Another Way to Die escrita por Claire Smith


Capítulo 6
Capítulo 6




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John Watson

— Vamos lá, Rosie! Ajude o papai a acertar dessa vez, ok?

Mary ria encostada no batente da porta. Ela estava supervisionando de uma maneira bem incisiva, e se eu errasse a maneira de colocar a fralda mais uma vez, a culpa seria totalmente dela por me distrair.

Rosie não parecia se importar com a situação e dificultava com prazer o meu trabalho. Remexia-se todas as vezes que eu achava ter ajustado um lado, engatinhava pela cama quando eu desfazia uma parte para cuidar de outra, e ria tanto quanto a mãe para mim, como se ficasse feliz por ter um pai tão bobão.

Ok, talvez Mary não fosse a única distração.

— Está fazendo isso super certo, John – Mary disse enquanto tentava abafar o riso. – Não está demorando nada também.

Rosie bateu palmas na cama concordando com a mãe.

— Nessa idade e já se une com a mãe contra a mim – falei em tom de ofensa, achando graça daquelas mãozinhas pequenas que já queriam dominar o mundo.

A campainha tocou. Não estávamos esperando ninguém.

Mary saiu do quarto para atender e pude ouvir os cumprimentos do nosso recém-chegado, mesmo que não tenha conseguido reconhecer sua voz pela distância.

Finalmente – já era hora - consegui colocar a fralda em Rosamund. Ela pareceu ficar feliz por eu já ter terminado, pois sorriu lindamente sem os dentinhos e, quando a peguei no colo, pôs a mão em meu rosto e acariciou levemente. Uma recompensa pelo trabalho feito.

— Obrigado, querida – murmurei. – Agora vamos ver quem chegou.

Na sala, encontrei Mary servindo um copo de uísque a Lestrade que apenas bebericava por educação, ainda devia estar em serviço.

— Não esperava vê-lo aqui, Greg – falei. – Algum problema?

— Na verdade, não. Estava de passagem pelo bairro e pensei que poderia vir aqui, ver a pequena Rosie, conversar com Mary e você, tomar uma bebida – e gesticulou com a mão que segurava o líquido, bebendo o conteúdo de uma vez como para afundar algo que quisesse dizer.

Depois daquela tarde incômoda, tudo o que queria era vir para casa e olhar minhas garotas. Sentir que estava bem e vivo ao lado delas. Em segurança. Ver Greg ali talvez não significasse algo ruim, ele poderia estar apenas de passagem como mesmo disse, mas já o conhecia por tempo suficiente para saber quando ele precisava de ajuda.

— Já falou com o Sherlock? – perguntei, sentando-me ao lado de Mary no sofá, de frente para a poltrona em que Lestrade se encontrava.

— Não consegui falar com ele depois de hoje mais cedo – respondeu. – Espero que não tenha esquecido esse caso em particular.

— Esquecer? – Mary perguntou. – Aposto que ele está investigando algo agora mesmo. Não é da natureza dele ficar simplesmente parado enquanto outros têm toda a atenção.

— Eu também penso assim, só que agora Moriarty está no meio. Ninguém previu isso, e não dá para perder aquele sabe-tudo porque o grande vilão voltou – Greg respondeu, dava para ver que estava incomodado com a situação.

Bom, como não ficar incomodado ou irritado com um caso de um serial killer fanático por Shakespeare e de um vilão que devia estar morto?

— Acho que posso dizer pelo cabeça dura do Sherlock que ele está cuidando do caso, mesmo que eu não tenha tido notícias dele também, mas ainda não deu tempo para ele fazer alguma burrada, acho – falei, sem estar totalmente convencido pelo que dizia. - Ele já deve ter levado Molly ao apartamento dela.

— Sherlock servindo como segurança? – Mary perguntou, com um traço do humor de instantes atrás voltando à sua voz.

— Queria estar presente para ver isso – Lestrade riu ao imaginar a cena.

Também não podia negar que a situação não era das mais normais, aquilo era bem incomum, entretanto Sherlock às vezes tinha um senso de proteção que ia do compreensível ao irritantemente desnecessário.

Imaginar Molly na Baker Street, tentando não morrer de tédio com os monólogos do meu amigo era uma tarefa difícil para mim. Esperava que a legista ainda não tivesse matado ele.

Aquilo era engraçado.

— Bom – pigarreei, eu já estava achando a ideia dos dois num apartamento engraçada demais para ser verdade – então não há motivo para me preocupar com sua visita, Greg?

Ele suspirou, decidindo contar logo a história completa de maneira direta.

— Um dos possíveis alvos está temporariamente sem dar notícias há dois dias.

Fiquei surpreso demais com a informação. No meu colo, Rosie pareceu sentir minha apreensão; Mary esticou o braço e a pegou num abraço protetor. Minha esposa sabia, melhor do que eu, como reagir àquela notícia.

— Como assim? – quis saber.

Lestrade sentou-se mais para frente da poltrona, passou a mão pelos cabelos e falou:

— Nós fomos atrás dos depoimentos dos parentes das vítimas, você falou com alguns, Sherlock e eu falamos com todos que aceitaram nos receber – começou. – A maioria não tinha qualquer tipo de informação a acrescentar à investigação, nada que os fizesse especiais a não ser as tristes histórias de perda. A Sra. Smith foi a última que ouvimos, ela relatou como foi perder o filho, o luto, e como ficou feliz em saber que o assassino estava morto; ela preferia que tivessem matado ele, para que a surpresa o atingisse antes da morte, e não que o desgraçado optasse pelo caminho mais fácil, como bem frisou ao nos contar.

— Espero que a história não termine aí. – Mary disse com impaciência, após o curto silêncio do inspetor.

— Ela nos contou muitas coisas, – Lestrade recomeçou - a maioria desnecessária. Por fim nos apresentou sua filha, Lauren, e a encheu de elogios até a hora em que saímos. – Greg olhou de mim para Mary antes de dizer o que tanto queríamos saber. – Ela sumiu há dois dias. A Sra. Smith me ligou quando a filha não chegou depois da faculdade, mas eu a acalmei. “Ela é jovem” eu disse, “deve estar com os amigos no campus”. Pedi para retornar a ligação caso ela não aparecesse, porque eu acreditei que não tinha nenhuma correlação com o Estrangulador. Eu quis acreditar nisso – suspirou. – Ainda a pouco ela retornou a ligação que não esperava, e contou que a filha não costumava sair sem avisar, que aquilo não era do feitio dela. Nesse momento, concluí ser um erro não ter dado a atenção necessária no início, agora já pode estar morta – disse.

A expressão de Greg Lestrade era a de um homem culpado, mesmo que esse sentimento não devesse ser seu.

— O que fazemos então? – perguntei. – Saímos atrás dela?

— É claro – Mary falou antes do inspetor. – Façam buscas, espalhem fotos da garota, todo tempo é precioso – ela afagou nossa filha que já dormia entre seus braços. – E ligue para o Sherlock. Agora! – intimou.

O detetive pegou o telefone para ligar, mais uma vez, sem obter sucesso; eu fiz o mesmo, ligando para alguém diferente.

— Olá, Sra. Hudson – cumprimentei indo direto ao ponto. – Sherlock está ai?

— Ah, John, até parece que não o conhece – pude ouvir que sorriu ao dizer isso. – Sherlock saiu há algum tempo, parecia inquieto e em êxtase, mas ele sempre fica assim quanto tem um caso novo – ela ponderou -, claro que hoje havia um leve perfume no ar, um aprumo maior que o normal. Mesmo assim não vi nenhuma diferença nele, se é isso que pergunta. Ele saiu para acompanhar Molly, voltou com um olhar irritado e saiu novamente como que ansioso. Não dá para saber o que se passa na mente dele! – terminou.

Agradeci a ela e me despedi, não era hora de jogar conversa fora com minha antiga senhoria.

— Ele saiu – disse -, e está à procura de algo. A Sra. Hudson disse que parecia um pouco diferente.

— E nós não fazemos ideia do objetivo da busca – Lestrade falou.

Concordei.

— Então não vou tomar mais o tempo de vocês – ele se levantou. – Obrigado por me receberem, vou avisar aos policiais do desaparecimento de Lauren Smith. Se surgir uma novidade aviso.

— John vai atrás do Sherlock amanhã, Greg, não se preocupe – Mary disse antes de o inspetor sair.

Fechei a porta.

— Vou?

— Sim – ela respondeu – temos que evitar outra morte, se possível – e foi colocar Rosie no berço.

Fiquei sozinho com meus pensamentos, imaginando onde meu amigo estaria e o que fazia de tão importante. Depois de uns instantes, apaguei as luzes da sala, deixando o cômodo sombrio e sem saída como minha mente.

 

Sherlock Holmes

O carro se aproximou do prostíbulo frequentado pela alta londrina menos vistoso que já vi.

— Tem certeza que ela não vai reconhecê-lo? – perguntei.

Bill Wiggins alisou a lapela do terno que usava. Preto, aveludado. Caro. De forma alguma lembrava o usuário de drogas convencional que era.

— Sem chances – respondeu sem conseguir esconder um risinho debochado. – O segurança estava na porta e não deu a mínima pra mim; ser um ex-drogado tem suas vantagens. Mas aquela deusa oriental – suas pupilas dilataram ao lembrar-se da mulher – não vai se importar de não ter dado atenção àquele traste – disse referindo-se a si mesmo. – Ela vai ficar encantada comigo num instante – e claramente ele queria dizer outra coisa.

Observei-o pelo retrovisor. Sua expectativa estava alta demais. Poderia ser um problema.

— Seu objetivo aqui não é esse – relembrei. – Estou colocando você nesse caso, preciso que faça sua parte.

Ele pensou um pouco.

— Está colocando seu melhor homem no caso?

— Não diria se tratar do melhor

— Até porque, esse seria John Watson – disse.

Ri alto antes de responder.

— Não – respondi em tom baixo. – Se formos falar de alguém ser melhor qualificado para a situação, esse alguém sou eu – disse sem uma sombra de modéstia. – E estou no caso – acrescentei.

— Eu tenho um chofer muito convencido – disse enquanto ria. Parou e falou com uma voz um tanto grave. Rara. – Ponha o quepe.

Olhei-o novamente pelo retrovisor. Peguei o quepe no banco ao lado e o coloquei na cabeça.

— O sucesso já tomou conta do seu pouco cérebro, Alexander Waters? – perguntei entredentes.

Billy nada disse.

Estacionei em frente a uma porta simples, sem qualquer adorno. Por fora aquilo poderia ser digno do pior local para se ter um negócio sexual, mas por dentro, o luxo deveria fazer jus a pouca fama do local e encantar os frequentadores mais fervorosos e antipáticos.

Saí do carro e abri a porta do passageiro para o empresário do ramo de chocolates sair.

— Lembre-se de falar em alemão algumas vezes – informei -, confunda o máximo que puder. Divirta-se! – Então me lembrei da mulher oriental na entrada. – Mas tente não se divertir muito – recomendei.

Ele murmurou qualquer coisa, totalmente concentrado no personagem criado. Antes mesmo que eu desse partida no veículo, já haviam aberto a porta e recebido seu mais novo, promissor e mentiroso cliente.

Era hora da segunda parte da noite.

— Ora, ora. Parece que temos um Sherlock Holmes aqui – uma voz feminina comentou ao me aproximar.

Algumas pessoas saíram de entradas mal vistas naquela rua pouco movimentada. Todos integrantes da minha rede de informações.

— Pode me fazer um favor, querida?

Ela se aproximou, permitindo que a parca iluminação alcançasse seu pequeno rosto moreno.

— Tudo o que quiser por um preço, Shezzy – e riu em reação a minha expressão. – Ah, por favor, já faz eras que não chamo você de cantor de rap.

— Seria preferível não espalhar o nome, Jess – entreguei a ela a sacola com mantimentos que trouxera. Alguns dos mendigos me deram tapinhas nas costas ao ouvirem meu nome-disfarce.

Jess deu uma rápida espiada no interior da sacola.

— Pagamento – ela disse.

— Isso é o pagamento.

— Você entendeu o que quis dizer.

— Informações primeiro – repliquei.

Vi que ponderou um instante antes de entregar a sacola a um mendigo e resolver falar.

— Aos negócios – disse, esfregando as mãos enluvadas para afastar o frio. – Seus marcadores não apresentaram qualquer mudança, exceto Lauren Smith que se encontra desaparecida. Bob foi o responsável por segui-la até o campus e relata não ter visto a garota sair. Sabemos que a mãe dela já informou a Scotland Yard, e vimos seu amigo policial na casa dos Watson no final da noite passada.

— Como vocês não a vigiaram direito?

— Ei, não podemos entrar no campus da faculdade, esqueceu? Como íamos adivinhar que a garota ia desaparecer no ar? – Jess fez um floreio com as mãos e murmurou um puff.

Quase duas semanas sem agir e finalmente o estrangulador havia encontrado sua nova vítima.

— Você acha que ele já a matou?

— Provavelmente não, ele vai querer encenar antes.

Ela me encarou.

— Encenar?

— Sim, sim – respondi exasperado. Onde será que ele esconderia sua vítima? – Ele vai armar seu show. Para se exibir. Ele gosta disso.

Senti o celular vibrar no bolso do casaco, com uma curta mensagem de Bill Wiggins.

 

Fogo.

 

O quê?

 

Uma nova mensagem:

 

Incêndio. Fumaça. Agora.

 

— Algum problema? – Jess perguntou antes de checar seu próprio celular. – Sério, um incêndio? As ambulâncias já estão próximas ao local, a polícia está a caminho.

— Tenho que ir – disse a ela.

Corri em direção ao carro. Apenas três quadras e chegaria lá.

— Onde está o pagamento, Shezzy?

— Na sacola – gritei ao sair cantando pneus.

...

Quando Billy disse que havia um incêndio, imaginei um cenário ao pé da letra. Corpos espalhados, rostos desfigurados e uma multidão acompanhando o resgate. Mas ao chegar, vi que o prédio parecia bem seguro após uma rápida inspeção, apenas algumas partes da fachada estavam chamuscadas, nada que sugerissem chamas em grande escala.

— O que aconteceu, Billy? – quis saber assim que o encontrei.

Ele estava recostado numa ambulância, a face suja de fuligem.

— Estou bem, obrigado por perguntar.

— Ele respirou fumaça demais ao tentar tirar uma garota – Mary respondeu para mim ao sair do prédio, dando-me um breve sorriso. – Pensamos que estivesse lá dentro, levamos um susto.

— O que quer dizer com susto? O que faz aqui?

— Trabalhando. Será que não posso me divertir?

Wiggins bufou.

— Não foi nada divertido.

Ignorei-o.

— Está aqui a pedido de Mycroft?

Ela assentiu.

O governo britânico não poderia esperar por algumas informações, tão previsível.

— Conte-me o que aconteceu, Bill.

— Não parece surpreso – Mary interrompeu.

— Não estou – afirmei. – Se meu irmão a chamou deve ter um bom motivo, além de confiar em seu currículo. Você é ótima no que faz.

— Oh – murmurou surpresa. – Devia ter gravado isso – sorriu e apontou Bill. – Diga a ele. E por favor, pule os detalhes entre você e Naomi.

— Então esse é o nome dela?

Ele assentiu sonhador.

— Após um tempo conversando – pigarreou – com ela, um segurança a chamou e aproveitei para procurar alguma pista. Acabei no bar sem achar nada e pedi uma bebida.

— O que mais?

— Ele ouviu alguns homens falarem sobre um contrabando a receber em Cardiff e na ajuda recebida de alguém importante – Mary explicou.

— Disseram quem é?

Wiggins negou.

— Falaram apenas se tratar de uma mulher.

Uma mulher. Ajudados por uma mulher. Mas quem?

— A carga – voltou a falar, chamando atenção para si – deve chegar em alguns dias, durante o casamento de George Herbert. Deram a entender que parte dos policiais fará a segurança do evento, assim onde quer que chegue esse contrabando, não vai haver ninguém para atrapalhar.

— George Herbert. Ele não é sobrinho de um…

— Membro do parlamento. Sim. E herdeiro da franquia de jóias – Mary acompanhava o raciocínio.

— Com quem ele vai casar? – Talvez o nome da família da noiva representasse uma ligação.

— Essa é a parte interessante, o casamento não traz qualquer retorno econômico aos Herbert. A noiva se chama Christine Hooper – Billy respondeu ansioso pela minha reação.

— Hooper? – Não era possível!

— Exatamente, Sherlock – Mary parecia ler pensamentos. – De alguma forma há uma conexão entre o casório e o contrabando, e se chama Molly Hooper. Quem quer que seja Moriarty, já está apontando um dos seus próximo alvos.

 


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