Londres, 25 de dezembro (Final do século XIX)

(2:00 A.M)

P.O.V Allen

*Estamos fechados devido a neve. As atividades serão retomadas ao amanhecer*

Dizia a placa na ferrovia arrancando-me um suspiro irritado e audível.

“Primeiro o desgraçado do Komui me manda em uma missão duvidosa na véspera de natal e agora vou ter que passar o natal sozinho em uma pousada porque não tem trem, e tive que mandar o Timcanpy de volta na frente com a inocência…”

—Que merda. Resmunguei em meio a um suspiro pesado enquanto caminhava lentamente procurando por uma pousada, pelas ruas desertas devido a hora, porém bem iluminadas e coloridas formando um belo contraste com o puro branco e gélido que cobria o chão denunciando a neve de poucas horas atrás.

Quando finalmente encontrei uma “bendita” pousada aberta pedi um quarto para a moça jovem atrás do balcão que julguei ser a recepcionista, que eficientemente e rapidamente me entregou uma chave e indicou com precisão a direção do quarto, agradeci com um leve movimento de cabeça e logo me pus a andar em direção ao quarto, mas apesar de tudo não estava com pressa de deitar ou me aquecer, pois aqueles pensamentos voltariam a minha mente.

“Eu rezei aos deuses para deixarem ele ficar.”

“Todas as minha lembranças mantém você próximo. (memories within temptation)

Em momentos silenciosos imagino você aqui.”

Era um quarto simples de tons pastéis mobiliado apenas com o essencial para se passar uma ou duas noites havia uma cama de casal muito bem arrumada e um criado-mudo com um pequeno abajur, coloquei minha mala de mãos ao lado da cama e ao tirar o pesado sobretudo me joguei na cama depois de apagar a luz deixando apenas a claridade da rua e o fraco e opaco brilho da lua iluminarem o quarto através da janela aberta.

E logo o momento que eu tanto temia chegou… Acabei me perdendo em pensamentos sem perceber…

*Flashback ON*

—Ei Shounnen, por favor, me mata logo… Não suporto mais ser seu inimigo… Não quero te matar… Você está vivo, essa notícia restaura a minha paz… Falou o moreno caído no chão coberto de sangue usando apenas uma pilastra da arca para sustentar suas costas.

—Tyki eu… Não sabia o que dizer naquele momento, meus sentimentos estavam confusos e meu coração acelerado doía e gritava desesperado para que eu não o matasse.

—O QUE ESTÁ ESPERANDO? MATE LOGO ESSE NOAH IMUNDO! Gritou Chaoji descontrolado.

—E-eu… Por mais que eu tentasse simplesmente não conseguia descer a espada, a ideia de matá-lo fazia meu coração sangrar, e logo todas essas angústias e incertezas começaram a transbordar por meus olhos caindo sobre o rosto do moreno caído aos meus pés que me encarava com olhos que eu jamais achei que veria em um Noah.

—Shounnen… Sussurrou com a voz falha.

—MATA LOGO! VOCÊ ESTARÁ TRAINDO NOSSAS CRENÇAS SE NÃO O FIZER! Novamente Chaoji gritou irado enquanto Lenalee observava em silêncio e Lavi lutava contra Road.

Mesmo assim permaneci imóvel enquanto as lágrimas rolavam sem controle por minha face e acabei por abaixar o braço sem coragem para matá-lo.

“Essas feridas não vão cicatrizar

Essa dor é muito real

Há muita coisa que o tempo não pode apagar” 

Em um ato que me pegou completamente desprevenido Chaoji me empurrou com força na direção de Tyki e em um ato de reflexo abri o braço cortando Tyki com a Crow Clown.

—TYKIIIIIII! Gritou Road desesperada enquanto o moreno gritava e agonizava de dor com as mãos sobre o rosto ensanguentado.

—Tyki! Exclamei apavorado, mas antes que eu pudesse tocar no moreno fui empurrado para longe com uma força absurda… Tudo o que eu pude fazer foi observar ele agonizando com várias cruzes brancas envolvendo-o… E logo tive que suportar vê-lo se transformar… Naquilo…

*Flashback OFF*

—Como será que ele está? Será que está vivo? Sussurrei melancólico me revirando na cama. Desde então haviam se passado três meses e não houve um dia sequer que eu não pensasse em Tyki, e graças a isso acabei aceitando que estava apaixonado por um dos meus piores inimigos… Isso dói…

—Eu quero vê-lo. Sussurrei me levantando e andando até a janela onde eu debrucei sobre o peitoral e encarei perdidamente as ruas desertas antes de focar minha atenção no céu escuro e sombrio sendo cobertos por nuvens e a lua que outrora era possível ver um leve brilho agora havia sido completamente ofuscada pelas carregadas nuvens cinzas.

“Em breve irá voltar a nevar”...

“Como diabos nós fomos terminar desse jeito?

Por que nós não fomos capazes de ver os sinais que perdemos

E tentar "virar o jogo"?”

“Mana… O que eu faço?”

P.O.V Tyki

—Tyki? Ouvi a voz de Road se aproximando. -O que faz aqui fora? Estão todos perguntando cadê você.

Estava parado do lado de fora da mansão encarando a grama coberta de neve e as flores congeladas do belo jardim… Tudo tão branco, tudo tão puro, tudo tão… Lindo… Tudo ao seu redor o fazia lembrar de seu amado.

—Estou apenas pegando um ar… Não estou em um clima festivo exatamente… Respondi sem me importar em encará-la.

—Sei… E como estão as dores?

—Não as sinto mais com tanta frequência. Respondi indiferente

—Sério? Vou melhorar a pergunta… E como está o seu coração? Tal pergunta me pegou de surpresa e acabei encarando-a atônito encontrando a morena com um semblante preocupado bem anormal da parte dela.

—O que sabe sobre isso? Perguntei em tom ameaçador.

—Eu ouvi o que você falou para o Allen naquele dia… E… Você acha que eu sou idiota? Desde que você supostamente o matou na China, você tem estado diferente, raramente vinha para a mansão e começou a matar humanos que cruzavam o seu caminho sem contar que a sua tolerância ficou quase que inexistente… Algo bem inadequado para o prazer. A pequena cuspiu as palavras de forma seca e parecia enojada com a situação.

—Primeiro você não tem provas, e segundo quem disse que eu me importo com o que você fala? Rebati irritado.

—Deveria! Essa situação já está me irritando e se o Conde ou o meu pai descobrirem você terá sérios problemas. Falou irritada

—E como eles descobririam? Eu quase matei o Allen e ele quase me matou, realmente não parece que há algum sentimento além de ódio e discórdia aí.Dei de ombros.

—É? O fato é que você deixou o Allen te ganhar na Arca e não teve coragem de conferir quando supostamente matou ele, e pior ainda pediu para que ele te matasse e ele não o fez… Ao invés disso começou a chorar ou seja, é recíproco.

—A onde você quer chegar com isso Road?

—VOCÊ NÃO É BURRO TYKI MIKK! EU QUERO DIZER QUE VOCÊ TEM QUE SE ACERTAR LOGO COM ELE! Você é um Noah, ele é um exorcista e pior ele é suspeito de estar envolvido com o décimo quarto membro, a pessoa que matou muitos de nós e você inclusive! Então aproveita que ele está passando o natal sozinho, e que o Conde Do Milênio nos deu “férias” até o último Noah despertar e vai chegar a uma conclusão com ele logo! Você não pode ficar dividido, ou você aceita ser um de nós e consequentemente a nossa missão de uma vez, ou você sai do clã. Road estava visivelmente irritada com a situação.

—Ok, você tem razão… Mas, será que vai realmente adiantar eu ir até ele? Será que ele não vai tentar me matar? Não estou em condições de enfrentar a inocência agora… Declarei apreensivo.

—Por experiência própria eu afirmo, ele não vai te atacar… Vi um fio de tristeza passar por suas orbes douradas momentaneamente.

—Road você…

—Sim eu já me apaixonei por um exorcista! Agora morreu o assunto! Então vá falar com ele de uma vez! Admitiu alterada invocando uma de suas portas.

—Tudo bem. Declarei dando-me por vencido.

—Ah eu não sei exatamente aonde ele está, mas vou deixá-lo no último lugar que eu o vi.

Assenti atravessando a porta que me levou para uma estação de trem fechada.

“Agora entendi o motivo dele passar o natal sozinho”. Pensei encarando a placa que dizia que o trens estavam parados, e logo me pus a analisar os arredores. Comecei a caminhar pelas ruas desertas, porém com uma bela iluminação natalina, e sem perceber acabei perdido em pensamentos o que me tirou total atenção do percurso que eu estava fazendo.

“Cem dias me fizeram mais velho

Desde a última vez que vi seu lindo rosto

Milhares de mentiras me fizeram mais frio

E eu não acho que possa olhar para isso da mesma maneira

Mas toda a distância que nos separa

Ela desaparece agora, quando estou sonhando com seu rosto” 

FlashbackS ON

—Oh,desculpe isso não é um lugar para crianças.

—Vou apostar meu casaco para recuperar as roupas do Krory.

—Hahahaha claro.

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—AQUI ESTÁ SHOUNNEN! UM PRESENTE PELO JOGO! Gritou jogando o baralho de cartas para o albino no trem.

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—Você foi incrível tentando salvar Suman Dark, Shounnen.

—Quem está aí? Quem é você?

—Pertenço ao clã Noah, me chamo Tyki Mikk, é um prazer conhecê-lo Shounnen.

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—Neeee Shounneeeeen! COMO É QUE ESTÁ VIVIO? Eu fui duramente criticado pelo Conde do Milênio! Acho que ele vai me punir!

—Como é?

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—Me… Mate…

—Tyki eu…

FlashbackS OFF

“Você costumava me cativar

Com a sua luz brilhante

Agora sou limitada pela vida que você deixou para trás

Seu rosto assombra todos os meus sonhos que já foram agradáveis

Sua voz expulsou toda a sanidade em mim

Essas feridas não vão cicatrizar

Essa dor é tão real

Há muita coisa que o tempo não pode apagar” 

“Eu realmente quero vê-lo… Ter certeza de que está bem… Nem que seja só por essa noite não desejo vê-lo como um inimigo, quero esquecer nossas diferenças, crenças e missões… Só quero poder falar sinceramente com ele, expor os meus sentimentos e poder amá-lo… Só hoje… Se existe alguma força superior, por favor, atenda meu pedido”. Supliquei em pensamento.

Sem perceber estava parado em frente a uma pousada relativamente pequena e por reflexo olhei para cima na intenção de analisá-la, porém me surpreendi ao encontrar aquelas belas orbes incolores que eu tanto amava me fitando surpreso.

P.O.V. Allen

Fui pego completamente de surpresa ao cruzar o olhar com aquelas belas e misteriosas orbes douradas que apesar de me assombrarem nos meus piores pesadelos me traziam calma, tranquilidade e calor nos meus melhores sonhos.

“Estou aqui sem você, amor

Mas você ainda está em minha mente solitária

Eu penso em você, amor

E eu sonho com você o tempo todo

Estou aqui sem você, amor

Mas você ainda está comigo em meus sonhos

E esta noite, somos só você e eu”

“O que ele está fazendo aqui? Por que ele está aqui?”

Mas, apesar de tais pensamentos a felicidade que estava sentindo por saber que Tyki estava viva era quase que sufocante. O olhar de Tyki era um tanto relutante e apreensivo, e por mais que estivesse feliz também estava apreensivo. (Afinal de contas esse cara quase me matou… DUAS VEZES).

—Eu não vim brigar Allen. Sua voz saiu transbordando insegurança, mas ao ouvir tais palavras eu joguei todas as minhas incertezas e o orgulho como exorcista no lixo.

“Quer saber dane-se, o cara que infelizmente eu amo está parado na minha frente e não quer me matar, preciso aproveitar”. Pensei me pondo a correr impulsivamente até a entrada da pousada parando a mínimos centímetros do moreno.

—Errr….

*Plaft*

Antes que ele pudesse formular alguma frase o interrompi com um tapa em seu rosto fazendo-o me encarar assustado e surpreso enquanto massageava o local atingido.

—VOCÊ É UM IDIOTA! Gritei despreocupado com as lágrimas teimosas que rolavam descontroladamente sobre minha bochecha. -POR QUE? EU NÃO ENTENDO? Continuei agora dando leves socos em seu peito.

—Allen…

—Sabe o pior? Eu só tenho motivos para te odiar… abaixei o tom de voz tentando controlar os soluços teimosos e deixei as mãos espalmadas em seu peito. -Por que está aqui? Perguntei com a voz trêmula.

Mas, não obtive respostas, tudo o que ele fez foi me abraçar, sentir seu coração bater acelerado, sua respiração descompassada e seu corpo quente traziam emoções completamente novas e indescritíveis.

—Eu precisava te ver… Sussurrou trêmulo.

—Por que Tyki? Isso é impossível… Sussurrei afundando o rosto em seu peito sentindo um forte cheiro de flores silvestres que de fato me agradou.

—Eu sei… Mas, eu te amo Shounnen e quero adiar o debate desagradável para amanhã. Sussurrou e com os dedos trêmulos levantou meu rosto forçando-me a encará-lo.

—Eu também te amo Tyki. Falei permitindo que o moreno selasse nossos lábios em um beijo calmo, porém necessitado.

Foi um beijo completamente novo e diferente, senti meu interior aquecer e pareciam que fogos de artifício explodiam no meu estômago.

—Está frio aqui fora. Comentou observando a neve que voltara a cair, me fazendo sorrir de canto.

—Vem, vamos entrar. Falei puxando-o levemente pela mão e o guiei até o quarto em que eu estava hospedado.

Ao fechar a porta do quarto voltamos a nos beijar e quando o moreno pressionou meu lábio inferior com a língua, abri passagem imediatamente correspondendo com a mesma intensidade explorando cada canto da boca do mais velho.

Quando nos separamos por falta de ar notei que estava deitado na cama e senti meu rosto esquentar ao notar nossas posições.

—Não se preocupa, não quero fazer nada que acabe me levando para a cadeia. Declarou deitando-se ao meu lado ainda ofegante e me puxando para deitar em seu peito.

—Bobo. Resmunguei em meio a uma risada abafada.

Logo senti suas mãos acariciarem levemente meus cabelos… “Por Deus como o cafuné dele é bom”.

—Eu não quero que essa noite acabe… Sussurrei em meio a um suspiro.

—Eu também… Não… Notei sua voz falhar percebendo que ele se sentia exatamente como eu… Sentimentos conflitantes, incertos, inseguros…

Ficamos um bom tempo em silêncio apenas curtindo as nossas presenças, trocando carícias e sentindo um o calor do outro.

—Ah é… Feliz Natal Shounnen.

—Hahaha esse é com certeza o melhor natal da minha vida. Respondi beijando-o ternamente.

E assim foi o resto da nossa noite, trocamos carícias até um pouco ousadas, beijos quentes, abraços possessivos, piadas bobas e não ousamos dormir nem por um momento, queríamos aproveitar cada milésimo de segundo ao máximo já que por essa noite, nós não éramos inimigos, não precisávamos lutar até a morte… Nós podíamos ser o que nós queríamos, podíamos no ver como pessoas… Como humanos normais…. Pudemos ter essa ilusão maravilhosa por uma noite....

“E eu desistiria da eternidade para te tocar

Pois eu sei que você me sente de alguma maneira

Você é a mais próxima do paraíso que sempre estarei

E eu não quero ir para casa agora

E tudo que posso sentir é este momento

E tudo que posso respirar é a sua vida

E mais cedo ou mais tarde se acaba

Eu só não quero ficar sem você essa noite

E eu não quero que o mundo me veja

Porque eu não acho que eles entenderiam

Quando tudo é feito para ser quebrado

Eu só quero que você saiba quem sou eu

E você não pode lutar contra as lágrimas que não virão

Ou o momento de verdade em suas mentiras

Quando tudo se parece como nos filmes

É, você sangra apenas para saber que está vivo”  

No dia seguinte Tyki e eu após conversarmos muito entendemos que não poderíamos simplesmente fugir de nosso destino, eu tinha que cumprir a promessa com Mana, eu não deveria trair a Ordem Negra e os exorcistas… Assim como ele não podia ir contra suas memórias Noah e não queria trair a família especialmente seu irmão e sobrinha.

Por isso… Mesmo depois de uma noite mágica onde nos conhecemos como pessoas, nós decidimos que voltaríamos para o campo de batalha como inimigos, se nos encontrarmos iremos lutar pelas nossas crenças até a morte… Dessa vez será para valer, o milagre de natal… O que aconteceu no natal… Irá ficar marcado em nossas memórias como um presente… O melhor presente que ambos poderíamos receber…

Depois de conversarmos e chegarmos juntos a tal conclusão nos despedimos com um último beijo carregado de sentimentos vindo de ambos… Em seguida nos separamos… Cada um foi para o seu caminho, lutar por seu propósito…

Mas, o sentimento não morreu, e o que aconteceu no natal…. Fica no natal, mas outros natais virão…. Quem sabe o milagre não se repete?

Pelo menos nós dois temos esperança… Esperança de que essa guerra tenha fim… Esperança de que possamos ficar juntos… Seja antes ou depois da morte...

Fim!

Feliz Natal!