Uma das coisas mais complicadas nos homens é a dificuldade em compartilhar seus sentimentos. A grande maioria de nós prefere ignorar o que chamamos de “pensamentos irritantes”, principalmente quando eles envolvem alguma garota. Claro que alguns aprendem que omitir os próprios sentimentos pode resultar em algumas conseqüências horríveis e acabam, pouco a pouco, optando por compartilhar aquilo que todos os adolescentes do sexo masculino se recusam (na maioria das vezes) a admitir que tem. Com a conquista da maturidade, o homem vai quebrando esse bloqueio e percebendo a estupidez que pensava há pouco tempo atrás. Em alguns casos, percebemos que sentimentos não foram feitos para serem mantidos para si mesmo um pouco mais cedo, geralmente quando nos apaixonamos pela primeira vez. Este último é o meu caso.

Antes de tudo vocês precisam entender que não é fácil ser eu. Meu sobrenome, antes respeitado, agora é tratado como um sinal de que eu sou um lixo humano. Draco Malfoy, meu pai, não é do tipo que se sentou comigo para me preparar caso eu acabasse me apaixonando por alguma garota em Hogwarts. O pior de tudo é que eu acabei me apaixonando justamente pela única garota que ele me mandou ficar longe, isso foi uma obra cruel do destino.

Decididamente não foi minha culpa! Rose Weasley é uma garota fácil de você se apaixonar, digo isso pela quantidade de caras que eu vejo no castelo, irritados por terem sido rejeitados pela ruiva. Para ser sincero, eu não havia notado Rose até a segunda semana de aula no nosso primeiro ano em Hogwarts. Ali eu já era desprezado por praticamente todo mundo do castelo, menos por Albus Potter, que se tornou meu melhor amigo, e sua prima Rose Weasley, que acabou se tornando... Bem, vocês já sabem.

A pior parte de ter se apaixonado pela garota mais popular e desejada da escola? Bem, podemos dizer que as pessoas não costumam ser nada gentis nos comentários quando me vêem conversando com Rose. Todos parecem ter assumido a missão “Lembrar ao Malfoy que ele NUNCA poderia se envolver com a perfeita Rose Weasley”, tenho que admitir que isso é muito frustrante. Tudo isso por causa de uma guerra na qual eu nem era nascido! Por causa de um maldito sobrenome que eu não pedi para ter, mas aprendi a ter orgulho de carregar, mesmo com todos os olhares de desprezo.

Até o final do meu sexto ano em Hogwarts, eu ainda conseguia aguentar tudo. Eu parei de me importar com a opinião dos outros e fiz mais amigos pela escola, minhas notas estavam altas, me tornei capitão do time da Sonserina, me envolvi com algumas garotas. Mas tudo desabou durante uma conversa rotineira com meu melhor amigo.

Era sábado de manhã. Eu e Albus estávamos nos preparando para ir à Hogsmeade com Rose e cumprir nossa tradição dos finais de semana em que passávamos o dia juntos conversando sobre trivialidades. Eu adorava aquela tradição que começamos no terceiro ano, simplesmente era ótimo ficar ali com as duas pessoas que eu mais gostava na escola. Mas foi naquele dia que Albus, pela primeira vez, cortou minha animação.

— Acho melhor irmos logo então. – Albus disse levantando-se da mesa durante o café da manhã.

— Por que a pressa? Rose ainda nem desceu para comer. – Indaguei ainda sentado, olhando para a mesa da Grifinória para me certificar que a ruiva não estava lá.

Albus me olhou de uma maneira estranha, parecia até que... Ele sentia pena de mim.

— Rose vai sair com John Wood hoje, cara. – Ele sentou-se novamente de frente para mim apoiando o rosto em uma das mãos. – Achei que você sabia, toda a escola está comentando sobre.

Eu quase pulei do banco surpreso. Rose nunca, nunca, havia aceitado sair com qualquer pessoa que não fosse eu e o Albus antes.

— John Wood?! O Monitor-Chefe? – Eu praticamente berrei, o que era um ato totalmente incomum para mim. – Mas ele é mais velho que ela e...

— Ele está no sétimo ano, Scorpius. Ele é apenas um ano mais velho que a Rose. – Albus me cortou, ele falava com uma voz entediada. Como diabos ele não percebia a gravidade daquilo?! – Por que você está fazendo escândalo por isso?

Eu levantei encarando-o sério. Minha expressão deveria estar muito furiosa porque aquilo fez Albus sorrir discretamente, ele sempre sorria daquela maneira quando tinha sucesso em provocar alguém, mas eu me envergonho em admitir que estava sem racionar direito e não lembrei desse pequeno detalhe naquele momento.

— Eu não estou fazendo escândalo! – Eu me virei e fui em direção a saída pisando forte, Albus ainda tentou me chamar, mas eu apenas o ignorei e continuei sem olhar para trás.

Eu não iria deixar aquilo acontecer, não mesmo! Sai quase que correndo pelas enormes portas duplas do Grande Salão furioso e esbarrando em vários estudantes no processo.  O ultimo desses “alvos”, porém, me segurou pelo braço impedindo que eu continuasse meu caminho em paz.

— Opa garanhão! Pra onde vai com toda essa alegria? – Me virei zangado para a garota ruiva que me segurava já sabendo quem era.

Dominique Weasley era a pessoa mais irritante que eu conhecia, mesmo que Rose conseguisse superá-la em certas ocasiões. A diferença era que eu irritava Rose de volta facilmente quando ela começava. Já contra Dominique eu nunca conseguia vencer em argumentos ou qualquer outra coisa, e ela se aproveitava disso sempre que podia. Apesar de tudo, acabamos nos tornando amigos graças as intervenções feitas por Albus.

— Oi Dominique, não tenho tempo pra te aturar agora, preciso ir ao... – Falei tentando soltar meu braço, mas ela segurou mais forte.

— Dormitório da Grifinória? – Ela completou sorrindo sarcástica, eu ODIAVA quando ela sorria daquela maneira, aquilo significava que ela estava planejando algo. – Se vai atrás da Rose, pode ir desistindo da idéia. Ela está ocupada se preparando para sair com o John agora.

Eu a encarei sério.

— Até você sabe disso? Mas que inferno, como eu sou o único a não saber?  – Resmunguei passando a mão nos cabelos, completamente nervoso.

Ela pareceu ofendia, fazendo pose com a mão no peito fazendo uma falsa imagem de indignação.

— Claro que eu sei disso, quem você acha que arquitetou todo o romance dos dois? – Ela parecia orgulhosa enquanto falava, mas mudou a expressão quando percebeu a maneira que eu a encarava. – O que foi? Não é minha culpa se você é lerdo e só percebe o que tinha quando perde.

— Do que diabos você está falando? – Reclamei confuso, entender Dominique era praticamente impossível na maioria das vezes.

Dominique suspirou e saiu me puxando pelo braço até um dos corredores vazios, de onde aquela garota maluca tirava tanta força eu não fazia idéia, mas acabei desistindo de lutar contra.

— Ok Malfoy, pode falar o motivo de você querer ir perturbar a Rose quando ela está pra sair com um cara legal pela primeira vez? – Ela disse quando finalmente paramos em um corredor vazio.

— Motivo? Eu não preciso de um motivo, ela simplesmente não pode sair com aquele cara! – Disse impaciente, aquilo estava me fazendo perder tempo.

— E por que ela não pode? – Ela perguntou me olhando curiosa, como se estivesse me incentivando a continuar.

— Por que...Bem...É que... – Então eu travei, irritado, e pelo sorrisinho de Dominique, completamente vermelho.

Por que ela não podia? Se você me perguntasse algumas semanas depois, eu iria responder facilmente, mas naquele momento eu estava tão confuso quanto Albus em uma prova prática de Poções (Os quatro caldeirões derretidos de Albus provam o quanto ele é horrível nisso).

A verdade é que eu nunca tinha parado para pensar na possibilidade de Rose sair com outro cara que não fosse eu. Sei que pode parecer estranho, mas éramos sempre nós dois juntos e isso parecia um cenário que nunca iria mudar. A idéia de Rose saindo com outro cara enquanto eu ficava sozinho nos finais de semana me assustou, ela sempre pareceu tão presente, tão próxima, tão minha...

— Você acabou de ter aqueles momentos clichês onde percebe o que já deveria saber a muito tempo? – A voz da ruiva irritante me tirou dos meus devaneios. Ela me olhava sorrindo de verdade agora, o que me fez sorrir minimamente.

— Cale a boca Weasley, tenho que ir. – Me virei e comecei a correr com a gargalhada de Dominique Weasley como tema de fundo.

— Malfoy! A senha é Veneno de Escorpião.— Dominique gritou quando eu já estava virando a esquina do corredor.

Veneno de Escorpião... Irônico não é?

Então eu corri como nunca tinha corrido na minha vida em direção ao dormitório da Grifinória. Provavelmente eu assustei alguns calouros que passaram por mim enquanto eu gritava para que eles saíssem da frente enquanto corria, mas não me importei, na verdade nada mais importava.

Quando eu cheguei à entrada da passagem para o dormitório, lembrei que o quadro me odiava.

Eu acabei esquecendo de mencionar que a Mulher Gorda me odeia certo? Bem, acontece que ela odeia todos os sonserinos naturalmente por causa da velha rivalidade entre as casas, mas parecia que ela nutria algo especial por mim. Então quando eu cheguei ofegante da corrida, ela me olhou com desprezo antes de comentar:

— Olha só, quanta deselegância. Os sonserinos são sempre assim? – Eu ignorei a ironia na voz da pintura.

— Hoje não vim para discutir com você, embora me sinta realmente tentado. – Ok, eu admito que gosto de provocar a pintura, não me julguem! Nunca disse que minha maturidade englobava brigar com pinturas.

Mas quem disse que o maldito quadro é da paz?

— Não importa. Você não passa daqui sem saber a senha. – Ela olhou pra mim com arrogância. – Escolhi exclusivamente para você nunca descobrir.

Foi minha vez de sorrir arrogante, a sensação de vitória é ótima sabiam?

— Veneno de Escorpião, maldita velha gorda...— Sussurrei a ultima parte para que ela não se irritasse mais do que já havia.

— Malditas crianças burladoras de regras! Por que alguém em sã consciência daria a senha a um sonserino? – Ela reclamou, mas abriu passagem permitindo que eu entrasse.

Para seu azar, Dominique nunca está em sã consciência. Engole essa seu maldito reduto de poeira.

Não era a primeira vez que eu entrava no Salão Comunal da Grifinória, então não fiquei surpreso em encontrar o local aconchegante como sempre, embora estivesse vazio com exceção de uma garota ruiva que sentava em uma poltrona próximo a lareira. O olhar distraído focado nas chamas da lareira com a expressão serena no rosto, a mesma que ela sempre fazia quando estava lendo um livro e esquecia tudo ao seu redor (Não que eu fique olhando-a quando ela está distraída).

Eu não sei o que me deu naquele momento, mas eu não consegui me mover ou falar algo. Passei alguns minutos só olhando para aquela garota que era o motivo de toda a bagunça que meus sentimentos tinham se transformado. Como eu nunca tinha cogitado a idéia de perder aquela garota? Ela é simplesmente perfeita, é claro que alguém logo insistiria tanto que ela aceitaria. Talvez um monitor-chefe fosse realmente a melhor opção para ela, como um Malfoy conseguiria competir contra toda uma legião de admiradores?

Então eu tomei a decisão que eu considero a mais estúpida que já tomei, eu me virei desistindo pronto para sair dali antes de cometer um erro. Foi justamente fazendo isso que Rose finalmente me notou ali.

— Scorpius? – Chamou. Eu não me atrevi a olhar para trás, sabia que se olhasse eu não conseguiria sair dali. – Por que demorou tanto?

É, não deu pra aguentar depois disso.

— Demorei? Você estava esperando que eu chegasse para poder sair? – Perguntei irritado, sei que não é legal agir assim, mas não deu pra segurar.

Rose, por outro lado, fez uma expressão de pura confusão para logo depois sorrir gentilmente como fazia quando eu ou Albus contávamos uma piada.

— Claro que sim, hoje é sábado não é? Dia de sair e tal... – Rose mantinha o sorriso no rosto, ela levantou-se da poltrona e aproximou-se de mim a passos lentos. – Algo errado?

Para cada passo que Rose deu em minha direção, eu dei dois aproximando-me dela. Estava farto de tudo aquilo.

— Você não pode sair com aquele idiota Rose! Não enquanto não ouvir tudo que eu tenho para dizer. – Eu respirei fundo, estava em um nível de nervosismo fora do comum, mas sabia que não teria outra oportunidade de falar tudo que eu mantinha escondido até de mim mesmo.

Rose Weasley, porém, parecia não querer ajudar.

— Scorpius, o que diabos você está... – Eu a cortei, agora eu não iria parar.

— Rose! Só me deixe falar agora. – Meu olhar a fez se calar, coisa que só acontecia quando ela percebia que eu estava mortalmente sério. – Olha Rose, eu não posso deixar você sair com John Wood, não me importa se o cara é monitor-chefe ou capitão do time de quadribol, não me importa se todos dizem que vocês são perfeitos um para o outro, não me importa se todos dizem que ele é três vezes melhor que eu. Eu não vou mentir para você nem para mim mesmo, eu não tinha certeza sobre o que eu sentia por você até poucos minutos atrás, mas eu sinto que se eu não falar agora eu não terei outra chance.

Rose me encarava boquiaberta completamente confusa, minha consciência gritava para que eu parasse com aquilo, mas eu estava cansado de deixar para um possível futuro. Eu entraria naquele jogo e apostaria tudo.

— Scorpius, você não... – Eu ergui a mão para interrompendo-a, eu não deixaria nada me parar agora.

— Rose, me deixe terminar! – Meu peito doía, tamanha era a velocidade e força que meu coração batia naquele momento, eu nunca havia ficado tão nervoso antes. –  Se você vai mesmo dar uma chance para John Wood, pelo menos eu vou garantir que você saiba que eu estou completamente apaixonado por você!

Rose aproximou-se outro passo de mim, agora estávamos praticamente colados. Eu senti uma angústia enorme quando vi seus olhos cheios de lágrimas.

— Scorp... –Ela tentou outra vez, mas eu aproximei mais meu rosto do dela. Em algum momento eu teria que pensar que ela ficaria muito irritada depois quando lembrasse quantas vezes eu a cortei.

— Rose, talvez eu possa me arrepender das conseqüências do que farei, mas não vou me arrepender de fazer isso agora. – Eu disse determinado. Mas eu não consegui beijá-la como eu queria, eu me envergonho em dizer que travei por alguns segundos ali.

Felizmente, eu não precisei fazer ou falar mais nada, pois foi justamente Rose quem quebrou a distância entre nós. Eu já tinha ficado com algumas garotas antes, mas nunca, nunca, havia sentido as famosas (e mais clichês impossíveis) borboletas no estômago. Eu não sei quanto tempo aquele beijo durou para ser sincero eu meio que perdi a consciência durante o processo. Quando voltei a mim, Rose havia se afastado e me olhava de maneira divertida.

— Acho que finalmente descobri uma maneira eficaz de fazer você calar a boca. – Ela sorriu com as bochechas coradas, aquilo me fez rir.

Eu mantive minhas mãos na cintura dela, puxando-a mais pra perto. Até parece que eu correria o risco dela se afastar.

— Isso quer dizer que você não vai mais sair com John Wood? –Perguntei esperançoso, louco para eliminar aquela aflição que me perturbava desde o café da manhã.

Rose gargalhou com gosto e me abraçou, aproveitando que eu era levemente mais alto que ela, Rose escondeu o rosto na curva do meu pescoço, de modo que sua respiração quente batia diretamente na minha pele me fazendo tremer na base (Quem já passou por isso sabe como é bom)

— Era sobre isso que eu estava tentando falar. – Sua voz soou um pouco abafada, mas eu ainda conseguia reconhecer o tom divertido característico dela. – Eu não faço a mínima idéia do que você está falando sobre John Wood, eu não falo com ele há meses.

Eu me afastei dela, precisava encará-la diretamente para me certificar que ela não estava mentindo. Para minha surpresa ela estava segurando o riso.

— Não faz sentido. Você demorou mais que o normal para descer – Eu resmunguei desconfiado. – Albus e Dominique me falaram que você ia sair com ele hoje, foi por isso que vim aqui correndo e quase atropelei alguns calouros pelo caminho.

— Eu só demorei porque Dominique disse que você queria falar comigo a sós, até mesmo Albus disse que não iríamos a Hoagsmead hoje. – Ela passou a mão nos meus cabelos, arrumando-os. Era um costume dela que eu adorava. – Pensando no resultado disso, não sei se fico feliz ou triste por terem armado para nós.

Eu baixei a cabeça envergonhado, de repente me senti o maior idiota possível. Aquele era um dos planos idiotas e maldosos que só poderiam ser pensados por Albus e Dominique juntos.

— Bem, o resultado é o que importa não é? – Disse baixinho, porém Rose estava próxima o suficiente para ouvir e rir.

— Sim, agora venha e vamos aproveitar o resto do dia, temos muito que fazer. –Ela disse me puxando pela mão até a passagem do salão comunal.

— Muito que fazer? – Indaguei curioso enquanto tentava a todo custo não tropeçar.

Rose virou-se para mim e sorriu. E garanto a vocês que aquela foi uma das visões mais bonitas que já vi.

— Sim, ninguém arma pra cima do meu namorado e sai impune. – O comentário dela saiu com um tom malicioso que me fez ter pena dos dois. – Uma boa vingança leva tempo e requer um bom ambiente para ser planejada.

Eu até pensaria em que tipo de vingança ela estava pensando, mas minha mente congelou e ficou repetindo apenas uma frase na minha cabeça, essa frase me fez sorrir feito um idiota provavelmente.

— Seu namorado, Weasley? – Perguntei provocando-a.

Rose ficou completamente corada quando percebeu o que disse, mas tentou manter a pose apesar de quase gaguejar na resposta.

— Sim, não me faça me arrepender disso, Malfoy. – Ela respondeu me puxando enquanto eu a abraçava de lado para que continuássemos nosso caminho.

Eu não consegui evitar o sorriso enquanto andávamos lado a lado. Eu me vingaria de Albus Potter e Dominique Weasley, mas não antes de agradecê-los, é claro.