Paixões Gregas Um amor como esperança (Degustação) escrita por moni


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Primeiro capitulo pessoas. Espero que gostem. Quem não se lembra. Danny narrou esse encontro no capítulo 37 de Amor sem fronteiras. Amanhã posto mais. Agora vou terminar o último capitulo de amor sem fronteiras.



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   Pov – Alina

   O céu ainda está escuro quando meu pai me toca o ombro levemente. Abro os olhos ainda com sono, sinto como se tivesse acabado de fecha-los. Meu corpo moído no colchão duro feito de palha por meu pai quando eu tinha nove anos.

   As paredes de pedra guardam calor e a pouca ventilação deixa os cômodos quentes dia e noite. Me sento assonada e um tanto perdida.

   ―Estou indo para o mar Alina. Deve começar seu dia. Fazer suas orações e cuidar dos seus afazeres.

   ―Sim senhor. – Fico de pé. Assim que me levanto tudo gira e escurece, caio sentada na cama dura. Uma mão na testa tentando me refazer. Vinte e quatro horas de jejum.

   ―Pode tomar café. O jejum purifica sua alma, não pense que não está alimentada. Isso tudo que acontece são tentações. Para você desistir da salvação. Como seu irmão. Perdi Makaros para as tentações mundanas, mas não vou perder você.

   ―Estou bem papai. – A tontura desaparece e sigo para a cozinha. O perfume do pão que assei ontem faz meu estômago reclamar. Descubro a tigela onde ele está guardado e coberto por um pano branquinho que passo horas clareando quase que como uma distração.

   ―Não antes das orações menina. Deus sempre em primeiro lugar. Como o Salvador nos ensina.

   ―Desculpe papai. – Me afasto do pão. Ele me olha um momento enquanto fico de pé olhando para o chão de pedra.

   ―Tenho que ir. Volto para o almoço.  – Assisto ele se afastar em direção a pequena embarcação que nos mantem desde sempre. Nada nunca foi diferente para nossa família.

   Não era quando minha mãe e meu irmão estavam aqui. Não é agora que restamos apenas eu e meu pai. Fico assistindo o barco sumir no mar calmo, penso em quando era pequena. No tempo em que estaria agora segurando a mão dela. Karisa Mantalos minha mãe, era uma mulher tão jovem e tão bonita. Até a doença atingi-la.

   Me lembro das lágrimas constantes do meu irmão, dos pedidos sem fim para ela procurar um médico. Makaros é cinco anos mais velho que eu e já tinha idade para entender o que se passava.

   Meus pais decidiram que Deus sabia o que estava fazendo, que ele e apenas ele tinha o poder de cura-la ou leva-la com ele e meus pais apenas esperaram.

   Eu não tinha ideia do que acontecia, aos poucos ela foi ficando magra e fraca e doente e uma manhã ela não acordou.

   Alastor, o salvador, como papai o chama e me obriga a chamar, disse que o senhor dos céus quis assim. Disse que tínhamos que nos alegrar e meu pai aceitou. Makaros não. Meu irmão era contra tudo que vinha da religião do meu pai, desde seu líder Alastor, a todos os seus conceitos. Bastou fazer dezoito anos para nos deixar.

   Casou com Thera, o namoro deles durou uma vida, desde o colégio, sempre em segredo, para meu pai e sua fé, esse é um pecado sem perdão. Soubemos do casamento dois dias depois, senti tanta tristeza de não poder estar com ele.

   Mais ainda quando meu pai passou a segui-los dia e noite exigindo que fossem até Alastor para que nossa família fosse salva do inferno. Meu irmão e a família de Thera o chamavam de lunático, doente, eu me encolhia a seu lado sem escolha e a pressão foi tanta que só restou ao casal deixar a ilha.

   Sinto falta do meu irmão. Makaros vem me ver as vezes, escondido, depois que meu pai saí para o mar e então nos sentamos nas pedras e conversamos um pouco, não é sempre que ele pode fazer isso. Meu coração se aperta todas as vezes que ele vai embora e tenho que voltar a vida de sempre.

   Não sei se é certo, não sei se é errado, não tenho ideia do que Deus acha de tudo isso, o que sei é que eu vivo aqui, que vivo essa vida e não tem outra para mim.

   Não estudei mais do que os primeiros anos do colégio, apenas o bastante para me alfabetizar, depois meu pai me proibiu de frequentar a escola e ninguém disse que estava errado.

   Meu irmão terminou os estudos, é homem e homens estudam, mulheres não. É isso que o Salvador que meu pai segue ensina. É isso que meu pai acredita e eu sou sua filha.

   Ele não tem mais ninguém, eu também não. Estamos aqui, perdidos nessa pequena ilha, afastado até mesmo das pessoas que vivem aqui. Vou pouco ao centro da ilha.

   Quando preciso de algo meu pai me acompanha, ou vai sozinho, vivemos do peixe que ele pesca, aprendi a cozinhar desde pequena com minha mãe, cuido da casa, dois cômodos cravado nas rochas. Nada que leve mais que uma ou duas horas do meu tempo.

   Além disso eu faço as orações que meu pai exige, não tenho ideia se acredito, apenas faço para passar o tempo. Além disso eu caminho próximo a casa, vou me sentar nas rochas todas as manhãs. Passo todo tempo que posso fora do claustrofóbico cômodo que se tornou meu quarto. Antes eu e meu irmão dormíamos no outro cômodo onde agora fica a cozinha e uma cama para meu pai.

   Quando sobramos apenas nós dois, ele me deu um quarto, é só uma cama e uma cômoda onde me sento para fazer as orações e copiar textos e mais textos que o salvador envia.

   Nem sei mais o que estou copiando, aquelas letras se misturam em minha mente e não significam mais nada. Faço meu trabalho, as orações, que são hoje só palavras que vou repetindo como um animal treinado que não vê mais sentido no que diz, mas repete e repete. No fundo acho que morro de medo do inferno que meu pai tanto fala.

   Depois me sento para o desjejum. Me alimento como se fosse minha última refeição. Nunca sei quando meu pai vai achar que estou impura, que cometi algum grande pecado e me obrigar a jejuar. Eu podia comer escondido, as vezes sinto tanta fome que apenas me deito e espero, não como, mesmo quando ele não está, ele descobriria, sinto que analisa tudo que temos na dispensa apenas para ter certeza que cumpro com minhas obrigações mesmo quando não está e se ele achar que não obedeci, então eu não sei o quão longe ele pode ir com isso.

   Quando meu estômago fica pesado e só quero me deitar e dormir de novo eu deixo a pequena casa para caminhar. É uma manhã clara e azul. A ilha é sempre assim. Azul infinito.

   Makaros fala mundo sobre o mundo, sobre as cores e os cheiros que estão além da correnteza do tranquilo oceano que me cerca como uma prisão.

   Não conheço nada do mundo, não vejo ele, não tenho nenhum meio de vê-lo, nem mesmo luz elétrica temos aqui. Não leio livros além dos que o próprio Alastor escreve. Nem musica, nem televisão, nem pessoas.

   Apenas acenos e olhares curiosos sobre mim e meu pai quando passamos pelas ruas mais movimentadas de perto do cais.

   Me sento sobre as rochas depois de molhar meus pés nas águas mornas. O silencio é as vezes meu melhor amigo, outras, meu pior inimigo. Raras vezes pessoas vem para esse canto perdido da ilha. As água não são tão mandas como os outros pontos, não tem bares, moradores e chegar aqui só não é mais difícil do que chegar a praia particular que pertence aos Stefanos além dessas rochas.

   Eles são importantes, queridos, bons é o que dizem. Não conheço nenhum deles. Só vi Leon Stefanos uma vez ou duas falando com meu pai. Os outros de longe. Lissa e os filhos, netos e nora e genro. A filha tem uma linda casa toda de vidro. A coisa mais linda que já vi e meu pai disse que só podia ser obra do mal.

   O vento sopra vigoroso, afasta qualquer nuvem do céu e meus cabelos dançam. É o mais próximo de liberdade que posso sentir. O vento traz com ele uma folha.

   Recolho pensando que os turistas deviam ter mais cuidado e não sujar nossa ilha com seus lixos de férias. Sorrio para a folha quando descubro que não é lixo. É um desenho, feito por um artista importante, por que é muito bonito.

   Íris. A deusa grega. Mensageira dos deuses. Eu não devia saber disso. É talvez a coisa que meu pai mais detesta na vida. A mitologia. Ele acha que é obra do grande mal, ilusão que afasta os fiéis do reino dos céus.

   Makaros me contava sobre os deuses, ele sabia sobre eles e suas lendas por que estudou muito tempo e me contava histórias que me faziam sonhar.

   ―Gosta? – A voz me chega de surpresa e salto de susto. Me volto e dou de cara com um rapaz. Primeiro fico com medo, mas vejo em suas mãos outras folhas e sei que é o artista e eu o admiro.

   Ele é bonito, como não me lembro de ter visto outro antes, eu não vejo muitas pessoas, mas ele é tão bonito e jovem e me olha como se eu fosse diferente. Como se não fosse real. Podia ficar olhando para ele o resto da vida, mas me dou conta de quem sou e sinto medo só de pensar no que meu pai diria.

   ―Íris. – Digo estendendo o desenho que ele recolhe sem dizer uma palavra. Ficamos nos olhando um momento e sei que devo partir e nem posso pensar em fazer qualquer outra coisa. Dá pena não falar com ele, não olhar os desenhos que ele carrega na mão.

   Corro de volta para casa. Corro o máximo que posso. Feito um raio, sem olhar para trás. Apenas para não cair na tentação de dizer algo. Quando chego a minha casa minhas pernas estão bambeando, meu coração batendo forte. É bom, ao mesmo tempo assustador e me faz sorrir.

   O resto do dia minha mente se divide entre o desenho e o artista. Ele deve ser um turista, nunca mais na vida vou voltar a vê-lo, nem tinha que ficar pensando nele. Acontece que penso e não sou muito boa de esconder as coisas.

   ―Está pronta? – Meu pai pergunta quando o céu escurece. Balanço a cabeça concordando. É só isso que uso. Vestidos iguais, brancos, e simples, papai não deixa que eu use qualquer outra coisa. – Temos que ir. Você precisa ir.

   ―Sei disso. – Ele me ajuda a entrar no barco. Nunca conversamos muito, atravessamos o mar todas as noites juntos, deixamos o barco e caminhamos dez minutos até o local das reuniões. Mesmo assim trocamos meia dúzia de palavras e com o tempo deixei de tentar puxar assunto.

   A casa onde o Salvador faz seus cultos todas as noites é grande, tem uma sala cheia de cadeiras e ele passa todas as noites uma hora inteira falando de como as pessoas devem ser e agir.

   Não tem muitos seguidores. Trinta pessoas no máximo. Não é fácil seguir suas orientações. O homem exige muito. Makaros o chama de lunático.

   Tudo começou com um sonho que ele diz ter tido e depois ele criou esse lugar e umas poucas pessoas o acompanham e meus pais entre essas pessoas.

   ―Podemos ir papai?

   ―Vá cumprimentar Alastor. Alina você sabe que logo virá para cá. Que é aqui que vai morar, será a primeira missionária. Precisa se acostumar com isso.

   Sinto arrepios só de pensar. Makaros disse que eu devia me negar, mas o que faria depois? O homem se aproxima. Me sorri e estende a mão. Eu toco meus lábios de leve na mão fria e sinto algo em mim reclamar.

   ―Damianos, está fazendo um bom trabalho com sua filha. Ela está uma moça muito recatada como deve ser. Continue a educa-la e sabe que serão recompensados.

   ―Alina vive para nosso senhor maior, ela não conhece nada do pecado.

   ―Tem jejuado?

   ―Sim. E feito as orações.

   ―Ótimo. Vão em paz. O tempo de se entregar a fé está chegando. Continue a prepara-la.

   Dessa vez volto para casa tremendo. Não quero viver naquele lugar vazio e triste, não quero pertencer aquele homem de nenhum modo, nem mesmo meu espirito. Meu pai canta canções religiosas toda a volta e depois se deita para dormir.

   Vou para cama. Antes do sol tenho que estar de pé com ele e sem escolha eu me encolho tentando adormecer. Penso nele. No artista e no jeito como ele me olhava. Penso nos olhos dele. Um rapaz tão bonito, alto, com roupas boas, ele deve ser rico, em férias na Grécia, as pessoas vem muito a ilha no verão. Pode ser isso. Apenas isso. Um homem bonito que nunca mais vou ver e mesmo que visse só me traria problemas.

   Me reviro na cama. Está quente e deixo meu quarto na ponta dos pés. Me sento na areia da praia e fico observando a noite. O ar fresco me deixa com sono. Relaxo e fecho meus olhos um momento para sentir a brisa.

   ―Alina! – A voz estrondosa do meu pai me desperta e salto na escuridão. Ele me pega pelo braço. – O que faz aqui? Na praia? No meio da noite? O que está procurando? Acha bonito esse comportamento? Pensa que não sei que sua cabeça fica cheia de sonhos?

   ―Foi o calor papai. Eu não...

   ―Volte para dentro. Vai passar o resto da noite em oração, e vai jejuar por vinte e quatro horas para espantar seus pensamentos.

   Faço o que ele manda. Eu nunca sei se um dia ele pode ir além de uns gritos e me colocar nesse castigo de rezar e não comer. Como não tenho certeza eu apenas aceito obedece-lo.

   Makaros vem cada vez menos me ver, meu pai passa cada vez mais tempo no mar e eu fico cada vez mais sozinha. Todas as manhãs me sento no mesmo lugar. Digo a mim mesma que espero por meu irmão, mas no fundo eu sempre penso se o artista um dia vai voltar.

   ―Pensando nele? – Salto de susto e meu irmão sorri surgindo ao meu lado. Nos abraçamos, como é bom vê-lo. Tem pelo menos um mês que não o encontro.

   ―Não estava pensando em nada.

   ―Sei bem! – Ele me abraça mais uma vez. Quando me sento a seu lado meu estômago reclama de fome. – Jejum de novo? – Seu tom de critica sempre me envergonha. – Por que obedece? Alina ele nem fica aqui para saber.

   ―Se descobrir dobra o castigo.

   ―Vinte anos Alina. Vinte anos. Já dá para enfrenta-lo. – Baixo os olhos, não sei nada do mundo. Meu irmão se arrepende e me abraça. – Trouxe para você. Come.

   Amo os doces que ele me traz. Principalmente chocolates, mesmo que ele diga que normalmente não são assim moles, que isso é por conta do calor.

   ―Obrigada. – Não espero que insista, vou logo abrindo um e comendo, gosto dos dedos lambuzados, parece que dá até mais sabor quando lambo. Ele me sorri, depois o sorriso fica triste. – O que foi?

   ―Fico preocupado com você. Com sua vida. Você sabe, essa coisa de acabar indo parar na casa daquele velho nojento.

   ―Ainda demora.

   ―Não sei, não sei mesmo. Ele queria você como esposa quando tinha quinze anos. Depois quando você só faltou morrer de tanto chorar e implorar e jejuar eles mudaram de ideia e decidiram que vai servir ao tal Deus deles como sei lá o que.

   ―Missionária.

   ―Que significa? – Fico muda. Não sei direito. – Vê? Nem sabe o que é isso, nem ele, essa religião só existe na cabeça daquele maluco e do nosso pai. Como ele está? – Lambo os dedos e abro outro chocolate. – Vai com calma. Quanto tempo está sem comer?

   ―Muito tempo. Ele está bem. Envelhecendo e sei lá, passando mais e mais tempo no mar.

   ―Os Stefanos dão muitas oportunidades aos pescadores. Não precisavam viver assim. Ele ganha um bom dinheiro com a pesca, mas entrega quase tudo para aquele lunático doente.

   ―Como está Thera? – Eu decido mudar o rumo da conversa.

   ―Bem, estamos bem. E o artista misterioso? Nunca mais apareceu?

   ―Nunca. Acho que era um turista.

   ―Tem certeza que não era Luka Stefanos?

   ―Claro que tenho, eu já o vi algumas vezes, ele tem olhos azuis. Dizem que é o homem mais bonito de Kirus, mas acho que o artista que é. – Fico vermelha quando me dou conta que disse em voz alta e meu irmão me abraça rindo da minha vergonha. – Não era o Luka.

   ―Sei lá. A mãe dele é artista, pensei que ele pudesse ser também, além disso veio da praia deles não é mesmo? Essas pedras são difíceis de descer, Luka é bom nisso.

   ―Não é ele eu juro. Que coisa! Por que sempre insiste nisso?

   ―Me assegurando que não está encantada por um cara casado e muito feliz no casamento é o que dizem.

   ―Isso é pecado sabia? Não mesmo. Que horror.

   ―Eu sinto tanto quando as vezes fala como ele? O que eu podia esperar, tenho medo que de tanto ele te pressionar um dia acredite nessa loucura toda.

   Olho para minhas mãos, um último chocolate nelas e fico olhando a embalagem. Não sei se um dia não vou acabar descobrindo que sou como eles. Talvez fosse melhor. Ficar presa nesse mundo sem nem mesmo acreditar nele é um tormento.

   ―Alina. Tem algo que vim dizer e não é fácil. – Olho para meu irmão. Meus dedos tremem. Ele parece tão triste.

   ―O que? – Me encosto em seu ombro. Ele afasta meus cabelos que o vento faz balançar e me beija o rosto.

   ―Tenho que ficar muito tempo sem vir. Se lembra do meu sonho de ir morar e me especializar longe?

   ―Vai embora da Grécia?

   ―Dois anos no Canadá. Eu e Thera. Alina eu sei que fica ainda mais sozinha, mas quem sabe eu consigo um emprego melhor, uma oportunidade de ter uma boa casa para enfrentar nosso pai, interna-lo se for o caso e cuidar melhor de você?

   ―Obrigado irmão, mas eu... eu quero que seja feliz. O papai estragou tudo para você. Casou cedo, foi morar na casa dos pais dela e nunca pode ser feliz aqui, teve que deixar a ilha daquele jeito, por que dia e noite ele ficava atrás de você. Sinto muito por tudo isso.

   ―Não é sua responsabilidade. Nada disso é. Quando voltar será a primeira coisa que vou fazer. Eu vou buscar você.

   ―Dois anos. Acha que vou estar aqui? Tenho medo deles terem me mandado para Atenas com o salvador.

   ―Não chama ele assim perto de mim, me irrita.

   ―É costume. Não vamos mais toda noite. O papai agora passa umas noites no mar. Fiquei uma semana sem ir e quando fui tinha menos gente.

   ―Quem sabe um dia não é o papai despertando? Alina eu tenho que ir, mas escute. Você não é propriedade dele, nem do lunático, você não tem que obedecer assim cegamente. Sabe onde aquela tia da Thera mora. Se lembra? A casa sobre a loja de presentes na rua dos artesãos? – Balanço a cabeça, meu pai me fez ir com ele meia dúzia de vezes atrás do meu irmão lá na casa da tia de Thera.

   ―Lembro direitinho.

   ―Vai precisar ser corajosa, tem que ir lá uma vez na semana, levar notícias suas e pegar notícias minhas.

   ―Ir sozinha? Escondida? – Me espanto. Ele me segura os ombros.

   ―Sim. Ou não vou saber que está bem. E não vai saber se eu estou bem. Promete fazer isso?

   ―Prometo.

   ―Ótimo. Ela vai me avisar, vai te contar como eu estou, quem sabe falamos por telefone? Amo você minha irmãzinha. Venho te tirar daqui. Eu sei que pode mais do que esse mundo pequeno que ele te obriga a viver.

   ―Boa sorte Makaros. Que dê tudo certo. Te amo. – Nos abraçamos, fico chorando enquanto assisto ele caminhar até uma lancha, subir e partir. Só quando a lancha desaparece é que caminho de volta para casa.

   Meu pai chega para o almoço. Escuto o som dos helicópteros chegando a ilha. Indo e vindo. São os Stefanos chegando. Dizem que são uma grande família.

   ―Acho que eles estão se reunindo para o natal. – Digo distraída olhando para o teto da casa como se assim pudesse ver os helicópteros.

   ―Desafiando Deus com essas máquinas de voar. Rindo dele. Um dia o inferno vai receber todos os infiéis.

   ―Eles são bons papai. Ajudam pessoas.

   ―Não sabe de nada. Nem desconfia. São ricos, são donos de tudo e não respeitam Deus. Já fizeram o casamento de duas moças. Ouviu o que eu disse? – Balanço a cabeça afirmando. – É talvez o maior dos pecados. Uma com a outra. Usando roupa branca. Símbolo da pureza. Como você usa. – O tempo todo eu penso. – Ainda bem que está protegida aqui. Longe deles.

   ―Papai. O amor... o amor é bonito. – Os olhos dele cintilam em sua fúria. Ele vem em minha direção cheio de rancor. Como se tivesse dito algo sujo e feio. Me assusta e me encolho.

   ―O que está dizendo? – Ele grita.

   ―Que as pessoas... que o senhor de todas as coisas deve achar que o amor é sempre bonito. Ele deve salvar as pessoas. Tirar da escuridão e do medo. Que as pessoas podem ter um amor como esperança.

   ―Eu te afastei de tudo e de todos para não se macular com esses pensamentos impuros e para que? Chega! Vá se recolher. Faça uma vigília em oração toda a noite e não vai comer até o sol se pôr amanhã. Peça perdão pelos pecados dos pensamentos sujos.

   ―Sim senhor. – Vou para o quarto, só tem uma cortina fina nos separando e me ajoelho ao pé da cama, mas não rezo, ao contrário disso eu choro, choro por que me sinto sozinha e perdida. Por que não tenho nem mesmo um amor como esperança de sair desse mundo que temo muito mais do que respeito.


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Notas finais do capítulo

Beijosssss