Todo o Espaço Entre Nós escrita por Tai Bluerose


Capítulo 14
Infiel


Notas iniciais do capítulo

Obrigada a todos que comentaram, logo responderei vocês.

Espero que gostem, qualquer erro me avisem.



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Capítulo 14: Infiel

— Se você precisar se retirar para meditar ou algo assim, você pode ir — disse Jim. Ele estava preocupado com Spock. Spock ainda parecia sobrecarregado emocionalmente e, até onde Jim podia dizer, envergonhado por tudo o que disse e toda a emoção que deixou escapar. Se toda essa coisa de falar sobre as próprias emoções era difícil para Jim imagine como devia ser difícil para um vulcano.

— Eu agradeço a sua compreensão e a sua preocupação com meu bem-estar, mas receio não querer deixá-lo sozinho. — Spock olhava para um vaso no outro canto da sala.

Spock estava evitando os olhos de Jim há um bom tempo, mas Jim não se importava. Ele também não tinha a menor vontade de ficar sozinho (ficar sem a companhia de Spock, na verdade). Mas os dois trancados em um quarto novamente estava fora de questão.

— Porque você não medita aqui na sala? Eu tenho um relatório para terminar de ler, assim nós dois nos fazemos companhia enquanto fazemos o que temos de fazer.

— Parece aceitável.

— Ok. Eu vou me trocar e buscar meu PADD, e você pega seu tapete e incenso.

Eles se separaram para buscar o que precisavam e voltaram para a sala. Eles se entreolharam rapidamente antes de se concentrarem em suas próprias tarefas.

Enquanto se preparava para meditar, Spock achou curioso que, anteriormente, teria preferido meditar longe de Jim, mas agora Spock sentia que não conseguiria se concentrar sem a presença do humano. Era mais fácil livrar sua mente de pensamentos sobre onde Jim estava ou o que Jim estaria fazendo quando Spock tinha a plena certeza de que Jim estava bem ali ao seu lado.

Essa percepção era preocupante, mas Spock escolheu não pensar muito sobre isso. Ele precisava limpar a mente e colocar seus escudos e emoções de volta no lugar.

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Por três vezes Jim abandonou sua leitura para observar o vulcano meditar. Esse pequeno momento entre eles era tão tranquilo e familiar, quase doméstico. Era agradável saber que Spock estava ali perto dele. Jim sempre sentiu isso quando estava em torno de Spock, essa sensação de segurança e pertencimento. Na época, ele ainda não tinha ligado dois mais dois, ele estava tão empenhado em fazer de Spock seu amigo, que não percebeu que seus sentimentos já estavam no próximo estágio.

Mas Jim sabia que este momento não poderia durar. Não para sempre. Afinal, todas as coisas realmente boas na vida de Jim eram assim: passageiras.

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Quando Spock saiu de sua meditação, ele viu Jim dormindo no sofá com o PADD sobre o peito, que subia e descia lentamente com sua respiração. Spock parou para observaro humano. Poucas vezes teve a oportunidade de ver seu capitão tão de perto, tão sereno, tão vulnerável. Ao alcance da mão.

Quando percebeu, Spock já estava com a mão pairando sobre o rosto de Jim, indeciso se deveria tocá-lo ou não.

Ele ansiava tocar, e justamente por isso optou por não o tocar. Em vez disso, sua mão pousou no ombro de Jim, que estava devidamente coberto por uma camisa de flanela xadrez. Spock apertou brevemente, chamando Jim pelo nome.

O humano gemeu e esticou o corpo, como um gato da Terra. Olhos azuis, lânguidos, piscaram e se focaram em Spock.

— Já é de manhã?

A voz de Jim era suave, doce e um pouco rouca do sono. O som fez algo primordial despertar dentro de Spock, e ele olhou para o humano com olhos negros, como se Jim fosse a coisa mais impressionante que ele já viu. Spock precisou de força para manter as próprias mãos presas ao lado do corpo. Ele soltou a respiração lentamente antes de responder.

— Não. Ainda é noite. Creio que você desfrutará de uma noite mais agradável se dormir na sua cama.

— Certo. — Jim bocejou e piscou algumas vezes, ele ainda parecia um pouco perdido e sonolento. — Eu não estava babando no sofá do seu pai, estava?

— Negativo.

— Graças! — Jim se moveu para colocar os pés para fora do sofá e voltou a olhar para Spock. —Você conseguiu meditar?

— Sim.

— Se sente melhor?

Spock pensou sobre isso por dois segundos. Exceto a pequena aceleração em seus próprios batimentos cardíacos, ele estava bem.

—Afirmativo.

Jim balançou a cabeça em confirmação, satisfeito por Spock. Ele recolheu seu PADD e se levantou. Spock também se levantou, seus olhos percorrendo o rosto levemente rosado do humano e os cabelos dourados desalinhados no lado em que estivera encostado no sofá.

— Bem, acho que devemos ir dormir agora.

— De fato.

Jim tomou a frente, indo em direção aos quartos. Ele parou, e Spock parou ao seu lado. Spock ficou um pouco surpreso, porque ele não havia notado que estava seguindo Jim.

— Eu, hum, quero agradecer pelo jantar. Foi muito... agradável. Eu gostei de passar esse tempo com você.

— Eu digo o mesmo, Jim.

Jim apertou o ombro de Spock em um gesto de conforto e aceitação.

— Boa noite, Spock — Jim sorriu e se afastou.

— Boa noite, Jim.

Spock ficou sozinho na sala. E como não havia ninguém ali para vê-lo ou julgá-lo, ele se sentiu livre para suspirar.

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— Vocês tiveram um jantar satisfatório? — Sarek indagou.

Sarek não estava tão interessado no que seu filho e o capitão fizeram na noite anterior, mesmo assim ele se ouviu perguntar. Se ele parasse um momento para analisar mais a fundo suas motivações naquele momento, ele descobriria que fizera a pergunta para estimular a conversação.

O silêncio nunca o incomodou, mas ter Spock e James conversando constantemente durante as refeições nos últimos dias fez Sarek se lembrar das refeições compartilhadas com sua esposa.

Entretanto, mais uma vez Spock e James Kirk compartilhavam uma refeição em silêncio. Sarek poderia considerar tal falta de interação perfeitamente normal, se não tivesse visto a maneira entusiasmada e familiar com que os dois se tratavam nos primeiros dias.

Sarek sabia que algo havia acontecido entre os dois, embora não soubesse exatamente o quê. Provavelmente, eles julgavam Sarek um tolo incapaz de notar seu filho roubando olhares para o humano, ou a maneira que o rosto de James ruborizava quanto seus olhos encontravam os de Spock.

Teriam eles se envolvido em coito e por isso se tratavam com constrangimento evidente? Sarek achou improvável.

Amanda com certeza teria uma resposta e saberia como lidar com a situação de forma espirituosa. De repente, Sarek se sentiu muito cansado daquele silêncio, e foi quando fez a pergunta.

— Com certeza.

— Afirmativo.

Os dois responderam juntos. E essa resposta animada e sem hesitação parece ter rompido completamente o constrangimento entre os dois.

Spock pousou sua xícara de chá sobre a mesa. — Jim queria admirar as estrelas, por isso caminhamos durante todo o percurso de volta. Isso nos atrasou um pouco.

— Não imaginei que fossemos demorar tanto. — James sorriu e deu outra mordida em sua torrada.

— Eu lhe informei previamente que a distância era longa.

James deu de ombros.

— Caminhar fortalece as pernas. Além disso, tivemos tempo para conversar. — James soprou seu café e deu um gole. — Foi esclarecedor, não foi?

— De fato.

Os dois ficaram se olhando com expressões felizes, e só foram interrompidos pelo som do PADD de James.

James pegou o aparelho e deslizou o dedo sobre a tela.

— Oh, é Sorvek!

— Sorvek? — Spock contraiu as sobrancelhas levemente.

— Sim, ele esteve aqui naquele jantar. Lembra?

— Eu sei quem ele é. Como ele conseguiu o seu número de contato pessoal é o que falho em entender.

— Eu dei a ele — Jim respondeu inocentemente, sem perceber a confusão no rosto de Spock.

James se levantou e se afastou da mesa para conversar com Sorvek. Spock o seguiu com os olhos, os lábios comprimidos numa linha, sua expressão não muito satisfeita.

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Spock não era dado a atitudes egoístas, mas ele se sentiu sendo um pouco egoísta quando Jim pediu para levá-lo ao local de trabalho de Sorvek.

Spock sempre fez tudo para tentar agradar a Jim, afinal ele era seu capitão e amigo. Mas, naquele momento, ao ver como Jim parecia ansioso para ver Sorvek, Spock sentiu uma emoção estranha, e ele acabou dizendo:

— Eu tenho coisas para resolver. — Imediatamente, Spock sentiu-se culpado e envergonhado pela mentira, e tentou consertar. — Mas eu posso conseguir um carro para levá-lo.

Jim piscou.

Coisas? Eu pensei que essa era a palavra humana imprecisa que você mais odeia.

— É ilógico odiar uma palavra. Eu não odeio a palavra coisas.

Jim ficou um pouco exasperado. Por que Spock estava sendo tão difícil?

— Bem, você não poderia fazer essas coisas depois, e vir comigo agora?

— Você não prefere apreciar a companhia do senhor Sorvek sem minha presença?

Jim olhou para ele sem entender nada.

— O quê? Por que inferno eu... — Jim parou, a compreensão caiu sobre ele. — Espere um minuto, você está com ciúmes?

Spock paralisou diante do olhar perplexo de Jim.

— Certamente não estou.

— Sim, você está. — Este foi Sarek, surpreendendo a Jim e Spock. — Eu, coincidentemente, tenho uma reunião marcada com os administradores do centro de pesquisa onde Sorvek trabalha. Você pode vir comigo, James, se desejar.

Sarek ignorou a expressão questionadora do filho e continuou olhando para o humano.

— Sim. — Jim respondeu mecanicamente ao perceber que Sarek aguardava uma resposta. Ele não sabia se estava mais surpreso com Spock ou com Sarek. — Obrigado, Sarek. Senhor.

Spock olhou para o pai com uma sobrancelha arqueada. Sarek olhou para o filho retribuindo o mesmo gesto, no que Jim imaginou ser algum tipo de competição para ver quem fazia a sobrancelha subir mais alto.

— Eu o avisarei quando estiver pronto para ir. — Disse Sarek a Jim e saiu da cozinha deixando o humano sozinho com Spock.

Jim não estava zangado ou ofendido, para alívio de Spock. Jim estava sorrindo, e seus olhos estavam cheios de carinho.

— Vamos, Spock, não seja bobo. Não é nada do que você está pensando. É uma surpresa para você, droga!

— Para mim?

— Sim. Mas agora não vai mais ser tão surpresa assim.

— Do que se trata?

— Eu tenho certeza de que você entende o conceito de “Fazer uma Surpresa”, Spock. Não vou dizer até chegarmos lá. Venha, Spock... por mim.

Spock olhou para aqueles grandes e esperançosos olhos azuis. Jim não estava ansioso para ver Sorvek. Jim estava ansioso para que Spock fosse com ele.

Spock, por fim, acabou cedendo.

Jim abriu um enorme e luminoso sorriso. Aquele sorriso que sempre afetou Spock de uma maneira agradável.

— Não posso acreditar que você pensou que eu estava interessado no Sorvek — Jim sorria enquanto tirava a mesa e colocava as xícaras sobre a pia.

— Eu não pensei...

— Sim você pensou — Jim interrompeu. — Sério? Ele nem é tão bonito.

Jim começou a lavar a louça. Spock pensou em lembrar a Jim que eles tinham um lavador de pratos na casa, mas eram apenas três xícaras e dois pratos; e Jim já estava entregando um prato para Spock secar.

— Sua escolha de palavras, Jim, dá a entender que você o considera bonito em algum aspecto.

Jim olhou para Spock, seu sorriso revelando que ele tinha captado o tom de brincadeira do vulcano.

— Não tão bonito quanto você, senhor Spock.

Pela reação de Spock, Jim imaginou que o vulcano não esperava que Jim dissesse isso.

— Saber disso faz seu ego inflar?

Spock corrigiu sua postura. Ele parecia muito mais altivo e presunçoso do que realmente era.

— Vulcanos não possuem ego. — Afirmou Spock com toda sua dignidade. Jim só conseguia notar as pontas das orelhas do vulcano ficarem verdes.

— É claro que não, que absurdo!

— Você está zombando de mim.

— Só um pouquinho. — Jim terminou sua tarefa, e Spock entregou um pano de prato para Jim secar as mãos. — Vamos nos trocar. Acho que seu vai ficar louco se nós fizermos ele se atrasar.

— Enquanto acredito que seja improvável que meu pai fique “louco”, o atraso é bastante desaprovado pelos vulcanos.

Jim sorriu.

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— Ele é realmente muito persistente — disse Sorvek a Spock.

Spock estava agora posando para uma foto ao lado de Sorvek, por insistência de Jim. Um bebê sehlat meio sonolento se movia em seus braços.

— Sorriam! — Jim pediu, mas só conseguiu que os dois vulcanos arqueassem uma sobrancelha em sincronia. Aparentemente, isso era muito divertido para Jim.

Jim fazia questão de mostrar para Spock todas as fotos, pedindo a opinião dele sobre quais estavam melhores. Para Spock todas estavam boas; embora, intimamente, ele tivesse uma preferência por aquelas em que apenas ele, Jim e os sehlats apareciam, sem Sorvek ou qualquer outro membro da equipe de Sorvek.

É ilógico ter preferência, sua consciência o recriminava.

Como embaixador, Sarek estava sempre envolvido em distintas comissões. Spock nem sempre sabia em que consistia todas elas. Assim como ele não sabia que seu pai, juntamente com o Conselho Vulcano, estava tentando recuperar espécies animais de Vulcano.

 Algumas espécies, como sehlats e le-matyas foram ilegalmente levadas para outros planetas por contrabandistas orions e ferengis. Sarek estava fazendo um grande esforço para conseguir trazer esses animais de volta e muitos já tinham sido resgatados. Se o trabalho para aumentar a reprodução em cativeiro continuasse progredindo, em pouco tempo, essas espécies estariam livres da extinção.

Fazia muito tempo que Spock não via um sehlat tão de perto, ou tocava em um. Desde a morte de I-Chaya, seu único companheiro da infância, Spock não teve outro sehlat. Ele não poderia levar um consigo para a Academia da Frota Estelar.

De todas as espécies animais do planeta Vulcano, os sehlats eram os que estavam mais próximos dos vulcanos. Devido sua capacidade de criar laços psíquicos com seu dono e sua lealdade inquebrável, eles eram os companheiros perfeitos para crianças e adultos. Spock lembrava como I-Chaya o fazia se sentir menos só.

Olhando agora para todos esses filhotes de sehlats, Spock se sentia feliz, porque as crianças vulcanas não estariam sozinhas neste novo planeta. Spock fez uma nota mental para agradecer a Jim por trazê-lo.

Spock acariciou a cabeça peluda do sehlat em seus braços. O sehlat se moveu e se aconchegou contra a barriga de Spock.

— Ele parece apreciar a sua companhia. — Sorvek comentou.

— Eu vejo. Ele deve estar me confundindo com a mãe.

Sorvek virou-se para Spock, sua expressão era suave, o canto de seus lábios minimamente inclinados. Um humano não notaria, mas Sorvek estava sorrindo.

— Eu estava me referindo ao humano.

Spock ergueu os olhos para o outro vulcano, depois os desviou para Jim.

Jim estava gravando uma mensagem de vídeo para seu sobrinho, mostrando os animais para ele.

— Quando eu contei a ele sobre meu trabalho e disse que tínhamos uma sehlat fêmea prestes a dar cria, ele me fez prometer que eu o avisaria se o nascimento ocorresse antes da data de seu retorno para a Terra. Ele me contou que você apreciaria conhecer nossas instalações. Ele disse que você tinha um sehlat de estimação.

— De fato, eu tinha.

— Eu não poderia negar um pedido do Capitão Kirk. Nosso povo tem uma grande dívida com vocês dois.

— Nosso povo não deve nada a mim — Spock disse com tristeza, se Sorvek notou, não disse nada.

— Ele é diferente do que eu pensei que seria. A maioria dos capitães humanos que conheci eram de mais idade e muito mais austeros. Capitão Kirk é jovem e mais... emocional.

— Os humanos geralmente são assim. Mas não é algo tão ruim — Spock apressou-se a defender a humanidade de Jim.

— Eu não afirmei que era. Na verdade, eu o achei muito intrigante.

O tom de Sorvek não era monótono. A curiosidade e a fascinação eram visíveis. Spock sentiu aquela emoção estranha outra vez. Uma inquietação desconfortável, como se algo coçasse sob sua pele. Ciúmes, dissera Jim.

Ciúme é uma emoção ilógica.

Spock pediu licença, entregou o pequeno sehlat a Sorvek e foi até Kirk. Ele deliberadamente tocou Jim, não no ombro ou no braço, mas nas costas, logo acima do quadril. Um gesto muito íntimo, que obviamente atrairia a atenção de Sorvek.

Vergonhosamente ilógico!

Ele percebeu que muitos vulcanos, assim como ele e Sorvek, viam o comportamento expressivo e alegre de Jim não como algo reprovável, mas curioso. Jim tinha uma luz natural capaz de encantar qualquer um. E ele era muito inteligente. Inteligente o bastante para atrair a atenção de qualquer vulcano. As pessoas ficavam intrigadas com ele, encantadas.

Spock se viu com ciúmes mais uma vez. Essa emoção o deixava irritado, desconfortável e envergonhado de si mesmo. Ele sabia que não tinha o direito de ser ciumento. Jim não era nada seu além de amigo, e ele não era de Jim. Que direito ele tinha de ser ciumento?

Eles se despediram de Sorvek e resolveram caminhar pela cidade. Jim queria comprar algumas lembranças para McCoy e seu sobrinho.

Com tudo o que aconteceu, e por estar em Novo Vulcano, Jim tinha esquecido completamente que era Natal na Terra. Mais uma vez Jim se sentiu grato por Spock ter o convidado para essa viagem, assim Jim estaria longe de todas as lembranças tristes que as festividades natalinas costumavam lhe trazer.

Automaticamente, Jim lembrou do último natal que ele, Sam e sua mãe compartilharam. Eles decoraram a árvore juntos, Sam ajudou Jim a colocar a estrela no topo. Eles beberam chocolate quente em frente a lareira e assistiram filmes antigos até tarde da noite. Não houve presentes, mas foi perfeito. Ele foi feliz naquela época. No ano seguinte sua mãe estava se casando com Frank e alguns meses depois estava deixando o planeta. Dois anos depois Sam estava indo embora, para nunca mais voltar.

— Algum problema, Jim? — Spock ficou intrigado com a tristeza no rosto do amigo.

— Não é nada. Eu estava lembrando do Sam.

Jim entrou em algumas lojas que vendiam artigos infantis. Ele queria comprar um sehlat de pelúcia. Tudo bem, ele achava que Peter já fosse grandinho para bichinhos de pelúcia, mas ele pensou que o sobrinho poderia gostar. No entanto, parecia não haver tal coisa como um sehlat de pelúcia em Novo Vulcano.

— É idêntico a um sehlat de verdade, mas é feito de tecido macio e com enchimento de espuma — o dono da loja olhou para Jim com uma expressão que dizia não fazer ideia do que Jim estava falando.

— Eu compreendo o que você está descrevendo, mas não tenho algo assim — disse o lojista vulcano.

— Um de madeira então?

— É possível encontrar um esculpido em rocha, mas é algo destinado a decoração e não para ser usado como um... brinquedo.

— Ninguém nunca deu algo assim para as crianças vulcanas?

— Porque as crianças iriam querer um sehlat de mentira se eles poderiam ter um de verdade?

Jim suspirou. Ele sabia que o que o dono da loja dizia tinha lógica. Afinal, as crianças da Terra tinham bichinhos de pelúcia porque no geral, ninguém daria um urso de verdade a elas. Exceto que agora as crianças vulcanas não poderiam ter um sehlat, pelo menos não num futuro próximo.

— Você não acha que um sehlat de pelúcia ajudaria as crianças a manter o apreço pela espécie? Agora que não há mais sehlats suficientes. — Jim tentava convencer o lojista.

— Parece ter alguma lógica.

— É claro que tem. Confie em mim, você vai vender horrores.

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Depois de encontrar o que procurava, Jim pediu para empacotar tudo e enviar para os respectivos endereços na Terra.

Um sehlat esculpido em pedra para Peter; uma garrafa de conhaque sauriano para McCoy, e uma pulseira de ouro para sua mãe. Jim achou que seria indelicado mandar algo para Peter e não mandar nada para Winona; como eles estavam em trégua, era melhor manter uma boa relação.

Jim também comprou um presente para Spock, um asenoi. Este era esculpido em rocha vulcânica, e tinha inscrições em Vulcano Gólico gravadas na parte de cima; quando a chama era acesa, as inscrições brilhavam. Jim achou a lâmpada incrivelmente bonita, e Spock não tinha uma. Era um presente perfeito.

— Não era necessário comprar algo para mim, Jim. Não é costume vulcano comemorar o Natal. — Disse Spock, mas Jim sabia que Spock havia gostado do presente. Spock olhava para a lâmpada de meditação com admiração e gratidão.

— Não é pelo Natal. É porque você é meu amigo.

A expressão de Spock se suavizou.

— Obrigado, Jim — o tom de Spock era solene.

— Agradecimentos são desnecessários, não é o que você sempre diz?

— Neste caso, não é.

— De nada — Jim respondeu com um sorriso.

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Eles pararam em um restaurante para almoçar. Enquanto comiam, o PADD de Spock soou. Jim viu uma pequena ruga de aborrecimento no rosto de Spock.

— Algum problema?

— De forma alguma. Mais algumas instruções da Frota Estelar. Eu verificarei isso quando chegarmos em casa.

Spock deixou o PADD de lado e continuou sua refeição.

— Você não parece muito animado com sua nova nave — não era uma pergunta, Jim não queria forçar o assunto. Mas algo estava fora em Spock. Qualquer pessoa, mesmo um vulcano, Jim supôs, estaria contente em receber uma nave estelar novinha. Jim conhecia Spock, e ele sabia que seu amigo deveria estar empolgado com a nova missão científica, pelo menos. Não foi essa a razão que Spock deu para ter escolhido sair?

— Vulcanos não ficam animados.

— Não me venha com isso. Eu já vi você realmente empolgado quando está em algum projeto científico. E agora você tem uma nave científica só pra você e não parece nem um pouco ansioso para subir nela.

Spock não disse nada. Jim torceu os lábios.

— Posso fazer uma pergunta pessoal?

Spock demorou tanto tempo para responder, que Jim já tinha tomado o silêncio como uma negativa. Mas então Spock respondeu.

— Você pode.

— Você disse, no passado, mais de uma vez, que não desejava ser capitão. Eu entendo que as pessoas mudam de ideia. Não há nada de errado nisso.

Ainda não era uma pergunta. Jim estava curioso, mas ele não queria forçar Spock.

— Eu ainda não entendo porque você aceitou a transferência para a T’Saura. Eu sei que não foi apenas pela ciência. Afinal, você teria muito mais tempo e liberdade para desenvolver estudos científicos sendo Primeiro Oficial na Enterprise do que sendo Capitão de um navio científico. Um capitão não tem muito tempo para lidar com assuntos que não estejam diretamente ligados ao comando. Você sabe disso. E imagino que você deve ter considerado isso; você sempre considera todos os fatores. Então, qual foi o real motivo?

Spock olhou para Jim. Sua expressão em branco.

— Creio que você não gostaria da resposta.

Jim se ajeitou em sua cadeira e remexeu a comida em seu prato. Ele não sabia exatamente o que era, exceto que era vegetal com molho, tinha um gosto agradável e levemente apimentado.

— É por minha causa? Você quer ficar longe de mim? Você sabe... para pensar.

Spock ergueu os olhos para Jim, surpreso. Jim pensou ter visto preocupação ou culpa no rosto de Spock, mas desapareceu tão rápido que ele pode ter imaginado.

— Sim e não — Spock disse baixinho. — Eu não tinha este objetivo em mente quando aceitei a transferência para T’Saura. Entretanto, cheguei a conclusão de que essa era a oportunidade perfeita para refletir sobre os meus sentimentos com respeito a você e Nyota, visto que eu seria obrigado a manter distância física de vocês dois.

Jim assentiu. Spock não estava fugindo dele. Isso é bom.

— Eu compreendo. Você fez uma escolha lógica.

— Obrigado.

— Então, se isso não foi a razão principal, qual foi?

— Na verdade, eu fui levado a reconhecer que seria sensato aceitar a promoção.

Jim piscou. Alguma coisa na forma como Spock disse aquilo o incomodou.

— O que isso significa? Você foi forçado?

— Não exatamente. Embora bastasse apenas uma ordem e eu teria de obedecer, obviamente. Acho que devo ser grato por eles terem me permitido... discutir os termos.

Jim abandonou completamente sua refeição. Ele sabia que algo não se encaixava nessa história.

— Do que estamos falando aqui, Spock?

— Como eu disse anteriormente, creio que a resposta não o agrade. E não acredito que eu deveria fornecer essa informação a você.

— Não, não. Você começou a falar, agora cuspa o resto fora.

Spock arqueou uma sobrancelha.

— Muito bem. Quando o Almirante Komak me apresentou a proposta, eu, logicamente, recusei. Nunca foi minha intenção deixar a Enterprise. No entanto ele insistiu que precisava de um oficial como eu para a capitania da T’Saura para fortalecer os laços entre a Frota e o povo vulcano. Eu apresentei a ele uma lista com os nomes de dez oficiais vulcanos e humanos que eu julgava mais que adequando para ocupar o posto de capitão. Novamente, o almirante insistiu que os outros não tinham o mesmo status e experiência que eu. Como ele estava sendo muito persistente, eu perguntei se eu realmente tinha o direito de declinar o pedido ou se a Frota estaria fazendo dessa promoção uma ordem oficial. Ele afirmou que entendia meu desejo de permanecer onde eu estava, mas para o bem do meu capitão, eu deveria aceitar a transferência.

— O quê?

— Ele me informou que o Almirante Nogura solicitou uma reavaliação da nossa capacidade de comando. Mais especificamente, Nogura quer saber se você continuaria a ter os mesmos excelentes resultados sem o meu auxílio como seu Primeiro Oficial.

O coração de Jim afundou. Então, a Frota ainda não acreditava que ele era capaz?

— De acordo com Komak, Nogura já tinha conseguido o apoio do restante do Conselho da Frota. Se eu recusasse o posto de Capitão da T’Saura, eles iriam transferir você para lá. E nomeariam a mim novo capitão da Enterprise. Eu nunca desejei ser capitão, Jim, mas eu não podia permitir que tirassem a Enterprise de você.

Jim se sentia completamente devastado e ao mesmo tempo profundamente grato; Spock estava fazendo um sacrifício por ele. Jim queria ficar zangado com essa situação, mas ele estava muito desanimado para isso.

— Eu não entendo. Se eles reconhecem que formamos uma boa equipe de comando, porque nos separar?

— Eu fiz a mesma pergunta a Komak. Nogura acredita que é desperdício manter nós dois em uma única nave, quando poderíamos estar chefiando duas. Temos que admitir, Jim, há lógica no raciocínio dele. O progresso da Frota e nosso compromisso com ela deve vir antes de nossas preferencias pessoais.

— A Frota que se foda! — Jim deixou escapar. Os vulcanos das mesas em volta olharam para eles com expressões não muito agradáveis.

— Jim!

— Desculpe. — Disse Jim para as pessoas das outras mesas. — Desculpe. — Disse ele a Spock. — Eles não podem fazer isso com você. Se o Nogura não está satisfeito comigo, ele devia me dispensar então. Não afastar você da Enterprise. Com essa chantagem de merda. Você merecia ficar lá. Você sempre mereceu ela mais do que eu.

— Jim, você está partindo do pressuposto de que eu tenho algum direito sobre a Enterprise, o que não é verdade.

— Você mesmo disse que não queria sair...

— Meu desejo em ficar é, exclusivamente, por lealdade a tripulação e ao Capitão da Enterprise. A nave em si nunca teve qualquer importância para mim. Você compreende isso?

— Oh, Spock... Por que você não me contou nada disso antes?

— Eu temia que você desafiasse o Almirantado, e... E eu acreditei, erroneamente, que você não se importava se eu partisse.

— Por causa do que me ouvir dizer a McCoy.

Jim apoiou os cotovelos na mesa e enfiou os dedos pelos cabelos. A comida fria e esquecida diante de seus olhos.

— Jim — Spock o chamou. Jim ergueu os olhos para o amigo. — Eu concordei em aceitar o comando da T’Saura com uma condição. Eu disse que um ano seria tempo suficiente para eles coletarem as informações necessárias sobre o mim e sobre você. Eu concordei em ser transferido, contanto que, após um ano de serviço na T’Saura, eu pudesse solicitar minha transferência de retorno para a Enterprise. Eles, embora com muita relutância, concordaram com meus termos.

— Então, se eu provar que posso ser um bom capitão sem a sua ajuda, eu poderei ter você de volta. Quero dizer, você poderá retornar para a Enterprise?

— Sim, mas somente após eu cumprir um ano na missão da T’Saura.

—Mas aí você só terá um ano antes do final da missão de cinco anos, Spock.

— Apenas mais um ano na Enterprise é melhor do que nunca poder voltar. E eu quero voltar, Jim.

— Sim, é claro, senhor Spock.

Jim sorriu, ainda que estivesse triste, porque sabia que Spock estava sendo sincero.

— Nogura realmente não gosta de mim, não é?

— Desconheço as motivações por trás das ações do Almirante Nogura. Mas se ele não é capaz de perceber e reconhecer a excelente capacidade que você tem para o comando de uma nave estelar, posso apenas supor que ele tenha inveja do grande capitão que você é, Jim.

— Você realmente pensa assim?

— Eu não teria dito se não pensasse.

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Eles estavam voltando para casa quando Spock percebeu a respiração irregular de Jim e o suor acumulando na testa e na nuca dele. Eles estiveram em movimento desde o começo da manhã, e em grande parte da caminhada Jim esteve diretamente exposto aos raios solares. A essa altura, Spock concluiu, o efeito do hipospray do Doutor McCoy já devia estar acabando.

— Não se preocupe, eu estou bem. Só preciso parar um pouco para respirar – Jim falou com dificuldade.

Spock olhou em volta. Eles estavam em uma praça, mas não era uma praça destinada ao lazer, então não havia muitos lugares para se sentar. Spock viu uma pequena estrutura de concreto feita para proteger um canteiro de plantas, mas podia servir como um banco. Alem disso, a escultura rochosa logo ao lado proporcionava um pouco de sombra.

— Você se importa se formos sentar lá?

Jim seguiu o olhar de Spock e concordou.

— Eu só preciso de um minuto. — Jim tranquilizou Spock.

— Eu diria que você precisa de no mínimo dez minutos.

Spock observou Jim enxugar a testa com a manga da camisa. A respiração de Jim foi se normalizando lentamente.

— Você sabe como é um beijo Vulcano, Jim?

Agora, de onde tinha vindo essa pergunta? Jim se questionou.

— É feio com as mãos, certo?

Spock assentiu. Ele olhou rapidamente para as mãos de Jim.

— O beijo da maneira vulcana é, para os vulcanos, tão íntimo quanto o beijo da maneira humana é para os humanos. Portanto, é compartilhado apenas entre os amantes e pessoas já casadas. Os vulcanos consideram esse um ato aceitável para ser mostrado em público. No entanto, existem outras formas de contato físico que são considerados aceitáveis, e que podem ser compartilhado entre parentes e amigos muito próximos. Eu gostaria de mostrar a você.

Jim piscou, se sentindo um pouco tonto. Ele não sabia se Spock queria realmente mostrar essas coisas, ou se Spock estava apenas tentando o animar; Jim ainda estava cabisbaixo desde que saíram do restaurante. Tudo o que Jim sabia é que Spock queria compartilhar algo pessoal com ele, e isso era maravilhoso.

— Claro, Spock, se você estiver confortável com isso — Jim tentou não parecer muito ansioso.

— Muito bem.

Spock se aproximou ainda mais e Jim teve que obrigar seu coração a não ficar tão acelerado. Mesmo com todo o calor, Jim sentiu um arrepio no momento em que Spock pegou sua mão direita.

Spock mostrou a Jim dois gestos simples. O primeiro consistia em alinhar todas as pontas dos dedos com as pontas dos dedos da mão da outra pessoa, mantendo os dedos abertos, mas sem encostar uma palma na outra. Não era algo difícil, nem surpreendente. O segundo toque já foi um pouco mais significativo, pois trazia lembranças para ambos; eles mantinham as mãos na posição do ta’al e, nesse movimento sim, as palmas eram pressionas uma contra a outra. Não havia nenhum vidro os separando agora.

Jim ficou hipnotizado pelas duas mãos unidas. Ele não sentia nada além da temperatura corporal quente de Spock, ainda assim, parecia algo especial. Depois de mais alguns segundos, Spock retirou a mão.

— Eu entendo que toques tão simples possam não ter um grande apelo para os humanos.

— É uma grande coisa para você, tocar alguém assim?

— Na verdade, sim. Embora seja um contado aceitável em publico, não é feito rotineiramente ou para qualquer um.

— Foi o que imaginei. Estou honrado por me mostrar isso. Se é suficiente para você, é suficiente pra mim.

Suficiente. Aquela palavra ficou dançando na mente de Spock. Era realmente suficiente?

Spock observou as pessoas indo e vindo pela praça. Alguns chegavam a direcionar um olhar para eles e continuavam em seus caminhos.

— As pessoas que nos viram agora, sabem que eu o considero como um amigo muito próximo. Como se fosse alguém da minha própria família, como um irmão.

— Você disse que nós compartilhamos um elo de amizade.

— Isso está correto.

— Como isso se formou? Foi quando nós misturamos nossas mentes?

— Não. Acredito que tenha sido muito antes disso — Spock deu uma resposta vaga, esperando que Jim não insistisse naquele ponto específico. — Mas durante nosso elo mental eu pude perceber a existência desse elo entre nós.

— E isso é uma coisa boa? Para você, quero dizer. Não lhe causa incomodo? Minha mente parece bastante caótica, até para mim.

— Sua mente não é caótica, é dinâmica. E um link de amizade não causa incômodo.

— E como isso funciona exatamente? Você consegue ler minha mente?

— Não. Um link é como um fio, feito de energia psíquica, unindo minha consciência a sua. Eu simplesmente estou sempre consciente de que você está na outra ponta. No máximo, eu poderia captar algumas emoções suas, se elas forem muito fortes; e apenas se você estiver próximo. Apenas um vínculo de casamento permite que duas mentes estejam constantemente em contato uma com a outra, mesmo em longas distâncias.

— Isso é muito legal.

— Devo concordar.

Depois da destruição de seu planeta natal, Spock fez um pacto consigo mesmo. Jamais se permitiria experimentar emoções tão fortes como as que experimentou naquele dia.

Ele foi um tolo.

As emoções vieram arrasadoramente incontroláveis sobre ele, e ele se viu completamente tomado pela dor, raiva e desejo de vingança.

Quando Jim estava morrendo na câmara de descontaminação, Spock desejou tanto poder salvá-lo, poder alcança-lo e confortá-lo, que por um instante pensou ter sentido Jim em sua mente. Foi tão rápido, que Spock pensou ter imaginado, mas então Jim morreu.

Naquele momento, Spock sentiu como se parte dele, parte de sua mente se apagasse, deixando um vazio. Como um elo rompido. Foi um choque, pois ele nem mesmo tinha percebido que um havia se formado. Logo em seguida sua razão foi subjugada, e ele foi tomado por dor e fúria.

Ele não entendeu, eles nem mesmo tinham se tocado pele a pele. Como era possível?

Spock nunca foi de acreditar em milagres, mas, milagrosamente, Jim estava vivo.

Nos dias que se seguiram, ele não conseguia ficar longe de Jim. Spock sabia que algo estava errado com seu próprio comportamento toda vez que McCoy olhava para ele com aquela expressão intrigada, sempre que Spock aparecia no hospital e pedia para ver Jim; ou quando ele começou a visitar Jim escondido de Nyota, depois que ela questionou se ele realmente precisava ir ao hospital todos os dias.

Aquelas emoções, aquele descontrole, permaneceram com Spock por muito tempo depois. Ele fez de tudo para se controlar, mas ficava pior perto de Jim. E manter distância definitivamente não foi a melhor das soluções.

Ele já devia saber, desde aquele momento em que sentiu Jim Kirk morrer, que aquele sentimento simples e tão poderoso não poderia ser mera amizade.

Inconscientemente, ele sabia.

Spock, ilogicamente, pensou que se ele ignorasse por completo aquele sentimento, ele sumiria. Mas no fundo ele sabia, não sabia? Por que mais ele lutou tanto para se apegar mais a Nyota e se distanciar emocionalmente de Jim?

E funcionou?

Não. Ele falhou miseravelmente.

Ele continuava repetindo para si mesmo que Jim era apenas seu amigo, mas uma parte dele dizia que não era suficiente, mesmo agora ele desejava sentir a mente de Jim outra vez.

Saber que Jim tinha sentimentos românticos por ele, algo que Spock jamais imaginou, mexeu com ele. Levou Spock a reavaliar tudo. A confissão de Jim mudou tudo.

Na verdade, Spock já tinha feito sua decisão. Ele já tinha confessado isso para Jim, não tinha? Se ele não estivesse comprometido com Nyota, ele estaria feliz em iniciar um relacionamento romântico com Jim. Se ele não tivesse comprometido com Nyota, ele não teria interrompido aquele beijo; e vai saber até onde ele teria ido com Jim aquela noite.

Foi por estar em um relacionamento com Nyota que ele escolheu ignorar e expurgar esse novo sentimento. Foi por respeito a Nyota que ele escolheu se afastar de Jim.

E em todas as vezes que Spock desistiu de tentar entender seus sentimentos por Jim para manter e fortalecer sua relação com Nyota, ele teve certeza de que estava fazendo a coisa certa. Mas isso não o impediu de se sentir de alguma forma errado.

Spock se sentia infiel. Emocionalmente infiel.

Infiel com Nyota e infiel com Jim.

Infiel consigo mesmo.

 Isso não podia continuar.

.

.

Quando chegaram na casa de Sarek, Jim correu para o chuveiro. Spock aproveitou esse momento para ligar para Nyota.

Ela estava tão feliz em ouvir dele. E ele estava feliz em ouvir dela também. Ele estava feliz em tê-la ao seu lado. Mas isso não podia mais ser assim. Ela deve ter notado algo diferente nele, porque em algum momento durante a conversa ela parou.

— Spock, você está bem?

— Incerto.

— Você quer conversar?

— Sim, nós devemos. Mas não agora. Quando eu voltar à Terra.

Houve uma pausa silenciosa de Nyota. Spock tinha certeza que não era apenas efeito do atraso da comunicação devido à longa distância.

— Quando você volta? — Ela perguntou finalmente. A voz dela tinha mudado.

— Amanhã.

— Tudo bem, Spock. Como você quiser.

Ela desligou. Sem “Eu te amo” desta vez. Spock ficou aliviado por ela não ter dito, assim ele não teria que responder. Ele se sentiu culpado por isso.

.

.

Spock apertava o PADD nas mãos quando ouviu uma batida na porta. Era Jim, com cabelo loiro úmido e cheiro de lavanda.

— Tudo bem por aqui?

— Sim. Eu estava conversando com Nyota.

— Oh... Ela deve estar ansiosa pra te ver, não é?

— Possivelmente.

— Eu vim te perguntar se você quer ver um filme. Orion’s Eleven. Ouvi dizer que é uma adaptação de algum filme terráqueo antigo. Espere... — Jim lia as informações em seu próprio PADD. — É cheio de violência ilógica e cenas de nudez, provavelmente você vai odiar. Esqueça o filme.

— Eu gostaria de ver.

— Mesmo?! — Jim quase engasgou de surpresa. — Certo, eu vou ver se consigo fazer seu sintetizador fazer alguma pipoca.

— Eu farei um chá.

— Chá com pipoca? Onde já se viu isso?

— Um suco?

— Mais aceitável.

— Você está começando a soar como um vulcano, Jim.

Eles assistiram o filme no quarto de Jim. Jim deitado em sua cama e Spock sentado na poltrona ao lado, Jim não ficou incomodado com esse arranjo.

Eles não terminaram de ver o filme, o cansaço e o calor finalmente levou a melhor sobre Jim e ele caiu no sono. Spock garantiu que a temperatura fosse agradável suficiente para Jim, colocou um cobertor sobre ele e o deixou descansar.

Spock tinha um lugar para ir.

.

.

— Aconteceu alguma coisa com Jim?

Foi a primeira coisa que o velho Spock perguntou ao ver seu eu mais jovem parado a sua porta.

— Não. Jim está perfeitamente bem. Reconheço que escolhi uma hora muito ilógica e inapropriada, mas eu não disponho de muito tempo. Vou entender se não quiser falar comigo. Tenho algumas perguntas... Perguntas de natureza pessoal.

O rosto do velho vulcano se suavizou imediatamente.

— Eu vejo. Você pode entrar.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler até aqui.
Comentários são bem vindos.
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Quem aí está ansioso para ver o novo Spock da série Discovery?



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