Os olhos vazios sugavam sua alma, enquanto um arrepio se espalhava pela sua pele. Nunca vira olhos tão vazios quanto os de Sweeney Todd. Eles eram negros e profundos. Sem vida, ousava dizer. Aqueles olhos encaravam Anthony, sem expressão, e o jovem sentia os joelhos tremerem sem saber por qual motivo.

"Por que está indo para Londres, senhor?" Havia perguntado momentos antes, o que lhe rendeu a atenção daqueles olhos.

—Estou indo buscar por algo que perdi – respondeu num fio de voz. – Posso isso graças a você.

Anthony engoliu em seco ante o agradecimento singelo. Estavam naquele navio há dias e já havia notado o quanto Todd tinha efeito sobre si. Talvez fosse por ser mais velho, ou fosse a sua personalidade sombria, ou aqueles olhos...

O jovem sabia, em algum lugar dentro de si, que havia algo de errado com aquele homem. Seus olhos vazios pareciam gritar por ajuda, como se a sua alma houvesse sido destroçada há anos. Ele parecia já estar morto.

Talvez fosse por sua necessidade de preencher o vazio nos olhos de Todd que o mais novo houvesse se esticado um pouco em direção aos lábios do homem a sua frente.

O convés estava vazio. Era tarde da noite e os homens dormiam em cantos espalhados e em redes pelo navio. Só estavam os dois ali.

Não fora a primeira vez que encostara nos lábios de um homem. Era jovem e era também um marinheiro. Só Deus sabia o que a solidão do mar podia fazer. Mas os lábios de Todd eram diferentes, eram frios demais contra os seus.

Se afastou do outro sem fitá-lo nos olhos, murmurando um pedido de desculpas mesmo que não houvesse se arrependido. Esperou qualquer reação do outro, qualquer coisa menos a pele fria de seus dedos contra seu pescoço. Sentiu o aperto em sua garganta e pensou que fosse ser estrangulado.

Mas não foi.

Todd o beijou de maneira torta, os lábios gelados engolindo o que podia da boca do outro. Anthony só pode se agarrar aos ombros alheios, enquanto tentava acompanhar aquele beijo quase cruel. A língua de Todd fez caminho até a sua e seu ventre se contorceu com o contato úmido. Mesmo sua língua era fria.

O navio balançava levemente contra as ondas suaves, os quadris de Anthony imitando o movimento contra os de Todd. Um suspiro escapou de sua boca e morreu na maresia salgada que os envolvia. O aperto exagerado em sua garganta fazia ser difícil respirar e o jovem tossiu quando se separaram do contato de seus corpos.

Buscou os olhos alheios, esperando ver alguma mudança, mas não havia nada. Os olhos fundos cercados por olheiras escuras o fitaram como antes. Nem a luz da lua parecia refletir nas orbes de Todd.

—Estaremos em Londres amanhã, não é? – questionou o homem, desviando seu olhar para o mar negro.

—Sim – respondeu Anthony, o observando.

E então, os olhos de Todd finalmente mudaram, como a maré. Eles se encheram de uma frieza hostil. Ódio, pensou o garoto.

O que quer que fosse, algo havia acontecido em Londres que mudara aquele homem.

"Ainda vamos nos ver?" Todd questionara quando desembarcaram nas docas de Londres.

—Você pode me encontrar se quiser.

Fora a resposta do homem.

Agora sabia dos fantasmas que o perseguiam naquelas ruas escuras. Sabia de tudo e ainda assim, só muito depois percebera que nunca poderia ter preenchido aqueles olhos, que os olhos de Sweeney Todd nunca foram vazios. Eles sempre foram cheios de ódio e tristeza.