Antes do Nosso Limite escrita por Mrs Days


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! Como estão?
Hoje é sexta e é dia de atualização!
Espero que gostem desse capítulo. Ele é um dos meus favoritos *--*



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Burley, Idaho – 2011

 

— Não acredito que você vai sair com Caleb Leighton! — Jessie exclamou jogando-se em minha cama com uma expressão sonhadora.

Abafei uma risada com o comportamento de Jessie, como se ela tivesse sido convidada no meu lugar. Mas a verdade era que eu queria pegar a mão dela e pular em todos os cômodos da casa, esbanjando minhas emoções, ao mesmo tempo em que queria me encolher em um canto e tremer de medo feito um chihuahua. Por isso acabei optando por seguir a onda de empolgação de Jessie, por mais que tivesse que frear suas loucas suposições do que aconteceria no sábado a noite.

— Isso sim que é uma bela despedida! — Jessie brincou apoiando seu cotovelo na minha cama e erguendo o torço para poder me encarar melhor. Um grande sorriso enfeitava os seus lábios, explicitando todos os pensamentos maldosos que dominavam a sua mente. — Para onde ele vai te levar?

Sentei-me na beirada da cama, tímida e ciumenta para relatar toda a minha conversa que tivera com Caleb. Ainda estava extasiada com o acontecimento, repetindo tudo em minha mente diversas vezes para ter a total certeza de que não se tratava de um cruel sonho que tive dormindo em uma das mesas da detenção. Jessie se aproximou de mim, deitando sua cabeça em meu colo para poder olhar para meu rosto corado. Seus cabelos cacheados se espalharam por meu colo e nos lençóis de minha cama, permitindo que seu rosto ficasse ainda mais jovial.

— Ele disse que me levaria ao limite. — sussurrei hesitante. Os olhos de Jessie se arregalaram levemente enquanto ela soltava um assobio baixo. — Só que não sei o que ele quis dizer com isso.

O sorriso de Jessie ficou ainda mais perverso.

— Acho que nós sabemos muito bem o que ele quis dizer com isso. — ela provocou e antes que eu pudesse rebater, ergueu seu quadril e começou a fazer movimentos estranhos. Eu comecei a gargalhar alto e ela parou, mexendo a cabeça como se estivesse satisfeita que eu tinha entendido. — Isso mesmo, garota! — começou a gargalhar junto.

Entre as nossas risadas histéricas, a porta do meu quarto foi aberta. Jessie virou a cabeça o máximo que pode com a limitação dos seus movimentos pela posição que estava deitada, contudo eu fui capaz de ver o olhar carregado de desprezo que Jade carregava enquanto estava parada na porta. Seu rosto estava rígido, como se ela tivesse comido algo e não tivesse gostado só que estava se obrigando a engolir.

— Podem fazer silêncio? Estou tentando conversar com meu namorado no telefone, mas suas gargalhadas estão me atrapalhando. — Jade reclamou e fechou a porta em seguida.

Eu e Jessie permanecemos em silêncio por alguns instantes.

— Acho que quem está precisando ir ao limite é a sua irmã. — Jessie brincou. E aquele comentário foi o suficiente para que começássemos a rir novamente. Fiquei sem fôlego, limpando o canto dos olhos por conta das lágrimas acumuladas quando Jessie tocou no assunto que eu estava tentando evitar. — Já falou com seu pai?

Isso foi o suficiente para que todo o meu bom humor evaporasse. A conversa com o meu pai estava sendo um grande atraso em meus planos. Já estava tudo pronto para a minha mudança. Jessie e eu tínhamos ido ao show de nossa banda favorito na semana passada e tive a grande sorte de ganhar a palheta do guitarrista, fazendo com a noite fosse melhor do que o planejado. Minha tia Lilian arrumou um quarto para que eu me hospedasse pelo tempo da faculdade e até conversou com um de seus amigos para me dar um emprego de meio expediente em uma livraria/cafeteria.

Minha mala estava devidamente arrumada e escondida no fundo do meu armário, com todos os documentos essenciais. Minha tia também tinha feito o favor de comprar minha passagem para a Califórnia, o que foi um sopro de alívio já que não tinha ideia de como arrumaria dinheiro para fazer tal coisa. Porém, nada parecia estar devidamente arrumado sem a aprovação de meu pai.

— Era para eu ter feito isso hoje, mas quando cheguei em casa depois da detenção, ele já tinha ido trabalhar. — suspirei cansada e passei os dedos por meus cabelos. — Não sei se terei outra brecha antes de sábado. Espero que sim, mas não estou muito esperançosa.

Novamente ficamos em silêncio, só que por motivos mais fúnebres do que os anteriores. Tinha medo de não ter a chance de me despedir devidamente com o meu pai, do mesmo jeito que não tínhamos chance de conversar a sós. Restringíamos aos cumprimentos básicos, como se fôssemos colegas de trabalhos e não membros da mesma família. E a pior parte era imaginar a reação dele quando eu contasse que estava indo embora no dia seguinte, com malas prontas e passagem comprada. Meu pai era um santo quando se tratava de paciência, mas era só ferir seus sentimentos que ele se tornava uma verdadeira fera.

— Enquanto sábado não chega, podemos nos concentrar em outras coisas. — Jessie disse levantando-se e pegando a sua bolsa. Curiosa, observei-a futucando sua bolsa até me encarar com o mesmo olhar perverso de minutos atrás. — Só para garantir que seu limite não tenha frutos... — ela jogou as camisinhas na direção do meu rosto e eu protestei. — Te garanto que por dentro é mais nojento. — caçoou.  

                                                           ********

 

Quando o sábado chegou, eu estava tremendo com o corpo carregado de apreensão. A formatura no dia anterior tinha sido incrível, com direito a choros e despedidas emocionantes – algumas não entendi por saber que as pessoas permaneceriam na cidade. Eu não quis dar sinal de minha tristeza durante a cerimônia, permitindo que as lágrimas rolassem apenas durante o discurso do representante de turma.

Jessie se sentou ao meu lado e segurou minha mão durante toda a cerimônia, dando-me olhares furtivos quando recomeços eram citados. Impressionei-me com o quanto tínhamos segurado a barra durante essas duas semanas.  Era de se esperar que ela me pedisse para não abandoná-la ou que caíssemos no choro todas as vezes que a minha mudança fosse mencionada nas nossas conversas furtivas, no entanto acontecia exatamente o contrário e eu meio que sabia o porquê.

Jessie sabia o quanto aquela cidade estava segurando-me e que o futuro que tanto debati durante as aulas não poderia ser posto em prática se eu continuasse onde estava. Ela via meu futuro brilhante e por mais que doesse, nossos caminhos iriam se afastar por alguns anos, mas nossa ligação não se apagaria nunca. Apostava que no dia em que retornasse – se um dia eu o fizesse – ela estaria casada, com filhos e me cumprimentaria como se eu tivesse ficado fora por algumas horas. Foi por isso que, quando jogamos nossos capelos para o alto, fiquei abraçada a ela por minutos sem fim, chorando em seu ombro. Quando nos afastamos, vi que ela estava chorando tanto quanto eu, ainda que tentasse disfarçar.

— Nem pense em desistir — ela murmurou secando meu rosto. — É o seu sonho e você não vai deixá-lo passar. Sou uma garota humilde de cidade pequena, me contento com o que tenho. Você não pode se contentar também. Siga os seus sonhos, depois volte. Quero que meus filhos e os seus sejam melhores amigos.

— Jessie... — fui incapaz de dizer algo por alguns segundos, engolindo em seco. — Eu te amo. — abracei-a novamente.

Ele acariciou o meu cabelo com cuidado.

— Eu também, menina prodígio. — murmurou. — E tem uma pessoa que parece que está esperando para falar com você. — ela se afastou e percebi que olhava por cima do meu ombro. Virei minha cabeça deparando-me com Caleb parado à centímetros de nós de braços cruzados e nos encarando. Quando seus olhos se fixaram nos meus, um pequeno sorriso cresceu em seus lábios. — Amanhã você o conquista e domingo, Stanford vai estar aos seus pés. Vai lá, Cass.

Por mais que não quisesse desgrudar de Jessie por esses últimos momentos, fui praticamente empurrada até onde Caleb estava. Ele tinha aberto sua beca expondo sua camisa de banda e suas calças jeans surradas. Passei as mãos por minhas bochechas, rezando para não estar parecendo um guaxinim. Ele se aproximou um pouco do meu rosto e moveu o indicador embaixo dos meus olhos de um jeito delicado.

— Desculpe por isso — apontei para o meu rosto.

— Não precisa se desculpar. Despedidas são difíceis. — garantiu e respirou fundo desviando os olhos dos meus, encarando o mar de alunos que ainda se cumprimentavam e choravam. — Queria saber se nosso encontro amanhã ainda está de pé. — arqueei uma sobrancelha surpresa por ele ainda estar em dúvida sobre isso. — Podia ter te dado um surto de consciência e você quisesse aproveitar seu último baile com os seus amigos...

Olhei na direção que Caleb olhava e pensei em suas palavras. Eu adoraria dançar Lady Gaga ao lado de Jessie, fazendo as coreografias loucas que inventamos no meu quarto. Queria poder tomar ponche batizado e receber elogios que antes achava que eram impossíveis. Ter uma última noite como uma aluna comum antes de me tornar aquela garota que saiu da cidade para estudar em Stanford. Fixei meus olhos em seu rosto percebendo o rastro de apreensão enquanto esperava minha resposta.

— Despedidas são difíceis e quanto mais vezes fazemos isso, piora quando realmente está na hora de se separar. — murmurei em uma reflexão própria. — Já me despedi de tudo nessa cidade, Caleb. Eu estou literalmente com os meus dias contados e não quero usá-los para dizer adeus novamente.

Ele assentiu como se entendesse as minhas palavras e tirou a outra mão das costas, revelando que estivera segurando algo durante todo esse tempo. Demorei um pouco para identificar o buquê violeta, mas quando o fiz, arfei. Estendi meu pulso permitindo que ele o colocasse e tive que me segurar para não começar a chorar novamente ou dar um ataque de nervos gritando o motivo dele não ter se aproximado antes.

— Comprei isso para o caso de você mudar de ideia sobre o baile. E como você disse que não tinha par... — encolheu os ombros e esperou que eu dissesse algo, mas eu só conseguia olhar para o pulso, espantada como se ali houvesse o segredo da vida. — Pode rir se quiser.

— O que? Caleb, eu nunca riria. Só se fosse da minha cara de tacho agora. — dei um riso nervoso e abaixei o pulso quando vi que estava chamando a atenção de algumas pessoas que passavam ao nosso redor. De soslaio vi meu pai sinalizando para que eu fosse até ele. — Nos vemos amanhã. — e em um ato ousado, dei um beijo em sua bochecha.

Ele tocou o lugar que eu tinha beijado e sorriu.

— Me mande uma mensagem com o seu endereço! — ele exclamou vendo-me andar rápido até onde o meu pai estava parado. — Te busco as oito.

                                                           ********

— Você não vai ao baile mesmo? — meu pai indagou vendo-me parada no meio da sala arrumada com o buquê no braço. Não era uma pergunta carregando uma repreensão por eu não ir, mas um questionamento já que todos os sinais estavam mostrando o contrário. Neguei, sentando-a na poltrona a sua frente. Estava nervosa, tanto por Caleb estar atrasado dez minutos quanto por finalmente ter arrumado um tempo sozinha com o meu pai. — Está bem bonita para quem vai ficar me casa. — ele zombou dando-me uma brecha.

Pigarreei olhando novamente para o relógio. Se Caleb chegasse naquele exato segundo eu seria poupada de dar explicações ao meu pai, contar sobre minha mudança e de quebra não teria que apresentar ambos. Só que ele não chegava, por mais que tivesse me garantindo – meia hora atrás – que estava se arrumando. Desse modo, não pude mais fugir na inevitável conversa que tinha que ter com meu pai.

— É só um encontro. — dei de ombros, como se aquilo não importasse.

— É com aquele rapaz que você estava conversando ontem? — indagou pousando a panturrilha de uma perna na coxa da outra em uma pose descontraída. Assenti. — Ele é o filho da Magda, não é? — assenti novamente. A cabeça do meu pai pendeu para o lado, como se ele quisesse me desvendar. — Está tudo bem?

Era o momento e não havia uma maneira sutil de escapar. Encarei os olhos azuis do meu pai, procurando o jeito mais suave de dizer que ele estava perdendo sua garotinha para a cidade grande. Passei minhas mãos suadas por minha saia e fechei os olhos rezando para todas as entidades possíveis me darem forças. Encarei meu pai, vendo o seu cenho franzido em preocupação e imaginei suposições que passavam por sua mente. Talvez a ideia de que eu estava indo embora não fosse uma delas.

— Stanford me mandou uma carta de aprovação na semana passada. — murmurei com calma, mantendo os meus olhos fixos em minhas coxas. Escutei o som de suas roupas enquanto ele descruzava as pernas e pousava os cotovelos em suas coxas, interessado em minhas palavras. — Semana que vem eles vão começar um programa para os calouros selecionados e eu fui uma delas, mas eu decidi que quero ficar na Califórnia e vou embora no domingo para morar com minha tia Lilian. — não consegui encará-lo nenhum segundo. Cada palavra saía arrastada dos meus lábios. — Queria ter contado antes, mas eu sabia como...

— Você não sabia como falar comigo quando recebeu a carta? — ele perguntou visivelmente frustrado. — Era só me dizer Hey, pai. Sua filha é um gênio e está indo embora. Exatamente como você está fazendo agora, mas com um tempo de antecedência.

— Você nunca estava sozinho ou em casa, pai! — reclamei encarando-o. — Eu tentei arrumar a ocasião perfeita para contar, só que nunca chegava. Desculpe por ser assim, mas eu tomei a minha decisão.

— Minha opinião não vale de nada, não é?

— Vale, pai, mas é só isso. Uma opinião que não vai me fazer mudar de ideia. Desculpe, minha vida nessa cidade já se encerrou. — levantei-me ao soar da buzina, aliviada por escapar daquela conversa. — Vou embora amanhã de manhã. — murmurei quando ele se levantou para seguir para o seu quarto. Parou no meio do caminho, mas não se virou para mim. — Sentirei sua falta. — ele ficou parado por mais alguns instantes antes de se afastar.

                                                                       *******

— Pode abrir os olhos — Caleb sussurrou parando a caminhonete que seu tio havia lhe dado de presente de formatura em um acostamento. Demorei um tempo considerável para reconhecer onde estávamos, no entanto, quando o fiz todas as suas palavras fizeram sentindo. E as de Jessie me fizeram corar. — É o limite da cidade. Amanhã você atravessá-lo, mas quis que você se acostumasse com a ideia primeiro. — abriu a porta do carro saindo e deu a volta para abrir as minhas. — Aqui é bem longe das luzes, então podemos aproveitar as estrelas.

Caleb tinha pensado em tudo, desde o lençol para que pudéssemos deitar na traseira da caminhonete, uma garrafa de vinho, copos e alguns morangos. Emocionei-me com seu gesto cavalheiro ajudando-me a subir e deitamos olhando para o céu. Aconcheguei-me contra o seu corpo quente, encaixando minha cabeça na curva de seu pescoço e aspirando seu cheiro como se fosse a mais pura das drogas. Afastei um pouco o meu peito para que ele não sentisse a força que meu patético coração estava batendo. Ele pôs uma mão ao meu redor, impedindo que me afastasse.

— No que está pensando? — indagou.

— Que resolvi um grande elefante e outro apareceu no meu caminho. — reclamei. Ele virou o rosto na minha direção, o que me deixou sem ar pela proximidade em que estávamos. Bastava que apenas um de nós tomasse a iniciativa e nosso beijo pararia de ser idealizado por mim para se tornar uma doce realidade. — Por que você fez isso agora?

Ele deu um meio sorriso.

— Péssimo momento para demonstrar interesse, não é? — brincou e suspirou ficando sério novamente. — Sei que deveria ter tentado antes, mas eu nunca encontrava uma brecha. Cair em cima de você, literalmente, foi uma jogada de sorte e não me arrependo de ter acontecido. Acho que é melhor assim. Amanhã você vai embora e ninguém fica com o coração partido. Talvez se tivéssemos começado isso antes, você anulasse os seus sonhos por minha causa ou eu terminasse com você para que nada te segurasse na cidade. Assim é mais simples, com todas as cartas na mesa.

Ele tinha razão. Se meu coração estava me fazendo sonhar cenários inusitados onde eu voltaria para a cidade e Caleb ainda estaria me esperando, tudo por conta de um encontro se tivéssemos iniciado um relacionamento antes seria bem pior. Menos uma despedida dolorida. Caleb era apenas um bando de “e se” que eu carregaria nos meus anos na Califórnia e não um bando de “quando” que me faria abrir mão de inúmeras oportunidades.

— Vou piorar as coisas se eu disser que sempre gostei de você? — arrisquei-me.

— Não sei — ele disse sincero. — Não vou dizer que não é difícil admitir que perdi inúmeras chances de estar do seu lado, mas fico repetindo que é melhor.

— Não vou me esquecer de você — garanti tocando em seu rosto com a ponta dos dedos. Nesse momento nossos lábios roçaram e uma corrente elétrica atravessou o meu corpo. Fechei os olhos, deliciando-me com aquela sensação. — Isso é injusto, porque acho que não vou mesmo me esquecer de você.

— Não quero que me esqueça. — murmurou.

Seus dedos se embrenharam por meus cabelos, puxando-me para um beijo forte e urgente. Por um segundo jurei que meu coração quebraria as minhas costelas com a força que batia contra o meu peito. Ele queria fugir, não queria deixar Burley. Não queria deixar Caleb e as possibilidades que aquele beijo carregava. Porém era uma decisão sem retorno, assim como a que tomei naquele noite ao me entregar completamente a Caleb.  Todo o meu corpo se recostou contra o dele, como se quisesse recordar de cada segundo e centímetro que envolvia aquele momento, querendo levá-lo anos a fio. Além do limite da minha memória.


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