Ódio Cego escrita por Antônia Fernanda


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Então, depois de um tempo eu tô de volta. Meio enferrujada, mas de volta. Aproveite a leitura dessa Thorki meio velha, meio nova guardada-na-gaveta-e-reformada.



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Ódio cego.

Há muito que eu gostaria de dizer e nunca tive a coragem.

Talvez não fosse exatamente a falta de coragem... mas talvez o medo da incerteza de minhas palavras. Gosto de ter segurança sobre as coisas, algo que muitos chamaram de arrogância, mas é uma característica minha.

Como poderia gritar que te odeio se nem sequer tenho plena certeza disso?

Eu te odiava tanto, eu pensava. Odiava o fato de você ser tão mais parecido com o papai que eu. Odiava o fato de ser tão energético, ser tão apressado e hiperativo, de ser incapaz de parar quieto. Odiava o fato de você ser tão beberrão e mulherengo (além de ser um bêbado incrivelmente chato e grudento, que por muitas noites eu tive que cuidar.) Odiava o fato de você ter uma personalidade tão incontrolável e arranjar confusão por onde andasse. Deuses, eu odiava tanto o fato de você ser melhor que eu em tanta coisa! Em corridas, lutas, cavalgadas... Eu sempre era tua sombra.

Você... vibrava energia. Uma energia que eu nunca soube lidar. Que me sufocava.

E não teve uma noite que eu não me perguntasse o que eu sentia por você. Minhas madrugadas insones passaram a ser minhas piores inimigas. Nestas horas, quando me pegava tremendo de ódio de você, minha mente me pregava peças... Me torturava, me enchendo de incertezas.

Lembrava de que você, apesar de ser um incorrigível hiperativo, ficava quieto num silencio sepulcral, me vendo treinar magia. Deuses, eu lembrava até do brilho dos teus olhos, fascinado com as cores e formas que saiam da palma das minhas mãos, em curiosidade e admiração infinitas.

Lembrava que mesmo bêbado, você me dava abraços gentis e dizia que me amava com uma convicção que me assustava. E repetia. Mais uma vez. E outra. Tantas vezes que sua voz se tornava eco na minha cabeça... E você adormecia no meu colo num sono tranquilo, sem a menor ideia do que suas palavras faziam comigo.

Lembrava de como você me protegia nas confusões que arranjava. Como se metia na frente de qualquer um que sequer olhasse torto pra mim. Lembrava até das brigas idiotas de bar, quando alguns homens tentavam me pagar bebida, na esperança tola de tentarem me levar para a cama. Lembrava como seus olhos se enchiam de um brilho de pura ira, como seus punhos se fechavam em raiva infinita, como você os socava e chutava, nem sequer se importando consigo mesmo ou com os ferimentos que eles poderiam te causar. E depois de todas as lutas, todas elas, eu cuidava de você, curava seus ferimentos... e deixava que você dormisse comigo para que o papai não brigasse contigo por arranjar brigas de bar.

Você o imitava, se lembra? Ficava em cima da cama, colocava as mãos na cintura, fazia uma cara arrogante e dizia, imitando o papai: “Futuros reis não devem se meter em confusões tolas”. Você adorava meu riso quando fazia isso.

Lembrava de como você me incentiva em ser o melhor que eu pudesse, em qualquer coisa. Como você entendia que apesar de minhas terríveis habilidades para correr, cavalgar ou lutar, eu era o melhor mago do reino. Lembrava de como você celebrava minhas conquistas e apreciava minha inteligência... Muito mais que o papai.

Nestas noites... Minha mente trabalhava muito mais do que deveria, num ciclo cruel de confusão, de amor e ódio. E nós crescemos. E minhas preocupações se tornaram outras. Mais intensas, mais confusas. Com cortes mais profundos.

Minha mente fazia questão de lembrar dos teus melhores beijos. Da maneira que teus lábios pacientemente me beijavam como se sentissem algum sabor exótico. Eu me lembrava de toda a loucura, o desejo presente nos teus lábios. Lembro até do meu sentimento imensurável de culpa que eu senti após nosso primeiro beijo... Mas me lembro também de toda a alegria que ele me proporcionou.

Lembro da sensação de tua respiração contra meu pescoço. Lembro de tuas mãos machucadas, maltratadas de guerra contra a minha pele, me segurando firme. Eu quase tinha a sensação de que você nunca mais me soltaria, nunca me deixaria ir. E você dizia, com a voz embebida em luxúria:

“Você é meu. Ninguém mais te tocará, nunca. ”

Você tinha um estranho fogo nos olhos. Eu, agora, me descobrindo gigante de gelo, sempre consegui ver essa chama nos teus olhos azuis. Talvez eu, todo esse tempo, ainda tentasse me enganar.

“Como você quer que eu faça, irmãozinho?” Você dizia. A luxúria nas tuas palavras era quase palpável.

Eu me lembro de tudo. Dos teus gemidos, de cada um de teus beijos e suspiros, de cada marca que você deixou na minha pele. As tuas mãos eram sempre possessivas, agressivas, me envolviam com ferocidade, mas dos teus lábios só saiam palavras doces. Coisas que eu não queria ouvir.

“Eu te amo. Eu te amo, irmãozinho.”

E doía. Ainda dói. A loucura e certeza das coisas que você me dizia durante o sexo me despedaçavam por inteiro de dúvida, de culpa. Doíam mais que seus arranhões. Suas mordidas nos meus ombros. A maneira como você me pegava pelos pulsos, com mais força que o necessário. Eu sempre achei que você gostava de me machucar... Mas não. Você só não tinha ideia de como você fazia eu me sentir. E eu tentei te odiar todos os dias da minha vida. Eu tentei com todas as minhas forças, com todo o desespero presente em mim.

Mas era teu nome que eu gemia naquelas noites. Era por você quem eu suspirava.

E eu odeio, odeio isso com toda minha alma. Odeio o fato de eu amar cada um de seus beijos. Odeio o fato de eu pedir aos céus todas as noites que você não se separe de mim. Odeio o fato de eu morrer de medo de que, de uma hora pra outra, você suspire o nome de outra pessoa enquanto estiver dentro de mim.

Eu te odeio, Thor. Te odeio por todo o amor que há dentro de mim.


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