Deitada em seu colchão afofado por várias almofadas, Una encarava o teto mal pintado por ela mesma e pensava sobre a semana que tivera. O garoto Arth não saia de sua cabeça por um minuto. Ela havia abaixado demais a guarda para ele esses dois últimos dias, tinha ido de total hostil para amiguinhos e trocas de sorriso em uma noite, e agora ela precisava arrumar isso. O sorriso de lado do garoto veio em sua mente, fazendo-a sorrir com a lembrança e depois grunhir de raiva com a imagem. Ela precisava dar um jeito nisso, ignorar o garoto, não ser simpática dessa forma com ele, de agora em diante se ela fosse conviver com o grupo e ter amigos ela deveria tomar muito cuidado com ele.

Seu celular vibrou e ela rolou para a outra ponta da cama para alcança-lo, era Flora.

“Parece que meu chefe quer treinar uma pessoa nova hoje e me deu um tempo a mais de intervalo! Se quiser aparecer por aqui antes, fique à vontade! Beijinhos.”

Preguiçosamente Una saiu da cama e encarou sua arara, pegando um jeans skinny surrado e desbotado e uma regata larga preta, amarrando uma jaqueta na cintura. Parou em frente ao espelho dando uma leve mexida em seus cabelos bagunçados e pendurou a bolsa em suas costas. Seus olhos apresentavam leves olheiras arroxeadas, resultado de uma noite fora de casa e um dia cheio de corações em pouco tempo. Ela estava exausta.

Pegou um taxi e desceu e frente ao shopping, indo em direção a livraria direto. Seu celular apitou assim que ela pisou no lugar, ao desbloquear a tela pode ver mais dois avisos de oportunidades de corações na tela que apontavam para o shopping. Ela bufou ao pensar que teria que dar um jeito de flechar pessoas na companhia de Flora.

Encontrou a garota em frente a livraria, sentada em uma poltrona com um refrigerante em mãos, ela lia alguma revista nerd até levantar os olhos e encontrar com Una se aproximando, a garota abriu um sorriso que foi logo correspondido e se levantou para abraçar a amiga, Una de primeira congelou com a ação, mas depois devolveu o abraço, tentando relaxar.

—Ai meu deus, você não sabe como eu ‘to aliviada de você estar aqui comigo! – A garota começa a falar assim que a outra se senta ao seu lado. – Não consigo nem imaginar o desastre que seria se eu tentasse conversas assim com o Arth. – Ela rola os olhos e ri. – Alias, precisamos falar dele depois e sobre VOCE TER DORMIDO NA CASA DELE.

—Não foi nada demais, viu. Até por que isso só aconteceu pelo fato da senhorita ter ido para a casa do Thom e me abandonado completamente. – Una faz uma careta para a garota, que tem as bochechas levemente coradas, mas não consegue disfarçar o sorriso.

—Olha, pode até ser, mas você não pareceu nem um pouco incomodada em ir com Arth naquele momento.

—Você ‘tava louca demais para lembrar disso. – Una rola os olhos para a garota. – Mas aposto -Não. Claro que não. Mas esse é um assunto que deveria ser discutido.

—An, não mesmo. – Una estava se divertindo com aquele papo de garota adolescente, ela nem se lembrava quando havia sido sua última conversa desse tipo.

Provavelmente na última reunião de família, ouvindo as histórias de seus irmãos e sobre os amigos que eles haviam feito, alguns chegaram até a frequentar escolas e viviam vidas relativamente normais. Una se perguntou como e porque nunca havia dado essa chance a si mesma.

—Enfim. Eu acho que estou realmente gostando do Thom. O que é estranho já que crescemos juntos, nos três inclusive, e ele sempre foi o amigo bobão e fofo que é atrapalhado com as garotas e me faz rir a todo momento ai de repente eu começo a me sentir totalmente idiota perto dele! Tipo, eu sempre fui uma garota superconfiante quando a questão é romance, mas agora do nada eu me sinto totalmente confusa, apaixonada, muito idiota. – A garota começou a falar rapidamente como se precisasse tirar aquelas palavras de dentro dela o mais rápido possível.

—Ei, respira. Calma. – Una tentou acalmar a garota, colocando uma mão em seus ombros e segurando um risinho.

—Meu deus eu me sinto tão besta! Você já se sentiu assim?

Una riu, dessa vez deixando escapar um pouco de sua habitual frieza no riso. –Não. Nunca me senti assim.

—Sorte a sua, querida Una. – A loira arregala os olhos ao ouvir seu nome, o que faz Flora rir. –O que? Você achou que meu melhor amigo não ia me contar o seu nome?

—Eu estou um pouco constrangida agora. – Ela solta, percebendo suas bochechas esquentarem.

Ela se importava com a opinião de Flora sobre a mentira que havia contato quando se conheceram! Isso era tão novo para Una. A garota nunca havia imaginado que um dia iria se preocupar com o que uma mortal, ou um pequeno grupo deles, pensava sobre ela e as coisas que ela havia dito.

—Ei, relaxa. Eu já tive vergonha do meu nome também. – A garota sorriu para ela, amigavelmente.

—Flora é um nome muito bonito.

—Una também é.

Una sorri e a amiga retribui. Ela se sentia realmente querida ali, e era muito estranho se sentir querida por alguém que não fosse Ian ou Ryan.

—‘Tá, agora que você sabe que eu sei seu segredinho e está tudo ótimo maravilhoso, vamos ao que REALMENTE interessa querida Una. – A garota se pôs de pé e jogou a latinha de refrigerante no lixo. –Eu preciso muito de ajuda para escolher uma roupa. – Ela ri.

—Hm, claro, mas... por que você precisa? Digo, existe alguma ocasião especial? – Una tenta segurar um risinho.

—Obviamente. Thom e eu vamos sair esse final de semana. – Ela cora. – Digo, não é como se não saíssemos todos os finais de semana, mas esse vai ser diferente, sabe? E ele já conhece tooodas as minhas combinações de shorts e camisetas, queria alguma coisa nova, especial.

“Como essa sensação que agora você tem por Thom”, Una pensa, sorrindo para a amiga nervosa a sua frente.

—É claro que eu vou te ajudar garota. Não sei como você se sente, mas ficarei feliz em ajudar! – Naquele momento ela só conseguia pensar que ela havia deixado a amiga assim quando usou uma de suas flechas.

Era um tanto quanto engraçada a situação, uma nova experiência. Una nunca havia presenciado de perto os efeitos das flechas em uma pessoa, em um casal, e agora parecia que ela iria acompanhar todo o processo do ladinho das pessoas. Não pôde deixar de pensar o que a garota diria se soubesse que ela era total responsável pelos sentimentos que agora a garota sentia pelo amigo. Será que ficaria brava? Encarou Flora que sorria bobamente para o celular enquanto digitava algo e pensou que seria muito difícil a garota sentir raiva daquilo, ela estava feliz. Radiante. Una sorriu, por mais que tenha desejado por muito tempo que as pessoas sofressem com o amor ver aquela demonstração de felicidade causada por ele a deixou comovida.

—Vamos então? – Elas caminharam em direção a uma loja bem arrumada e com aspecto de ser bem cara.

Entraram e os olhos de Flora já começou a buscar peças que chamassem sua atenção, indo direto para uma arara aonde se via várias peças xadrez e poás diferentes. Flora seguia uma estética meio grunge básico quando se vestia, misturando ocasionalmente peças aleatórias que você nunca imaginaria vê-la usando, como o vestido de estampa floral que ela já tinha em mãos.

—Você acha que isso ficaria bom em mim? – Pergunta meio insegura, encarando a amiga.

—Não sei se combina muito bem com você – Una ri – mas não custa experimentar, não?

A garota concorda e segura o vestido em uma das mãos enquanto continua a remexer os cabides com a outra.

—Você não vai ver nada?

—Hm, acho que não. Sabe, não sou muito uma pessoa de comprar roupas.

—Aí para com isso. Todo mundo gosta de comprar roupas.

Una revira os olhos para ela, que ri. “Bom, realmente. Pensando bem, seria ótimo gastar um pouco no cartão. ” Ela pensa, sorrindo por dentro. Se ela fosse ter amigos, sair e tentar se tornar uma pessoa normal e sociável fazer compras com Flora poderia ser uma das coisas que ela faria muito, então decidiu tentar se divertir com isso.

Lentamente ela andou até uma arara de jeans e começou a olhar as peças.

—Sabe, eu vou sair com Thom na sexta lá pelas oito da noite, mas as onze tem uma festa na casa do Max. Você e Arth podiam combinar de nos encontrar lá! – Flora falou um pouco alto para alcançar Una que estava na sessão masculina olhando umas camisetas, um pouco distante.

Ela parou por um segundo, tentando não se irritar com a sugestão de Flora.

—Não sei se é uma boa. – Diz, não querendo soar muito seca.

—Você não gosta dele? Porque assim, acho que ele super gosta da sua companhia. – Ela segura um risinho.

—Não. Quero dizer, nada contra, mas esse fato me deixa irritada. – Ela vai chegando mais perto de Flora para diminuir o tom de voz.

—Ah, qual é! Arth é um dos maiores pegadores da escola, já que ele desencana de você e isso passa. – Ela encara Una com um sorrisinho e com várias peças de roupa em seus braços.

—Espero. – Ela diz seria, mas depois ri da garota pequena tentando segurar milhões de peças ao mesmo tempo. –Vem, vamos provar essa avalanche antes que tudo caia.

Flora Ri e as duas vão em direção ao provador, entrando cada uma em uma cabine, lado a lado.

—Da um gritinho quando provar algo para eu ver! – Ela grita, já dentro de sua cabine. – Eu vou te mostrar tudinho que eu provar!

—Pode deixar. – Una ri e fecha sua cortina do provador.

Parada em frente ao espelho fortemente iluminado ela não consegue fugir de se encarar. Os olhos grandes demais, com aquela luz forte mais violetas do que o normal, a bochecha magra e chupada, os lábios finos e um cabelo extremamente branco em volta de seu rosto, com leves cachos bagunçados. Ela levou os dedos ao rosto, passando-os embaixo dos olhos e descendo até os lábios, as unhas arranhando levemente a pele, suspirou. Começou a se despir e suas asas se sentiram confortáveis o suficiente para se abrirem e ocuparem praticamente todo o espaço da pequena cabine, tocando levemente o chão. Deu uma boa olhada para a cena, uma garota extremamente magrela e pálida, com uma roupa intima preta que a deixava com aspecto de mais branca ainda e suas enormes asas atrás, passou os dedos nas suas costas, sentindo o começo delas ali, logo abaixo da escapula, arranhou ali um pouco mais forte, subindo pelo pescoço com as unhas cravadas na pele.

—Posso abrir?? – A voz de Flora a desperta.

—N-não. Só um minuto. – Ela responde meio desesperada, olha ao redor e pega o short jeans e uma das camisetas que havia escolhido e as veste rapidamente, encolhendo as asas novamente.

A garota não seria capaz de vê-las nem que elas estivessem totalmente abertas, mas Una sempre tinha medo de não ser capaz de esconde-las e deixar que as pessoas a vissem sem querer.

Abriu a cortina e deu de cara com Flora, que vestia um macacão curto e justinho na cintura, listrado verticalmente de azul marinho e branco e um quimono preto de mangas compridas.

—Você ‘tá muito fofa. – Declara. – Mas ‘tá bem bonita.   

—Eu pensei isso também! – A garota quase grita, e Una ri. – Gostei da camiseta. Mas ela não é muito básica não?

Una olhou para baixo, havia colocado uma camiseta vinho com alguns respingos propositais de tinta branca, alguns tamanhos maiores que o dela para que ficassem no comprimento do short e mais larguinha no corpo.

—Ah, eu gosto. – Ela dá de ombros.

—É, eu sei. – Flora ri, vai até sua cabine e volta com um vestido preto de veludo. –Experimenta isso.

—Não, obrigada. – Una olha com desgosto para a peça e ri.

—É sério. Você precisa de uma roupa para a festa de qualquer forma, e eu tenho certeza que esse vai ficar lindo nesse seu corpinho de modelo.

—Para com isso.

—Vai, Unaaaa. Por favorzinhoo. – A garota faz biquinho e Una suspira irritada.

—Dá isso aqui vai. – Ela pega a peça da mão da amiga e entra no provador novamente.

Ela se livra da camiseta e do short, deixando-os ao lado e coloca o vestido. Era um simples pretinho básico, de veludo e alcinhas, meio soltinho no corpo, mas de uma forma sexy e bem curto. Ela revira os olhos e abre a cortina, Flora bate palminhas quando a vê e sorri.

—Você ‘tá muito bonita, garota! – Ela a encara, pensativa. – Já sei o que falta. – E então sai correndo dos provadores.

Logo a garota volta segurando uma camisa xadrez vermelha e uma jaqueta jeans bem destruída e desbotada.

—Coloque os dois, uma meia bem legal e um coturno e ficará mais que perfeito. – Entrega as peças para Una sorrindo, como se estivesse super aprovando a própria dica.

—Não sabia que você realmente gostava dessas coisas. – Disse, enquanto pegava as peças e as vestia. – Nossa, ficou muito bom. – Una se encarou no espelho meio espantada por ter gostado da imagem.

—Dã! É claro que ficou. – Ela ri e volta para a própria cabine. – Agora que você já sabe o que vestir sexta, foca em mim!

—Mas ainda tem quase uma semana para essa festa, eu não dei nenhuma garantia de que realmente vou. – Una resmunga enquanto veste outra camiseta e uma saia jeans tingida com vários tons de vermelho. Vermelho escuro era sua cor favorita, misturadas com peças brancas e pretas sempre davam resultados satisfatórios para ela.

—Ah, mas você vai sim. Não tem essa de não dar garantia. – Flora tentou soar mandona, com pouco sucesso. – Agora que você me deu um gostinho de como é ter uma amizade de garota ao meu lado, eu nunca nunquinha mais vou sozinha em festa alguma.  – Ela ri.

—Aham, se você diz. – Una riu e decidiu apenas concordar com a garota, já que ela não tinha dúvidas nenhuma de que ela acabaria cedendo para a garota e aparecendo na festa.

—Pronta? Acho que agora eu arrasei demais. – Disse, abrindo a cortina da cabine de Una, que tentou não olhar brava para a garota.

—Deuses, ficou perfeito!

Flora estava com um vestido bem colado ao corpo com uma estampa xadrez bem pequena em preto e branco e detalhes em renda preta na barra e decote do vestido, uma jaqueta de couro com detalhes em um dourado rosinha.

—Agora imagina com um tênis preto cano alto bem clássico, um batom vermelho e super delineado preto nos olhos.

—Thom vai simplesmente surtar. – Una riu, imaginando a cara de bobo que o garoto já fazia ao ver Flora usando apenas uniforme triplicada ao encara-la tão arrumada para ele.

—Eu sei!! – Elas riram juntas. –Meu deus, todo meu salário do mês vai nessa desgraçada dessa jaqueta. Mas ela é linda demais para ser deixada para trás.

Una riu e balançou a cabeça para a garota. As duas voltaram para o provador para colocarem suas roupas e passar no caixa.

Além da roupa escolhida para sexta, Flora levou mais uma calça xadrez vermelha e uma camiseta branca com uns detalhes bordados no peito, Una também levou a camiseta vinho, a saia jeans e as roupas escolhidas por Flora para ela. As duas saíram da loja rindo e discutindo sobre Thom e como ele estava completamente apaixonado por Flora, enquanto a mesma tentava se mostrar insegura e em dúvida, mesmo Una sabendo que ela era totalmente consciente dos sentimentos do garoto por ela.

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