Irreal escrita por TopsyKreets


Capítulo 1
Capítulo Único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/725062/chapter/1

Irreal

 

A floresta tropical estava no ápice da escuridão. Pérola aprendera a muito o que aquilo significava. Estava perto de amanhecer. Muito perto agora.

Uma noite inteira vasculhando aquela ilhota. Cada praia, cada caverna, cada tronco oco.

 

Tudo isso por um deslize da Ametista.

 

Ela tinha que deixar a droga do bebê perto do portal. Mas é óbvio.

 

Garnet, Pérola e Greg nunca exigiram muito que Ametista tomasse conta do bebê Universe. Naquela tarde, no entanto, uma missão exigiu que esta o observasse por duas horas.

Fora o necessário para que este engatinhasse até o portal da sala das Gems e o ativasse, sendo enviado Deus sabe se lá onde.

 

Droga de bebê. Eu sabia que ia dar algum tipo de problema, cedo ou tarde.

Mais do que óbvio.

 

Entretanto, depois de horas de uma dura caminhada, Pérola não culpava mais Ametista. Ela era uma criança ainda, e ninguém imaginava como o bebê podia ter feito o portal da sala de estar da casa das Gems funcionar. Ainda mais uma que ainda nem andava por si só.

Na verdade, não sabia se se importava o suficiente para pensar muito no assunto.

Odiava tudo aquilo. Greg. O bebê. Tudo era uma lembrança constante de que ela jamais voltaria.

Estava cansada. Queria voltar para casa. Poderia dormir e esquecer de tudo. Garnet daria um jeito, sempre dava. Tudo ia ficar bem.

Estava realmente cansada. Nunca se sentira assim, tão desprovida de energia. Suada, com lama até os quadris. Parte dela queria desistir, se dando por vencida frente a situação. Mas outra ainda sentia a necessidade de continuar procurando.

 

Depois de todo esse tempo, eu ainda me comporto como a criada. Típico.

 

— Só mais um pouco agora, Pérola. Você está quase lá.

 

Ótimo, minhas alucinações voltaram. Perfeito.

 

Essa alucinação em si a acompanhara todo o momento desde a chegada na ilha deserta. Pérola estava gastando toda a energia que restara procurando o jovem Steven, e estava esgotada o bastante para não conseguir mais ignorar aquela visão rosada a sua frente.

 

Na verdade, parando pra pensar, acho que já estou seguindo as indicações dela faz um tempo.

 

E era isso mesmo. Ela ditara o caminho até ali. Mas Pérola se decidiu a não mais seguir uma ilusão. E se necessário, a responderia a altura.

— Pare de falar comigo. Você não é real.

Rose Quartz a encarou com perplexidade no olhar, como se ela estivesse dizendo algo sem nexo.

— Tem certeza?

— Absoluta. Você se foi, e jamais vai voltar.

Rose se perdeu por um momento. Olhou para o alto. Para o céu estrelado. Depois olhou abaixo. Para a grama, par os próprios pés. Deu um longo suspiro.

— Entendo. Tudo bem, vou te deixar em paz, se é o que você deseja.

— Ótimo.

Pérola continuou o caminho, e agora notara que estava completamente sozinha.

 

Perfeito. Retomei o controle. Não estou tão louca assim.

 

Cinco minutos mais tarde, Rose reaparecera, sentada num galho de uma árvore, poucos metros acima da cabeça de Pérola.

— Posso pelo menos te seguir um pouco mais? Quero saber como isso vai terminar.

— ARHHH!  – Pérola gritou.

Não tinha mais forças para aquilo.

 

De todas as alucinações do mundo, porque justamente tinha que ser a da única pessoa que ela não conseguiria ignorar jamais?

 

— O que você quer de mim, afinal? – Pérola questionou – O que você exatamente quer de mim?!

Rose sorriu e apontou para frente.

— Que você seja honesta consigo mesma. E que siga mais um pouco agora.

 

Ela ainda tentava entender o que Rose queria dizer com honesta consigo mesma, quando cortara a folhagem a sua frente e se deparara com uma clareira a céu aberto, no centro da floresta.

E no meio desta. Mas bem no meio, o jovem Universe repousava tranquilamente, sendo aparado por um enorme leão, de juba dourada e resplandecente. Havia vários destes, no entanto. Uma quantidade absurda de máquina de matar, ali repousando, em torno do bebê.

Pérola tremeu por um segundo. Mas se refez rapidamente. Teria que lutar mais um pouco para sair dali. Mas poderia fazê – lo. Ela era uma Crystal Gem, treinada pela própria Rose Quartz. Ela conseguiria.

Ela tomou um susto quando se deparou que, agora, sua alucinação não mantinha mais distância. Estava a seu lado. Muito próxima mesmo.

— Vai para de mentir agora, querida? – Disse, por fim.

A jovem olhou ao redor, para garantir que o espanto com a proximidade de sua alucinação mais vívida não teria acordado as feras.

Vendo que estava tudo bem, ela sussurrou:

— Eu vou tirá – lo daqui. Depois, acabamos. Eu vou embora. Pra mim já chega, disso tudo. Inclusive de você.

 

Rose responderia, mas Pérola pisara em um galho seco. Quando deu por si todos os leões estavam de pé, nada felizes com a presença da visitante.

Eles começaram a se mover, e cercaram sua presa.

Ela sacou sua arma, pronta para a luta. Só mais uma. Estaria acabado.

— Você confia em mim? – Rose perguntara.

— O quê?

Com isso, o primeiro leão atacou. Pérola o atingiu em cheio, lançando para cima. Mais vieram ao seu encalço, e ela foi derrubando um a um.

Uma mordida no braço, agora. Outra na perna. Ela continuava, sem hesitar, mas estava claro que eram animais demais. Não havia condições de se manter de pé por muito mais tempo.

 – Confia ou não?

Ela deu um salto brusco para a frente, acertando o que pareceria ser o Alfa, e tomando o bebê em de seus braços. O pouso teria sido mais perfeito se a perna não latejasse tanto.

— Pérola, confia ou não?

O alfa se levantou, resoluto. Ele avançou, derrubando Pérola. Esta colocou seu corpo perto do bebê, a fim de protege – lo, o oferecendo seu ombro direito para uma mordida certeira e dilacerante

Ela estava apagando. Ia desmaiar ali, no nada. Mais uma vez, viu sua ilusão se aproximar. Ela a encarava com aflição.

— Eu confio, eu... – balbuciando do chão – Eu juro.

— Então pare de lutar.

— Mas...

— Só pare. Por favor.

 E ela o fez. O leão avançou com tudo para cima dela, mas parou momentos antes. Sentiu a pequena mão da criança em seu focinho. O toque era meigo, gentil, típico de uma criança. Quando deu por si, o corte infligido por Pérola estava desaparecendo. O animal se acalmou. De repente, um brilho imergiu da Gem de Steven. Todos os leões estavam bem agora, como se a luta jamais tivesse ocorrido.

 

Pérola, se levantou, com certo esforço. O grupo se afastou dela.

Atrás dela, um caminho ficara livre, levando – a para longe dali, para uma das praias da ilha.

Ela segurou o bebê o melhor que conseguia e seguiu mancando para fora da clareira.

 

No caminho a frente, ela encontrou Rose sentada e cima de uma pedra. Achou justo, àquela altura, um descanso.

 

— Obrigada – Disse.

— Eu não fiz muito. Você, sim.

Ela passou a mão e se por cima das costas de Pérola. Ela se alinhou nos braços de Rose, ainda com o bebê no colo, que voltara a dormir tranquilamente.

 

— Você não odeia o bebê. Ninguém que odeia tanto alguém faria o que você fez.

Ela não conseguiu responder. Ela sentia o toque, o cheiro dela.

 

Tão real. É verdade. Tem que ser.

 

Rose continuou.

— Está com raiva de você mesma. Mas não precisa assim. É uma Gem incrível, minha Pérola. Tenha orgulho de você.

Esta se permitiu fazer algo que raramente fazia.

Se permitiu chorar.

 

— Não pude te salvar.

— Não havia nada a ser salvo. Está tudo bem.

— Eu quero você de volta.

Rose passou a mão esquerda pelo rosto. Aquela era um desejo sincero, profundo, esperado de quem ama de verdade.

— Acho que isso que nos faz humanas, sabe? Somos livres. Para fazer o que quisermos.

Sentir, desejar. Nem sempre sabemos o que queremos, apesar disso. Você é livre querida. Pode ir conhecer o mundo. Ou pode ficar com ele, mais um pouco.

Seja o que escolher, eu não vou te julgar.

Ela acariciou o rosto de Pérola uma última vez. Um último beijo.

Então, toda a dor desaparecera, e ela caiu para a escuridão.

 

***

 

Pérola quase deu um pulo da cama.

 

Era um sonho.

 

Ou melhor, uma lembrança. Recorrente. Até hoje não sabia se aquilo havia sido totalmente real ou não.

 

Já haviam passado anos. Mas ela ainda estava ali.

 

Olhou par a mesa de cabeceira da cama. Era a primeira coisa que sempre fazia, assim que acordava, todas as manhãs. Olhava para a foto dela. E depois, para a foto de todos reunidos na praia.

Esteve, Connie, Garnet, Ametista e Greg.

Ela havia perdido uma família. Mas recebera outra em troca. Talvez seja isso que ainda a mantivera ali, depois de tanto tempo.

Quando saiu do quarto, se deparou com Ametista, bem à sua frente.

 

— Ah, já ia bater. Connie já chegou para o treino. Está te esperando.

 

Ela sorriu. O trabalho nunca acaba, não é?— Pensou.

 

Passou direto por Ametista, sem dizer uma palavra. De repente, parou, retornou e beijou a amiga de surpresa.

Ametista guardava esses raros momentos para se dar ao luxo de ficar visivelmente corada totalmente e sem graça.

Ela tentou dizer algo que tirasse Pérola do sério, mas essa já havia se apressado em receber Connie.

Ela gostava dos beijos de Pérola. Eles a deixavam nervosa; envergonhada, com uma pitada de raiva.

 

...

 

E quanto mais raiva ela sentia, mas fofa ela ficava.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Irreal" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.