Defeitos egoístas escrita por 616


Capítulo 1
Gaiolas


Notas iniciais do capítulo

Meio óbvio, mas o nome do Viktor nessa história é Vityel pq eu gostei disso por mais tosco que esteja huahauah
Se achar qualquer erro, pode me corrigir nos comentários ou por mp. Críticas tbm são bem vindas smp que construtivas
Enjoy



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Yuri tocou o portão com seus dedos e ele instantaneamente se abriu, mostrando caminho para um grande hall circular e iluminado. Penas brancas flutuavam no local e os feixes da luz solar tinham texturas de grandes cortinas com brilhos de poeira. A brisa que se passava pelas grades e pelo teto furado não fazia barulho algum, somente regulava a temperatura corporal de quem tivesse conseguido subir até ali.

Foi um longo caminho percorrido, mas não foi difícil: para chegar à casa dos anjos, era necessário ter uma intenção pura e possível de se realizar. O coração da criatura que subia as escadas e ultrapassava os obstáculos era delicadamente interpretado pelas fadas mais pequenas da cidadela. Se não houvesse muito caos, nada seria dificuldade; mesmo que fosse uma trilha de quilômetros e quilômetros, o tempo passava mais devagar e a estamina de quem quer que fosse era sempre regenerada.

Estava perplexo por não ter que usar nenhuma magia de invocação ou chamado. Foi recebido por um anjo sorridente que esticou suas asas num espreguiço relaxante. Ele bocejou, piscou os olhos algumas vezes e olhou de onde vinha o barulho da visita.

— Vityel! — exclamou Yuri, abrindo a boca mais do que o necessário. — É mesmo você?

— Sim, sou eu! Mas como você sabe meu nome? Alguém das suas terras escreveu sobre mim? — A voz do anjo era alegre e gentil.

— De onde eu vim, há uma biblioteca inteira dedicada a você… Muitas pessoas te conheceram e contaram as experiências de como foi vir aqui.

— É mesmo? Venha, sente-se aqui. —  Apontou para o lado do mármore retangular onde estava sentado. — Agora fiquei curioso. O que falam sobre mim?

Yuri estranhou ter começado o diálogo com uma conversa tão casual. Caminhou até a pedra com um pouco de receio e sentou-se, tirando suas flechas das costas e colocando-as sobre o colo.

— Não estou tomando seu tempo, Vityel?

— De jeito nenhum, eu só tenho dormido esses dias. Conte-me.

— Primeiro… As pessoas falam de como você as surpreende, principalmente se comparado a outros anjos. Dizem que você é relaxado e mais… Humano. — Parou para refletir e analisou suas asas, suas poucas vestes brancas e a cor de seu cabelo. Não o achava tão humano assim. Ele realmente parecia uma divindade. — Elogiam sua aparência, o jeito como fala e como as entende. Gostariam que você fosse companhia delas, mas isso é algo fora da realidade.

— Entendo. —  Acenou com a cabeça. — Yuri Katsuki, certo?

— S-sim!

— Eu sei seu nome porque as fadas me disseram — estão me dizendo agora, para ser exato. Parece que seu caminho foi um dos mais calmos já percorridos, estou certo? — sorria entusiasmado e sentia-se confortável. Prestava bastante atenção no ser humano que estava ali.

Achava-o bagunçado. Ele carregava poções nos bolsos, mas também emanava magia e podia se virar com ela. As flechas que ele carregava eram de platina e obsidiana, sinal de que era um arqueiro bem experiente para ter aquilo em mãos e responsável o suficiente para saber no que atirar. Tinha adagas embainhadas na cintura e livros de feitiços na mochila —  andar com aquilo tudo deveria ser bem difícil.

— É… Não foi difícil chegar até aqui. Só foi demorado. Não precisei usar nem metade das coisas que trouxe.

Enfim, o anjo perguntou:

— Mas, Yuri, diga-me: o que fez você subir até aqui com uma intenção tão pura? Você parece almejar algo, mas não sei dizer o que é. Se não sabe, eu já lhe digo que não posso conceder desejos como um gênio, só o que estiver ao meu alcance dentro desta casa.

Não havia motivo para hesitar depois de toda a rota percorrida.

— Vityel, eu… Meu cachorro morreu. Como você deve saber, todo o país lá embaixo está em guerra, e eu não tive escolha senão partir de casa levando ele comigo. Mas… Usaram ele contra mim, e ele acabou morrendo.

Vityel ficou em silêncio por um momento.

— Eu não posso trazer seu cachorro de volta…

— Eu sei disso. Mas há algo que você pode fazer para me ajudar a trazê-lo de volta. É disso que eu vim atrás.

O anjo percebeu como o semblante do rapaz era sério após a mudança do assunto. Além de tudo, viu o seu lado egoísta: ele saiu da guerra para tentar recuperar a vida de seu animal de estimação, e ele era uma pessoa forte, muito forte. Mal se sabe quantas vidas ele poderia ter salvado no tempo que gastou subindo à sua casa.

— E o que posso fazer por você?

— Me dê uma boa lembrança. Qualquer uma.

Recuou por um momento.

— Por quê?

— É o que preciso. A parte principal do feitiço envolve a reprodução da aura de algum ser divino, um anjo é válido. A maneira mais fácil de fazer isso até agora é tendo alguma memória digna relacionada a isso. Por isso, é o que eu lhe peço. Por favor. — Levantou-se do mármore e ajoelhou-se em seguida.

Tão estranho. As ambições do rapaz eram muito fechadas e ele não era tão inocente quanto parecia. Porém, era admirável que seus pensamentos tivessem intenções puras com algo que pudesse prejudicar tantas pessoas no país. Era um pedido que poderia ser recusado com causa justíssima.

Entretanto, Vityel também se ajoelhou, sem se curvar. Pediu para que Yuri erguesse a cabeça e perguntou-lhe:

— Que tipo de lembrança você quer, Yuri? Isso é algo muito fácil. Podemos jogar uma partida de xadrez ou falar sobre algo que você gosta. Posso te dar conhecimento em algo que você tem curiosidade. Isso depende de você.

— Qualquer uma. Algo rápido, se possível. — Mesmo com o feitiço em mente, ele não tinha pensado em nada que pudesse lhe servir de lembrança com Vityel.

— Algo rápido… Yuri.

— O quê?

— Olhe para mim.

Vityel passou os dedos nos lábios do rapaz e deu-lhe um beijo sem aviso. Pôde vê-lo arregalar os olhos e ficar sem jeito; uma reação engraçada, por sinal.

— Vityel…

Fez aquilo por mera curiosidade. Curiosidade sobre Yuri Katsuki. Curiosidade sobre como ele pensava, sobre o que achava das coisas do mundo, do que achava sobre a guerra e do que achava sobre si mesmo. Não quis testá-lo nem algo do tipo. Ele só queria ver.

Havia uma biblioteca sobre ele lá embaixo, no entanto poucas pessoas conseguiam alcançar as casas, e mais escassas ainda era aquelas que conseguiam o que queriam. Acreditava que mais da metade sobre as coisas que Yuri viu sobre anjos estavam erradas e gostaria que ele soubesse ao menos um pouco sobre o que eles realmente eram. Ele também tinha interesse em humanos, mas sabia tão pouco sobre eles e viu que estava tão errado quando finalmente pôde recebê-los em sua casa que sua maior tristeza era não ter conhecimento acerca do real, acerca do que não estava pronto. Com aquele encontro, Vityel confirmou que queria ver, que queria sentir, que queria pecar a conduta que seguia. Afinal, Katsuki tinha seu lado humano, mas também tinha um lado somente dele.

— Creio que você vai se lembrar bem de algo como isso.

— Creio que sim… — respondeu, sem jeito e vergonhoso. Puxando um pouco de coragem, completou: — Obrigado…

Pegou suas flechas e levantou-se, despedindo de Vityel e deixando o portão. E não deixou de olhar para trás enquanto partia. Era encarado de volta quando olhava diretamente nos olhos do anjo.

— Boa sorte, Yuri.

As grades fecharam-se e prenderam-no na casa novamente. Ele ficou em pé até perder Katsuki de vista, sentindo que ele realmente teria partido. Tinha conseguido o que queria, afinal.

Quanto mais longe ia, mais Yuri enxergava uma gaiola aprisionando Vityel, e algo enchia seu coração com uma culpa que não era sua. E precisava seguir, mesmo tendo tantas perguntas. Precisava voltar ao campo de batalha após completar o seu feitiço. Precisava evitar que mais e mais pessoas ficassem presas eternamente na gaiola da morte.

Mesmo tão errado, ele fez o que queria. Mesmo tão errado, Vityel concedeu seu desejo. Até mesmo um anjo têm seus defeitos...

 


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