Claire's Anatomy escrita por Clara Gomes


Capítulo 37
Capítulo 34 – Who Wants to Live Forever?


Notas iniciais do capítulo

Oi gente! Pra não perder o costume, mais uma vez estou eu aqui pedindo mil perdões pelo sumiço, dessa vez foram uns 6 meses né? É que durante o período letivo minha vida é realmente insana, não tenho nem tempo pra lavar o cabelo direito kk aí quando chegam as férias e eu acho que vou escrever horrores, abro o arquivo e não consigo fazer fluir. Mas eu tenho a responsabilidade de postar para mostrar que não, eu não desisti da fic, apesar de que imagino que muitos de vocês tenham. Então volto hoje com mais um capítulo, e não prometo que postarei de novo tão cedo, e já me desculpo por isso.
Esse capítulo seria a "Season Finale" da nossa 4ª temporada, coincidindo com o final da 9ª temporada da série, logo teremos algumas cenas desse episódio. Ele é chocante, e não me matem pelo final hahaha.
A música é extremamente emocionante, ainda mais devido à relação da vida de Freddie Mercury (seu cantor) com a letra. Ela combina muito com o capítulo, e deixarei o resto com vocês. Link: https://www.youtube.com/watch?v=_Jtpf8N5IDE
Espero que gostem do capítulo, boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/720919/chapter/37

 

Você acha que há solução para tudo? Mesmo que não seja fácil, mas para todo problema existe uma solução? Que tudo pode ser resolvido, mesmo que custe muito caro? Ou você acha que algumas coisas simplesmente não sou resolvíveis, como algumas doenças ou questões matemáticas?

Peguei mais um pedaço de pizza e troquei de canal, terminando mais um filme. Percorri todos os canais, não encontrando nada de interessante. Bufei e joguei a cabeça para trás, chocando-me contra o encosto do sofá. Aquele era o cúmulo do tédio, e foi aí que percebi que não era mais feita para ficar em casa descansando.

De repente, algumas palavras vindas da TV me despertaram interesse: “Forte tempestade é prevista para atingir Seattle essa madrugada. Fenômeno pode ser muito prejudicial para a cidade”.

— Obrigada, Senhor! – pulei do sofá animadamente, erguendo os braços aos céus como agradecimento. Percebi o quão errado era comemorar algo daquele tipo, mas naquele momento eu não estava realmente me importando.

Ouvi meu celular tocar, e rapidamente peguei-o para ver quem era. Como se lesse meus pensamentos, minha mãe estava me ligando, e eu tinha quase certeza que teria algo relacionado com a notícia que acabara de ouvir.

— Boa tarde, mãe. – atendi da forma mais simpática que pude. As coisas estavam finalmente voltando a ficarem normais entre nós duas, e eu estava feliz por isso.

Boa tarde, Claire. Você já deve ter visto a notícia da tempestade, não é?— disse, indo direto ao ponto.

— Sim. – assenti, como se ela pudesse ver.

Eu imagino que você pretenda passar a noite no hospital para ajudar com os prováveis feridos, certo?— especulou, realmente deixando-me impressionada com a leitura de pensamentos.

— Sim. – concordei novamente.

Então seu pai vai passar aí para buscar os gêmeos.— afirmou, parecendo não querer me dar opções de escolha. Eu ainda me mantinha firme, e não havia deixado meus filhos com ela nenhuma vez depois de nossa briga. Isso ainda me deixava um pouco sem jeito, porque queria de certa forma provar para eles que eu conseguia fazer aquilo sozinha.

— Mãe, eu não sei... – mordi o lábio, indecisa.

Claire, já chega desse show. A gente sabe que você consegue se virar. Mas hoje a coisa vai estar caótica, pelo jeito. A creche do hospital vai estar lotada, a energia pode acabar... O melhor é deixar as crianças comigo. É mais seguro e mais confortável para eles.— retrucou, tentando me convencer. Ela tinha razão, por mais que eu não quisesse admitir.

— Okay, vai. – cedi, suspirando – Ele pode vir daqui a pouco? Eu quero chegar no hospital antes que as coisas fiquem loucas.

Ele já vai sair daqui.

— Obrigada, mãe. – sorri fraco, agradecendo-a.

Sempre que precisar. — falou, e pouco depois encerrou a ligação.

Tirei o celular da orelha e respirei fundo, ainda um pouco incomodada com aquela situação. Mas aquilo teria que acontecer uma hora ou outra, e aquele era o momento certo.

—-

Ao adentrar o hospital, notei que algumas pessoas cochichavam e davam risadinhas, outras até apressavam-se para as escadas ou elevadores.

— Venha Claire, está acontecendo. – uma enfermeira que passou correndo por mim chamou-me, deixando-me confusa. Será que algum acidente muito grave já havia acontecido, mesmo antes da tempestade começar?

— O que...? – perguntei para ninguém, e decidi seguir o fluxo logo de uma vez.

Peguei um elevador junto com algumas enfermeiras e enfermeiros, e segui-os até a entrada das ambulâncias, encontrando Rebecca, Anastasia e Erick observando tudo atentamente.

— O que está acontecendo? – questionei, ainda sem entender.

— Cale a boca e preste atenção. – retrucou Anastasia, apontando para frente.

Fiz o que ela mandou, e notei a presença de Kepner, que empurrava um homem numa maca, fazendo as primeiras perguntas do atendimento como era de costume. De repente, uma música começou a tocar no fundo, deixando a médica e a mim confusas. Reconheci que a música era I’m Gonna Be (500 Miles), da banda The Proclaimers, e o suposto paciente levantou-se da maca, começando a dançar com os paramédicos.

— Ai meu Deus... – finalmente comecei a sacar o que estava acontecendo, abrindo um sorriso e cobrindo minha boca com a mão, sentindo uma leve vergonha alheia.

Mais dançarinos saíram das ambulâncias, e um deles puxou uma cadeira para April sentar-se, enquanto todos seguiam uma coreografia ensaiada em volta dela. Após alguns segundos, Matthew, o paramédico namorado da ruiva, apareceu descendo as escadas externas, também juntando-se ao grupo na dança. Sem perceber, comecei a dançar sem sair do lugar, seguindo o ritmo da música. Olhei para Rebecca, que estava ao meu lado com cara de tédio, e segurei em seus ombros, fazendo-a se mexer junto comigo enquanto ria de sua desaprovação evidente. Erick juntou-se a mim, tentando imitar os passos dos dançarinos, finalmente arrancando uma risada de minha amiga, que cedeu e começou a dançar junto com o homem, deixando-me um pouco de lado e fazendo-me estranhá-la. Pouco depois, a música acabou, e os dois apenas continuaram rindo e se encarando.

Decidi voltar minha atenção para o grande acontecimento. Agora Matthew encontrava-se rodeado pelos dançarinos, em frente à sua namorada, que estava sentada na cadeira de rodinhas, totalmente emocionada e segurando uma rosa que eu não sabia de onde havia aparecido.

— April, sei que parece loucura... – o paramédico começou a falar, sendo interrompido pela jovem.

— Totalmente loucura! – exclamou, rindo e esbanjando alegria.

— E para alguns, repentino. – continuou o rapaz, parecendo nervoso – Mas quando tenho certeza de algo, eu tenho. A primeira vez que te vi aqui nessa entrada... senti um choque. E pensei... Essa é a pessoa mais linda que já vi. E aí eu pensei... Bom, eu tinha certeza... de que ia me apaixonar por você. E nunca fiquei tão feliz de saber alguma coisa na minha vida. – discursou, arrancando sorrisos da multidão. Virou-se para uma colega de trabalho e estendeu a mão, sendo-o entregue uma caixinha preta.

— Oh meu Deus! – Kepner disse alto, já totalmente entregue ao choro de emoção, e cobriu a boca, enquanto o moço se ajoelhava à sua frente.

— April Kepner... eu te amo. E quero passar a vida tentando fazê-la tão feliz como me faz. Se você me deixar. – afirmou, abrindo a caixinha em seguida, revelando o esperado anel – Quer casar comigo? – indagou finalmente, em meio a várias interjeições de fofura.

— Sim. – respondeu com dificuldade, e todo o grupo comemorou, jogando pétalas de flores cor-de-rosa e vermelhas. Matthew então colocou a aliança no dedo de sua agora noiva, enquanto todos aplaudiam e gritavam. O casal trocou um beijo apaixonado, e o homem agarrou-a e levantou-a, girando com ela ainda com os lábios grudados.

— Isso foi tão fofinho! – falou Anastasia, com um largo sorriso no rosto. Sequei uma lágrima que escorria por minha face, tentando disfarçar o choro.

— Pois é... – concordei, pela primeira vez sentindo inveja de verdade de April Kepner.

— Eu passo. – Rebecca deu de ombros, lançando um olhar para Erick antes de voltar para dentro do hospital.

A multidão foi se desfazendo, e eu segui o pessoal novamente, encontrando Rebecca escorada num balcão, mexendo num prontuário.

— Será que algum dia eu vou ter algo assim? – perguntei, encostando no balcão também.

— Você realmente achou isso legal? – ergueu uma sobrancelha, parecendo não acreditar – Com a escolha de homens que você tem, eu acho difícil. – não perdeu a oportunidade de me alfinetar.

— Okay, vamos cortar esse assunto. – retruquei, sem paciência para ouvi-la falar sobre aquilo mais uma vez.

— É sempre assim, você não quer ouvir a verdade... – disse ironicamente, ainda com os olhos no prontuário – Tem falado com aquele embuste?

— Ele me manda mensagem às vezes, e eu respondo, mas sei lá, não é a mesma coisa. – suspirei, lembrando-me de nossas conversas – Eu realmente gosto dele, mas não consigo mais confiar. Toda vez que olho para a foto dele, imagino-o comprando e usando aquela maldita arma. – desabafei, tristemente – Por que ele tinha que ser assim?

— Sem querer ser a amiga chata mas já sendo... Eu te avisei, não é? – ergueu os ombros, agora me olhando – Mas relaxa, você vai encontrar seu príncipe encantado, cavalheiro de armadura brilhante montado num alazão. – falou com uma pitada de sarcasmo.

— Eu sou mais os cavalos brancos. – dei de ombros, sorrindo fraco.

— Racista. – acusou-me de brincadeira, fazendo-me revirar os olhos.

— E aí garotas, qual é a boa? – indagou a Lewis, parando à nossa frente.

— Estou esperando alguma coisa acontecer e reclamando sobre como nunca terei um pedido de casamento como esse. – respondi, olhando em volta, sentindo a falta de alguém – O Diego não veio hoje? – franzi o cenho.

— Não, ele disse que estava se sentindo indisposto, e achava que era o começo de alguma gripe, virose ou algo do tipo. – afirmou a loira, fazendo cara de dúvida.

— Como ele está? – questionou Cooper, aparentemente preocupada.

— Sobrevivendo. Às vezes eu fico realmente preocupada, sabe? Tem dias que ele parece bem, mas outros ele parece no fundo do poço. Eu não sei o que fazer. – suspirou.

— Dê a ele o tempo que precisar. Creio que o apoio que você está dando já é o suficiente. – aconselhei, baseada em minha experiência.

— Eu sei... Só é preocupante. – assentiu, com um olhar distante.

—-

Algumas horas depois, o céu começou a fechar, e tudo foi ficando escuro, já dando um clima um pouco aterrorizante do que viria por aí. O hospital todo trabalhava nos preparativos para receber os casos.

— As coisas estão ficando estranhas. – afirmou Rebecca, observando o lado de fora pela janela.

— Nem me fale. – ergui as sobrancelhas, também olhando para o céu – Começou a chover... Deveríamos ir para a Emergência, os casos já já vão começar a chegar.

— Claro. – a morena concordou.

Seguimos para a Emergência, onde alguns cirurgiões se inscreviam na lousa para disponibilidade, e outros carregavam coisas como cobertores, remédios e equipamentos. Nós duas escrevemos nossos nomes, e ficamos observando o movimento.

— Está engrossando... – Cooper falou, assistindo ao lado de fora no mesmo lugar em que nos encontrávamos mais cedo, durante o pedido de casamento de Matthew.

De repente, a energia elétrica caiu, voltando a funcionar poucos segundos depois, e deixando todos tensos.

— Os geradores têm que funcionar. – eu disse seriamente, me desesperando só de imaginar aquele hospital sem energia elétrica.

Alguns instantes a seguir, a eletricidade acabou novamente, ficando por um período mais prolongado antes de voltar. Quando abri minha boca para dizer alguma coisa, vi uma lanterna se aproximando em meio à chuva, e só reconheci o veículo quando ele já estava parado à minha frente.

— Eu preciso de ajuda aqui! – exclamou Anastasia, depois de abrir a porta do carro.

— Oh meu Deus... – murmurei, antes de correr até ela, preocupada – O que aconteceu?!

— Diego... Ele teve uma overdose. – respondeu com a voz trêmula, deixando-me sem ar por um instante. Em um piscar de olhos, abri a porta do carona e analisei a figura pálida do jovem, o que foi como uma facada em meu peito.

— Alguém ajuda aqui! – berrei, e como impulso tentei encontrar os batimentos – Ele está vivo, mas os batimentos estão muito fracos. Precisamos correr.

Uma equipe aproximou-se com uma maca, e eu ajudei-os a colocá-lo sobre ela. Corremos para dentro do hospital, todos encharcados pela chuva que havíamos tomado, e o posicionamos em um canto.

— Anastasia, o que exatamente aconteceu? – questionou Rebecca, enquanto fazíamos os primeiros procedimentos.

— Eu não sei... – negou com a cabeça, tendo o rosto molhado numa mistura de água da chuva e lágrimas – Eu estava preocupada com a saúde dele, então decidi dar uma passada em casa para ver se ele precisava de alguma coisa, e quando cheguei o encontrei desse jeito. – caiu num choro mais profundo, provavelmente relembrando a cena – Eu deveria ter desconfiado...

— Hey, agora não é hora para arrependimentos. – Cooper rebateu, segurando os ombros da loira – Você sabe o que ele usou?

— Eu encontrei frascos de morfina. Acho que ele pegou daqui do hospital. E uma garrafa vazia de uísque. – afirmou, recompondo-se um pouco.

De repente, notei uma mudança na cor do paciente, que começou a ficar arroxeado. Posicionei meu dedo sob seu nariz para checar sua respiração, e não senti nenhum ar.

— Ele parou de respirar! Temos que intubá-lo! – alertei, e as enfermeiras já se apressaram para pegar o material de intubação. Rebecca auxiliou-me, e juntas terminamos o serviço em pouquíssimo tempo – Paciente estável. – falei, após olhar as máquinas. Peguei uma lanterna e abri suas pálpebras – Pupilas contraídas. Apliquem 0,5mg de naloxona e vamos observar. – ordenei, tentando ao máximo me manter controlada. Dois minutos se passaram e ele não demonstrou nenhuma melhora, então deveríamos aumentar a dose – Mais 0,04mg. Vamos lá, vamos lá. – murmurei a segunda frase, torcendo com todas as forças para ele reagir. Alguns segundos depois a respiração do jovem voltou ao normal, e ele começou a lutar contra o tubo – Isso! – comemorei e retiramos o tubo – Vamos fazer uma descontaminação intestinal com carvão ativado e interna-lo na UTI, e quero supervisão constante nele! Pode ser que os sintomas voltem. – virei-me para a equipe e mandei, respirando fundo – Ele ficará bem. – encarei Anastasia, que agora estava com o choro mais controlado – E não se esqueçam de mantê-lo bastante aquecido.

— Meu Deus Claire, muito obrigada! – a loira abraçou-me, parecendo aliviada.

— Eu tive ajuda. – sorri fraco para Rebecca – Agora nós vamos ter que colocá-lo na ala psiquiátrica quando ele melhorar, e ficar bastante de olho nele. Se ele tentou se matar, quer dizer que ele não está dando conta. Ele precisa de mais ajuda do que podemos oferecer.

— Eu deveria ter sido mais cuidadosa... – Lewis voltou a chorar, demonstrando culpa na voz.

— Isso não foi sua culpa, você fez absolutamente tudo o que pôde. – Cooper segurou seus ombros novamente e disse seriamente – Se você não tivesse se preocupado em leva-lo para morar com você, em ir checar como ele estava hoje, ele já poderia estar morto há dias. Então considere-se uma heroína.

Foi quando minha ficha caiu. Se alguém tinha qualquer pingo de culpa ali, essa pessoa era eu. Afinal, se o namorado dele não tivesse morrido em minhas mãos, ele não iria sentir vontade de se matar. Pelo menos, não por aquele motivo.

— O que aconteceu aqui? – Hunt aproximou-se e analisou a cena.

— Diego tentou suicídio usando morfina e Anastasia encontrou-o. Mas Claire conseguiu estabilizá-lo. Ele foi levado para uma desintoxicação com carvão ativado e depois será levado para a UTI. – explicou a morena.

— Você acha que ele está bem o suficiente para ser transportado? – indagou o traumatologista, virando-se para mim.

— Creio que sim, por quê? – respondi e franzi o cenho.

— Estamos levando todos os casos menos urgentes para o Seattle Press. Assim que terminarem a descontaminação, ordene que os preparem para a transferência. Você pode ir junto, já que é a responsável pelo caso. – afirmou e eu assenti – Dra. Lewis, você acha que está em condições de trabalhar? – voltou-se para a residente, que ainda parecia um pouco abalada.

— Eu posso ajudar com alguma coisa que não seja tão pesada. – ofereceu-se, provavelmente sabendo que a situação ali no hospital ficaria muito caótica em pouco tempo.

— Perfeito. Vocês duas, procurem o que fazer, ajuda está sendo necessária em todo lugar. Claire, acompanhe Diego. Bom trabalho. – ordenou e sorriu fraco para mim, e eu retribuí o gesto agradecida.

— Vejo vocês depois então, meninas. Eu as manterei informadas. – acenei e parti à procura da equipe que estava com meu paciente.

—-

Depois de um pouco de dificuldade para chegar no outro hospital, finalmente Diego já estava instalado na UTI, enquanto eu descansava um pouco em um canto deserto do lado de fora do prédio.

Caminhava de um lado para o outro, respirando fundo, enquanto tinha o que parecia ser uma crise de ansiedade. Eu reprimira todos os meus sentimentos quanto àquele caso até aquele momento, no entanto, finalmente eles me atingiram como um soco. Diego tentara se matar! Meu amigo Diego, cujo namorado morrera na minha mesa de cirurgia havia dois meses. O mesmo Diego que cuidou dos meus filhos enquanto estive em coma, que perdeu um paciente pela primeira vez enquanto trabalhava comigo. O melhor amigo de Anastasia. E tudo porque eu não consegui manter seu namorado vivo. Eu não podia evitar mas me sentir extremamente culpada pela morte de Mariano e pela quase morte de seu companheiro. Sentei-me numa mureta e foquei num ponto no chão, para tentar pôr meus pensamentos em ordem. Eu precisava me recompor, pois ele poderia acordar a qualquer momento, ou algo pior poderia acontecer, e eu seria necessária como médica. Aquela noite parecia um pesadelo, mas eu tinha que entender que estava tudo sob controle. Ele estava vivo e a salvo por enquanto, e nós batalharíamos para conseguir fazê-lo melhorar para nunca mais pensar em algo do tipo.

Depois de alguns minutos, consegui me controlar, por fim. Com a cabeça mais fresca, lembrei-me que precisava entrar em contato com a família dele, e como não conhecia ninguém, tive que procurar em seu arquivo. O que encontrei foi apenas uma pessoa, seu avô materno, que, para piorar a situação, residia no Brasil. Será que ele falava inglês? Provavelmente não. Então precisava de um tradutor.

Parti em busca de alguém que falasse pelo menos o mínimo de português, até que achei uma enfermeira que disse ter vindo do Brasil. Arrastei-a comigo e pedi para fazer a ligação do telefone do hospital, depois de explicar exatamente o que ela tinha que dizer.

— Olá Sr., aqui é do Hospital Seattle Press, é com o... Andrelino Gomes que eu falo? – falou o nome com um pouco de dificuldade. Alguns segundos se passaram, e ela prosseguiu – Então, seu neto, Diego Gomes, teve uma overdose de morfina, mas os médicos conseguiram trata-lo e agora ele está estável. – explicou, e parou de falar por um tempo, provavelmente ouvindo o que ele dizia – Sim, foi. – suspirou, e eu franzi o cenho, tentando adivinhar o que estavam falando – Sr., fique tranquilo, ele está bem agora. Tem como vir para Seattle vê-lo? – fez um olhar atento e assentiu – Okay, nós esperaremos pelo Sr.. Eu sinto muito pelo ocorrido, e espero que tenha uma ótima viagem. – desligou o telefone e olhou-me – Ele virá o mais rápido possível, mas disse que provavelmente só conseguirá chegar daqui um dia ou mais.

— Está bem, melhor que nada. Será bom para o Diego ver um rosto da família para confortá-lo, e até ajuda-lo a passar por isso. – sorri tristemente – Obrigada pela ajuda.

A moça assentiu em agradecimento e tomou outro rumo, enquanto eu não sabia exatamente o que fazer. Foi quando uma outra enfermeira aproximou-se correndo de mim.

— Ele está acordado. Seu paciente Diego Gomes está acordado. – avisou, e eu abri um sorriso aliviado.

— Obrigada! – disse e parti apressadamente para o quarto do rapaz, ansiosa para vê-lo. Observei-o pela janela por alguns instantes, antes de entrar dando duas batidinhas na porta como se pedisse licença – Oi. – falei meio sem jeito, mantendo minha distância.

— Hey. – olhou-me com uma expressão indecifrável.

— Como está se sentindo? – perguntei, agora me aproximando dele. Peguei a lanterninha e chequei as pupilas, só por precaução, e tudo estava normal.

 — Não sei explicar. – negou com a cabeça. Sentei-me na poltrona ao lado de sua cama e encarei-o, sentindo as lágrimas chegando.

— Eu sinto muito. Muito, muito mesmo. – não contive o choro – Se não fosse por minha causa, Mariano não estaria morto e você não estaria... nessa situação.

— Claire, isso não é sua culpa. De nenhuma forma. – esticou o braço e segurou minha mão, fitando-me seriamente – Eu estava descontando minha raiva em você, porque não tinha mais em quem descontar. Porque eu não podia bater, xingar, matar o atirador. Mas eu fui injusto. A única pessoa que tem culpa disso é quem entrou naquela maldita boate, carregado com todo o preconceito nojento do mundo, e saiu atirando em pessoas inocentes que não estavam fazendo mal para ninguém. Quando vocês abriram o corpo dele, já não tinha mais o que ser feito. – afirmou, com firmeza nas palavras – Quanto a isso... – apontou para si mesmo – É menos sua culpa ainda. Eu tenho uma doença que corre no sangue, e você não tem nada a ver com isso. Minha mãe se suicidou. Você nem me conhecia na época. Então, pare de pensar que isso é por sua causa, porque nem tudo é sobre você, Claire. Merda acontece, e nem sempre você tem controle sobre isso. – apertou minha mão, encarando meus olhos – Apenas. Pare. – finalizou pausadamente.

Ele tinha razão. Aquilo não era sobre mim, não era minha culpa. Meredith e eu fizemos o possível por Mariano, mas por causa de um atirador, ele tinha partido. E eu não tinha nada a ver com a depressão de Diego e suas tendências suicidas. Nem poder dar apoio eu pude, já que ele não deixava eu me aproximar. Mais ainda, eu dera meu máximo para salvá-lo naquele dia, e com sucesso. Um pouco de perdão comigo mesma cairia bem.

— Obrigada, Diego. – sorri e sequei as lágrimas, recompondo-me. Ficamos em silêncio por alguns minutos, até que decidi pronunciar-me novamente – Você é médico. Você sabia várias maneiras certeiras de se matar. Por que fez isso? – perguntei, realmente confusa. Se ele quisesse mesmo se suicidar, ele poderia ter escolhido outros jeitos de fazê-lo, e aquilo estava me deixando intrigada.

— Você acredita em destino, Claire? – respondeu com outra pergunta, me deixando ainda mais confusa.

— Eu acredito. – assenti, um pouco reflexiva.

— Eu também, e como não podia tomar essa decisão sozinho, deixei para que ele decidisse. Se ninguém me encontrasse e eu morresse ali mesmo, era porque definitivamente minha hora havia chego... Mas se alguém me achasse e eu sobrevivesse, tudo bem, eu iria me levantar e seguir em frente. No entanto, eu realmente achei que a primeira opção ia acontecer, então não sei muito bem por onde recomeçar. – explicou e suspirou, chocando-me. Eu não sabia o que dizer, nem fazer, então fiquei em silêncio processando as informações por algum tempo.

— Eu estou feliz que o destino tenha escolhido a segunda opção. – falei finalmente, sorrindo tristemente, e ele me imitou – Você pode pedir umas férias, se divertir um pouco, ir viajar, esfriar a cabeça... Depois você volta para medicina, que é o que você realmente ama. Eu sei como é perder o sentido da vida, e às vezes você tem que simplesmente continuar vivendo... Deus, o Universo ou sei lá o que acaba colocando as coisas no lugar. – tentei aconselhá-lo, lembrando-me de minhas próprias experiências ruins, que eram muitas.

— É, talvez esse seja o jeito mesmo... – deu de ombros, fechou os olhos e respirou fundo – Obrigado, Claire. Você salvou minha vida, mesmo eu não querendo muito vive-la mais. Acho que graças a você, eu vou ter um recomeço. – agradeceu, e eu abri mais meu sorriso.

Detive-me a aproximar-me dele e abraça-lo fortemente. Mesmo que nunca fomos os mais íntimos, ele era um dos meus melhores amigos, e esteve me apoiando nos piores momentos. Nós éramos uma família, e eu não podia perder mais um membro da família, não tão cedo.

—-

Tive que passar a noite no hospital, pois a tempestade me impedira de ir para casa. Dormi em uma das camas das Salas de Descanso, e, na primeira oportunidade, quando a chuva diminuiu um pouco, pedi um táxi para casa. Peguei o celular e vi que tinham várias mensagens, tanto das meninas do hospital quanto de minha mãe e Ronan. Respondi todos menos o homem, dando notícias sobre Diego para as garotas e pedindo para minha mãe tomar conta dos gêmeos um pouco mais. Eu precisava de um tempo para realmente descansar e pôr a cabeça no lugar.

Ao descer do táxi, dei de cara com quem menos esperava e queria ver: Ronan. Ele segurava um buquê de flores e alguns sacos de papelão, provavelmente com comida neles.

— Eu sabia que estava chegando. – afirmou, com um sorriso leve no rosto.

— Quem te disse? – questionei, tentando parecer indiferente.

— Segredo. – deu um de seus sorrisos irônicos – Vamos entrar, eu trouxe café da manhã. – ergueu um pouco as sacolas, tentando chamar a atenção.

— Ronan, eu não sei... – neguei com a cabeça, um pouco insegura.

— Nós precisamos ter uma conversa decente, sem estarmos estressados ou por celular. Por favor. – disse seriamente, e eu suspirei, cedendo.

— Okay. – passei por ele e destranquei o portão da frente, deixando-o entrar. Subimos para meu apartamento, e enquanto eu tomei um banho rápido, ele organizou a mesa.

— Espero que goste. – falou enquanto eu me servia de um pedaço da torta doce que ele trouxera. Soltei um gemido de satisfação, finalmente tocando-me que não comia havia horas. O homem soltou uma risada fraca, deixando-me constrangida.

— Desculpa, é que eu estou com muita fome. – tapei a boca para falar enquanto mastigava.

Aye, percebe-se. – riu-se, e ficamos em silêncio por alguns minutos – Olha, Claire, eu sinto muito...

— Sente muito por ter uma arma ou por eu tê-la encontrado? – encarei-o acusadoramente.

— Pelos dois. – respirou fundo – Eu não achava uma falta tão grave, até olhar pela sua perspectiva. E eu me coloquei no seu lugar, e pensando bem, você tem razão por estar tão zangada. Você tem um histórico muito triste com armas, e eu sinto muito pelo o que você teve que passar por causa de pessoas que pensam igual eu pensava. – olhou no fundo dos meus olhos enquanto falava, o que me deixou um tanto comovida – Por isso eu me livrei da arma. Eu fui um idiota de não ter pensado por esse lado quando comprei-a. Por favor...

— Eu preciso pensar... – neguei levemente com a cabeça. Eu queria muito voltar a namorá-lo, mas eu não sabia se podia confiar nele de novo – Não sei se confio mais em você. – ergui os ombros.

— Mas a confiança pode ser reconstruída com o tempo. Eu juro para você que nunca mais vou nem pensar em comprar uma arma, okay? – tocou meu braço com sua mão, e eu logo senti um leve choque – Não estou falando que devemos morar juntos de novo, afinal foi realmente um passo muito largo. Só que deveríamos nos conhecermos melhor, namorar bastante, curtir esse momento que demorou tanto para chegar. O que você acha?

Fiquei vidrada em sua íris azul por alguns instantes, ainda refletindo sobre aquilo. Talvez ele estivesse certo. Talvez fosse válida a tentativa. Afinal, era tudo o que eu queria há alguns meses, certo? Não podia desperdiçar minhas chances de ser feliz ao lado de quem amava.

Não falei nada, apenas puxei-o pelo casaco e uni nossos lábios, matando a saudade que estava daquele beijo que me levava aos céus.

— Nunca mais se atreva a me decepcionar desse jeito. – sussurrei e voltei a beijá-lo.

— Estamos bem, então? – indagou, sem tirar sua boca da minha.

— Estamos bem. E vivendo em casas separadas. – respondi, continuando o beijo.

—-

 Era manhã do dia seguinte, e eu finalmente recebera a notícia de que o avô de Diego estava chegando na cidade, então fui busca-lo no aeroporto junto com Anastasia e Rebecca e fomos direto para o hospital.

Adentramos o quarto em que ele estava ficando na ala psiquiátrica, e o rapaz abriu um largo sorriso ao ver seu avô.

— Diego! Meu Deus, eu fiquei tão preocupado! – exclamou o idoso, correndo para abraçar seu neto.

— Eu sei vô, me desculpa... – meu amigo começou a chorar, provavelmente se sentindo culpado.

— Já não bastava sua mãe, eu não podia perder você para essa maldita doença... – acariciou a cabeça do mais novo, sentido – Foi por causa da morte do seu namorado, não foi?

— Principalmente. Quando eu pensei ter encontrado a pessoa com quem passaria o resto da vida, essa pessoa morreu. Não tenho mais forças, vovô...

— Sei como é difícil meu filho, eu sei bem... Mas não pode se entregar assim, okay? Eu vou te ajudar a melhorar... Você não está sozinho. Tem a mim e a todos os seus amigos. – olhou para nós três, que assistíamos a tudo caladas.

— Eu quero ir pra casa. No Brasil. Eu quero ir embora. – afirmou, fazendo-nos franzirmos o cenho e nos entreolharmos.

— Como assim, ir embora? Você tem uma vida aqui. – o velho soltou-o um pouco e fitou-o com uma expressão confusa.

— Eu não quero mais essa vida. Preciso recomeçar. – negou com a cabeça, ainda com o rosto banhado de lágrimas – Aquele hospital sempre será o hospital em que Mariano morreu, e eu não aguento mais. Tudo nessa maldita cidade me lembra ele. Eu preciso recomeçar em outro lugar, mas não posso fazer isso sozinho, então quero ir embora para o Brasil com o senhor. – explicou, fazendo meu coração apertar. Eu entendia bem como ele se sentia, e eu mesma já pensara em sumir de Seattle. Contudo, para mim foi bom ficar, só que talvez não fosse o mesmo para ele...

— Entendo. – assentiu, suspirando – Se é o que você quer, nós voltamos para São Paulo.

— Espera, então você vai desistir. Simples assim? – questionou Rebecca, parecendo inconformada.

— Eu não vou desistir, eu vou continuar a residência em São Paulo. Só preciso de novos ares, e terá que ser a quilômetros daqui. – finalmente virou-se para nós – Olha, eu sinto muito, garotas... Eu sei que era para sermos nós quatro contra o mundo, ainda mais depois que o Akira... – fez uma pausa, com uma cara triste – Enfim, mas eu realmente preciso. Desculpem-me mesmo... – desviou o olhar para Anastasia, que parecia ainda um pouco em choque – Principalmente você, Ana.

— Faça o que precisa fazer. – sorriu tristemente – Mas nunca se esqueça de mim. Não importa o quão longe estivermos, saiba que eu vou te amar para sempre. – deixou algumas lágrimas escaparem, e correu para os braços do rapaz quando ele chamou-a num gesto com a mão.

A esse ponto, eu já também não conseguia mais conter o choro, mesmo tentando ser discreta. Os dois residentes ficaram abraçados por alguns minutos, ambos chorando alto. Até que o jovem abriu os olhos e acenou com a cabeça para nos aproximarmos, e Rebecca e eu juntamo-nos a eles, formando um abraço coletivo regado a lágrimas.

— Obrigado por tudo, gente... Eu vou sentir a falta de vocês.

Uma vez, alguém me disse que tudo tinha solução, menos a morte. A morte é a única coisa que realmente não tem volta – a não ser quando reanimamos um paciente, mas nesse caso ele não está completamente morto. Mas note que a morte é um problema sem solução, não uma solução. Muitas vezes, para muitas pessoas, a vida parece não ter mais como ser vivida. Tudo virou uma bola de neve e não há conserto. E é por isso que elas decidem tirar suas próprias vidas, não por vontade de morrer, mas por falta de vontade de viver. A vida pode ficar realmente difícil às vezes. Mas, como eu disse, tudo tem solução, menos a morte. Os problemas têm solução, todos eles, e a vida vale sim a pena ser vivida. Nem sempre será um mar de rosas, mas a beleza está em cada pequeno momento feliz que nos mostra que há motivos para viver. Nunca se sabe o que se passa com uma pessoa, e cada um sabe a cruz que carrega. No entanto, acredite, tem como sorrir de novo, tem como ser feliz de novo. Tudo pode ser resolvido – mesmo nem sempre sendo fácil –, menos a morte. A morte não é uma solução, ela é o fim sem volta. A vida pode ser boa, e não se esqueça: você não está sozinho. Sempre haverá outra opção além de tirar a vida, então exclua essa alternativa. Fale sobre seus problemas, peça ajuda. Você é e será amado. Você é especial.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não me matemm, eu sei que o Diego é um personagem adorado, mas faz parte do enredo que planejei para a história. Lembrando que aqui não temos o problema do ator tretar com a Shonda e não voltar mais, então ainda há chances rs
O mais importante desse capítulo é a narração inicial e final. Eu sei como é sentir como se não houvesse mais saída, e pensar que morrer talvez seja a melhor solução. Mas não é, e devemos estar sempre cientes disso! Desabafe, procure ajuda, e não se culpe e se machuque. Há muitas pessoas dispostas a ajudar, além das que são especializadas e são o recomendado. Vai dar tudo certo!
Caso esteja passando por um problema e não queira procurar pessoas próximas (apesar de que é bom!), o CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone (Número: 188, ligação gratuita), email, chat e voip 24 horas todos os dias. Acesse www.cvv.org.br para chat, Skype, e-mail e mais informações sobre ligação gratuita.
Espero que minha fanfic ajude de alguma forma, e que tenham gostado do capítulo. Se vocês ainda leem minha história, deixem um comentário aí por favor, faz toda a diferença pra mim.
Beijos e até o próximo!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Claire's Anatomy" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.