Costumo projetar-me nas horas difíceis, em corações desolados, como uma promessa de melhora, uma crença de que tudo acabará bem. Costumo surgir dizendo que as coisas darão certo e quando não dão, jamais me chamam de culpada. Sou apenas um conforto.

 Conheço todos os sentimentos e acontecimentos. Não sei como me imaginam, mas particularmente gosto de me imaginar em meio a luzes. Minhas luzes. Luzes que são como pequenas chamas acesas num ambiente escuro. Chamas que fraquejam quando vem a dor. A dor que me apaga a primeira chama.

 É a deixa para que o medo apareça. E eis que ele vem correndo, com seu olhar alucinado e batimentos desordenados, e insanamente ataca minha segunda chama, que num movimento tremeluzente desaparece aos meus olhos.

 Não nego que ando com más companhias. Vivo lado a lado com as tragédias, pois são lindas as tragédias com seus escuros mantos de sangue, andando serenas em sua elegância cruel, tornando belos os romances literários e depressivos os corações que as conhecem. Suas mãos gélidas destroem o calor da terceira chama, que deixa para trás apenas seus rastros de fumaça, como os últimos suspiros humanos diante da morte.

 A quarta chama é destruída pela tristeza, que se arrasta pálida e chorosa pelos cantos da existência, pingando suas lágrimas egoístas nas vidas sem sorte. A essa altura já não me resta muita vida, minha voz não passa de um sussurro, mas continuo ali, esperando.

 Minha espera termina quando vem a morte, em seu cavalo negro como a noite. Ela me toma em suas mãos delicadas, soprando silenciosamente minha última chama.

 Na escuridão total, acompanho minha amiga morte por um caminho silencioso, ela costuma me levar por último, mas nunca me deixa para trás. E sempre que abandono a existência, paira a certeza de que tudo dará errado, até que um novo coração não tão despedaçado, me traga de volta à vida ansioso por um pouco mais de esperança.