Aventureiro De All Star escrita por Gabriel Lima


Capítulo 8
Capitulo 8




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/726509/chapter/8

      Não paravam de bater na porta, mas eu estava sem paciência e não ia parar meus cálculos naquele quadro, não podia parar.

 — Isaac! Abre essa porta! — ele gritava do lado de fora.  

 — Não tenho tempo pra rolês Tobias, preciso terminar isso aqui! — eu disse.

 — Já faz um mês que você está trancado nesse quarto, e não comparece as aulas! — disse ele.

 — Não preciso ir, estou muito a frente delas, só preciso mostrar os resultados da minha pesquisa, e ganharei uma bolsa para o meu doutorado! — eu disse, deixando cair minha caneta, peguei-a no chão ao lado de uma maçã mofada, e continuei.

 — A faculdade está prestes a suspender sua estádia na república, você vai ser despejado! — disse ele.

 — Antes do despejo término a pesquisa! — eu disse. Então ouvi um barulho bem alto, olhei para o lado e vi a porta ser derrubada, Tobias entrou acompanhado de mais dois dos meus colegas. Voltei a olhar para o quadro, continuando meu trabalho.

 — Ótimo, já estava pensando em trocar essa porta por uma à prova de som... — eu disse. Ele entrou desviando dos restos de comida e da roupa suja no chão, o cheiro do quarto não estava bom, mas eu garanto que estava tomando banho todos os dias, aquilo só ia durar até eu terminar meu trabalho. Se terminasse...

 — Isaac, eu sei como está se sentindo, mas essa não é a melhor forma de ficar em luto... Você não está...

 — O que? Sozinho? Quantas vezes você acha que eu escutei essa frase nas últimas semanas? E ainda assim não deixa de ser mentira... Porque pelo que eu saiba nós somos o que existe dentro de nossas cabeças, uma massa cinzenta responsável por tudo que sentimos, e pelo que eu saiba o espaço onde ela fica não é compartilhado com ninguém... Dormimos sozinhos, sonhamos sozinhos e pelo que eu saiba também morremos sozinhos... Então eu estou sozinho assim como meu avô estava quando morreu... — eu falhei na minha tentativa de usar a raiva para sobrepor minha tristeza e comecei a chorar, parando meus cálculos. Ele tossiu, tentando disfarçar:

 — Estamos aqui para o que precisar... — disse Tobias. Sequei minhas lagrimas e continuei meus cálculos.

 — Quero continuar meu trabalho... — eu disse. Tobias suspirou.

 — Vamos cara, deixa ele aí, não vale a pena... — disse Matheus atrás dele.

 — Não, eu quero ver no que ele está tão obcecado... — disse Tobias.

 — Ah eu não tenho paciência pra isso... Ele passou o curso todo se achando e agora faz isso, tô indo embora... Vamos Wallace! — disse Matheus. Eles saíram, Tobias os ignorou enquanto observava meus cálculos e os desenhos na minha mesa.

 — Isso é impossível... — disse ele. Parei os cálculos, faltando apenas uma linha para concluir, e olhei pra ele.

 — O que é impossível? — perguntei.

 — Hidrelétricas usam a força da gravidade para gerar toda aquela energia, não vai conseguir fazer o mesmo ocupando um metro quadrado — disse ele.

 — É possível se criar um modo de motor semi-perpetuo, precisaríamos de algo com movimento continuo pra movimentar molas que gerariam cada vez mais força pra mover um motor... Seriam diversas molas num sistema complexo de engrenagens, quanto mais tempo estimulado mais energia será gerada, e o que seria melhor que a correnteza de um rio para manter o movimento disso? Basicamente é um gerador eletrostático colocado em motor semi-perpetuo através da indução mecânica e fluvial... — ele me olhou desconcertado, confuso, coçando a cabeça.

 — Eu não consigo entender como isso é possível... — disse ele — É como aquelas molas de carrinhos que a gente puxa para trás e ele vai com tudo para frente?

 — Isso! Só que ao invés de ter que soltar o carrinho para ele ir para frente, a força seria imediatamente transferida para um sistema de molas, que multiplicaria a força, sem parar já que a correnteza do rio é contínua...

 — O quão complexo é esse sistema? — perguntou ele. Voltei para a lousa e escrevi minha última formula.

 — Bem, eu acabei de terminar os meus cálculos, essa é minha fórmula para o gerador semi-perpetuo... — eu disse olhando para a lousa. Ele se aproximou observando meus cálculos, os quais tinha levado um mês para concluir.

 — Isso é impossível... Em que princípio físico você está se apoiando? — disse ele.

 — Só estou usando as leis de newton... — eu disse.

 — Não! Você tá ficando maluco, como pode ter certeza que esse aparelho não terá dez vezes mais manutenção que um gerador comum? Quer dizer, toda essa força faria as molas quebrarem em bem pouco tempo... — disse ele.

 — Não com esse cálculo da dispersão e distribuição de energia... — Aponto para uma linha discreta no meio dos cálculos.

 — E como vai transformar a voltagem sem perder parte da energia que acumulou? — perguntou ele.

 — Boa pergunta... Primeiro precisaria descobrir quanta energia é de fato gerada, e se existe algo que possa receber sem que eu precise transformar de cara... — eu ia dizendo.

 — Está me dizendo que arriscou seu curso por causa de uma coisa tão complicada?! Você tem ideia da concorrência que existe para entrar aqui? Muitos ricos pagam para seus filhos estarem aqui! E você passou em primeiro lugar! — ele disse.

 — É apenas um contratempo... E isso aqui vai mudar o mundo... Imagine as aplicações desse negócio quando estiver pronto! — eu disse.

 — Não, não é tão simples assim... Isso levaria alguns anos de estudo e teste, com uma equipe de cientistas para colocar em prática... Não é algo para um lobo solitário, eu sei disso, eu sou físico! E nem mesmo eu consigo ver simplicidade na resolução disso! — disse ele.

 — Eu vou conseguir... — eu disse.

 — Não, você vai apenas acabar com uma oportunidade que muitos matariam para ter... — disse ele.

 — Talvez..., mas eu também posso acabar criando algo que faria Einstein ferver os miolos para entender... — eu disse.

 — Ou fazer seu avô se revirar no tumulo por conta do que está jogando fora! — disse ele.

— Será? Como você disse, entrei em primeiro lugar, foi a maior nota desde a criação do curso... Quer saber? Nem que eu tenha que cursar física, mas eu vou concluir isso! — eu disse.

 — Eu não vou querer assistir essa loucura, minha formatura é em algumas semanas, e sinceramente, quero estar longe de alguém com ego inflado e síndrome de grandeza... — disse ele, virando-se e indo em direção a porta.

 — Não é que eu seja egocêntrico, mas é que eu não tenho absolutamente nada a perder, deixar a expectativa subir a cabeça e fazer com que eu me empolgue ao extremo, talvez seja a única maneira de eu conseguir algo, e também preencher este vazio... — eu disse. Sem se virar Tobias disse:

 — Espero que você consiga...  — E saiu. Nunca mais o vi desde então.                                      

 

O céu estrelado peruano me seduzia para um carrossel de lembranças, e a única coisa que me trazia de volta a realidade era a respiração de Joice, que apoiava a cabeça em meu peito. Como eu não conseguia dormir no hotel, ela topou acampar comigo perto da vila, só não pensei que fosse querer dividir o saco de dormir, o calor humano me trazia paz, mas era minha mente que me deixava inquieto. O carro alugado por Joyce, estacionado ali perto era tentação para que eu fugisse de novo.

 — No que você está pensando? — perguntou ela, baixinho, tirando-me do transe. Olhei para ela, ainda estava com os olhos fechados.

 — Como sabe que estou acordado? — perguntei.

 — A sua respiração mudou... — ela disse, virando a cabeça e apoiando o queixo em mim, me observou, com um sorriso de canto que fazia suas covinhas aparecerem, isso sempre me fazia enrubescer.

 — Err... Só estava me lembrando da faculdade... — eu disse.

 — Ah quando você surtou e quis fazer graduação, a pós e o doutorado ao mesmo tempo? — ela perguntou e riu. Fingi uma risada, mas não funcionou muito bem.

 — Eu estava de luto naquela época, e achei que tentar mudar o mundo fosse preencher o vazio que sentia, só me deixaram fazer isso depois de ver todos aquela pilha de papéis e projetos, o reitor queria que a faculdade tivesse a honra de ser o palco daquilo tudo... — eu disse.

 — E você conseguiu não é mesmo? Sir. Isaac Newton! — ela disse, me fazendo cócegas.

 — Ei... — eu ri, não resistindo as cócegas — Para! E é Bermont! Não Newton... — não consegui mais falar e tentei sair do saco de dormir, de tanto que estava rindo.

 — Não! Não sai! Tá bom, eu paro! — ela disse — Você é muito mole com cócegas...

 — Mas você sabe disso! — eu ri e fiz cócegas nela.

 — Ah não! Nem venha! — disse ela contendo o riso.

 — Viu? Você também não aguenta... — eu disse.

 — Tá! Chega! — ela afastou minhas mãos, e apoiou outra vez a cabeça no meu peito.

 — Joy... — eu disse.

 — Fala... — disse ela.

 — O que você vai dizer pra mídia? — perguntei. Ela apertou meu braço.

 — Nada... Eu não estou mais na empresa... Eu me demiti... E vendi todas as minhas ações lá... — disse ela.

 — O que?! Como assim? O que aconteceu? — perguntei.

 — Bem, com todas aquelas ações filantrópicas em países com crises diplomáticas a ONU começou a discutir o risco de espionagem através da empresa, então solicitaram que a empresa tivesse um departamento dentro da organização, mas pra isso teriam de parar com o marketing em cima da ajuda e ao invés de receber contribuição dos países ajudados, receberiam contribuição de todos os países e empresas aliadas... Gregory... Aquele imbecil... Recusou o acordo, e a empresa recebeu intimidação diplomática, fazendo com que a ajuda na maioria dos países tivesse que ser interrompida... 

 — Então todo aquele projeto...

 — Não... Quer dizer... Os lugares que a gente ajudou, cresceram, melhoraram sua economia, mas aqueles que estavam no início, e os que ainda iriam ser ajudados...

 — E as minhas invenções? — perguntei.

 — Bem, quando eu desafiei o conselho a aceitar o projeto, eles jogaram a responsabilidade sobre os riscos pra cima de mim... Então eu fiquei como detentora de toda aquela tecnologia... Sendo assim... Toda as suas criações voltam pra você... — ela olhou pra mim, apoiou-se em meu peito e se sentou — Não quero que decida agora o que quer fazer... Quero que se cuide... Depois que vendi as ações... A Forbes me classificou como a mulher mais rica do mundo, a Tesla fez uma oferta por todos aqueles projetos, queriam assumir os riscos e colocar em prática..., Mas foi você que criou aquilo tudo, sem você não tem sentido... Porque acho que você é a única pessoa no mundo que não vai pensar em lucros com aquilo... Porque o que quer de verdade é mudar o mundo... Mas isso não servirá de nada se você não mudar o seu... Não mudar a si mesmo... Não pode trazer algo pra fora se esse algo não estiver aqui... — ela cutucou meu peito, meu coração palpitava sem parar.

 — Eu... — sequei meu rosto e funguei o nariz — Acho que eu nunca quis mudar o mundo de verdade... Acho que eu sempre quis na verdade trazer meu avô de volta... Porque num mundo perfeito ele estaria lá... E meus pais também... E quando eu vi que estávamos trazendo resultado, percebi que me sentia uma fraude, porque na verdade eu estava querendo algo em troca... — eu disse.

 — Para todo doador há um recebedor, pra todo recebedor há um doador... Você só estava esperando receber algo inviável... — disse ela.

 — Sim, eu sei... Estou cansado de tantos finais repentinos na minha vida... É sempre no melhor momento, sempre quando as coisas estão mais intensas... Eu mal tinha recebido a educação dos meus pais quando aquela merda aconteceu... E depois o meu avô... Lembra quando você perguntava dos meus amigos, e sempre que eu apresentava algum era funcionário da empresa, ou de outra empresa? Sempre contatos... Nunca amigos de verdade, os quais eu passaria o final de semana inteiro jogando vídeo game, ou até tarde conversando sobre as coisas mais profundas... Isso é porque eu afastei todos eles... Porque quase acabei com minha sanidade mental para criar isso, pra mudar o mundo... Isso foi um erro...

 — Não! Não foi um erro! O seu único erro foi tentar agir sozinho... Porque ao contrário das pessoas, suas criações nunca desapareceriam ou morreriam..., mas isso não pode continuar Isaac! Eu sei que é difícil, mas tudo tem um fim... As vezes não de forma justa, ou no tempo certo, mas sempre tem... E não tem nada que a gente possa fazer a não ser seguir em frente... — disse ela.

 — E como eu sigo em frente? Eu fiz isso a minha vida inteira...

 — Acho que você está aqui pra isso... — disse ela — E eu não vou a lugar nenhum... — inspirei fundo olhando para as estrelas, enquanto grilos compunham a trilha sonora daquele lugar.

 — Ok... Se eu consegui me empenhar pra criar tudo aquilo, acho que posso me empenhar pra vencer a depressão... — eu disse.

 — É isso que eu queria ouvir... — disse ela — E quando você conseguir, nós vamos, juntos, mudar o mundo, ouviu? Nada de fazer as coisas sozinho... — apenas assenti e beijei ela, lentamente, tentando perdurar o momento, mas dessa vez sem medo do fim.

      Não lembro o que estava sonhando, só sei que do nada eu era atingido pela trompa de um elefante, que não para de me bater, e acordei no susto com Juanita sacudindo meu ombro.

 — Ei gordo! Acorda! — disse ela. Joyce resmungou do meu lado, sua pele roçando na minha fazia meus pelos eriçarem.

 — Ru? Como veio parar aqui? — perguntei. “Ru” foi o apelido que dei a ela, por conta pronúncia do J. Ela riu.

 — Não dá pra esconder um carro no meio do mato! A gente viu o carro, e veio ver quem estava aqui! — disse ela, apontou pra Joyce e perguntou — Ei, quem é ela? — ela tapou a boca, rindo — Você ficou vermelho!

 — A gente? Quem mais está aqui? — perguntei, olhei para o carro e vi uma renca de crianças da idade da Juanita escondidas atrás, assim que as vi tentei me sentar.

 — Por que vocês estão pelados?! — perguntou Juanita, um pouco mais alto do que eu gostaria.

 — Fala baixo! Depois eu te explico, e apresento ela, tá bom? Vai ser mais uma amiga para sua lista! Mas pode fazer um favor pra mim agora? Volta com seus amiguinhos pra vila, que daqui a pouco nos vamos pra lá! — eu disse. Ela riu.

 — O gordo tá com vergonha... — ela tapou a boca, contendo o riso.

 — Vai logo menina! — eu disse.

 — Tá, eu vou, mas quero conhecer sua esposa! Tchau! — ela correu em direção ao carro.

 — Ei não é minha esposa! Ainda é minha... Ah deixa pra lá... — eu disse. Juanita chamou os colegas de volta aos cochichos e risadas. Eu também ri depois que eles saíram.

 — É impressão minha ou uma garotinha acabou de te chamar de gordo? — disse Joyce murmurando.

 — Então você é a garota que enfrentou um bando de ricaço a troco de uma ideia maluca... — disse Hans quando lhe apresentei Joyce. Ela deu uma risada fofa.

 — Mais ou menos isso... — disse ela — E você é o sábio da montanha...

 — Daquelas bem baixinhas sabe? Tenho medo de altura... — disse ele. Rimos. Então ela me surpreendeu, abraçando Hans. Ouvi ela dizer baixinho:

 — Obrigado por tê-lo ajudado, eu não sei o que faria se ele... — ela se interrompeu, engolindo um choro. “O que eu teria provocado a ela se tivesse...”.  Hans afagou suas costas.

 — Não foi nada, isso é meio que... O meu trabalho... — disse ele. Eu parei de ouvir a conversa entre os dois por um momento para reparar em Juanita, que olhava um tanto desconcertada a mãe de um de seus coleguinhas ajudando-o a tirar a mochila das costas e segurando em sua mão para levá-lo para casa. Bem, ela sempre voltava para casa de Yomira e sua mãe, aos cuidados delas e de Hans, não estava necessariamente sozinha, mas eu sabia exatamente o que ela sentia. Aproximei-me dela, tão distraída olhando em volta que nem percebera que Hans, Joyce e eu já havíamos chegado à vila. Toquei em seu ombro.

 — Ru — eu disse.

 — Oi, gordo! — ela disse, olhando-me.

 — No que está pensando? — perguntei. Percebi uma lagrima escorrer de um de seus olhos.

 — Por que ninguém quer me contar sobre o meu pai e a minha mãe? — perguntou ela. Fui pego de surpresa, em todos aqueles dias em que eu estivera ali, Juanita nunca demonstrou o mínimo de curiosidade sobre seus pais. Hans havia dito que ela não se lamentava por isso, mas agora...

 — Eu... Não sei... Por que está se preocupando com

isso agora? — perguntei.

 — A professora disse que o dia dos pais tá chegando, e todo mundo fez presentes com papel, cola e giz de cera... Mas eu não fiz... Porque...

 — Eu sei... Você sabia que eu perdi meus pais? Cresci com meu avô... Foi difícil... Acho que eu me sentia quase como você... Mas eu dava todos esses presentes, do dia das mães e dos pais para ele...

 — Se eu fosse fazer isso ia dar muito trabalho! — disse ela.

 — Por quê? — perguntei.

 — Tem muita gente na vila, imagina fazer um presente para cada um... Eu não ia dar conta... — disse ela. Eu ri.

 — Então dê um presente que você não precise fazer — sugeri.

 — Tipo um abraço? — perguntou ela.

 — É. Acho que sim. — eu disse. Ela sorriu.

 — Então você vai ser o primeiro! — disse ela.

 — É mesmo? — abaixei-me, e a pequena me abraçou — Obrigado...

 — Agora é a vez do doutor! — ela me soltou e correu em direção a ele. “Como ela saiu tão rápido dessa tristeza?” pensei.

 — Ei doutor! — ele se virou, olhando pra ela. Quando foi surpreendido pelo abraço.

   — Toma seu presente! — disse ela.

   — É meu aniversário? — perguntou Hans.

   — É o de todo mundo! — disse ela, e depois ficou parada olhando pra Joyce.

   — Oi! Você deve ser a Juanita — disse Joyce.

   — Você parece uma princesa! — disse Juanita. Joyce abraçou-a, com certa afinidade.

   — E você é uma fofa! — disse Joyce, e a menina retribuiu o abraço. Um afeto tão repentino me deixava desconcertado, eu ainda não conseguia compreender as emoções, apesar de minha forte empatia.

 — O que está sentindo? — perguntou Hans, sentado numa pedra, a beira do lago Piuray. Enquanto Joyce e Juanita riam juntas, brincando na água. O céu estava azul como nunca, assim como o lago refletido pela luz solar, as montanhas da região me faziam sentir pequeno.

 — Eu não sei... — respondi — Pequeno, talvez... Impotente... Inquieto...

 — São muitas emoções... Eu estava esperando outra resposta... — disse Hans.

 — Qual? — perguntei.

 — Alegria... — disse ele, deixando-me desconcertado — Quer dizer... Sua noiva veio atrás você, não está só como pensou que estava... E sua pequena amiga, parece ter gostado muito dela, veja só como as duas se dão bem, parece até que se conhecem há um bom tempo... Isaac, você consegue perceber o que impede de sentir o quão bom é isso?

 — Eu... Acho que não... — eu disse — Ontem, Juanita estava triste por não saber sobre seus pais... E com um pequeno conselho que dei ela mudou tão rápido seu humor... Como alguém é capaz de oscilar tão rápido entre tristeza e alegria? Quer dizer, ela é apenas uma criança e eu... Um adulto... Não consigo me permitir sentir uma mera alegria de um momento bom... — Hans sorriu.

 — Você percebe mais do que imagina! — disse ele — Juanita ter mudado seu humor tão rápido não muda o fato de que ela se sinta triste por não saber mais sobre seus pais... Significa apenas que ela não possui barreiras em relação aos estímulos que a rodeiam...  

 — E que barreiras seriam essas? Eu não vejo o que estou fazendo para barrar minha alegria... — eu disse.

 — Se quer realmente ver, observe seus pensamentos. — disse ele — No que exatamente está pensando agora?

 — Ahn... Estou incrédulo por Joyce estar aqui... Confuso por Juanita ser tão espontânea, triste por ela ser órfã como eu.... Um pouco melancólico por toda a situação criada até aqui...

 — Muitas direções... Lembre-se, apesar de um relógio apontar as horas o tempo não é um ciclo que se repete, é uma linha infinitamente tênue..., mas para satisfazer as necessidades humanas usamos medidas repetitivas e padronizadas... Porém isso só deve ser usado para nossa rotina, não para nossas emoções e pensamentos. Por que está repetindo um ciclo em sua mente? O passado não vai se repetir jamais, e o futuro sempre vai ser imprevisível, não pode se prevenir da dor se prevenindo do prazer e da alegria, pois isso é apenas outra forma de criar mais dor!

 — E como eu paro de fazer isso? — perguntei.

 — Primeiro me prometa que não terá pressa, pois além de não ser fácil, demanda tempo, muito tempo... — disse ele.

 — Eu terei...

 — Para que consiga quebrar ciclos viciosos precisa aprender tudo sobre o que te estimula, tanto para o que é bom, quanto para o que é ruim, e aprender a usar isso a seu favor com bastante prática e análise... Porém também precisaremos investigar e compreender tudo que te aflige, para que essas coisas não se tornem estímulos ocultos em seu desenvolvimento...

 — Então a vida é feita de estímulos? — perguntei.

 — A vida eu não sei, mas as suas emoções são... E alguns estímulos viciam tanto quanto uma droga... A depressão, metaforicamente falando, é como o vício num estímulo que sempre vai te deixar mal, não importando quantos outros possam te deixar bem... Precisamos vencer isso... — disse ele.

 — Isso é mais difícil do que qualquer invenção que eu já tenha criado... — eu disse.

 — Talvez seja porque suas invenções tiveram muita teoria antes da prática, e na vida não existe espaço para separação disso, você estará sempre praticando! Mesmo agora, ouvindo o que tenho a dizer, está praticando a forma como lida com suas expectativas em relação ao futuro... Quando criou todas aquelas coisas, praticou fuga emocional... E agora está começando a praticar uma reabertura do que é capaz de fazer e sentir!

 — Tem certeza de que você não é o cara do beco naquele dia? — perguntei e ri — Certo, eu entendo... E estou disposto...

 — Ótimo!

 — Hans...

 — Sim?

 — Quanto tempo você levou para dominar isso?

 — Muito mais do que você imagina..., mas esse tempo foi a melhor parte...

      Olhei para Joyce no lago, que percebeu meu olhar e sorriu pra mim, consegui sorrir de volta, ela fez um gesto para que eu entrasse na água. Senti receio, mas como Hans disse, eu precisava praticar, então tirei a camisa, deixei minhas coisas na areia e pulei no lago. Deixando-me aproveitar cada momento com as duas no lago, que mesmo com a água fria, me fez sorria como não fazia há muito tempo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Aventureiro De All Star" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.