Sasuke,

Talvez eu soubesse desde o início, talvez sentisse desde o princípio, talvez fui tola em negar meu lado cético ou simplesmente a Fortuna tenha brincado com o nosso destino e tudo tenha acabado assim...

Talvez... tantos talvez... Mas tudo segue o mesmo fim.

Talvez a famosa frase de que "os fins justificam os meios" não seja tão verdadeira quando só há um final a seguir. Pois, seja qual for o nosso meio, o nosso final diz tudo aquilo que já sabíamos desde o início. Diz que não fomos feitos para casar.

Não fomos feitos para véus e grinaldas.

Não fomos feitos para votos.

Não fomos feitos para dividir uma cama.

Não fomos feitos para acordar com beijos e você me dizer que volta à noite.

Não fomos feitos para cercas brancas.

Não fomos feitos...

Por isso te escrevo essa última canção de amor, enquanto atravesso essa porta que por tantas vezes foi a testemunha de nossas entradas trôpegas, de nossos beijos roubados, de nossos sorrisos tolos.

Enquanto te escrevo e caminho por essa selva encoberta de torres cinzentas, o volume daquele Jameson que guardamos por tanto tempo, diminui gradativamente...

Não lhe canto uma música alegre como tantas vezes você foi testemunha diante do meu piano negro, enquanto seu raro sorriso destoava de seus lábios finos e a calça jeans rasgada pendia do seu quadril.

Música é o amor? Talvez, mas hoje ela não canta um final feliz. Talvez... ela nunca tenha cantado...

Não mancho esse simples papel com as minhas lágrimas inexistentes, mas a preencho com meus pensamentos enquanto o trem parti para fora da cidade.

Fomos tolos Sasuke. Hoje eu sei, pois, olhando pela janela vejo o céu nublado e entendo que nunca cantamos o amor. Como poderíamos cantar um final feliz se até em cantos Shakespearianos não há finais felizes?

Não fique triste. Não se preocupe comigo Sasuke, pois tenho tudo o que preciso aqui.

Tenho minhas palavras e suas lembranças.

Ainda sinto o formigamento do seu toque em meu rosto.

Ainda ouço suas palavras sussurradas ao pé do meu ouvido sobre um futuro que nunca chegará.

Não se preocupe, pois nunca compraremos uma mesa que nunca iremos sentar. Nunca compraremos louças ou luzes de vitrais. Nunca vou escolher a sua gravata. Pois, não fomos feitos para um futuro, apenas para o presente e hoje, o presente é o nosso passado.

O trem está parando e desço para a plataforma com os saltos ecoando solitários mesmo com a multidão ao meu redor.

Com os passos ininterruptos sigo em frente, em direção ao meu destino enquanto termino de escrever minha última canção de amor para você.

Talvez você se pergunte se eu chorei e eu te respondo que sim. Chorei e minhas cristalinas lágrimas eram suas, somente suas e de mais ninguém, pois era o seu rosto sereno que preenchia meus pensamentos enquanto elas rolavam solitárias sobre minhas faces rosadas sem o auxílio de seus calejados dedos para romper seus trajetos.

Se você perguntar se sinto saudades de você, te respondo com antecedência e sinceridade que sim. Que sinto falta de nossas piadas bobas, de como você sorria apenas para mim, de como você me tocava, me beijava, me amava.

De como deixávamos a cama tão desarrumada e adormecíamos com as pernas entrelaçadas e meu rosto de encontro ao seu peito de batidas tão calmas.

O mundo parecia infinito naquela época, mas hoje sabemos o quão limitado somos e que só as lembranças nos restam no fim.

Acredite Sasuke, sinto saudade até de nossas brigas tolas, pois nossas reconciliações eram a melhor parte do nosso dia.

Talvez essa canção – para as pessoas que por ventura leiam – seja a prova de que merecemos um final feliz e cercas brancas, mas ao finalmente parar os meus passos e erguer meu olhar dos meus últimos versos, eu finalmente vejo a prova de que nunca teremos um final feliz.

Pois eu vejo a sua lápide.

Negra, brilhante e tão imaculada, assim como seus olhos e meu piano eram para mim.

Eu vejo a única lembrança que restou da sua existência depois de me abraçar e receber a bala em seu peito. Receber a bala que aquele ceifador direcionava para mim, não para ti.

Eu me lembro do seu último sorriso, daquela promessa silenciosa de que tudo ficaria bem enquanto seu corpo perdia as forças sobre mim.

Eu acreditei em seu sorriso como eu sempre tinha acreditado antes, mas você não cumpriu sua promessa; mas eu, diferente de você, cumprirei a minha e te entregarei minha última canção de amor.

Desculpe não trazer aquelas flores que você tanto me presenteava.

Desculpe por não ficar por muito tempo.

Desculpe por isso, mas antes que a chuva caía, apenas te entregarei, em um papel simples e dobrado, a minha última canção de amor.

Desculpe meu amor, mas está na hora de partir. O próximo trem já vai partir e eu estarei nele, rumo ao desconhecido, mas com você em meu coração...