Proibido para menores de 70 anos escrita por Gabi Wolf, Giovanna Wolf


Capítulo 20
O show de Filomena - parte 4


Notas iniciais do capítulo

Oie, quanto tempo né? Trabalhos, aulas. Enfim, tudo começa de novo.



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Depois de pegarmos um crachá “emprestado” de um dos funcionários da Globo, depois que Manuel deu um apagão no pobre homem, conseguimos finalmente adentrar no estacionamento da sede.

Poxa, você não sabe o que é dificuldade até ter que distrair um bando de caras vestidos como pinguins na porta de uma sede de televisão famosa nacionalmente. Pois é. Se você nunca passou por isso sua vida foi fácil.

— Ficar parado não vai ser o suficiente. – Tio Manuel falou. – Temos que fazer algo diferente. Eu já vi isso em filmes... Que tal se, encenarmos uma briga?!? – Ele sugeriu com os olhos arregalados e brilhantes. Eu tinha a certeza de que ele estava feliz em fazê-lo.

—  Aqui mesmo no estacionamento? – Perguntei já desconfiado da ideia. – Agora?

— Não, Nicolas, vamos fazer isso em casa... Dããã. – Camila como sempre estava irritante. Acho que em questão de encher a minha vida, ela estava pior que Valentína. Minha irmã era um anjo em comparação a ela. E coloque anjo nisso.

— Fica quieta Camila! – Pedi. – Pelo menos por um momento.

— Eu, já sei! – Manuel exclamou rindo, como um velho palhaço caduco, se afastando da rodinha que se parecia como uma daquelas de time de futebol americano. Ele começou a rir como o papai Noel, vagando pelos carros. – Haha!

— O que foi? – Vovô Bento perguntou, tão confuso como eu.

— Podemos usar as crianças. – Ele falou simplesmente. – Lembra Bento? Não há coisa que incomode mais um adulto do que ver dois moleques em uma briga de rua.-  Ele coçou a barba, se sentindo genial. Olhei para o carro onde Tio Barnabé e o resto do grupo estavam para ver se alguém estava vendo isso. Alguém precisava me tirar dessa encrenca. Eu não queria ser uma marionete de um velho motoqueiro que tinha uma neta descontrolada. Eu preferia ficar preso a Valentína pelo resto da vida do que passar a isso.

— Por favor. – Eu já estava implorando.

— Cala a boca Nicolas. – Camila falou e então me deu um tapa na parte de trás da cabeça. – Deixe de ser um bebê chorão pelo menos por um dia de sua vida. Não vamos estragar tudo por sua causa.

E fiquei quieto. Não pela Camila, mas sim porque eu via que já estava encrencado. Era tarde demais. Estava preso a um bando de malucos. E não demoraria muito para eu virar um também.

***

E então, seguimos com o plano. Eu e Camila atuaríamos em uma briga. Se bem que para ela aquilo era bem fácil, já que a todo momento ela me provocava. E aposto que ela aproveitaria aquela farsa para me dar uma bela surra atrasada. Eu novamente estava perdido.

— Seja convincente. Finja que está brigando comigo. Todo o plano depende disso. – Ela avisou. Como se eu precisasse ser convincente para apanhar dela. – Não vá estragar tudo Nicolas. Estou de olho em você. – Ela fez um sinal, indicando seus olhos e logo em seguida apontou para os meus.

— Tá, mas o que eu falo? – Perguntei, não fazendo a mínima ideia do que falaria.

— Qualquer coisa. Invente. – Ela respondeu como se fosse assim tão fácil. – Nunca assistiu novela da Globo não?

— Acho que não.

— Mesmo?!? – Ela abriu a boca em formato de “O”. – Você nunca assistiu novela? Em que tipo de planeta você vive?

— No planeta Terra? – Perguntei.

— Só finja. – Ela suspirou, como se não acreditasse no que havia ouvido. Como minha mãe sempre fazia quando meu pai falava alguma coisa que ela não gostava. Acho que era coisa de menina mesmo.

Ok. Ela falou que era para mim fingir. Respirei fundo. O que eu poderia inventar em uma hora dessas? Pense Nicolas, pense... O que causa uma briga entre duas crianças? Eu nunca havia brigado com alguém da minha idade. Todos eram meus amigos na escola. E principalmente, eu nunca havia brigado com alguém do sexo oposto...

— Eu começo então. – Ela bufou. – Prepare-se.

Juntos, marchamos para perto dos guardas que pareciam do FBI. Imaginei se eles portavam algum tipo de arma e engoli em seco.

— Você é um bobão! Seu moleque fedido! – Distraído enquanto olhava para o cinto de um dos caras, senti um empurrão no peito e quase caí no chão. Fiz uma cara de “o que você está fazendo?!?” para Camila. E então caí a ficha. Ela já estava encenando. E talvez essa seria a minha chance de revidar toda a raiva que eu sentia por ela ás vezes. – Por que você contou para a minha mãe?!? Era um plano secreto, e agora ela descobriu. Cara, podemos ser presos?!? Qual é o seu problema? – E então ela deu uma volta ao meu redor, como se estivesse esperando para me atacar. – Eu confiei em você e você... Você me traiu seu infiel!

Acho que agora ela estava exagerando. O que eu havia feito de tão ruim assim?!?

— Vai embora seu! – E então ela chegou perto de um carro preto e chutou com força e raiva a porta dele. Vi que ele ficara amassado. Por um momento, eu me perguntei de que o pé dela era feito. De chumbo?

Finalmente, os guardas pareceram mais atentos. Porém, achei que não era suficiente então, achei que era hora de encenar:
— Mas, eu não fiz nada! – Comecei e ela piscou para mim.-  Você que colocou tudo a perder! Foi por sua culpa que a banda se separou! Foi por sua culpa que não viajamos naquele carro para os Estados Unidos. Íamos ficar famosos! Mas você quis tudo para você. Eu sabia! – Aumentei o tom da minha voz. – Você é só uma garota mimada e metida e desde o começo, você só quis a fama e o sucesso para você. Eu vi o papel na sua casa. Você iria nos trocar por outra gravadora. Você é uma falsa!

— Ora seu! – Então ela foi em direção aos guardas e tirou sem a menor dificuldade um extintor grudado a parede e fingiu que iria acertá-lo em mim. – Eu vou te matar! Vou te arrebentar em pedacinhos. Tanto, que você não vai ser lembrar nem do nome da sua mãe!

 Ela foi bem convincente, porque quase acreditei que ela iria me acertar com aquela coisa vermelha mesmo. Fingi tropeçar e cair e deixei que ela segurasse aquela coisa em cima da minha cabeça. Pelo canto do olho, observei Manuel e vovô logo a frente, escondidos atrás da traseira de um carro amarelo. Tio Manuel fazia um sinal positivo nas mãos, incentivando o gesto, como se ele fosse um diretor instruindo seus atores em um filme. Já o vovô apenas meneou a cabeça, preocupado, como se aquilo não cheirasse nada bem. Mas, para que ele não se sentisse preocupado nem nada, dei uma piscada a ele, que sorriu ao receber o gesto.

Fiquei deitado no chão, imóvel, esperando algo acontecer. Então, como por um milagre, ouvi os seguranças gritando e imaginei que eles estavam vindo na nossa direção. Vi o sapato lustroso negro de um deles na minha frente, enquanto ele tentava “acalmar” Camila.

— Garota, coloque isso no chão. – Um deles pediu. – Se não fizer isso, vamos ter que chamar seus pais. Entendeu?

Camila parecia relutante:

— Eu não vou soltar isso, não enquanto não matar esse traidor que fede a bacalhau! – Dei uma risada baixinha. Aquilo era muito cômico. – Não vai ser um pinguim que vai me impedir!

E por mais que estranho isso possa parecer, ela saiu correndo, em disparada para longe do estacionamento. E adivinha? Os homens caíram na dela e a perseguiram. Os dois. Aquilo estava muito bom. Manuel e Vovô saíram de onde estavam e cauteloso, Manuel perguntou, olhando de um lado para o outro:

— A barra está limpa?

— Totalmente. –Respondi, confiante. – Mas, precisamos ser rápidos.

Tio Manuel fez um sinal positivo para o carro onde Tio Barnabé, Tio Francisco e Tia Filomena estavam. Eles, então, saíram um a um do carro e foram em direção a porta que outrora estava ocupada pelos seguranças. E lá, Tia Filomena agradeceu:

—  Obrigada garotos, eu não sei o que faria sem vocês. – Ela me beijou na testa. Gente, ela estava parecendo uma rainha, toda vestida de vermelho. Era um daqueles vestidos apertados na parte das canelas sabe? Estilo meio que sereia. Só faltava a coroa. E quanto ao cabelo, suas mechas acinzentadas radiantes caiam sobre os seus ombros nus em uma espécie de cascata. Isso é que era rainha!

— Arrebenta Filomena. – Manuel desejou, com os punhos cerrados em sinal de incentivo. – Estamos atrás de você. Só falta apagar a energia, pelo menos por um momento. E depois entramos para ver como você está se saindo.

— Acreditamos em você Filomena. – Foi a vez de vovô Bento. – Brilhe como uma estrela e incendeie como uma chama.- E então ele piscou. Fiquei confuso. O que aquilo queria dizer?


— Não temos muito tempo. – Tio Barnabé falou. – Acho melhor irmos.

E então Filomena, ao lado de Valentína, foi escoltada para dentro da sede. Acenei para a última, sorrindo. Ela, que olhou para trás no exato momento, repetiu o gesto e por uma estranha razão fiquei contente por isso.

— Nicolas, temos que dar um jeito na energia. – Vovô me cutucou, me chamando. – Chegou a hora de eu lhe ensinar uma antiga brincadeira do vovô. Vamos.

Vovô me levou para o outro lado da sede, onde Tio Manuel havia encontrado a torre de energia. E para a nossa sorte, ela estava acima do estabelecimento, lá em cima. E de novo, estávamos perdidos.

— Argh!! – Tio Manuel estava irritado. – Por que não podia ser mais simples?!? Que saudade daquela caixinha preta com um raiozinho na frente... – Ele se sentou no chão, no asfalto, com as costas encostadas na parede.

— E agora vovô? – Perguntei a ele preocupado. – O plano vai dar certo, não vai?

— Se Deus quiser sim meu neto. – Ele respondeu sabiamente, colocando uma mão sobre meus ombros, em sinal de consolo. – Vamos pensar em algo.

E como um raio, ouvimos Camila gritar e acenar de longe, correndo em nossa direção. Em pouco tempo ela estava ali, ofegante, apoiando o corpo com os seus joelhos:

— Aqueles carinhas são persistentes mesmo hein? – Ela comentou, olhando para trás. – Mas não o suficiente para me vencerem... – Ela olhou para nós e notou nossa cara de enterro. – O que houve? Alguma coisa deu errado?

— Não achamos o padrão de energia. – Respondi. – Na verdade, até achamos, mas.... Digamos que a tecnologia avançou um pouco.

— Entendo. – Ela respirou fundo, mas pareceu ter uma ideia. Vislumbrei uma pequena lampadazinha surgindo sobre seus cabelos loiros. – Ei! Nem tudo está perdido. Preciso apenas de dois celulares, um alicate, um papel alumínio e um notebook

— Tá, mas onde vamos achar isso tudo? – Perguntei, confuso.

— Tudo bem. Só preciso de um notebook e um celular.- Ela pediu. – Tem tudo isso no carro, está em uma mochila velha. Podem verificar.

Obedeci a Camila e abri o carro. Achei aquela tal mochila e retirei o notebook e peguei um celular qualquer. Quase tentei descobrir o código do celular, mas decidi não ativar minha curiosidade. Não era hora para descobrir o segredo dos outros, mas sim, de tentar fazer algo pela Filomena. Ela confiava em nós. E precisava da nossa ajuda.

Entreguei o notebook a Camila que começou a conversar com alguém através do chat do Facebook. Parecia ser um amigo dela do colégio, pelas palavras que ela usava para se dirigir a ele. E pareciam bem próximos na minha opinião.

Então, ouvi o celular tocar. Todos estavam bem atentos a qualquer passo que ela fazia. Parecia que ela estava desarmando uma bomba ou algo parecido. Ela atendeu e todos fizeram o máximo de silêncio o possível.

— Sim... Ahã... Desligar?!? – Ela foi um pouco para longe. – Essa é a senha? Uhum... Agora? Aí esperar quanto? OK... Ok... Obrigada. Te devo uma na escola. Tá... – Ela riu. – Tá bom... Meu avô está aqui, não posso falar. – Tio Manuel deveria ter achado a conversa muito estranha porque arqueou uma de suas sobrancelhas de viking. – Tá bom... Chega vai! Nos falamos depois. Ok, tá, tchau. Preciso desligar.

Ela desligou o aparelho e logo em seguida, começou a mexer nele. Pelo que eu havia entendido, havia um código especial para desativar a internet de algo muito maior do que uma casa. Vai ver esse colega dela era um hacker profissional. Ou quem sabe um procurado da polícia brasileira.

E por incrível que pareça aquilo pareceu funcionar, porque alguns minutos depois – longos minutos para leigos como nós, que estávamos praticamente sem entender nada... – ela fez uma dancinha de comemoração e anunciou toda feliz:

— Consegui desligar a conexão da rede via satélite. – Ela falou. – Pelo menos, vamos atrasar o programa mais um pouco, para inserirmos Filomena nele. Ahh!!- Ela de um gritinho. – Eu sou um gênio!

Vai nessa?!? Nem se ela fosse neta do Einstein eu acreditava naquilo...

E juntos, entramos finalmente na sede. Á medida que andávamos por aqueles imensos corredores, vi as consequências daquela proeza da Camila: muitas pessoas estavam desesperadas, correndo com papéis nas mãos perguntando umas às outras o que ocorrera com a transmissão do programa. E se eu estivesse em outra situação, acho que ficaria feliz por estar em uma rede de transmissão nacional.

Entramos em uma sala onde o símbolo do “The Voice” estava estampado na porta. A partir desse momento, Camila começou a dar ordens:
— Podem deixar a iluminação por minha conta. – Ela disse. – Vão na plateia e vejam como Filomena está se saindo. Eu acompanho tudo pela televisão daqui.

— Mas, você vai ficar na melhor parte! – Protestei. Sempre sonhei em ser diretor de um filme.

— Nicolas. – Ela se aproximou e colocou as mãos nos meus ombros. – Tia Filomena precisa de você. Aposto que quando ela entrar naquele palco, primeiramente, ela vai TE procurar. Nicolas, ela te ama. Você precisa estar lá para apoiá-la. Faz muito tempo que ela não confia em alguém há tempos... – Ela disse aquilo e fiquei confuso. O que havia acontecido a Tia Filomena, para a mesma não confiar em ninguém?

Porém, antes que eu perguntasse mais alguma coisa, ela já havia colocado aqueles fones de piloto de helicóptero no ouvido e feito um sinal positivo com as mãos, indicando que estava tudo bem.

A porta se fechou a nossa frente e julguei ser a nossa deixa:

 - Vocês estão prontos? – Perguntei a Tio Manuel e Vovô. – Precisamos ir agora. Tia Filomena nos aguarda.

— Beleza. – Tio Manuel concordou.

E juntos, fomos em direção a plateia. Nos misturamos como cidadãos que pagaram por estar lá, e como todos ali, estávamos apenas esperando o show continuar.

E foi a conta de uma música tocar ao fundo. As luzes se apagaram. As cadeiras dos juízes começaram a brilhar na cor vermelha. Todos pareciam confuso. Eu era capaz de ouvir murmúrios de várias direções. Mal sabiam eles que o show estava prestes a começar.

Algumas luzes se acenderam finalmente. Uma delas, uma branca, estava direcionada para o palco. Uma figura cintilante surgiu. Percebi que era Tio Barnabé, vestido em um terno preto cintilante.

Olhei para a cara de algumas pessoas. Estavam confusas. Pareciam ter notado a ausência do outro apresentador. E lá vinha o Tio Barnabé com sua voz firme, digna de um verdadeiro apresentador:

— Senhora e senhores, aqui estamos em mais uma edição do “The Voice” e gente, alguém está sentindo esse cheiro de chorume aqui?!? – Ele fez um sinal de que algo não estava cheirando bem. A plateia riu. – Por favor, alguém liguem esses ares-condicionados, porque o negócio está feio aqui. É emoção de mais ou burrito de feijão? – a plateia riu novamente. Tio Barnabé era uma comédia mesmo...

— É brincadeira. – Ele disse rindo de sua própria piada. – Mas com um fundinho de verdade. Mas, enfim, quem está animado para um show de verdade? – Ele incentivou a plateia. Conhecia essa tática.

Alguns “eus” ecoaram no fundo.

— Eu hein? Preferiam estar na cama? Ou estão em algum tipo de cerimônia fúnebre? – Ele parecia desapontado, meneando a cabeça. – Ah... Eu quero ver empolgação, felicidade, Rock’n’Roll pessoal!! Vamos de novo!

— EUUUUUUUU- algumas pessoas levantaram as mãos e gritaram em coro. Apenas um grito de um menino reverberou ao fundo, mais alto do que os demais. E olhei para trás, o sujeito estava sem camisa e agitava os braços de um lado para o outro. Uau!

— Isso sim é que empolgação de verdade. – Tio Barnabé falou ao microfone, sua respiração saiu junto. – Como é seu nome garoto?

Ele bem que tentou gritar, mas não adiantou.

— Alguém dê um microfone a esse garoto, por favor? – Ele pediu e foi feito.

— Júlio!

— Júlio como aquele boneco do Cocoricó... Hum... – A plateia riu. – Diga Júlio, você está aqui sem sua mãe saber, não está? Você disse a ela que iria estudar, mas na verdade, havia comprado o ingresso do show há algum tempo antes.... Estou certo?

— Como adivinhou? – Ele parecia impressionado.

— Simples. Porque eu faria o mesmo se fosse você. – E todos caíram na gargalhada.

Depois de Tio Barnabé alegrar um pouquinho as pessoas, ele anunciou, com uma voz impressionante de locutor de rádio:

— E a seguir, uma competidora extraordinária, que vai deixá-los malucos... A linda, e maravilhosa: Filomena!!!


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