Preguiça - A Revolução escrita por Lai Carpe


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Então né, eu tive essa ideia bem loca pra uma história e decidi escrever, eu já havia postado essa história aqui uma vez, mas retirei a publicação para revisá-la, e agora que comecei a fazer isso, estou repostando.

A princípio seria uma one, mas, como ficou maior do que o previsto, resolvi dividi-la em alguns caps e transformá-la em uma short-fic.

Além disso, eu tbm postei ela em outras plataformas: Spirit e Wattapd.

E acho q é só, tenham uma boa leitura ^^



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/728418/chapter/1

Rio de Janeiro, 2018.

Arthur's Point Of View

Fazia uma temperatura agradável na noite carioca, eu até podia enxergar algumas poucas estrelas no céu, o que era raro hoje em dia devido a tantos gases poluentes.

Eu tinha os pés descalços sobre o chão de madeira da minha pequena varanda, vestia uma blusa branca e uma calça de moletom cinza, tomava um chá de camomila e observava as areias da Praia do Flamengo serem lavadas pelas ondas do mar, enquanto aguardava o início do último debate político das eleições presidenciais daquele ano.

Um momento de preparo psicológico. Um momento de calmaria que antecedia a mais uma tempestade já esperada, a partir do momento em que eu decidi assistir ao debate no conforto do meu sofá.

Olhei o relógio em meu pulso e, vendo que faltavam poucos instantes, retornei à sala.

♦♦♦

Amanda's Point Of View

"Dez minutos" — Ouvi alguém da produção gritar do corredor.

— Dez minutos. Dez minutos. Dez. Minutos. — Repetia frustrada, e já um tanto desesperada, massageando minhas têmporas e tendo os cotovelos apoiados na penteadeira do camarim. — Onde aquele homem se meteu?! - Perguntei a ninguém, visto que estava sozinha no recinto. — Ah, mas ele vai ouvir muito quando chegar. Vou meter a mão na cara dele, para tomar vergonha na cara e ter mais responsabilidade com horários! Argh! — Bufei irritada.

Coloquei-me de pé e passei a andar de um lado a outro do camarim enquanto murmurava as mais possíveis e impossíveis ofensas a meu amigo, chefe e afins, até que ouvi três batidas na porta.

— Pode entrar, está aberta! — Avisei sem interromper minha 'caminhada'.

— Com licença, Srta. Leblanc. — Marco pediu. Ele vestia um terno cinza, trazia um quepe de chofer nas mãos e tinha um fone de ouvido transparente ao redor do pescoço.

— Oh, claro, Marco! — Assenti um tanto surpresa com a presença dele. — É... Se você está aqui, quer dizer que o Arthur finalmente chegou. Oh, graças a Deus! — Exclamei aliviada. — Chofer, motorista ou segurança? — Perguntei reparando de relance seu figurino mais uma vez, enquanto já buscava minha bolsa para sairmos dali. Marco era um moreno alto, olhos azuis, cabelo ondulado na cor castanho escuro, e um rosto quadrado. Dono de um sorriso muito sedutor, por sinal. Ele era o personal trainer do Arthur há sete anos, uma espécie de motivador pé no saco, que o ajudava a digamos equilibrar sua preguiça. Ele e o Art ficaram noivos há três meses, o que só contribuiu para eu que tivesse que aturar esse chato mais horas do dia com seu inoportuno hobby; atuar.

— Os três! Sou mil e uma utilidades, madame! — Exclamou sorridente, ajustando o paletó ao corpo e, repentinamente, vi seu semblante tornar-se inseguro. — Err... Sinto informar, porém, que a senhorita está enganada!

— Como assim enganada? Enganada como? E pare de me chamar de senhorita, porra! Você nem é tão bom ator assim! Anda, desembucha. — O interrompi, péssimo momento para mais uma de suas improvisações.

— Aff, mano, larga de ser estraga prazeres, eu estava tão bem no meu papel! Vim até engomadinho. — Disse passando a mão esquerda nos cabelos endurecidos por gel. — Retomando o assunto, e dessa vez não me interrompa. — Exigiu apontando o dedo indicador em minha direção e prosseguiu ajeitando o paletó. — Ele não vem. — Disse simplesmente, com a maior tranquilidade.

— Mas que porra?! Como assim ele não vem? Ele não pode fazer isso. Perdeu o juízo de vez. — Exclamei, já buscando meu celular e procurando seu número nos contatos.

— Ei, ei, calma. — Disse se divertindo com meu aborrecimento e pondo as mãos em meus ombros.

— Cala a boca, Marco, não me pede calma não, caralho. — Tirei suas mãos de mim com mais agressividade do que pretendia. — Até parece que você não sabe que é em cima de mim que vão descer o pau se ele não aparecer por aqui hoje. O que ele tá querendo, afinal? Comeu criança quando era merda, só pode! — Concluí.

— Esse seu estresse não vai resolver nada, você o conhece muito bem para saber que, quando ele toma uma decisão, dificilmente arrepende-se. E também sabe que ele não faltaria a um compromisso como este sem uma boa justificativa. — Disse calmo, havia sentado na cadeira que eu ocupava minutos atrás e rodava nela feito uma criança.

— Eu e ele temos conceitos diferentes de "boas justificativas". — Eu disse sarcástica.

— Fodam-se os conceitos de vocês! Ele escreveu uma carta, pediu que eu trouxesse aqui e a entregasse a você. — Disse retirando um envelope do bolso interno do paletó e o entregando a mim, assim que me aproximei dele. — Ele disse que você deverá explicar a situação aos demais candidatos, que eles deverão votar e, se a maioria permitir que a carta seja lida ao vivo, você terá que ler ela em rede nacional. E tecnicamente ele terá participado do debate. Tcharam! Esse é o plano dele. — Disse dando de ombros.

— Isso é loucura, duvido que os outros candidatos permitam, é menos concorrência para eles. — Ponderei já abrindo o envelope, tomada pela curiosidade.

— Pois é, eu também pensei nisso, e acho mais prudente recorrermos à população. Vamos agora falar com a produção e pedir que abram uma votação online para que os eleitores possam votar durante o debate. — Ele dizia enquanto eu dividia minha atenção entre sua fala e as inúmeras linhas ocupadas pela caligrafia despreocupada do Art. — E ao final dele você lê a carta dentro do tempo de participação que o Art teria direito. Tuts tuts. — Desviei a atenção da carta por uns instantes para encará-lo e ver um sorriso maroto em seus lábios, ele esfregava as mãos uma na outra, e antes de se dirigir à porta, dançou o moonwalker em volta de mim. Gargalhei com a gracinha dele e pedi que se adiantasse enquanto eu terminava de ler a carta.

♦♦♦

Marco’s Point Of View

Eu andava apressado, quase saltitando pelos corredores do estúdio de gravação, em decorrência de minha genial ideia. Não sou nenhuma gazela, tenho meus modos e os uso quando julgo necessário, mas deveríamos poder nos expressar como bem entendêssemos e sem ser julgados por isso. Quer dizer, até onde eu sei, ainda não é crime ser feliz. Porém, não vou frustrar-me por conta disso, já que eu tenho maneiras muito melhores de expressar minha felicidade, na prazerosa companhia de meu noivo.

Cheguei à sala reservada aos diretores do programa, dei três batidas na porta e alguns segundos depois vi a maçaneta ser girada.

— Pois não? — Disse o homem que apareceu à minha frente, encarando-me por cima dos óculos de grau e ajeitando-o em seu enorme nariz. Eu era poucos centímetros mais alto do que ele, que possuía cabelos escuros com alguns fios grisalhos e trazia uma expressão firme e não muito amigável no rosto.

— Err... Senhor, eu sou Marco Arantes e vim aqui em nome do candidato Arthur... Err... — De repente não sabia como prosseguir. "Esse cara vai me dar um 'não' tão seco que seria melhor estar perdido no Saara. Ah Art, você me paga seu filho da puta."

— Sim... — Encorajou-me a prosseguir. Tinha um semblante visivelmente preocupado. Também, quisera né, o Art sempre aprontou cada uma, que já era de se esperar que as pessoas ficassem preocupadas com a mera menção de seu nome. Tal pensamento me fez recordar de uma ocasião em que chegávamos a um motel e encontramos um senador, que havia travado um debate com o Arthur a respeito da família tradicional brasileira há alguns dias, a questão era que o tal senador não estava com sua esposa naquele lugar e o Art não pensou duas vezes antes de filmar o senador aos amassos com uma amante num Mercedes-Benz E350 de vidros não tão escuros e postar o vídeo no YouTube.

Fui tirado de meus pensamentos ao ouvir o som de um pigarro. Naquele momento bateu uma súbita saudade da Mandy.

"Já pode aparecer, senhorita LeBlanc.". — Pensei, encarando o teto, como se por um milagre aquele gesto fosse fazer minha adorável amiga brotar ao meu lado.

— Sr. Arantes, prossi... — Chamou-me, e no segundo seguinte foi interrompido por uma voz familiar aos meus ouvidos.

— Sr. Amel! — Mandy o chamou um tanto alto do fim do corredor e deu uma curta corridinha até nós. "Lembrar-me de questioná-la sobre seu dom de ler mentes, ô mocinha abençoada". — Sr. Amel, boa noite! — Estendeu a mão para cumprimentá-lo.

— Amanda... LeBlanc. — Encarou o crachá que a Mandy trazia na blusa.

— Isso mesmo. — Disse ainda recuperando o fôlego. — Creio que meu amigo aqui já o tenha deixado a par da situação, não é mesmo? — Perguntou, intercalando olhares entres mim e o diretor.

— Acho que era o que ele pretendia, mas não teve sucesso em concluir! —Disse com um tom sarcástico e impaciente, analisando-me de cima a baixo. Já não fui com a cara desse sujeito.

— Bom, então deixe que eu assuma daqui. — Disse, esfregando as mãos no casaquinho que usava. — Houve um imprevisto e o candidato Arthur não poderá comparecer ao debate desta noite. No entanto, ele enviou uma carta com o que ele pretendia falar aqui hoje e... — Foi interrompida pelo sujeito mal-encarado.

— Espere um instante, deixe-me ver se entendi, ele escreveu as perguntas que faria aos outros candidatos esta noite, mas e as respostas que ele daria às perguntas dirigidas a ele? Como ficam?

— Err... Não foram bem perguntas que ele escreveu, está mais para um discurso... — Respondeu um tanto desanimada, já prevendo o que viria a seguir; uma gargalhada do diretor. Fui inundado por uma súbita vontade de socar a cara dele.

— Minha cara, isso aqui é um debate, não um comício. Sinto muito, mas eu não posso ajudá-la.

— Senhor, eu sei que não está bem nos padrões de um debate, mas ele tem direito a um determinado tempo para expressar seu plano de governo.

— Está correta, mas ele abdicou deste direito no momento em que optou por não comparecer aqui no horário predetermi... — Ia dizendo, quando Mandy o interrompeu.

— Eu compreendo isso Sr. Amel, mas nós queríamos apenas abrir uma votação para os demais candidatos, para que eles decidissem, além de propor também que uma enquete online fosse aberta para que o povo também pudesse votar e então o resultado diria se a carta do Arthur poderá ou não ser lida! — Disse num só fôlego, sem dar brecha para que o homem a interrompesse também.

— É só? — Perguntou, fazendo brotar em meu peito uma faísca de esperança.

— Sim. — Mandy disse, parecia ter a mesma esperança que eu.

— Eu sinto muito, mas ainda assim não posso fazer nada. Passar bem. —Disse recuando alguns passos e fechando a porta, mas não antes que eu o impedisse, colocando meu pé entre a fresta que restou.

— Marco! — Mandy me repreendeu.

— O que está fazendo rapaz?! —Perguntou encarando meu pé e em seguida meu rosto. — Eu vou chamar o segurança! Faça-me o favor! — Ergueu a cabeça, pronto para gritar.

— E o que você acha que eu sou? — Perguntei sarcasticamente, retirando um crachá falso de dentro do meu paletó e praticamente esfregando na cara do sujeito. Virei o rosto para Mandy e dei uma piscadinha, vendo-a revirar os olhos.

— O que?! — Perguntou confuso e pareceu pensar por um instante. — Então será demitido. — Disse simplesmente. "Fodeu, nessa parte eu não pensei!".

Aproveitando meu momento de distração, o desgraçado pisou no meu pé.

— Passar bem! — E fechou a porta.

— Que porra é essa? Comeu merda caralho? Como você enfrenta o homem desse jeito? Seu cuzão, você acabou com qualquer chance que a gente pudesse ter! — Disse a Mandy, gritando e me arrastando pelo corredor de volta ao camarim.

— Mas a gente não tinha chance nenhuma, mulher! — Me defendi e a ouvi bufar irritada.

— De onde você tirou aquela porra de crachá?

— Puff, você me subestima demais! — Fingi estar ofendido.

— Eu não te subestimo, só não te acho a pessoa mais inteligente do mundo, e a cada lufada de ar que você dá, a minha teoria está mais perto de ser comprovada!

Ignorei o insulto de minha simpática amiga e continuamos andando de volta ao camarim, até que eu ouvi um barulho de notificação em meu celular e uma luz se acendeu em minha mente.

— Já sei! — Disse, estacando no lugar repentinamente.

— Ai meu Deus, lá vem! Conte-me sua brilhante ideia, Einstein!

— Vamos tweetar! — Anunciei abrindo os braços teatralmente.

— Quê? Como assim? Não entendi...

— Ai, minha lerdinha, vem que eu te explico no caminho! — Disse a puxando pelo braço de volta ao camarim.

Chegando lá, expliquei a ela o que iríamos fazer. Se queríamos o apoio do público, nada como ir até o público pelos meios mais práticos e acessíveis. Assim, como 140 caracteres não permitiam que expressássemos toda nossa insatisfação com a direção do debate, twittamos incansavelmente alegando coisas como a democracia questionável deste país, o caráter manipulador da mídia — com ênfase na culpa das redes televisivas — e o descaso com os possíveis eleitores do meu candidato preferido, afinal de contas, tecnicamente ele participaria do debate.

E por fim, aparentemente conseguimos causar uma significante comoção nacional, compartilhamos nossa indignação e expusemos os responsáveis através da minha conta pessoal, da conta da Mandy, do próprio Arthur, uma vez que tínhamos a senha dele, e até mesmo da conta do partido. Algumas centenas de pessoas perguntaram o porquê daquelas "acusações" justo agora, faltando poucos instantes para o último debate e nós não poupamos esclarecimentos.

Enfim, só nos restava esperar que a produção tomasse ciência de nossa pequena revolução.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Continua...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Preguiça - A Revolução" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.