Do You Hate Me? escrita por Srta Who


Capítulo 1
Eu Odeio Beber.




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Capítulo I –

Eu Odeio Beber.

Algumas coisas não têm explicação. Elas acontecem e passam, simples como o nascer do sol ou uma brisa de primavera, mas uma pessoa muito inteligente uma vez disse ou pensou que as coisas mais simples são as mais complicadas de serem explicadas. Yukio Okumura jamais conseguiria desvendar o mistério por trás de seu pai. Seu verdadeiro pai, não aquele mostro que os concebeu com sua mãe. Shirou Fujimoto seria para sempre um enigma em sua cabeça. Por que ele, um paladino, tinha abandonado suas ordens para se fingir de padre num mosteiro só para salvar a vida dos filhos de satã? Talvez fosse apenas a bondade humana da qual tantos filósofos falam, ou talvez fosse algo mais. Vai saber.  

            Mas, tendo razões ocultas ou não em seus atos ainda era o homem mais admirável que Yukio conheceu em seus quinze anos andando pela crosta fina e turbulenta desse planeta. E por esse motivo não conseguiu acreditar quando recebeu a notícia de sua morte alguns meses atrás.

            Seu celular tocou as 6:00 da manhã. Até hoje ele sente que nunca vai esquecer aquele momento, a forma como suas pernas tremeram como varas secas de uma árvore numa ventania, de como a única coisa em seu cérebro era um grito pavoroso o qual nunca alcançou sua garganta. “Mentira!!!” Ele pensou naquela manhã. “Mentira!! Vão me pagar caro por essa piada! Só pode ser uma piada de muito mal gosto! ” Yukio continuava a pensar a caminho do mosteiro.

            E quando chegou lá tudo o que viu foi seu pai morto no chão e o mosteiro, seu lar, destruído. Naquele segundo a piada se tornou real. Foi quando Yukio Okumura descobriu. O destino tem um péssimo senso de humor.

            Depois do dia chuvoso do funeral toda sua vida começou a desmoronar bem de baixo dos seus pés enquanto ele corrigia provas, assinava papeis e mentia para si mesmo pensando que aquilo juntaria os cacos quebrados nos quais ele havia se tornado. Mas como uma pilha de papeis sobre sua mesa e litros de café em seu organismo poderiam consertar o fato de que ele tinha apontado uma arma para seu próprio irmão? Como fingir uma melhora inexistente traria sua paz de volta? Por que ele mentia quando isso não apaziguaria as dúvidas sobre seu olho, sobre si mesmo, sobre Mephisto, a escola seu irmão ou qualquer outra coisa?

            Se Yukio tivesse feito qualquer uma dessas perguntas a si mesmo algum dia não estaria na situação que estava agora. Era deplorável acordar e ver que mais uma vez tinha apagado de exaustão na madeira fria de sua mesa com centenas de papeis espalhados em baixo de seu rosto que lhe serviram como o pior travesseiro do mundo. Sua cabeça latejava de dor e suas costas não estavam nem um pouco melhor. Era surpreendente a coluna do rapaz ainda não ter se partido em duas dada a frequência com que dormia desconfortavelmente curvado.

            Depois de um longo minuto esfregando os olhos Yukio agarrou o celular. “11:00” O relógio digital marcava na tela. Ele franziu o cenho prometendo nunca mais trabalhar até as cinco da manhã e se frustrando por antecipação dado o descaramento dessa mentira que tão frequentemente contava a si mesmo.

            O garoto baixou os óculos e esfregou os olhos mais uma vez considerando seriamente voltar a dormir afinal, era sábado, e estava sozinho no imenso dormitório já que Rin tinha ido acampar com seus outros alunos da turma de exorcismo aproveitando o feriado prolongado que Mephisto decretara na quinta feira. Aquele demônio era realmente louco.

            Yukio recostou-se na cadeira sentindo os músculos doerem pela noite mal dormida. Estava prestes a se levantar para lavar o rosto e quem saber pegar um pouco mais de café quando o celular tocou. Ele atendeu sem nem olhar o número.

—Alô?

—Yukio seu pirralho bastardo desgraçado! Eu estou tentando falar com você a manhã inteira! O que diabos estava fazendo até agora?! – “Escandalosa” ele pensou. “Escandalosa demais”.

—Dormindo. – O rapaz respondeu usando o indicador para apertar uma das têmporas.  

—Dormindo? Yukio Okumura dormindo até essa hora? Tá brincando comigo, né?

—O que você quer? – Ele não estava no clima de suportar uma conversa com aquela irritante e vulgar mulher de cabelos vermelhos.

—Venha me encontrar naquele bar ao perto da minha casa. Não demore, sabe que eu odeio esperar.

—Shu... – Tu.… tu... tu... tu.

—E – Ela desligou na minha cara...? – Sua voz demonstrava raiva, mas por alguma razão Yukio se levantou da mesa e foi se lavar para encontrá-la jurando ser a última vez que fazia o que ela queria e de novo se sentindo frustrado com a própria mentira.

...

—É meio cedo para beber não acha? – Ele disse quando finalmente a encontrou sentada no balcão velho e acabado do bar. Aquele lugar certamente era o pesadelo de algum arquiteto por aí. Era um cubículo abafado e fedido com todas as janelas tapadas por madeira ou um pó grosso que se acumulava no vidro impedindo que a luz do sol entrasse por entre os vitrais coloridos com imagens de quem o jovem acreditava serem deuses da mitologia japonesa.

—É meio novo pra ser tão chato, não?

—Pode só me dizer o que quer de uma vez? Esse lugar me dá náuseas. – Ele disse ignorando o insulto, já que quando retrucava os dois passavam horas e horas trocando xingamentos sem nunca chegarem à lugar algum.

—Vamos beber!

—São onze horas da manhã, e eu sou menor de idade.

—Ah! Por que tem de ser tão chato? Vamos! O mundo está acabando! Vamos beber!

—O que quer dizer com ‘’o mundo está acabando’’?

—Que tal a gente fazer assim... Você bebe comigo, se eu ficar bêbada primeiro que você eu te conto, se você ficar bêbado primeiro vai ter de... Hmm. – Ela o sondou com aqueles olhos purpuras sinistros brilhando como os de um predador prestes a caçar o jantar. –Me contar o que está acontecendo com você. – Yukio gelou. Achava que estava se saindo bem escondendo seu treinamento particular de todos. Teria de ser mais convincente.

—Não tem nada acontecendo comigo!

—Hiro! Manda três garrafas de Whisky! – Shura gritou para o homem gigante de costas.

—Eu nunca disse que ia aceitar. – O estudante reclamou.

—Seu não te conhecesse isso até funcionaria.

—Não sou como você diz mesmo?... Um gato medroso de quatro olhos?

—Mas você é curioso, vai querer saber a qualquer custo do que eu estava falando.

—Aqui Shura-san. – O homem coberto de tatuagens entregou três garrafas a ela.

—Obrigada. – Shura agarrou duas garrafas, empurrou a terceira contra o peito de Yukio e se levantou para ir embora.

—Ei! Aonde você vai!?

—Você não pode beber aqui. Não quero que nenhum policial pense que eu estou aliciando menores. Vamos, o dormitório de vocês tem bastante espaço, pelo menos se você desmaiar ninguém vai ver. – Ela disse dando uma gargalhada que ressoou pelas paredes mofadas do bar vazio.

...

—Muito bem! As regras são as seguintes...

—Não sabiam que existiam regras para beber.

—Calado! – Ela lhe passou um pequeno copo de vidro cheio de da bebida incolor. –É um joguinho meu cada um faz uma pergunta, quem se recusar a responder tem de beber.

—Quem começa? – Eles tiraram pedra, papel tesoura. Yukio venceu, ele tinha uma estratégia, faria perguntas que ela certamente se recusaria a responder, seria mais fácil assim.

—O que quis dizer com ‘’o fim do mundo’’?

—Tsc... – Ela bebeu. –O que rola entre você e a loirinha? Ele bebeu.

Sentiu toda a extensão da garganta entrar em chamas enquanto a bebida descia rapidamente até seu estômago vazio, o que o fez se sentir ainda pior. “Como alguém em sã consciência consegue beber essa droga? ” Ele perguntava a si mesmo.  

—Por que implica tanto comigo?

—Porque é divertido. O que aconteceu em Tokyo? Você está mais estranho do que de costume desde que voltamos.

—Por que teria acontecido algo?

—Nha, Nha, Nha. – Shura disse balançando a cabeça negativamente num gesto exagerado fazendo com que seus longos cabelos fossem de um lado para outro de um jeito cômico. –Você não pode responder uma pergunta com outra pergunta, vai beber duas vezes.

—Isso não é justo. – Ele resmungou.

—É claro que é. Quebrar regras gera castigo achei que você, quatro olhos, entendia isso melhor do que ninguém. – Ela encheu seu copo e mais o dela. Yukio bebeu os dois se hesitar, mas não conseguiu evitar uma careta ao ingerir o segundo. Shura riu sonoramente. –Eu com certeza estou te levando para o mau caminho garoto.

—O que ainda está fazendo na Vera Cruz? Com certeza você odeia dar aulas, porque não trabalha apenas em campo?

—Uma pergunta de cada vez moleque.

—Responda. – Ele desafiou, já estava se sentindo tonto. Ela bebeu.

—Por que é tão certinho?

—As regras são importantes para que se mantenha a ordem, preciso ser controlado para que tudo corra bem.

—Pega leve Spock.

As coisas seguiram assim por um tempo, várias perguntas constrangedoras foram feitas, e muitos copos ficaram secos, e de repente já estavam na metade da segunda garrafa e Yukio sentia todo o lugar girar ao seu redor.

—Como consegue beber tanto e nem alterar o tom de voz? – Ele já estava bastante alto, a voz que saia de sua boca não parecia a dele. Aquela tinha sido a primeira pergunta que veio em sua cabeça não conseguia mais formular as questões da maneira como queria já há cinco ou seis rodadas e acabava perguntando o que dava na telha.

—Eu sou meio demônio esqueceu? – Ele riu, uma risada alta estranha. De bêbado. Obviamente sua resistência a bebida tinha sido cultivada durante anos sentada em mesas de bar e não tinha nada a ver com sua condição, mas ela tinha um plano. –O que? – Shura estava muito surpresa por vê-lo naquele estado e até um pouco arrependida. Só um pouco.

—Boa sorte tentando embebedar o filho de satã.

Os olhos de dela brilharam em divertimento enquanto pronunciava quase obscenamente as próximas palavras.

—Te... peguei...

—O que? Como assim? – A cabeça dele girou ainda mais ao se levantar da cadeira onde esteve sentado o tempo todo. Ele sabia que já estava bêbado há muito tempo, mas tinha feito o máximo para não dar nenhum indicio disso, até a voz ele tinha conseguido disfarçar... mais ou menos...

—Você perdeu medroso.

—Como?

—O primeiro sinal de que alguém está bêbado é que começa a dizer coisas que não diria sóbrio, quantas vezes na vida já admitiu ser filho de satã? – Ele permaneceu em silêncio. –Foi o que pensei. Era sempre Rin, não é? Por ele carregar as chamas você o via como filho dele, enquanto você era só um humano, não é?

—Ca-Calada. – Era verdade. Mas ouvir verdade que enterramos no fundo da alma para esquecer saindo da boca de outra pessoa nunca é uma experiência agradável.

—Tínhamos um acordo, agora você vai me contar tudo o que aconteceu.

—Você... você di-di-ssssii, mesma! Disse... eu estou bê-bê-bêbado. Não posso... fa-falar. – “Ah, então ele é tipo de bêbado que fica gago”. Shura pensou.

—E o que vai fazer? Já está em casa, além do mais... eu adoro ter essas conversas com pessoas que estão embriagadas, elas nunca mentem.

—Acha que eu não... não posso... posso... conseguir falar mentira?

—Acho que não, e se parecer que está mentindo enfio o resto da bebida na sua goela abaixo. Ela disse apontando para as garrafas dissidentes que se encontrava lado a lado na mesa, uma delas já pela metade só de lembrar o gosto ele tinha vontade de vomitar. –Acredite ou não estou fazendo isto para o seu bem.

—Até... até pa-parece! – Shura suspirou se sentindo frustrada ao ver o estado de seu colega exorcista. Ela ponderou por alguns segundos sobre o que faria. Certamente não seria nada útil tentar falar com Yukio agora.

—Vai dormir, vai, moleque. – Ela bradou, por fim, balançando as mãos. – Não quero ninguém desmaiando. Continuamos a quando você acordar.

—Eu não quero do-dormir. – A voz de Yukio estava tão arrastada que chegava a ser mais irritante que sua usual tensão de trabalho.

—Anda logo! – Shura o empurrou até o quarto e quando chegaram lá ela o forçou a se deitar, arrancou-lhe os sapatos e as meias e o cobriu até o queixo. Yukio tentou inutilmente se levantar, mas estava tão tonto e enjoado que decidiu fazer o que ela mandava mais uma vez.  Ele pegou no sono não muito depois e a ruiva decidiu descansar um pouco na cama vaga de Rin. Ela também não tinha dormido muito bem àquela noite. 


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