Open escrita por daddysaidno


Capítulo 1
Stay open


Notas iniciais do capítulo

Oi gente
Então, essa é a coisa mais especial que eu já postei nesse site, então leiam com amor



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Em menos de um minuto, posso citar uma centena de coisas das quais gosto em Luis. Dessa centena, contei a ele umas dez, e das outras noventa ele nunca vai saber. Porque, mesmo que eu tente, existem pelo menos noventa coisas que eu não conseguiria dizer, nem em trinta minutos, se os olhos dele estivessem olhando nos meus.

Então, eu digo a ele ''gosto de, pelo menos, um milhão de coisas em você'', e ele duvida. Acha que não há tanta coisa boa assim nele. Mas eu gosto do pacote completo, o que vier de bom e o que vier de ruim, mesmo que me doa gostar. E ele não acredita. Acha que sou exagerado, e sou. Ele é exagerado. A gente se exagerou, e tudo bem. Eu gosto disso nele também.

O que importa é que quando eu o conheci, provavelmente tocava algum sertanejo, as luzes coloridas me entusiasmavam e a cerveja esquentava no copo enquanto tudo o que eu conseguia fazer era cochichar no ouvido da minha amiga ao lado. '’Que cara lindo’’ eu disse, pelo menos, umas quinze vezes desde o momento em que ele passou a colar do nosso lado. O cabelo dele beirava a cintura e o meu sotaque era acentuado, coisa que o fazia rir, tanto que ficava difícil não sorrir o tempo inteiro também, apenas pelo fato de que ele estava ali. 

E lembro do gosto de uva quando começamos a dividir jellyshots sem perceber que, pouco a pouco, o mundo sumia para que apenas nós dois dançássemos naquela noite, pelo resto da noite. Do gosto de uva que dividimos quando Luis me beijou, do tremor que me arrepiou, e do quanto eu dancei, lembro de estarmos atrás do palco, de nos despedirmos e da mensagem que ele havia mandado quando cheguei em casa. '’Tu é massa’’. Me apaixonei.

Se a semana tivesse oito dias, teríamos nos visto todos os oito dias depois daquela festa. Mas só nos vimos sete. Eu morava longe e tinha data marcada para ir embora, a exatamente duas semanas dali, e Luis disse que me veria todos os dias, até o dia em que eu fosse embora. Eu aceitei.

No sábado seguinte, tocava Martin Solveig enquanto a vodka descia quente pela minha garganta e as mãos grossas dele deslizavam pela minha barriga, indo e voltando como se não houvesse ninguém ao redor para ver. Talvez não houvesse. Durante horas, só haviam nossos narizes pregados um ao outro e a batida que nos impulsionava como um corpo só. Ele me fez livre e eu fui livre. E eu o deixei livre. Livres, nós ficamos juntos.

Quando percebi que a música iria acabar, tomei coragem e chamei. ‘’Dorme lá em casa’’ pedi, e ele sorriu bem grande, como costumava fazer. ‘’Vou em casa buscar minha escova e meu pijama’’ respondeu no meu ouvido.

Com um shortinho de Hora da Aventura, roubando meus travesseiros a noite inteira, dividimos meu colchão de solteiro. No escuro, pude sentir a sensação elétrica de quando o seu corpo não hesita ao se derreter nos dedos de alguém. Enquanto minha amiga, que me ouvira elogiá-lo pelo menos quinze vezes na semana passada, dormia na cama ao lado, esquecemos a camisinha e nos entrelaçamos com pressa. Se a noite pudesse durar o dia seguinte também, eu abdicaria do domingo para viver aquele sábado o dia inteiro.

Eu não dormi. Enquanto o gosto de vodka durava na minha língua e Luis roncava nas minhas costas, passei a madrugada sem saber como lidar com a ansiedade que torcia meu estômago.

Ele ficou para almoçar no domingo, conheceu meu pai e ajudou a assar as costelas na churrasqueira. Chamou minha irmã de cunhada. E eu, acanhado no canto da mesa, contendo um milhão de sorrisos que insistiam em se entregar, observava enquanto, com os cabelos bem presos num coque alto, ele ria.

‘’Me chama de bonitinho’’ pediu, caçoando do meu sotaque nordestino. ‘’Vamos namorar enquanto você estiver aqui’’ ele sugeriu, mais me impondo do que propondo, e eu nem hesitei. Trocamos apelidos fofos, como um bom casal deveria fazer.

Não éramos um bom casal. Todas as vezes em que o nariz comprido dele se perdia no meu pescoço, em silêncio nós contávamos o tempo, e ficava menor cada vez mais rápido. Fizemos juras só para que fossem quebradas quando a hora chegasse, contamos vantagem de um amor com data de validade. Construímos todo um castelo de cartas só para vê-lo cair em cima de nós no fim.

E quando o desespero me apertou, deixei que o impulso falasse mais alto e fiz o que não deveria fazer, mas do que não me arrependo. ‘’Fiz uma besteira’’ falei pra ele num áudio de whatsapp gravado com voz de quem aprontou, ‘’alarguei a orelha e mudei a minha passagem. Mentira, não alarguei a orelha’’. Ele ouviu o áudio pelo menos três vezes antes de realmente entender. Nos dei mais três semanas de presente, e por isso ele chorou uma noite inteira em cima do meu peito. Eu chorei ao vê-lo chorar.

Acordar de madrugada passou de enfadonho a rotina, só para que eu pudesse perder meu tempo de sono observando Luis dormir enquanto suas músicas enchiam o quarto. E acordar de manhã cedo para me despedir antes que ele fosse trabalhar se tornou uma das minhas coisas preferidas. Tanto quanto rodar de carro pela cidade só por rodar, ouvindo Martin Solveig sem vontade de se despedir, presos numa sintonia cruelmente similar.

Quando nos despedimos no aeroporto, ele não ficou até o embarque. Eu não queria que ele ficasse. Mas me deixou um envelope e dentro dele um kit autodestrutivo que ainda guardo dentro do meu livro preferido. Algumas fotos, um cartão SD com uma música e uma carta de duas páginas. Chorei da primeira à última palavra, sentado na poltrona sala de embarque como se estivesse a caminho do juízo final. Tinha tanto peso no peito que provavelmente perderia a capacidade de dormir tranquilo e rolaria a noite toda procurando o aperto de dividir com alguém um colchão de solteiro.

A fila de embarque se formou, como se para contar o meu tempo, e eu não tive coragem de guardar o kit autodestrutivo na mochila. Segurei com firmeza, o suficiente para amassar as bordas das fotos, mas não importa, enquanto voltava a atravessar a porta de embarque. Imaginei quanto custaria para reaver minha bagagem, porque eu não consegui entrar naquele avião.

As fotos amassadas ganharam lugar especial nos porta-retratos da nossa mesinha de cabeceira.


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Notas finais do capítulo