Amy! escrita por Kcoruja


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Oh god! Finalmente consegui postar o capítulo, vocês não imaginam o trabalho que deu. Mas finalmente estou aqui... Espero que gostem.



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Com o papel que Jorge tinha me dado em mãos eu procurava insistentemente o número escrito. Fazia algumas horas, que eu estava procurando essa rua.
Um jeito ruim se apossava do meu ser, talvez fosse fome ou um mal presságio, senti isso ontem, antes de encontrar o Ricardo. Talvez não fosse tão ruim, não pude evitar o sorriso e as lembranças.
" Não, eu preciso esquecer, eu vou esquecer tudo."
Andei por mais algum tempo pedindo informações, eu precisava encontrar a casa escrita no papel, estava escurecendo, eu precisava de um lugar para dormir e alguém para falar sobre qualquer coisa, esse insistente diálogo sem resposta ecoava na minha cabeça enlouquecendo e me derrotando a cada frase de acusação que o meu grilo falante bradava, assim como Pinóquio eu quero mata-lo, custe o que custar.
Quando finalmente achei a rua e o número da casa a coragem me faltou, e se Jorge fez isso só por educação? E se o endereço estiver errado? E se? E se? Inúmeras possibilidades invadiam minha mente me fazendo fraquejar. Não, eu definitivamente não trabalho com teorias não posso fazer isso, não com a vida que escolhi.
Num momento de coragem extrema apertei a campainha da pequena casa amarelada de portão azul desbotado, não demorou muito uma mulher de cabelo bagunçado e calça de moletom apareceu com suas inúmeras rugas na porta a alguns metros de distância, ela gritou com voz estridentente e tediosa.
" Eu não quero comprar o que for que você estiver vendendo."
Disse isso e foi se virando.
" Espera! O Jorge? O Jorge está?"
" E que você quer com o meu marido garota?"
" Ele me deu esse endereço, falou que era para procurar ele quando eu precisasse."
" Ah não! Era só o que me faltava, você também é filha dele?"
" Não, não, eu conheci ele na estrada a poucos dias, ele é um homem especial!"
O rosto preocupado da mulher se transformou em uma carranca horrosa ela caminhou a passos pesados até onde eu estava, abriu o portão com uma força desnecessária me assustando me fazendo dar dois passos para trás, ela ergueu o dedo indicador no meu nariz e começou a gritar.
" Escuta aqui sua vadiazinha de beira de estrada, eu não quero saber de você vindo aqui procurar o meu marido, novamente, ele é casado. Tem familia, mulher e filhos, isso não vai ser estragado por uma puta qualquer que vem procurar ele, você não é a primeira, se aparecer aqui de novo eu te mando para o hospital como todas as outras."
No susto e vergonha, eu abri a boca varias vezes sem saber o que dizer, os vizinhos estavam na rua olhando para nós duas esperando um espetáculo que eu sei que eles já presenciaram varias vezes.
"A senhora está enganada, me desculpa, mas o Jorge é meu amigo."
" Olha aqui sua quenga, aprendiz de ramera. Homem casado não tem amiga não, some daqui antes que eu desça a mão na tua cara como você merece, sua Piranha."
Eu não tinha mais cara para ficar ali, quando Jorge disse que a mulher dele era ciumenta e rabugenta eu nunca imaginei que fosse a esse ponto, ela me humilhou em público sem nem se preocupar em me escutar.
Sai correndo dali segurando as lágrimas que escorreram assim que ouvi os aplausos dos vizinhos, meu Deus, como pode, só tem gente louca aqui, só pode. Como algum ser humano é capaz de se divertir com alguém sendo humilhado? A dor e a vergonha não valem mais nada hoje em dia? Onde foi parar o caráter e o senso de amor ao próximo? Você está em outra cidade Amy, não pode querer que as pessoas sejam iguais as que você conheceu até aqui. Minha mente repetia insistentemente essa triste realidade enquanto eu caminhava em direção a qualquer coisa.
Meus pés pediam clemência quando parei e me deixei cair sentada na calçada, eu estava perdida mesmo. Andar mais só ia piorar a situação. A rua escura pela falta de iluminação me dava a certeza de estar vivendo um pesadelo. Eu estava com fome e necessitava de um banho ou alguém para conversar, falar sozinha já não adiantava nada só me dava a mais plena certeza que eu enlouqueci, pirei mesmo, não tem saída, não tem 48h que eu estou na estrada e já enlouqueci completamente, falo sozinha, e pior respondo minhas próprias perguntas, estou fedendo e todos os planos que fiz para esse momento parecem idiotas agora, Por que diabos mesmo eu fugi de casa?
" Você quer mais do que pode ter, mas isso não te impede de buscar."
O susto que tomei com a voz que respondia minha pergunta interna, só não foi maior do que o que tomei com a mulher magra, quase esquelética de dreadlook's e tatuagem estranha que cobria metade do rosto dela e descia pelo pescoço, destacando ainda mais o rosto seco dela. Ela sorriu e se sentou ao meu lado, por instinto cheguei meu corpo para o lado, no segundo que fiz isso me arrependi e me aproximei novamente. Com uma seda na mão em silêncio ela enrolava um cigarro. Ela é ou já foi bonita algum dia, talvez a beleza estivesse escondida em algum lugar entre os alargadores enormes na orelha e os piercings. Quando viu que eu não ia falar nada ela parou de fazer o que estava fazendo e me olhou, aqueles olhos negros me encaram sem expressão nenhuma por alguns segundos mas depois assumiram uma expressão de quem se desculpa. Eu acho que enlouqueci, mas agora os olhos dela eram de um verde escuro, onde foram parar a negritude deles?
" Eu sou Afilhada da bruxa, mas não precisa ter medo, não vou fazer nada com você, você já fez tudo. O mal vai vir aos poucos, então não tem por que ter medo de uma doida que acredita em bruxas."
E se calou e voltou a prestar atenção na seda, enrolou mais um pouco e selou o papel com saliva. Eu não conseguia fazer minha mente funcionar, como assim essa doida tá lendo a minha mente?
Ela observou o embrulho alguns segundos e me olhou novamente.
" Tem fogo ai?"
Eu pensei em negar ou talvez sair correndo, mas por fim assenti e peguei o meu velho isqueiro e ofereci a ela. Eu não tinha certeza de nada mesmo, então fazer tentar amizade é o certo.
" Gostei do cabelo."
Enquanto acendia o cigarro ela me olhava com aqueles olhos que eu não conseguia descobrir se eram verdes ou pretos. Ela tirou o cigarro lentamente dos lábios e depois de um tempo soltou a fumaça com cheiro de mato seco queimado.
" Não gosta não, acha eles sem noção, mas relaxa, não tem que ser bonitos, é uma crença, não modismos. São poucas as pessoas que sabem o significado de um dread."
"Eu não sei, mas queria de entender."
"Não, você não quer, só quer ter alguém para conversar, quando você quiser realmente saber eu te explico."
Ela disse me olhando fixamente e por fim me entregou o isqueiro e o cigarro em seguida. Peguei o objeto e joguei no bolso. Negando o cigarro.
" Eu não fumo, não sei fazer isso."
" É fácil, eu te ensino, é só sugar o ar pela boca e prender alguns segundos."
" Não, obrigada!"
" Qual é garota, fez proed foi? Pra quem fez o que você tá fazendo não existe moral, anda logo, isso não vai te matar."
Minha mente deve estar me pregando uma peça só pode, como assim? Do nada aparece uma menina que me assusta e se diz parente de bruxa e fica falando como se soubesse quem eu sou. Por alguns segundos tenho certeza total que enlouqueci, assim como Dom Quixote, mas ao invés de dragões eu vejo bruxas. Então ela me cutuca me obrigando a voltar a realidade.
" Pega que eu leio a tua sorte."
"Eu não acredito nisso."
" Acredita sim, todo ser humano acredita e quer saber o que o futuro tá preparando. Pega logo."
Eu peguei, por uma curiosidade mortal eu peguei, não era vontade de saber o futuro, ou talvez fosse mas não totalmente, o que me movia mais enquanto eu pegava aquele cigarro de maconha era a curiosidade de saber se a tal "brisa" é real. Vontade de saber como é.
A ideia de uma bruxa me dizendo o meu futuro é muito interessante, talvez mais uma forma de pesquisa para o meu conhecimento humano, se ontem eu decidi conhecer coisas diferentes essa é muito diferente.
Enquanto o papel tocava a minha boca, uma vontade estranha de dar ânsia tomava meu corpo, eu nem tinha dado nenhuma tragada, estava esperando a coragem chegar, e então ela veio de repente e avassaladora, e eu traguei. Suguei a fumaça fedida de gosto ruim, minha vontade era tossir até que meus órgãos saissem pela boca mas eu me neguei, um sorriso bizarro se formava no rosto da menina me dando medo mas criando uma forte excitação, eu estava fazendo algo que é errado um crime. Prendi o ar até que a vontade de cuspir meus rins tossindo fosse insuportável, e então soltei o ar pela boca e comecei a tossir. A menina riu e disse simplesmente.
" De novo, você fez errado solta pelo nariz."
Na enorme adrenalina de fazer algo errado eu repeti, dessa vez a vontade de tossir não veio tão forte, e eu aguentei, soltei o ar mas dessa vez pelo nariz, ouvi as palmas e me permiti sorrir com orgulho, então era só isso? Entreguei o cigarro para ela e ficamos alguns minutos em silêncio revezando a posse do cigarro, eu me sentia bem e feliz de uma forma estranha, algo em mim gritava que eu fiz uma merda muito grande mas outra se sentia bem pelo momento. Quando a última tragada foi dada, a menina que só então eu notei ser uma mulher com seus vinte e muitos me olhou e com toda calma me disse.
" Não sou rastafári, sou simpatizante digamos assim, eles são meio caretas, cheios de pode, não pode, isso não é para mim. Uso os dreads não por ligação ao corpo ou a Jah, uso por que gosto. Mas sou realmente afilhada da bruxa, vem, vou te levar até ela. Tenho certeza que ela vai gostar de te conhecer."
"Esse negócio de bruxa é real mesmo?"
Ela deu uma larga risada enquanto se levantava, me fazendo levantar também, tudo que eu não quero é ficar sozinha, não quero ficar sozinha aqui e nem com meus pensamentos. Achei que antes de terminar o cigarro eu ia ter alucinações bizarras mas pelo jeito sou imune a isso. Enquanto andava minha mente teimosa insistia em me lembrar as coisas e escolhas erradas, mas por algum motivo estranho eu não me sentia mal ou sei lá o que mais eu pudesse sentir, eu estava tranquila e feliz, relaxada a ponto de não me preocupar que essa garota esteja me levando para a morte certa, espera e se ela estiver me levando para a morte? Você não queria isso? Coisas diferentes? Então, morrer vai ser uma coisa que você nunca fez. Ignorei o tom de sarcasmo que minha mente usou e me deixei sorrir, ou rir não tenho certeza. A mulher a minha frente me olhou e sorriu de volta como se lesse meus pensamentos, mas isso é impossível certo? Não existe ninguém com essa capacidade apenas os x-mens mas eles não existem, ou existem? Por que eu não tenho mais certeza de nada?
" Chegamos."
Ela entrou por um corredor largo e escuro, eu não conseguia enxergar nada, apenas conseguia ouvir o som seco dos nossos passos me garantindo que estávamos em movimento. Ela parou e deu três batidas ritimadas numa porta de madeira, logo depois a porta se abriu, ela entrou falando um monte de coisa, que minha mente não conseguia entender nem a metade. Eu não sabia se entrava ou esperava, acho que como ela estava virada para a porta a tal bruxa estava esperando, então entrei no local pouco iluminado, eu não conseguia observar nada, por que tanta escuridão, é para esconder os corpos ensanguentados? Com toda certeza do mundo, o seu é o próximo.
Me peguei imaginando as bruxas feias da ficção, me preparei para ver uma mulher com cabelos desgrenhados, verrugas e um enorme nariz, dentes faltando ou sobrando, me preparei para caldeirões que fervem eternamente alguma poção, um gato preto e vassouras que varrem sozinhas. Me preparei para tudo que os livros e filmes dizem que são reais, mas então a luz se ascendeu, me cegando por alguns segundos, com toda certeza eu não estava nenhum pouco preparada para o que vi, nem corpos ensanguentados, nem caldeirões. Era uma casa normal, comum e sem nada de mais, nenhum velho livro de magia, nada, nada do que imaginei, nem o gato que ressonava tranquilamente com as patas esticadas na almofada em cima de um puff era preto, um gato amarelo com cores variadas se espalhando. Poxa se a mulher é uma bruxa não podia ao menos ter um gato preto? Os livros não são reais Amy, você sabe disso, agora para de ser essa criança mimada que a Júlia era.
OK subconsciente, entendi.
Elas ainda conversavam tranquilamente me deixando terminar a análise, quando guardei todos os detalhes do local me permiti olhar a Bruxa, ela facilmente teria uns quarenta anos, cabelos bem cuidados mas com alguns fios brancos perdidos pela extensão dele, ela parecia tranquila enquanto eu a observava, de perfil ela parecia normal, comum demais, ela não é bruxa não pode ser, a pele morena e os olhos castanhos denunciavam algum tipo de ligação indígena facilmente.
Então ela se virou para mim e me sorriu, foi então que o susto veio, não tinha verrugas, mas em compensação tinha uma tatuagem enorme e idêntica a da garota que me trouxe aqui.
" Ivone, ela é Ivone e eu sou a Bruxa daqui Filipa. Vem, senta aqui, tem um resto de pizza e uma boa quantidade de mortadela na geladeira tem pão no armário, a larica logo vem, só não comam tudo."
Ela saiu me deixando com a mulher que agora tinha nome Ivone, eu estava tão curiosa com a ideia de uma bruxa, queria saber como e o que ela ia me dizer, queria avançar o futuro com a mão por alguns segundos para saber o que ela ia dizer e se existe possibilidade de ser real, eu tenho certeza que ela vai dizer o mesmo que as ciganas que iam na cidade: ' você vai encontrar o amor, suas amigas tem inveja de você, vai se sentir dividida entre dois homens, surpresas vão acontecer na sua vida.' Eu ouvi a mesma conversa tantas vezes que chega a ser engraçado essa ansiedade me consumindo. Onde será que ela foi? Buscar o caldeirão? Não evitei sorrir com a lembrança da Cuca no sítio do pica pau amarelo rodando o caldeirão tentando descobrir o que a Emília estava aprontando naquele dia. Uma lembrança estranha, mas engraçada, tudo era perfeito nessa época. Eu devia parar de achar que o mundo é um conto de fadas, ele não é e nunca foi, ou talvez foi quando eu vivia no meu mundo cor de rosa buscando a perfeição. A bruxa voltou e me olhou nos olhos por alguns segundos totalmente sem expressão, então ela balançou a cabeça dizendo.
" Garota! Eu vou te ajudar a conseguir o que você quer, os documentos e segurança. Você tem que acreditar em mim."
" Do que você tá falando?"
" Tem um perigo muito grande esperando por você, ele tá te cercando, esperando o bem te deixar, mas eu não vou deixar isso acontecer, você tem uma alma boa, não merece esse mal que tá te esperando."
Eu não conseguia entender direito o que ela falava, o meu raciocínio não estava 100% normal e eu estava começando a ficar com uma fome enorme. Sem cerimônia nenhuma abri a geladeira e peguei a caixa de pizza pela metade, enquanto Ivone fazia um pão com mortadela, ou talvez fosse mortadela com pão, comemos enquanto a Bruxa procurava alguma coisa incessantemente. Então ela achou, se sentou numa cadeira de madeira com o objeto no colo, sussurrando alguma coisa. Ela me olhou por alguns segundos e indicou a cadeira a sua frente, me sentei com o ultimo pedaço de Pizza na mão, ela esticou a mão pedindo a minha enfiei o resto de pizza na boca e limpei a gordura na calça, e então entreguei as duas mãos, ela pegou a esquerda e ainda sussurrando algo que eu não fui capaz de entender colocou sobre um objeto pontiagudo e quente. Olhos fechados e concentrada era assim que a bruxa estava, num impulso estranho fechei meus olhos e tentei silenciar a minha mente o máximo possível, era quase como se algo dentro de mim me obrigasse a isso. Então o objeto foi esfriando sob minhas mãos, e eu senti uma coisa estranha e inexplicável, era como se uma parte do meu grilo falante me deixasse, um vazio mental.
A bruxa me olhou e disse.
" É um talismã, um colar com a pedra da Lua, é lua cheia hoje, e pelo horário da madrugada ela tá no ponto mais alto, é um presente meu para você, ele vai te protejer de quase tudo, menos do mal que existe dentro de você.
Entenda, só funciona enquanto você acreditar. Então acredite e sinta como você sentiu agora. Em algum momento da tua caminhada você vai ter que reencontrar amores que vai perder pelo caminho, e a cada passo para longe do que é verdadeiro vai ficar mais difícil continuar, escuta teu coração, por que ele vai te mandar voltar a tempo de dizer Adeus para quem tá te esperando para partir dessa vida, não deixa ela esperar muito tempo."
Ela colocou o colar no meu pescoço enquanto eu tentava entender tudo que ela disse. Ela ergueu meu rosto e disse antes de eu apagar.
" Não deixe ninguém tocar na pedra, nunca!"


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Notas finais do capítulo

Pretendo voltar ainda esse ano, então não me esqueçam... Até logo



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