Our Place escrita por Elizabeth Stark


Capítulo 1
You´re better than I can see


Notas iniciais do capítulo

Sou fã de carterinha do natal e por isso uma fic não bastaria ser postada, mas sim duas (você pode conferir "Suéter de Lã aqui: https://fanfiction.com.br/historia/719582/Sueter_de_La/)
Espero de coração que goste desse capítulo ♥.
Os devidos créditos ao/a artista pela capa extraordinária.
Um natal com muita comidinha pra vcs e um ano novo muito brilhante!



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O rosto de Astoria lembrava a Draco de manhãs natalinas.

O fato de suas famílias terem celebrado este feriado em especial juntas uma ou duas vezes, só provou a ele que, presente ou não, independente do lugar, ela fazia a superfície de sua vida um pouco mais reluzente.

A proximidade cordial de ambos levou a discutirem interesses  em comum, que o fazia se sentir sempre melhor em relação a si mesmo. Porém, chegou a um ponto que observar o contorno dos lábios de Astoria a certa distância, ou seu cabelo preto e sedoso descerem pelos ombros sem poder tocá-los, não era mais o bastante. Passar cada vez mais tempo com ela confirmou que jamais seria, tampouco.

Isso era levemente compensado por sempre reclamarem das vidas parecidas enquanto conheciam novos lugares, juntos. Draco suspeitava que, se não fosse um pelo outro, o contorno de seus corpos ficariam permanentemente em suas camas deprimidas.

Mas hoje a veria no lugar preferido de ambos em todo o mundo. O vilarajo Notting Hill, achado ao acaso enquanto exploravam rotas de paisagens naturais. E apenas por isso, seu dia seria um pouco mais que deprimente ou cheio de expectativas de merda frustradas.

Assim que aparatou na praça de paralelepípedos, avistou crianças buscando moedas de uma fonte escura talhada com quatros anjos de pedra. Draco cobriu o rosto com o capuz da capa. Fios platinados caíram em seu rosto enquanto percorria a rua em aclive, tentando não admirar as casinhas de tijolos agora enfeitadas para o natal com um olhar penoso de tristeza. Talvez em um futuro muito distante se visse habitado em uma delas, sentindo o cheiro da torta da padaria quando acordasse pela manhã...

Moradores da vizinhança entravam e saiam das lojas locais com sacolas vermelhas e verdes. A neve cobria os tijolos, janelas e bancos da região.

Continuou seu trajeto, apressado, até virar uma esquina um pouco abandonada e localizar a entrada do bar onde geralmente se lamentava de noventa por cento da sua vida. “Bezerro apaixonado”, Draco leu a placa ao bater a varinha três vezes na porta de entrada, que se abriu sozinha.

Quando o interior do local preencheu seu campo de visão, uma cadeira se arrastou sozinha de uma das mesas vazias, pronta para recebê-lo. Ao passar pela entrada, notou na parede lateral palavras escritas em uma letra borrada no papel de parede mofado com o tempo. Desiluminador. Berrador. Bicho-papão. Guelricho. Veritasserum. Bezoars. Pomo de ouro. Penseira.

Lugar estranho.

Andou preguiçosamente até a mesa de costume depois que tirou o casaco e o pendurou no cabideiro atrás da porta. As mesas eram todas de madeira escura e simples, dispostas ao redor do espaço, algumas com cadeiras ou poltronas com estofados rasgados improvisadas. Draco passou a notar, miseravelmente, que a mesa que costuma sentar ficava mais perto das luzes amareladas, em um canto afastado do movimento, onde um suave cheiro de abóbora saia da cozinha, trazendo um mensagem gritante de clima romântico. (Só constatou isso ao sentar sozinho).

Observou o balcão central, composto por três máquinas de cerveja amanteigadas enfeitiçadas. Duas flutuaram em sua direção. Sorriu. Era uma excelente opção para abrir o paladar e sossegar sua cabeça.

Talvez ela viesse. Talvez ela se importasse.

Ao fim da segunda cerveja, Draco andou mais confiante até o balcão.

— Tarde, Roger. – cumprimentou o atendente no tom mais passivo que conseguiu expressar.

Um rosnado amigável foi registrado como resposta.

— Sabe aquela garota que veio aqui uma vez comigo? Ela já veio acompanhada por outra pessoa? – Draco perguntou sem rodeios, constatando uma coceira insuportável na garganta.

— Que garota? – Roger resmungou, extremamente desinteressado. O cabelo escuro alinhado para trás cuidadosamente contrastava com os olhos verdes irritados e desfocados.

A única no planeta que suporta minha presença, lembrou a si mesmo.

Talvez fosse uma boa hora para lembrar das gorjetas gordas que deixava para o infeliz.

— Morena, alta, levemente mal humorada. – emendou, apoiando as mãos no balcão. Estava determinado a obter suas informações se isso evitasse um futuro onde veria seu coração rachado ao meio por Astoria, provavelmente em público.

— Malfoy, é o único bar do vilarejo. Quantas caras feias você acha que preciso atender por dia? Pior. Quantas bobagens amorosas me envolvem?

— Apenas responda a pergunta. – olhou diretamente nos olhos do atendente, paciente. Isso o fez se lembrar que ser carregado para fora de um bar uma vez na vida já bastava.

— Vem muitas morenas por aqui. Preciso de mais adjetivos. Pode não parecer, mas trabalho aqui e não fico prestando atenção em cada rabo de saia que entra. Como já disse antes.

— Enfim, ela é morena. – emendou novamente, agora triunfante – Alta, pele pálida, um pouco rosada quando está ofegante. – sorriu ao imaginar Astoria recuperando o fôlego no seu quarto. - Sinceramente engraçada. Irritada de forma geral. Fala muita besteira interessante, gosta de usar preto e casacos de veludo. Não tem vergonha de sua risada escandalosa e odeia esperar a bebida sentada. – lamentou finalmente ao notar que todas essas coisas estavam a quilômetros de distância de serem suas.

— Peitos enormes? – Roger concluiu aparentemente confuso.

— Disso você lembra?

— Disso eu me lembro. Por que não foi direto ao que importa? – Roger abriu as portas do armário de copos e devolveu três recém-lavados para dentro. – Ela veio aqui uns dias atrás. Sentou em várias mesas diferentes até que sossegou e foi para a que você está sentado agora. Parecia irritada. Não deve ser fácil gostar de um cara que monitora sua vida.

— Não estou monitorando nada! Apenas curiosidade. Amigável. Não que seja da sua conta. - acrescentou.

O olhar de Roger parecia perguntar se esses eram os sinais de um psicopata.  

Draco não se abalou. Um homem deve fazer o que julga importante antes de meter seus sentimentos em certos lugares.

— Esqueça que eu perguntei. Ela deve estar chegando. – agradeceu colocando três galeões sobre a madeira do balcão. – E mais duas cervejas com gengibre.

Enquanto a esperava, Draco remoia a sensação de que faltava apenas um dia para o natal. Outrora era um feriado magicamente alegre e que o fazia sorrir. Em seus pensamentos sabia que o único motivo de não ser totalmente indiferente à data era que talvez houvesse a remota possibilidade de passar com alguém que sinceramente se importava. Muito remota, aliás.

Um singelo sino soou quando a porta se abriu. Sardas discretas, cintura realçada pelo casaco apertado e pequenos pingos de neve derretidos pelo cabelo preto. Malfoy sentiu sua existência inteira se chacoalhar intimamente por míseros instantes quando Astoria entrou.

Ela instantaneamente olhou para a  mesa “deles” e se direcionou a ele.

— Oi. – Draco a cumprimentou, subitamente esquecendo-se de todos os aspectos que estavam simplesmente uma merda em sua vida.

— Eu amo esse lugar. O cheiro. O nome. Até Roger não é de se jogar fora. – Astoria disse, sentando-se em frente a ele, sorrindo.

Draco olhou ao redor. As palavras “espelunca” e “aconchegante” lhe vieram a mente. Mas sabia ao que ela se referia. Nenhum bruxo ali parecia de suma importância ou minuciosamente atento aos jornais. Ali não eram ninguém e francamente, era a melhor coisa que poderiam desejar depois de tudo.

Mais três cervejas chegaram flutuando na mesa, a pedido de Draco, enquanto Astoria explicava sucintamente outros lugares que descobrira pelo mapa que estudavam.

— Não disse? Meu pedido chega a mim sem que eu precise me dar o trabalho de levantar. – ela enrolou as mãos em volta de uma das canecas antes de beber. Os dedos finos, pálidos e delicados.

— Na verdade pode chamar isto de magia ou se preferir ser mais justa, que o cara que está te acompanhando é muito adiantado.

— Então, você merece que eu seja igualmente adiantada. – ela começou a revirar a bolsa que trouxera. - Comprei uma coisa para você. Mas queria te dar antes do jantar na sua casa. Não queria que nossos pais vissem.

Ela retirou um enorme embrulho de uma bolsa minúscula, menor que sua mão, sorrindo ansiosa.  Malfoy admirou o feitiço de ampliar a bolsinha. Seu cérebro parecia em câmera lenta ao olhar para o rosto dela.

 Um pacote com fitas vermelhas.

Um presente de natal.

Draco o recebeu extremamente boquiaberto. Não conseguiu responder nada até abrir as fitas e o papel pardo. Um jogo de lençóis macios e delicados. As bordas com linhas desenhadas com as letras D.M.

— Você me disse que tem problemas para dormir na sua cama. Que odeia seu quarto. Talvez isso possa ajudar. Tem essência de camomila. Uma erva trouxa que ajuda a acalmar. É incrivelmente macio. Também enfeiticei o tecido para se ajustar ao tamanho da sua cama. Bem, resolveu meu problema. O cheiro é maravilhoso, também.

Ainda segurando a fita vermelha, ficou impossível para Draco esconder seu espanto.

— Eu não te comprei nada. Quer dizer, nada tão...

Íntimo, pensou. Incrível. Atencioso. Apenas um kit de livros idiota sobre viagens com comentários exclusivos sobre exploradores experientes.

Uma pausa que somente o barulho de canecas pairando sobre mesas foi registrado.

Astoria o olhava atentamente. Draco desejou pela primeira vez em que passavam juntos estar em qualquer lugar menos ali.

— Não, não é isso. – Astoria semicerrou os olhos.

— Eu adorei. Muito obrigado. É sério.

— Você está assim pelo presente inesperado, talvez bacana, ou pelo modo, sei lá, discreto que estou dando? Para ser mais especifica, num bar onde nossa família jamais nos encontraria...- perguntou sem rodeios com uma ruga no meio da testa.

— A segunda opção parece um pouco mais o que estou pensando. – Draco sentiu suas bochechas esquentarem de um modo terrível. A sinceridade confiante dela era de deixar qualquer um de pernas bambas.

De repente, Astoria se alterou de um modo que só pode ter significado que entendeu cada intenção de Draco.

— O que acha que está acontecendo aqui? – disparou.

— Como assim?

Ela bufou, irritada. Deu um gole na cerveja, apoiando as mãos na madeira da mesa que estava talhada com um M na borda. Provavelmente a inicial de algum casal apaixonado. A luz amarelada refletia no rosto dela. No fundo do bar, Draco podia ouvir um homem rindo.

— Por que acha que ainda frequento os feriados na sua casa? Com nossa adorável família? – ela virou o rosto, uma rebeldia começando a ascender, depois continuou. – Não sou tão louca por viagens assim, sabe? Faço essas coisas em excesso porque você está junto comigo, apenas por isso. Não me diga que não estava óbvio!

— Não estava. – Draco respondeu rapidamente.

— Você está sendo estúpido. Muito estúpido. – mais um gole de álcool desceu pela garganta dela. Draco se sentiu desfiladeiro abaixo, junto com sua dignidade.  – Não sei por que esperei tanto tempo você ter alguma iniciativa.

Queria dizer alguma coisa útil para ela, que explicasse tantos meses de  tristeza que sentiu com a relação deles. Sobre o quanto pensou em que ela estava fora de seu alcance. Mas o que saiu de sua boca foi desanimador.

— Não sei por que está agindo assim, Astoria. Você mais do que ninguém sabe que não sou como antes. Pelo menos não tão estúpido.

 

O olhar dela dizia o claramente o contrário.

O estomago de Draco dava saltos paraolímpicos. Nunca imaginou que toda sua hesitação em respeito aos sentimentos dela seria interpretado como pura burrice. Às vezes se pegava imaginando nas profundezas escuras do seu quarto solitário na mansão o que diabos passava na cabeça dela por querer sua companhia.

— Não posso evitar. Ficar perto de você faz meus miolos se desgrudarem. – disse sinceramente.

Um assomo de diversão transcorreu pelo rosto redondo a sua frente. Até que uma curva delicada de um sorriso tomou os lábios dela. Quando isso aconteceu, Draco sentiu um conjunto de desconforto, sofrimento e ansiedade cederem de seus ombros.

Estar apaixonado por uma garota extraordinária tinha seu preço, percebeu.

— Eu esperava ouvir que eu fazia de você um homem melhor, talvez até que eu desse um pouco de cor a sua cara pálida. Não que eu faço seu cérebro parar de funcionar.

Draco entrelaçou seus dedos nos dela, disponíveis sobre a mesa. Era a primeira vez que fazia isso e pareceu muito simples de uma forma incrível. De relance, notou pela primeira vez o papel de parede roxo velho, com alguns retalhos floridos sobre os mofos. Pertos das janelas, o primo de Roger, Alexander, cantava uma melodia suave. Draco se pegou divagando sobre a frase da música: “You’re better than I can see.”

— Acho que um meio termo em relação a isso fará bem a nós dois. – sorriu pra ela.

Ela pareceu ainda mais linda, no instante que a garçonete ascendeu as luzes de natal dentro do bar, indicando o inicio da noite. Ao redor deles, toda uma iluminação de cores verdes, vermelhas, azuis e rosas dançavam enquanto, delicadamente, encostava os lábios nos dela.

Draco soltou  o rosto dela apenas para dizer, brevemente, que sentia muito por ter demorado tanto. Teriam muito tempo para conversar. Precisava apenas senti-la em suas mãos.

Mas sabia que algumas coisas aconteciam na hora certa, antes de beijá-la novamente.

Astoria fechou os olhos, sabendo que nenhum lençol do mundo seria tão macio quando a suavidade dos movimentos da boca de Draco.

Quando o bar estava prestes a fechar, antes de passarem pela porta, Draco leu novamente as palavras aleatórias ao lado da porta.

— Sabe o que significam? – perguntou a ela. Agora, podendo, finalmente, por a mão em sua cintura enquanto recolhiam seus casacos.

— Esse lugar era um esconderijo da Ordem da Fênix. Muitos bruxos vinham aqui discutir táticas de batalhas. Provavelmente deve ser algum código deles. Roger é bem apegado à decoração. Não gosta de mudar muita coisa.

Despediram-se dos funcionários, Astoria desejando um feliz natal a todos, enquanto Draco se limitava a uma gorjeta impressionante, sem falar nada.

O ar do lado de fora estava mais frio e cortante quando saíram. Pouco importava. Não sentia essa sensação morna perto do peito havia muito tempo.

— Astoria, o que acha de alugarmos um lugar por aqui e passar o feriado? Longos dias com nossos pais não é uma ideia que me agrada.

Ela agora olhava atentamente para seus olhos. Draco os encarou de volta sentindo uma paz percorrendo todo seu corpo. Foi incapaz de segurar um sorriso.

— Aqui é nosso lugar, não acha, Draco?

Um coro da igreja do vilarejo soava próximo, provavelmente ensaiando para amanhã.

O rosto dela agora não trazia apenas uma sensação de manhãs natalinas, mas sim um vasto horizonte de esperanças, abraços mornos e alegrias singelas.


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Notas finais do capítulo

"You´re better than I can see" é uma frase da Astoria em The Cursed Child.
O feitiço de ampliar a bolsinha que tanto Hermione e Astoria usam, é ilegal, segundo a J.K Rowling comentou no Pottermore. Mas quem se importa??
E o nome do bar, "Bezerro Apaixonado" é o nome também de um animal que você encontrará no livro "Animais fantásticos e onde habitam" que achei que combinou com esse estabelecimento caindo aos pedaços de esquina.

Beijos e abraços e boas festas!



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