Apenas os Tolos Fazem o que eu Faço escrita por roux


Capítulo 1
I




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— Quem é você?

Essa foi à primeira coisa que eu perguntei para ele quando recuperei minha voz, quando saí do transe do sexo, estava ofegante quando ele saiu de cima de mim. O corpo suado, o meu também, os cabelos bagunçados, os meus também, os olhos verdes me encarando, o sorriso safado e descontraído nos lábios. Ele me ignorou, minha pergunta não valia a pena para ser respondida, eu não valia a pena quando não estava rebolando. Eu não sorri de volta. Ele sustentou o olhar por mais um tempo, e então, caminhou até sua roupa caída no chão do quarto, passou a se vestir, de costas para mim, uma rápida melodia tocada em assovio escapando de sua boca. Eu suspirei frustrado, e me deitei nu sobre a cama, com vergonha, não por estar nu, mas sim, vergonha pelo que eu vinha fazendo. Ele terminou de se vestir e se ajoelhou sobre a cama, de tênis. E então me encarou.

— Eu indo embora, véio. — Falou com o sorriso presunçoso nos lábios. Levantou então, e saiu do meu quarto.

Continuei ali, deitado, quieto, me abracei e virei para o canto. O que eu estava fazendo da minha vida? O que eu estava fazendo comigo? Ouvi o barulho da geladeira sendo aberta. Ele estava procurando algo pra comer.

Eu me sentei na cama macia e bagunçada. Era a minha cama! Eu passei os dedos pelos lençóis, macios, podia ainda sentir o adocicado do amaciante de flores, agora, se misturando com cheiro de suor de sexo, apenas sexo. Eu não passava de sexo para o Felipe, apenas sexo com o hétero que gosta de descobrir. Estremeci com esse pensamento e ouvi a porta bater. Ele se foi, assim como chegou, sem explicações...

Eu levantei da cama e caminhei até minha cueca, eu a vesti e sai do quarto. Respirei cansado, sem animo e me mandei para a cozinha. Estava com fome, bastante fome, larica.

Mas não conseguia parar de pensar. Ele não me beija, eu sou apenas sexo.

 

 

Eu estava na festa da Marina. A mesmice de sempre, um bando de adolescentes entediados e infelizes com suas vidas, pagando de “olha como estou feliz, eu encho meu cu de maconha e sou feliz, eu transo o tempo todo e sou feliz”. O ambiente estava com um cheiro forte de maconha, não que eu não usasse, mas aquilo estava me incomodando aquele dia. Eu estava me incomodando aquele dia, existir estava me incomodando, na verdade.

— Fala aí cara. — Ouvi alguém dizer e levantei o olhar. Meu nome não é cara, senti vontade de dizer, mas respirei fundo, até porque todos que estavam ali eram apenas caras e minas quaisquer, que víamos em todas as sociais, mas que não faziam diferença nenhuma, na verdade nem podíamos chamar de amigos de rolê, era sempre cada um na sua. Não conhecia, para ser sincero nunca tinha visto antes. Sorriu amigável e me estendeu o beck. Eu não peguei, acenei com a mão dispensando. Ele estendeu então um copo de bebida, levei aos lábios. Catuaba, eu odiava, mas todo mundo bebia então eu bebia também, tomei mais um gole e devolvi pra ele.

Ele pegou a bebida e tomou um gole. Notei quando o pomo de Adão em seu pescoço se movimentou enquanto engolia, achei aquilo fascinante. Era divertido e engraçado. Eu segurei a risada, acho que já estava bêbado.

Bah, eu sou o Lucas, sou primo da Mariana, estou de passagem por aqui em São Paulo, mas moro no sul. Cheguei hoje e estou procurando me enturmar nessa festa, não conheço ninguém aqui, guri. — Ele disse sorrindo e tragando a maconha mais uma vez.

Ele nem precisava dizer, eu conheci o sotaque logo de cara, mas a Mari nunca tinha falado sobre primo do sul. Eu sorri, sem jeito. Meu sorriso enferrujado, não sabia mais como fazer aquilo, não nos últimos dias pelo menos.

— Eu sou o Mateus. Eu sou...

— Amigo da Mari, ela fala de você o tempo todo, tche. — Ele me interrompeu e sorriu. Eu fiquei pensando naquilo e achando a frase muito estranha. Não sabia que a Mari, a Mariana que eu conheço falava sobre seus amigos, logo ela que nunca se importou com nada ou alguém além dela mesma. Eu sorri.

— Eu não sabia que ela falava sobre... — Pensei em dizer, alguém além dela mesma, mas seria pesado. Ela era minha amiga, então apenas disse. — mim.

— Ela fala de você o tempo todo guri, em todas as nossas conferências ela vive dizendo o quando queria que nós nos conhecêssemos, que seriamos bons amigos já que pensamos iguais em vários aspectos. — Ele disse rindo e terminando de fumar seu baseado, só então me toquei que eu queria dar um trago, mas agora já era. Ele bebeu num gole só o restante de sua catuaba. — Você não é de falar muito, né tche?

Então riu.

A risada mais estranha que eu já tinha ouvido.

A risada mais louca que chamou minha atenção e me fez achar bonita.

Eu ri também, mas baixo, com minha risada seca.

— Acho que estou meio bêbado. — Eu disse pra ele, e então notei que a música tinha mudado nada de pop indie. Estava tocando funk. Eu não podia esperar outra coisa, estávamos numa festa paulistana, sem funk, não seria uma “boa” social. Eu logo emendei tentando puxar assunto. — Vai passar quanto tempo por aqui.

— Eu vou ficar mais um mês, estou resolvendo certas pendencias para poder mudar pra cá, vou estudar por aqui. — Falou entusiasmado, como se isso de alguma forma tivesse que me entusiasmar também.

Eu não o fiz, pois não me importava. Encarei sem demonstrar entusiasmo e ouvi uma voz já tão conhecida.

— Não vai apresentar não?

Eu suspirei sem me virar e encarei primeiro o primo da Mari que eu já havia esquecido o nome, e depois me virei para Felipe. Esse estava com o rosto vermelho, era sempre assim que ele ficava depois de usar muita maconha. Encarei seus olhos verdes, estavam vermelhos, mas sua postura era firme, peito inflado, tentando mostrar alguma coisa. O que?

— Felipe esse é o primo da Mari. — Eu disse indicando o menino em minha frente e depois apontei para Felipe. — E esse é o namorado da Mari!

— Fala aí guri, eu sou o Lucas. Já vi muita foto sua, mas pessoalmente tu é muito diferente, tche. — Falou Lucas sorrindo amigável.

Felipe não sorriu.

Apenas me encarou.

Eu encarei.

Cansado.

Eu suspirei e ele continuou a me encarar.

— Está acontecendo alguma coisa aqui? — Perguntou Mariana que chegou abraçando seu primo. Ela sorriu pra mim e depois seus olhos brilharam enquanto ela olhava para Felipe. — Os três homens da minha vida juntos. Essa festa está tão ruim, não é mesmo? É a pior que eu já dei. Será que tá faltando bebida? Maconha? Alguma coisa deve estar acontecendo, não é possível, minhas festas nunca foram tão paradas assim, não tem ninguém dançando. Mas sobre o que vocês estão falando? Não! Para tudo! — Ela quase berrou. — Vocês viram o cabelo da Martinha? Está horrível hoje, e aquela maquiagem mal feita da Duda? Nossa, eu nunca sairia de casa daquela forma...

Ela continuou falando. Era assim que a Mari funcionava. Ela afogava a todos nós com suas frases que muitas das vezes não faziam sentindo algum. As pessoas detestavam as festas dela. Era sempre um fiasco, ela falava demais.

Eles continuaram conversando, o primo também resolveu desatar a falar. Eu suspirei. Cansado. Sempre cansado. De tudo. Isso. Cansado. Do mundo. Inteiro. Felipe ainda me encarava. Feio.

— Eu vou ao banheiro. — Falei e saí. Não poderia ficar ali mais nem um momento. O cheiro de maconha e nachos estavam me embrulhando o estomago. Invés de seguir pelo corredor e ir parar no banheiro. Eu segui para a porta da frente e escapuli da festa.

O ar frio me tomou. E eu me sentei no meio fio, os pés na rua. Àquela hora da madrugada não passava nenhum carro. Eu queria ir embora, mas não havia ônibus. Não tinha o dinheiro para o uber, precisaria dormir aqui. Eu teria que ficar no quarto ao lado ouvindo os gemidos de Felipe e Mari.

O que estou fazendo aqui? Foi à primeira coisa que me veio à mente. Eu não queria estar sozinho em casa, mas também não queria estar aqui. Pelo menos não queria mais, eu cheguei afim, mas não estou mais. Nenhuma novidade, eu sempre assim. Nunca quis nada por inteiro, sempre quis as coisas pela metade.

Eu era esse fracasso. Eu buscava por coisas incompletas, e quando era completa, eu fazia questão de usar só pela metade. Eu suspirei fundo e acendi um cigarro.

— Achei que você tinha parado de fumar. — Ele disse. Eu encolhi os ombros, tinha ido até ali para fugir dele, mas ele me seguiu. — O que você estava conversando com aquele cara?

— E desde quando eu passei a lhe dar satisfações da minha vida? Das minhas conversas ou de quando eu fumo ou não? — Perguntei seco. — O que você quer Felipe?

— Eu quero saber o que você estava conversando com aquele cara. Não fui com a cara dele. — Ele disse e sentou do meu lado. Puxou o cigarro das minhas mãos e tragou.

— Nada. — Eu disse e baixei o olhar. À tarde de ontem vindo a minha cabeça. Ele indo embora sem dizer nada, ou melhor, ele chegando sem dizer nada, arrancando a minha roupa e me fodendo sem dizer nada, então... Só depois indo embora sem dizer nada. Não queria muito assunto então fui grosseiro. — Nada que interesse a você!

— Essa doeu. — Ele falou e se levantou, me estendeu a mão. — Levanta que eu quero te mostrar uma coisa.

E aí estava meu calcanhar de Aquiles. Eu estendi a mão e segurei sua mão, ele me puxou do chão e caminhou comigo para longe da luz do poste elétrico. Ninguém nos veria ali, talvez, no fundo eu queria que eles vissem, não, eu não queria que vissem. Não queria que a Mari soubesse que ele a traia. Não queria que a Mari soubesse que eu a traia.

Ele me prendeu na parede. De costas para ele. Me encoxou com força e riu em meu ouvido antes de passar a língua quente e úmida em minha orelha. Eu estremeci e senti o corpo se entregar pra ele. Ele não me beijou como sempre. Apenas colocou o pau pra fora da calça e esperou que eu mamasse. Eu o fiz.

 

 

 

O sol começava a nascer e alguns estavam indo embora. Alguns outros dançavam agora no fim da festa. Estavam loucos demais. Felipe era um dos que dançavam. Estava agarro a Mari e se beijavam, e se comiam na frente de todo mundo. Eu desviei os olhos. Não queria ver. Era sempre assim, ele ficava comigo, mas era sempre ela que ele beijava e passava a noite.

O primo da Mari se aproximou de mim.

— Parece que hoje vamos dividir o quarto. — Ele disse com um sorriso simpático no rosto.

— É. — Eu disse sem interesse. — Se bem que acho que já tem ônibus, vou embora.

— Qual é guri fica aí. Depois que a gente acordar eu te levo de carro, tche. — Ele disse rindo. — Eu não mordo fica tranquilo.

Eu forcei outro sorriso.

 

 

 

Eu me joguei em um colchão no chão, e o Lucas se jogou na cama. Os dois de roupas, eu acho que ele também estava com vergonha de tirar a roupa na minha frente. Eu fiquei olhando o teto branco por um tempo. Ele em pouco tempo passou a roncar, era um ronco baixo e até mesmo gostoso no ouvido. Eu sorri. Então ouvi algo além do ronco. Eram os gemidos dos dois no outro quarto.

Era com ela que ele terminava a noite.

Eu cobri a cabeça com um travesseiro e fechei os olhos. Eu deveria ter ficado em casa.


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