O Planeta dos Chapéus escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olás!

Para este desafio, escolhi falar sobre a melhor companion de todos os tempos, Donna Noble.

Pode-se dizer que esta one é uma forma de consolo para o final da personagem (aquilo foi de cortar o coração com navalha, convenhamos, estou tentando superar até hoje...)

Espero que gostem!



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Como Senhor do Tempo, posso fazer coisas inacreditáveis. Experiências fantásticas estão sempre se revelando diante dos meus velhos olhos. Olhos que já viram de tudo um pouco, mas que nunca se cansam de explorar mais e mais.

Seja em mundos desconhecidos, tempos remotos, realidades futuras ou simplesmente em contato com a peculiaridade da raça humana, estou sempre aprendendo algo novo enquanto viajo em minha TARDIS pelo vórtice temporal. Às vezes, sozinho; na maioria das vezes, na companhia de mulheres brilhantes.

Cada uma delas, teve sua importância em minha linha do tempo e sempre terá um espaço especial em meus dois corações.

Infelizmente, também como Senhor do Tempo, há certas coisas que não posso fazer. Não posso alcançar Rose Tyler no mundo paralelo em que ela foi parar no fim de tudo, voltar no tempo e ser menos idiota com Martha Jones ou salvar Astrid do final prematuro que encontrou quando cruzei seu caminho. Mas existe algo que me consola em relação a tudo isso. Essas mulheres sempre se lembrarão de mim, das aventuras que vivemos juntos, dos riscos que corremos, dos perigos que vencemos e, no final das contas, sempre saberão o quanto foram e são fantásticas e especiais.

É por isso que me despedir de Donna Noble vai me custar tanto. Dói saber que ela terá que esquecer tudo o que vivemos. Cada momento tenso ou divertido, cada riso, cada lágrima, cada aprendizado e cada proeza. Tudo estará perdido em breve, como se nunca tivesse acontecido para ela.

Se fosse só por mim, eu acabaria me conformando. Que escolha tenho afinal? Por mais doloroso que seja, toda companion me abandona em certo momento da jornada, segue o seu caminho, encontra seu destino eventualmente. Sempre acabo ficando sozinho.

Mas tirar essa escolha de Donna será a coisa mais difícil que terei que fazer. Porque não se trata apenas de mim e da minha necessidade de ter alguém ao meu lado para compartilhar as viagens no tempo e espaço, minhas impressões sobre elas, a empolgação e meus momentos mais introspectivos. Trata-se dela, alguém sedenta por escapar da rotina e incertezas do futuro em prol de aventuras a bordo da TARDIS. Trata-se do seu desejo genuíno de pertencer a algum lugar, viver intensamente cada experiência e conquistar o seu próprio lugar no universo.

Donna teve tudo isso. E agora, eu terei que tirar tudo isso dela. Tivemos o melhor dos tempos. Mas, ironicamente, ela nunca saberá disso.

Enquanto a observo caminhando em volta do painel de navegação e conjecturando rápido sobre nosso próximo destino, quase de forma descontrolada, percebo que não tenho mesmo escolha. O DNA que Donna absorveu da minha mão regenerada, por meio da Meta-crise biológica bidirecional, não só a fez herdar o melhor de mim — a mente de um Senhor do Tempo — mas sobrecarregou seu cérebro humano. A um nível que logo será insuportável para ela.

Doctor-Donna soa épico e brilhante, mas na prática esse tipo de junção é impossível.  E se eu não apagar suas lembranças logo, o final da minha querida companion poderá ser trágico.

Ciente de que não posso permitir que isso aconteça, aproximo-me dela.

— Não me faça voltar — Donna pede, desesperada, ao captar minha intenção. — Doutor, por favor, não me faça voltar!

— Donna. — Seguro seu rosto entre minhas mãos. — Oh, Donna Noble, eu sinto muito. Mas nós tivemos o melhor dos tempos. O melhor.

Não sei como, mas consigo esboçar um meio sorriso. Apesar da tristeza diante da inevitável despedida, pego-me relembrando como Donna Noble foi inspiradora e importante para mim, e isso me deixa feliz de uma forma nostálgica.

Ela deve imaginar que aprendeu muito comigo, mas é justamente o contrário. Donna me ensinou muito sobre certos valores, me questionou exaustivamente e me fez perceber que mesmo com as limitações de um Senhor do Tempo, eu posso fazer a diferença para alguém. Nunca vou me esquecer que ela me convenceu a voltar para Pompeia e salvar aquela família do Vesúvio. Nunca vou esquecer sua risada alta, seu sarcasmo, sua doçura e sua tendência a gritar quando contrariada.

— Adeus — despeço-me por fim.

Fecho os olhos e me concentro em sua mente.

— Não, não, não! Por favor, por favor! Não!

Reúno forças e conecto nossas memórias. Isolo as dela. Apago cada momento que vivemos. Donna desmaia em meus braços quando a última lembrança que tem de mim se perde para sempre.

Fico alguns instantes estático, incapaz de me mover, tampouco de levá-la de volta para sua casa, em Londres. Tudo o que sinto é pesar, vazio e tristeza.

É nesse momento que avisto algo por sobre sua cabeça. A caixa que Donna encheu de chapéus para quando fôssemos visitar “o Planeta dos Chapéus” repousa esquecida num canto da TARDIS. E de repente, esse pequeno fato e esse mero lampejo me dão um estalo, uma ideia maluca brota e uma possibilidade se apresenta diante dos meus olhos já não tão tristes.

Encho-me de esperança enquanto Donna, sem saber disso, me inspira uma última vez e reforça algo que me ensinou, mas que eu havia esquecido por um momento: mesmo quando tudo parece perdido, sempre há uma saída. Sempre pode haver uma saída.

Eu não tenho que aceitar tudo. E eu não preciso lhe tirar tudo.

Convicto, fecho meus olhos e conecto nossas mentes de novo. Se posso apagar certos acontecimentos de seu cérebro, talvez também consiga acessar nosso subconsciente em comum e criar algo novo e especial. Uma última ligação entre nós. Vívida e sólida o bastante para que Donna encontre o caminho, mas segura o suficiente para não colocá-la em perigo.

Sei que ela não pode se lembrar das nossas viagens no tempo e espaço, mas o que dizer de um planeta que só existe em seus sonhos e de uma aventura que nunca aconteceu?

Imagino como esse mundo seria. Numa galáxia distante, um exoplaneta em formato de chapéu, cercado por luas de chapéu, uma estrela-chapéu iluminando cada dia. O clima ameno, agradável. Seus habitantes, cujos corpos têm a forma achatada de um chapéu, desfilam roupas coloridas e texturizadas pelas ruas, descansam sob copas de árvores também no formato do acessório e comem os saborosos frutos — chapeuzinhos suculentos — que caem aos montes de seus galhos.

Esse mundo inexistente nos manterá juntos de alguma forma. E sem riscos para a mente de Donna. Não irá sobrecarregá-la porque ela precisará dormir profundamente para vislumbrá-lo.

Toda vez que ela sonhar com ele, eu a verei feliz, explorando, vivendo e divertindo-se aos extremos, em seu melhor estilo aventureiro. Cada hora, uma experiência diferente em suas terras e esquinas longínquas. O mais importante: sempre consciente do seu valor para o universo e para as pessoas, ou seres, que tiveram, têm ou terão o privilégio de cruzarem seu caminho.

E toda vez que acordar, Donna terá esquecido tudo. A TARDIS e o alienígena de sobretudo que a acompanharam em tal empreitada. Até a próxima vez, é claro. Até o próximo sonho maluco. Até a nossa próxima viagem ao Planeta dos Chapéus.

Mais uma vez, teremos o melhor dos tempos.


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