#Scarlett Anders

Acordei mais cedo do que deveria. Ruby estava deitada de lado ainda em sono profundo. Olhei o celular para ver as horas e vi que se passavam das 4:00hrs da manhã. Me espreguicei ainda deitada. Todo o sono havia se esvaído de dentro de mim e percebi que, mesmo se tentasse, não conseguiria mas dormir, então resolvi assistir televisão antes de precisar acordar a Ruby para nos arrumarmos para o segundo dia de aula.
A televisão estava ligada num canal que eu, até então, nunca tinha assistido, e estava passando o jornal. Peguei o controle em cima do criado-mudo e aumentei dois níveis no volume para que eu pudesse ouvir as notícias e ao mesmo tempo não acordar a Ruby.
O repórter começou a falar com ar preocupado e algumas imagens, vistas por cima, provavelmente filmadas de um helicóptero passavam atrás dele. As imagens mostravam pessoas vagando por uma cidade que não reconheci.
— As pessoas por todo país começaram a agir de forma estranha e violenta, mordendo umas as outras. Arrisco dizer que estejam comendo umas às outras. - Disse o repórter sublinhando as últimas 4 palavras.
Em algum ponto da filmagem pude ver algumas pessoas que, devido a altura, pareciam apenas pequenas formiguinhas, abaixadas diante de uma outra pessoa que estava deitada no chão. As pessoas abaixadas pareciam extremamente interessadas na outra. Me perguntei o que estavam fazendo.
— Cientistas e médicos começaram a suspeitar que trata-se de uma fórmula alterada do vírus da raiva que está fazendo com que as pessoas ajam como os cachorros infectados por tal vírus, ou seja, mordendo todos a sua frente. - Continuou o repórter.
Senti meu coração pulsar mais rápido, minha respiração estava ofegante. Aquilo não poderia estar acontecendo de verdade... Poderia? Pessoas mordendo umas às outras? Isso era coisa de filme.
" Não " - Pensei - "Estou apenas sonhando e quando acordar tudo vai estar normal."
Eu me belisquei na esperança de fazer tudo aquilo desaparecer, como um sonho mau. Mas nada mudou.
— E tenho de dizer a todos vocês que estão assistindo, o mundo que vocês conhecem está se esvaindo e as pessoas estão deixando de ser quem elas eram. Então - Ele suspirou - sinto informar a todos vocês que a única forma que vocês tem para conseguirem sobreviver, é matando todos esses monstros sem demonstrar piedade, por que, garanto a vocês, eles não terão piedade quando tentarem matá-los.
Com essas palavras, o repórter desapareceu e em seu lugar apareceu o logo do jornal brilhando na tela preta.
Eu me levantei sentindo minhas mãos tremerem, torcendo silenciosamente que aquilo se tratasse apenas de uma brincadeira de mal gosto. Mas... e todas aquelas imagens? Bom... Não dava para ver direito, não é?
Fui até a cozinha e me servi de um copo d'água, em seguida, fui até a janela ao lado da porta de entrada, abri a cortina e comecei a contemplar a rua lá fora através do vidro.
Havia um gato preto em cima do muro de uma casa do outro lado da rua, com os pelos eriçados.
O dia estava claro e fresco, pela forma como as ruas estavam vazias, qualquer pessoa, mesmo sem relógio, poderia dizer que acabara de amanhecer. Olhei mais adiante e só então percebi que as ruas não estavam tão desertas assim, logo em seguida, percebi por que o gato estava tão assustado daquela forma.
Do outro lado da rua estava uma garotinha, tão pequena que era quase imperceptível. Ela estava de costas, trajava uma camisola rosa na altura dos joelhos e seus pés estavam descalços, ela parecia ter acabado de acordar. Segurava um ursinho marrom pelo braço esquerdo, e aprimorando a visão percebi que estava cheio de sangue. Imediatamente fui tomada por uma onda de pavor.
— Não pode ser. - Murmurei.
A garotinha não demorou muito para perceber que eu a observava, e então, se virou lentamente e começou a caminhar em minha direção, com a cabeça baixa e o cabelo loiro cobrindo-lhe o rosto. Ela parou no meio do caminho e cambaleou um pouco. O que aconteceu em seguida foi extremamente rápido e sem sentido. Não faço ideia do porque da minha atitude, que nem eu mesma esperava, abri a janela imediatamente e esquecendo tudo o que havia acabado de ouvir e ver na televisão, gritei:
— Hey, você está bem?
A garota levantou a cabeça e me encarou por alguns segundos com a cabeça inclinada de uma forma estranha como se tivesse quebrado o pescoço. Um medo alucinante fervilhou dentro de mim quando a garota tomou impulso e veio correndo em minha direção. No impulso, fechei a janela com força e soltei um grito estrondante quando as mãos ensanguentadas do garoto - uma delas ainda segurando o urso - tocaram o vidro e lá se fixaram como se tivessem sido coladas. Dei 3 longos passos para trás e acabei caindo de bunda no chão, as duas mãos tampando a boca e de meus olhos grossas gotas de lágrimas quentes desciam e passeavam pelas maçãs de meu rosto. Então, tudo aquilo que o repórter dissera era verdade... O que ia acontecer agora? E o meus pais em São Francisco, será que já sabiam? 

Eu estava tão confusa.