforma num bebê.

Entendo. Quero dizer, eu tenho certeza de que não é uma semente de verdade, mas entendi. Então vocês me adotaram?

Mais ou menos. Miguel ficou um pouco inseguro quando eu propus que fosse através de uma barriga de aluguel.

O que é isso?

É quando um dos dois pede a uma mulher que cuide da semente dele. No caso, Miguel quis que fosse a minha semente… Espera um pouco! Você pensou essa conversa toda só pra chegar nesse momento, não foi?

Érn… Mais ou menos. Pai, é que… Ok, fui pego.

Está tudo bem, Jamie. Eu não posso dizer que sei como é, mas estou aqui para o que precisar, só… Já conversamos sobre isso antes.

Eu sei, pai, mas eu prometo que não vou atrás dela. Ela não precisa saber que eu sei quem ela é. Eu só quero entender as coisas.

Eu sinto muito, Matt. Eu não posso fazer isso…

 

— Então quer dizer que seus pais sabem quem ela é, mas não podem te dizer porque fizeram uma promessa? É sério isso? - Matt e eu estávamos caminhando pela calçada enquanto eu o deixava a par da minha atuação situação com meus pais.

— É. Bom, por um lado eu entendo eles, sabe? Acho legal esse comprometimento com ela e tudo mais, mas, ao mesmo tempo, isso só me aproxima mais dela.

— Como assim, Jamie? Você fez sentido nenhum agora.

— Se ela pediu pra não dizer quem é, isso significa que deve ser alguém próximo a eles.

— Ah, sim! Entendi. Acho que faz sentido, mas, também pode ser apenas uma “viagem” sua.

— É, eu não nego – Falei enquanto ria, mais de nervoso e insegurança do que qualquer outro sentimento.

Não foi da noite pro dia que essa ideia de encontrar minha mãe biológica ocorreu. Imagine uma criança ver todos os amiguinhos com suas mamães enquanto eu ficava de longe olhando. Ou então quando meninos como Jon, que eu falei no último relato, implicando comigo dizendo que eu tenho dois pais e que isso era errado.

Eu já tinha um certo probleminha para controlar minha raiva. Meu pai Josh até mesmo dizia às vezes que eu era o Incrível Hulk, mas que precisava aprender a controlar isso e o bullying comigo não ajudava em nada. Não que eu tenha sofrido muito a ponto de ficar traumatizado, mas… Mexeu um pouco comigo.

O que ajudou, na verdade, foi a gravata vermelha que eu ganhei da tia Ana a três anos atrás. Eu a usava em volta do pescoço e ambas as extremidades caíam sobre os ombros à frente do torso. Sempre que eu ficava com raiva, eu segurava a gravata com força e respirava fundo, lembrando sempre do que tia Ana me dissera no seu aniversário.

Aliás, tia Ana acabou se tornando uma grande amiga naquele dia. Na minha inocência de criança, pedi a ela que fosse minha mamãe de mentirinha, mas ela retrucou dizendo que não precisava porque já era bem ativa na minha vida, e de fato era. Sempre que eu estava machucado, ou aborrecido com algo, ela era sempre uma das primeiras pessoas a me prestar ajuda. Ela me dava conselhos, conversava comigo.

Aos poucos, e às vezes observando a tia Glória, mãe de Matt, fui me dando conta de que era exatamente esse o papel de uma mãe em relação aos filhos e isso só nos fez aproximar ainda mais. Hoje em dia eu percebo que de fato não era extremamente necessário ter uma mãe, porque a representação feminina vinha basicamente das amigas dos meus pais, seja da parte da tia Ana ou da tia Glória. Tia Ana era um “tantão” mais ativa, porém, tia Glória tinha seus momentos.

— Eu só queria entender tudo – Falei mais para mim mesmo do que para Matt

— Eu sei, Jamie, mas talvez seja melhor pra todo mundo se você focar no que já tem e não no que poderia ter.

— Matt, me promete uma coisa?

— O que é? – Matt me encarava sério e, ao mesmo tempo, curioso.

— Promete que nunca vai deixar de ter esses pensamentos maduros? – Brinquei com ele.

— Eu “to” falando sério, cara! – Matt disse entre risos – Tia Ana já é praticamente uma mãe pra você e, ainda tem o tio Josh e o tio Miguel. Tenho certeza de que os dois são ótimos pra você.

— Eles são! Eu não estou reclamando por ter dois pais, não é isso! Eu só quero montar esse quebra cabeças.

— Entendi… Bom, se é o que você quer, eu te apoio – Matt adiantou-se por uma entrada cortando um campo de grama e apertou a campainha da casa à nossa frente – Você é meu amigo.

— Obrigado por entender. Eu queria que meus pais apoiassem, mas por causa dessa promessa que os dois fizeram à minha mãe..

— É. Meio doido isso.

— Nem me fale!

A porta se abriu revelando uma mulher centímetros mais alta que Matt ou eu, com o cabelo arrumado no famigerado “rabo de burro” e usando uma camisa branca de corações vermelhos e uma bermuda jeans. Assim que nos viu, Tia Ana abriu os braços já comemorando e corremos para um abraço triplo.

Após os cumprimentos, nós entramos. Tia Ana nos ofereceu alguns biscoitos que ela fizera outra dia e perguntou se não queríamos algo para beber. Matt pediu achocolatado, mas eu acabei pedindo café.

Matt e eu nos sentamos próximos ao pote de biscoito sob a mesa redonda da cozinha enquanto conversávamos com tia Ana sobre o nosso dia a dia. Matt ficou me zoando por admitir naquela semana que estava gostando de uma menina na escola, mas que talvez não fosse recíproco.

— Você já pensou em falar com ela? Nunca vai ser recíproco se não tiver atitude – Tia Ana disse.

— O Jamie é frouxo, tia. Duvido que ele faça isso.

— Frouxo é você, idiota! – Retruquei rindo e fazendo-os rir também – Eu só tenho medo de receber um “não” se eu chamar ela pra irmos em uma festa!

— Larga de frouxo, Jamie! O “não” você já tem! Fale com ela e tente conseguir um “sim”. Use seu charme!

— Que charme? – Matt disse rindo – Brincadeira. Eu também não sou charmoso.

— Vai ficar de viadagem também, Matt? Todo homem e toda mulher tem um tipo de charme. Vocês só precisam descobrir qual o de vocês. Varia muito de pessoa pra pessoa – Tia Ana levantou-se e foi pegar o café que tinha terminado de passar para me servir – Às vezes é o cabelo bem cuidado, um olhar, o jeito de falar, o jeito de andar, ou talvez… O conjunto de algumas coisas!

— Nossa, tia! Você acordou inspirada hoje, ein! Está com algum crush em vista, não é? – Eu provoquei um pouco, só pra ver sua reação.

— Bem… – Tia Ana suspirou e aproximou-se com uma xícara de café e outra com achocolatado quente – Tem um cara num posto de gasolina perto do escritório. Ele tem um… um… como posso dizer… Charme!

— Ai, lá vem você com essa história de charme de novo! – Matt revirou os olhos.

— Mas é verdade. Você tem que se olhar no espelho e achar o seu.

— E qual é o seu, sabichona? – Perguntei realmente interessado.

— A conversa. Eu sei como conversar com uma pessoa de modo que ela preste atenção em mim.

— Parece o Jamie! – Matt disse sorrindo, mas tia Ana o fitou curiosa e perguntou “por quê?”. Matt achou estranho, mas continuou – Bom, o Matt é bom de conversa. Ele é todo desajeitado e tal, mas tem lábia.

— Eu não quero me gabar, mas… É verdade! – Tia Ana me encarava com os olhos cheios de brilho como se estivesse orgulhosa ou talvez… Feliz. Ela não parecia surpresa, no entanto, o que deixou tudo ainda mais estranho – Foi como consegui nota pra passar Matemática ano passado.

— Miguel deve ter pirado! – Tia Ana falou como se estivesse a disfarçar algo, quase gaguejando – O que ele fez?

— Nada, porque eu passei! Eu convenci a professora a mudar minha nota e não colocar a anterior no boletim. Eu sou demais, eu sei.

— Só queria saber o que você disse a ela

Matt disse cruzando os braços e nesse movimento, derrubou a caneca com achocolatado. O líquido escorreu pela mesa e caiu direto na bermuda do rapaz, sujando-o. Ele levantou-se depressa e foi ao banheiro sem pedir, pois já se sentia em casa, enquanto tia Ana apressou-se para pegar um pano e limpar a mesa com a ajuda de Jamie.

— Duvido que ele tenha um charme – Falei brincando com meu amigo, mesmo em sua ausência – Desculpa por isso.

— Tudo bem. Ele sempre foi desastrado mesmo. – Tia Ana dizia enquanto arrumava a mesa novamente – Deve dar trabalho pro anjo da guarda dele.

— Eu não sabia que tinha virado um anjo.

— Você sempre foi um anjo! – Voltamos a nos sentar à mesa e conversar.

— Bom, eu não me importaria em ter poderes de anjo. Pelo menos assim eu poderia descobrir quem é a minha mãe biológica.

— O que?

Tia Ana me encarava num misto de curiosidade e nervosismo. Eu até tinha percebido, e achei estranho, mas achei melhor continuar e ver aonde aquela conversa acabaria.

— É. Eu queria saber quem é a minha mãe. Não quero cobrar os serviços de mãe dela porque… Bom, você meio que foi uma mãe pra mim, mas… – Segurei as duas pontas da gravata vermelha que estava ao redor do pescoço – Eu quero conhecê-la. Eu quero… Entender tudo.

— Por que agora? Quero dizer… Josh e Miguel não têm sido suficiente pra você?

— Meu Deus! Por que todo mundo acha isso?

— Isso o que? – Matt vinha do banheiro balançando a bermuda. Ainda estava sujo, mas parecia parte do estampado da roupa – Ah, não… Jamie começou com essa história de mãe outra vez?

— Vocês dois têm falado sobre isso?— Tia Ana estava realmente interessada em saber o que estava acontecendo.

— É, bem… Eu perguntei aos meus pais sobre a minha mãe, mas eles fizeram uma promessa pra ela e agora não podem me dizer nada a seu respeito.

— Entendo… – Tia Ana fechou as mãos com força e olhava a esmo, provavelmente pensando em outras coisas – Eu entendo. Sempre quis conhecer minha mãe também, mas meu pai foi bom pra mim. Um tanto machista, mas bom.

— Sentimos muito – Matt disse

— Obrigada, mas o que eu quero dizer é que…

— “Nem sempre a gente precisa saber de tudo” – Falei revirando os olhos. Matt e tia Ana me encaravam preocupados – Eu entendi. Talvez… Só talvez, eu acabe deixando isso pra lá.

É claro que eu não ia deixar essa história pra lá, era da minha mãe que estávamos falando. Eu só menti naquele momento para eles me deixarem em paz e não se preocuparem muito. Sim, eu já tinha pensado em desistir dessa história de encontrar minha mãe biológica, mas não o faria tão cedo.

Mas as coisas acabaram fugindo um pouco do controle…

 

Eu já tinha ido para casa e tinha acabado de jantar com meu pai Josh, já que meu pai Miguel estava de plantão no Hospital. Preocupado por estar um pouquinho tarde para visitas, meu pai foi até a porta ver quem era, mas não tinha ninguém ali. Apenas um envelope no chão. Uma carta.

Ele a leu, mas não disse nada quando eu perguntei quem era e acabei ficando sem resposta, mas quando meu pai Miguel chegou, no dia seguinte, de manhã, os dois me chamaram para conversar assim que eu acordei e me entregaram o envelope. Eu o abri, curioso. Que tipo de maluco mandaria uma carta em pleno século vinte e um?

Meus pais estavam apreensivos, de mãos dadas, e só de vê-los daquele jeito, fiquei apreensivo também. Olhei o conteúdo do envelope e percebi que eram duas fotos. Na primeira, estavam tia Ana, meu pai Miguel e o tio Charlie. O trio era jovem, provavelmente com a mesma idade que eu tinha quando vi aquelas fotos que marcariam o resto da minha vida.

Estranhei que alguém mandou um envelope e uma foto revelada para mim, mas continuei a analisar o conteúdo e, na segunda foto estava um outro trio: Tia Ana grávida e meus pais, Josh e Miguel. Os dois estavam abraçando a amiga deles com uma mão, cada, sobre a barriga enorme, onde havia uma criança.

Num primeiro momento eu achei a foto engraçada. Era quase como se meus pais estivessem esperando um filho com a tia Ana e então, foi quando eu finalmente percebi que eu era a criança.


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