Eu estava em pé sobre um puff onde três pessoas terminavam de ajustar o meu vestido para o baile de halloween quando a porta se escancara.

— O que pensa que está fazendo?

— Lizzy eu quero... – Avan parecia perturbado.

— Boa tarde Lizzy,como vai?Eu estou atrapalhando você? É assim que a gente começa sabia?

— Desculpa,eu não podia imaginar que você estivesse se trocando.

— Será que vai virar rotina você invadir locais em que eu esteja semi nua?

— Assim espero.

—Como disse?

— Nada. Desculpa.

Sophia riu.

— Pessoal,acho que podemos colocar o cinto depois,podem nos dar licença , Sophia,por favor,acho que o senhor Jogia tem algo a me dizer. – Sophia saiu rindo – Me ajude aqui Avan – lhe dei a mão e ele me segurou enquanto descia do puff,coloquei o pé no chão e ele me puxou pra junto dele.

— Você está linda.

— E você deveria estar se arrumando. – Desviei o olhar e forcei minha mão para sair daquele abraço – afinal,o que veio fazer aqui?

— Avan? O que faz aqui?

Dexter entrava pela porta.

— É o que acabei de perguntar. Dex,esse terno de risca de giz,eu realmente tenho bom gosto,você está um gato.

— Tudo isso graças a minha estrela,que está radiante nesse vestido. Você não acha Avan?

— Acho. Lizzy realmente você esta estonteante. Guarde uma dança pra mim. Eu vou deixar você terminar de se arrumar. Até mais Dex!

— Avan,você não disse o que veio dizer.

— Esquece... eu só.. esquece.

Ele saiu sorrindo. Dexter achou bem estranho mas estava mais empolgado com o vestido.

Logo fomos para o salão e comei a desfilar minha “china poblana”,que era uma roupa típica mexicana.

—Lizzy,daqui duas horas exatamente o prefeito vai estar sentadinho aqui e a dança começa. Pois a festa só começa oficialmente depois disso. – Sophia checou na prancheta.

—Pra que essa demora?

— Você conhece o Dex. Vem,tem alguns produtores que ele quer que você conheça.

Fiquei cumprimentando pessoas e posando para fotos durante o que me pareceu uma eternidade,até que finalmente Sophia me levou para a coxia montada especialmente para os bailarinos do Ballet Folklorico do México,de Amália Hernandes. Retoquei a maquiagem,troquei de sapatos e me aqueci.

— Onde estão aqueles dois malucos? Diga que os viu.

— Vi,estão na segunda fileira,olhe ali,bem atrás do prefeito e pertinho do Daniel Craig.

— Eu detesto esse cara. Meu 007 favorito é o Pierce Brosnan.

— Não fala isso alto Lizzy!!

Mas quem gargalhou alto foi ela. Peguei uma garrafinha verde com uma caveirinha na tampa e engoli o conhaque lá de dentro.

—Eu não consigo vê-los Sophia,tem certeza que são eles?

—Claro,o de terno vermelho é o Ketan.

— Mas o irmão alto é o Avan. Você se confundiu,tem alguma coisa errada.

— Amiga não tem nada errado,eles estão lá olhando a festa e esperando o balé,agora chega disso pois vai começar. O José e o Rafael estão do outro lado e já fizeram sinal,está tudo pronto,vai lá e arrasa.

A orquestra dos mariachis começou a tocar e as bailarinas da primeira canção fizeram sua dança apresentando os dois bailarinos que seriam meus pares na dança do chapéu,a famosa “El jabare tapatio”,fizemos uma adaptação para que ao invés de um homem cortejando a moça,fossem dois,a brigar. Essa adaptação era sempre bem vinda pois o publico adora tragédias,ao final,o homem que ganhasse o coração da moça,mataria o outro. Um duelo de dança magnífico.

— Credo Sophia.

—O que,alguma coisa errada?

— Só acho que essa idéia de dançar essa coreografia não vai pegar bem,o Avan e o Ketan,ontem o Avan tava enciumado.

—É,poisé né.

— Mas o que o Dex quer,a gente faz né.

—Aham. Amiga,não me mata não.

Eu não entendi bem o que ela disse,era minha deixa para entrar no palco,mas consegui ver a cara de criança arteira de Sophia. O que será que ela tinha feito de errado? Respirei e entrei.

Nos primeiros passos,Rafael veio até mim e com seu sombrero fez o cortejo, ele estava tremendo. Quando  beijou minha mão senti uma barba fina em seu  rosto  que não estava lá no ultimo ensaio. José veio fumando um charuto,o que não estava programado. Rafael se levantou e eu fiz meus passos até José. Quando ele foi me cortejar,me deu a mão e então pude ver seu rosto. Avan estava usando o charro,o traje masculino tradicional mexicano dos bailarinos. Fiquei apavorada.

— O que você está fazendo aqui?

— Baila conmigo señorita?

— Qual é garoto você vai estragar tudo.

— Garoto não,e nós ensaiamos direitinho,é só fazer o que tinha que fazer e pronto.

—Nós?

No passo seguinte,completamente perdida,Rafael levanta a cabeça e sem surpresa,não havia Rafael. Ketan tomou seu lugar. Acho que fiquei parada por um minuto então Avan o puxou e começaram a “cena da briga” onde os dois duelariam por mim. Corri pra perto da coxia e Sophia gritou que estava tudo bem pois eles sabiam a coreografia. Fiquei muito brava,não sabia se gritava,se saia correndo,se matava os dois,se matava a Sophia... já que não podia fazer nada disso,voltei a cena e continuei a coreografia. Claro que a coisa foi um pouco pior do que eu esperava,afinal eu não sou bailaria e até onde eu sabia,eles não eram,pois as dancinhas básicas que o Avan fazia em Brilhante Vitória não podiam ser consideradas,mas ainda assim era mais do que o Ketan tinha feito. Ate o momento em que eles jogam o chapéu no chão,como parte da coreografia maluca que eles estavam fazendo,o Kett era o malvado,então ele me puxou e dançamos juntos,Avan no chão,como se estivesse ferido. Eu pude perceber que enquanto eu dançava com o seu irmão,Avan nos fuzilava com os olhos. Onde estava o ator que não estava fingindo dor?

—Agora ele vai me matar e você pega o chapéu dele que é o da direita.

— Ketan Jogia eu vou matar vocês dois.

E assim,Avan se levantou e cravou a espada cênica no irmão,que caiu ajoelhado e “morto”. Com o toque da orquestra,ele me abraçou e dançamos,então eu peguei o seu chapéu e fiz o que a coreografia manda que é esconder nossos rostos fingindo um beijo de amor e eu acredito que se não tivesse sido rápida,ele o teria feito.  Ketan se levantou e juntos agradecemos e saímos para a coxia,de onde correram outros bailarinos para o palco.

— De quem foi essa idéia ridícula?

— Ah foi lindo Lizzy,eles nos amam!

—Avan NÃO! Ninguém achou graça,isso não foi nada legal.

— Eu sabia que ia dar merda,sabia que ela ia ficar muito brava mas eu não tenho nada  a ver com isso,vocês se entendam ai. –Ketan riu.

— Sophia eu vou te matar.

— Lizzy desculpa.

— É,foi ótimo,as pessoas gostaram,o Dex adorou. A gente não errou nenhum passo! – Avan tentava me acalmar.

— Avan foi péssimo,eu ensaiei um mês e meio com os bailarinos da Hernandes,afinal cadê eles?

— A gente ensaiou ontem a noite com eles,na verdade o José teve um problema e não poderia se apresentar.

— O que?

—Eu não sei bem,mas o Rafael ia falar com você pra passarem de novo com outro cara ai eu..

—Vocês ensaiaram ontem a noite?

—É,ai ele vinha te falar e eu disse...

—Só ontem? Impossível.

—É. Só ontem. –Avan terminou.

Mal pude acreditar que eles ensaiaram tão pouco,tive que retirar o que pensei sobre o Avan não saber grande coisa sobre dança e Ketan me surpreendeu. Algumas pessoas do próprio balé vieram comentar aquela “coisa” que fizemos,disseram que foi muito bom. Na verdade a roupa ajudou. Eu vestia uma saia enorme vermelha e o balanço dela quando eu girava era magnífico,os dois muito bem trajados em charros brancos com detalhes marrons e um sombrero com franjas também na cor marrom. Mas a atmosfera... afinal eram dois irmãos “brigando” pelo amor de uma mulher. As pessoas adoram esse tipo de coisa. Não havia nada a fazer a não ser me acalmar e aparecer linda e sorridente ao lado dos dois nas fotos,afinal,nada tinha sido estragado.

Foi o que fizemos. Sorrimos. Fotografamos. Bebemos. Voltei para o quarto pois o baile ia realmente começar e eu tinha outro vestido. Entrei no chuveiro pra tirar o suor e sonhei. Como Avan era irritante,e surpreendente. Sei que não era coisa da Sophia,ela não faria essa maluquice pois sabe as coisas que estão em jogo mas ele,não,ele não sabe de nada e era bem capaz de bagunçar a minha vida. Depois de trocada fui pro salão,onde musica eletrônica competia com o som dos mariachis lá de fora. Dançamos. Dançamos e nos divertimos muito. Voltei pro meu quarto quando o sol já ia alto no dia primeiro de novembro. Voltei a encontrá – los depois das quatro da tarde.

— Vivo? – Perguntei a Avan.

—Vivo,mas meio morto.

—E Ketan? Bem?

—Bem. Acho que sim. Parece que ele e a Sophia se entenderam ontem?

— Será? Não fiquei vigiando.

— Eu acho que sim. – Avan tinha um sorriso safado no rosto.

— Tira essa jaqueta e vem cavalgar comigo.

— Cavalgar? Ah não Lizzy,eu to morrendo. Deita aqui comigo. -  ele estava em uma cadeira enorme no pátio sul,privativo dos quartos.

— Não. Se eu deitasse ai eu morreria junto com essa sua ressaca,vem fazer alguma coisa que melhora,e a coisa a fazer é cavalgar.

Saímos correndo pelos pastos verdejantes da velha fazenda.