Cartas para Romeu escrita por Bomma


Capítulo 1
Flores e cartas




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Aquele finalzinho de tarde enquanto lia um romance qualquer esperando dar a hora do final do expediente, o sino tocou, fazendo meu coração palpitar dentro do peito. Nossos olhares se cruzaram e eu me perdi na imensidão castanha de suas orbes. Eu poderia facilmente compará-los ao pôr do sol. Uma mistura belíssima de cores quentes que aquecia-me com seus preciosos últimos raios.

Eu gostava de sua anatomia; a forma como seus dedos eram magros e longos, a forma como o comprimento de suas pernas o deixavam elegante e me encantava com a ternura de seu olhar lançado a mim. Com passos silenciosos ele adentrou o local, invadindo meu olfato com seu perfume amadeirado e assim como o vento, Namjoon entrava pelas pequenas frestas de meu coração. Sorrateiro e imperceptível, e mesmo com sua suavidade ele não deixava de fazer com que meu corpo inteiro tremesse. Eu poderia lhe comparar com várias coisas, mas nada que eu pudesse denominar meu.

Quando eu era pequeno minha mãe sempre dizia-me que não devemos ter inveja das pessoas, pois tudo aquilo que possuíam, elas lutaram ou alguém lutou para que elas pudessem ter. Porém toda vez que ele entrava por aquela porta branca para dar a ela mais uma prova de seu amor, eu esquecia isso. Sentia inveja. Talvez em outra vida eu pudesse ser aquela pessoa da qual toda sexta-feira Namjoon faria juras de amor, declarações e promessas, que receberia um beijo doce quando ele chegasse em casa ou simplesmente aquela pessoa que pudesse segurar suas mãos em um dia ensolarado.

— Boa tarde, Seokjin. – Sua voz grave ecoou pelo local. Eu gostava até mesmo da forma como ele pronunciava meu nome.

— Boa tarde, Namjoon. – Sorri em resposta ao fechar meu livro e colocá-lo em cima do balcão para que pudesse atendê-lo. – O que será hoje? – perguntei.

— Hm... Eu quero um buquê com as flores mais bonitas. – Assenti e fui até o estufa e trouxe-lhe um buquê bonito de astromélias com tulipas rosas.

Ele pegou as flores e agradeceu-me, dizendo que os buquês que eu arranjavam-lhe eram os melhores e como um ato rotineiro, o moreno tirou uma flor do pequeno ramalhete e me ofereceu, dizendo como eu estava bonito naquele dia. Todas as sextas-feiras ele elogiava-me depois de colocar uma flor atrás da minha orelha, o que fazia meu coração dar um solavanco no peito.

Eu não poderia estar apaixonado por ele. Eu não deveria me apaixonar por uma pessoa da qual eu não pudesse gritar aos quatro ventos meu amor. Namjoon era casado.

Já havia acostumado-me com suas visitas nas sextas-feiras. Eu esperava ansioso todas as semanas por aquela visita que não durava mais do que dez minutos. Aquele tempo ínfimo era o suficiente para regar meu coração com uma alegria imensa, deixando um sorriso abobado no meu rosto por uma semana. Mas naquela sexta-feira, onde o inverno fazia um vento frio gelar a cidade, ele não apareceu. O sorriso do meu rosto murchou feito uma plantinha que você esquece de regar em tempos de calor.

Por isso segui em uma organização rápida para fechar a floricultura naquela quarta-feira de fevereiro. Já era quase noitinha, o movimento fora pequeno naqueles três dias devido ao inverno que castigava a cidade com sua melodia fria de choro sólido das nuvens. O rangido histérico  da porta me fez anotar mentalmente que precisava comprar óleo para colocar nas dobradiças. Assustei-me quando estava saindo da floricultura e esbarrei desastradamente em alguém, que por pouco, não me deixou cair. Suas mãos firmes e braços fortes me ampararam, o toque mínimo foi o suficiente para meu corpo todo queimasse.

— Oh, me desculpe! – desculpou-se me ajudando a ficar com o corpo reto. – Por que está fechando tão tarde hoje?

— N-Namjoon... –  Fitei-o por alguns instantes. – Ah, está tudo bem. Apenas tinha algumas coisas a mais a fazer.

— Ou será que ficou esperando por mim? – brincou com um sorriso largo e brando.

Quando senti minhas bochechas esquentarem o suficiente para que uma hiperemia tomasse conta delas, revirei os olhos, passei uma mão sobre a outra nervosamente e a levei até meu rosto para disfarçar a vergonha com o frio.

— Está louco da cabeça – resmunguei e recebi uma risada alta em resposta.

 As três palavrinhas que viera a seguir fizeram meu coração disparar em uma mistura de medo e ansiedade. Medo que ele escutasse o sapateado do meu órgão cardíaco. Minhas mãos estavam geladas e eu não sentia o chão debaixo dos meus pés.

— Senti sua falta – disse, inclinando o corpo levemente para se aproximar.

 Sempre odiei como Namjoon não tinha vergonha das palavras. Dizia tudo que lhe vinha a cabeça. Agia completamente por impulso, gostava de imediatismo. Prendi a respiração em meus pulmões.

 – Está indo para casa? – perguntou sem me dar chances para dizer “eu senti tanto a sua falta que fiquei um tanto amargurado”, mas assim como das outras vezes, contive aquela vontade de jorrar meus sentimentos em cima de si.

Mais uma vez fitei meus sapatos para evitar que meu olhar entregasse de bandeja os sentimentos mais secretos de meu ser. Não precisava ser nenhum expert para notar que o que eu sentia era tão antigo e que estava em um estágio tão avançado a ponto de transbordar por todo o meu ser.

— Estou e você? O que faz por essas bandas essas horas? – Tentei puxar assunto.

— Vim te ver. – Aquela resposta pegou-me desprevenido, fazendo minhas pernas bambearem igual vara verde. – Estava em casa e percebi que nesses dois anos nunca tivemos uma prosa descente. Eu não sei quase nada sobre você. Isso é totalmente injusto. – Riu soprado. – Você sabe até sobre minhas gerações antigas e talvez vidas passadas.

Era a mais pura verdade. Namjoon passou dois anos me contando sobre sua vida nesses dez minutinhos que passava na floricultura e eu sabia tudo de cabo a rabo. Também sabia algo que deixava meu coração em ruínas; o amor que ele tinha por sua mulher era tão vívido que chegava a me apertar o coração. Os dois planejavam ter dois filhos e morar algum tempo no exterior. Eu a invejava, invejava as belas declarações  e os sentimentos escritos nos cartões que acompanhavam o ramalhete.

Eu sabia que ele jamais seria meu.

Era como aquela ditado “Um amor que termina sem nunca ter tido um propósito, sem nunca ter tido a chance de florescer, um amor que nunca dará flores como uma semente esquecida é chamado de amor não correspondido”. Por esse motivo eu não o culpava. Você não pode corresponder uma coisa que nunca fora lhe dada.

— O que acha de irmos tomar um café? – Encarei-o por breves segundos pensando em uma desculpa para não me aproximar dele a ponto de ser perigoso para mim, mas ele acrescentou me desarmando completamente: – Não se preocupe com o horário, eu te levo para casa depois. – Assenti com um pequeno sorriso e o acompanhei até a cafeteria mais próxima.

O movimento da cafeteria estava tão ou até mais morte do que a floricultura. Sentamos longe da porta por onde entrava o vento frio; só se ouvia o rádio que tocava algumas músicas depressivas para combinar com a melancolia daquela dia de inverno. Aquele sentimento duro era absorvido por meu coração de bom grado, afinal eu nunca poderia declarar meus sentimentos. Nunca poderia tê-lo em meus braços e amá-lo da forma como só eu saberia.

Estávamos sentados um de frente para o outro. Bebericamos o café em silêncio; até mesmo o modo firme como ele segurava a asa da xícara de porcelana era bonito aos meus olhos, e por diversas vezes tentei afastar meu olhar do círculo dourado posto em seu dedo anelar. Ele brilhava tanto quanto o olhar quente de Namjoon.

— Você parece estar cansado hoje. Muito trabalho? – Ele foi o primeiro a quebrar o gelo.

— Pelo contrário – suspirei entediado – O movimento foi fraco hoje... A verdade é que eu desconfio que estou na fase inicial de uma gripe, mas nada preocupante.

— Deveria tomar um antigripal e ir cedo para cama, Seokjin. – Namjoon apoiou o queixo sobre a mão. –  Não gosto quando fica doente, seu sorriso fica sem cor.

— Certo. – Ri soprado olhando para a fumacinha que saia da xícara – Por que não veio semana passada?

— Sabia que havia sentido minha fala. –Sorriu convencido. – Precisei fazer uma viagem a negócios. Ficou preocupado que não fosse mais me ver?

— Sim – respondi rapidamente, arregalando meus olhos quando percebi o que havia dito. – Q-quer dizer, somos amigos, não somos? É normal amigos se preocuparem uns com os outros – justifiquei de forma rápida, fazendo-o rir.

— Certamente. Amigos... Por algum motivo, essa palavra soa estranha saindo de seus lábios. Você não é como um amigo para mim. – Meu coração parou. – É como um irmão. – E não voltou a bater. Eu não queria ser como um irmão mais velho para ele. Queria ser mais.

— Claro! Você é com um irmão para mim, também. – sorri de lado, bebendo meu café.

— Eu te chamei aqui porque quero te contar uma coisa. – Pousei a xícara sobre a mesa de madeira e o encarei com certo medo. – Eu vou pro exército cumprir meu serviço obrigatório. Resolvi antecipar para que pudesse ir para Inglaterra mais cedo. – Se antes meu coração já não queria bater, agora havia entrado em necrose. Fiquei alguns minutos encarando minhas mãos sem saber o que falar. – Acho que isso foi repentino demais, não? – riu divertido.

— Demais... – Tentei tomar cuidado com minhas palavras. – Quando irá?

— Daqui duas semanas. Você ainda será meu irmão quando eu voltar, não é?

— Sem dúvidas.

— Eu quero que você me escreva toda semana, promete? – Aquiesci. – E também tenho um pedido a fazer. É um pedido simples, mas é muito importante para mim. Você acha que pode cumpri-lo? Eu vou entender se não pud...

— Eu posso – disse rapidamente e ganhei um sorriso terno em resposta.

— Quero que prepare um buquê com as flores mais bonitas e mande para Joohyun todo mês. Você poderia fazer isso por mim? – Por alguns segundos pensei em negar, mas ao me deparar com o olhar brilhando em pura esperança, eu desisti e assenti. – Obrigado. Eu jamais saberia como agradecê-lo... Receberá uma carta todo mês também.

— Não precisa agradecer, sei que também faria isso por mim. – Seus dedos tocaram os meus por cima da mesa.

Aquela sensação quente e perturbadora feriu minha pele em um grau arrasador. Meu autocontrole quase perdeu para vontade de entrelaçar sua mão a minha.

Controle-se, Seokjin. Controle-se!

— Da mesma forma, obrigado.

Namjoon afastou sua mão para tomar o café e a sensação abandonou meu copo instantaneamente.                  

Foi numa segunda-feira de manhã que meu coração se desfez em farelos ao vê-lo partir. Ao contrário de sua esposa, que sorriu minimamente para ele e acenou depois de receber um beijo encharcado de sentimentos. Desabei em lágrimas quando ele me abraçou, molhando seu paletó branco que fazia um contraste bonito com sua pele morena. Ele estava reluzente.

Passei dois dias chorando apenas por pensar que não veria seu rosto ou ouviria aquela voz grave por dois anos. Havia me acostumado com suas visitas, com suas indagações sobre minha saúde, com as melodias rápidas que às vezes eram cantaroladas quando ele entrava na floricultura.

Sentiria falta de tudo.

 O sorriso voltou a adornar meu rosto quando eu recebi sua primeira carta em um envelope um tanto amassado, contendo uma foto sua com dois soldados. Ele sorria abertamente e fazia um “v” com os dedos.

 “Seokjin,

 Está vendo essa foto? Esses são Chanyeol e Baekhyun! Eles estão no mesmo dormitório que eu. São bem legais! Gostou do meu corte de cabelo? Estou lindão.

Eu pensei que seria mais fácil ficar um mês sem te ver. Sinto falta do seu jeito tímido, dos socos que você me dava quando eu dizia que você era tão feminino quanto uma princesa e das risadas sopradas que dava quando eu escorregava ou tropeçava em algo.

 Se eu te dissesse que aqui é ruim, eu estaria mentindo. Estou aprendendo muitas coisas, me sinto honrado por estar servindo meu país e protegendo minha pátria.

Está frio demais! Você está usando luvas?

Seokjin, se você não estiver se cuidando  como prometeu, eu juro que vou te bater! É sério! Eu aprendi dez formas diferentes de chutar uma bunda. A minha está dolorida até agora *risos*.”

 Ri ao imaginar as milhões de reclamações que ele provavelmente fizera pela dor. Namjoon era totalmente adorável, até mesmo na forma de colocar a ação entre asteriscos.

 “Eu espero que esteja bem e que não me troque por aquele garoto que começou a trabalhar com você! Eu sou mais legal que aquele cubo de açúcar mal humorado.”

Tampei a boca para evitar que minha risada se escandalizasse, mas Yoongi me encarou com a sobrancelha arqueada e pediu para que fosse menos barulhento.

“Faltam apenas vinte três meses, setecentos dias, dezesseis mil e oitocentas horas. Parece ser muito tempo, não é? Mas logo estarei aí quando você menos imaginar eu aparecerei em uma sexta-feira. Prometo que sempre estarei do seu lado.

Com carinho, do seu irmão

Kim Namjoon.”

Eu sorria como um idiota por saber que ele sentia minha falta. Minha mãe sempre me disse que não devemos tentar tapar o céu com a palma da mão, ou seja, se está negando o óbvio um dia terá que enfrentá-lo. Não queria dizer a mim mesmo que aquela carta e toda aquela aproximação das últimas semanas tinha me dando esperanças. Eu não queria enfrentar as esperanças cultivadas em meu peito.

Quando você cria esperança, ela cria um desespero equivalente. Você se apega demais e acaba se machucando demais. Eu não queria me machucar mais do que eu próprio já estava me machucando.

Então eu negava a acreditar que aquilo que me deixava feliz era esperança. Respondi sua carta dizendo que estava me cuidando como prometi e que não estava vivendo a base de macarrão instantâneo, que sentia falta do seu jeito desastrado e que sua esposa havia adorado o buquê de crisântemo. Não sabia exatamente o que escrever, pois nunca fui bom com palavras como ele.

No quinto mês eu já havia aceitado a ideia de que só o veria dali um ano e sete meses. Daria tempo de executar meus planos, afinal aquele era meu último ano da faculdade de gastronomia. Eu e um colega de sala, Jimin, estávamos correndo com todos os preparativos para nosso projeto final e foi  em um dia aleatório enquanto precisávamos de alguns cartazes para a apresentação que eu conheci o namorado de meu colega. Yoongi, o aluno rabugento de direito, nos deu um dez de presente aquele semestre.

Eles eram extremamente adoráveis, tinham praticamente a mesma altura e brigavam como cão e gato, mas depois de uns minutos emburrados um com o outro, os dois riam e se beijavam. Costumavam chamá-los de o casal cenoura. Jimin tinha o cabelo laranja e Yoongi, verde.

Notar que Namjoon não só se lembrava de Yoongi, mas admitir ter certo ciúmes do garoto fez meu dia, meu mês e quase meu ano serem completamente estonteantes.

E então o tempo se fechou para mim e Namjoon. Ao receber a oitava carta do ano, deixei que a pequena pulga atrás da orelha mordiscasse minha curiosidade. Ele perguntou se o correio estava funcionando em todos os bairros, porque fazia dois meses que a esposa não lhe escrevia.

— Yoongi – chamei o garoto que quase dormia sobre o balcão.

— Hm? – resmungou sonolento.

— Você entregou as flores para a senhora Kim mês passado, não foi?

— Uhum. – Às vezes eu ficava com vontade de bater nele por seu jeito monossilábico.

— Ela te disse alguma coisa?

— Não. – Assenti como um entendimento mudo.

— Hoje eu faço as entregas, tudo bem? – Ele aquiesceu e voltou a encostar a cabeça no balcão.

O garoto sonolento quase não abria a boca e quando a abria deixava que notassem o bueiro que era de tanto palavrão que falava.

 Depois que o movimento da floricultura diminuiu, preparei um ramalhete com as rosas mais bonitas e subi na moto indo em direção ao hospital que Joohyun trabalhava.

Ela era enfermeira. Namjoon me contou que a conheceu depois de ter levado um tombo no gelo e batido a cabeça, resultando em um desmaio. Joohyun cuidou dele e ele se apaixonou imediatamente. Sua esposa era uma mulher linda. Com toda sua seriedade e sensualidade ainda era possível notar a juventude em seu rosto angelical e voz doce.

Mesmo sabendo que minha beleza era consideravelmente notável, eu sabia que Namjoon nunca largaria sua esposa com curvas sinuosas para ficar com um homem que não tinha muita coisa a lhe oferecer. Apenas um amor jorrado aos ventos de outono, aquele que deixa todas as árvores secas. Nada especial comparado a uma mulher que o amava intensamente – ou pelo menos era o que eu pensava.

Eu sabia que Joohyun trabalhava até as quatro naquele dia, então planejei fazer a entrega assim que ela saísse do serviço. Passei algumas horas em frente ao hospital, ora observando meu relógio ora observando as pessoas que entravam e saíam. Por conta de sua demora caminhei até a recepção para procurá-la e fui informado que Joohyun estava cuidando de seu último paciente e logo desceria, mas meu tempo estava corrido naquela tarde então pedi permissão para subir, alegando que eram flores de seu marido que estava no exército. Fui até o quarto informado e o paciente estava dormindo, mas o cômodo estava vazio.

Ouvi sua risada ecoando pelo corredor vazio, vinda do último quarto. Aproximei-me da porta e notei que havia uma fresta aberta. Meu coração se quebrou em mil pedaços pela cena que vi, porque sabia que o fato dela estar aos amassos com o dono do hospital significava que todas aquelas juras, declarações e promessas não era reais. Ela havia simplesmente jogado o amor de Namjoon no lixo. Meu coração quebrou ao imaginá-lo sofrendo por isso.

Talvez outra pessoa ficasse feliz ao descobrir aquilo, já que poderia ser usado como uma chance para reconquistar o grande amor de sua vida em um momento de fragilidade, mas eu não faria isso. Nem sonharia com algo assim. Aprendi que quando você ama uma pessoa, a vontade de vê-la feliz é tão grande que não importa se a felicidade dela não é compartilhada com você e que você não seja a pessoa que a fará feliz. Amar é muito mais que isso tudo. Amar é querer a felicidade alheia.

— Quem é você? – perguntou a voz grossa ecoando pelo corredor, a mesma que fez Joohyun virar-se assustada.

— J-Jin? – gaguejou arregalando os olhos – O que está fazendo aqui? – Seus olhos estavam esbugalhados.

Sorri falsamente e ergui o buquê de rosas que estava na minha mão. Joohyun afastou o cara que a segundos atrás estava atacando seu pescoço e abotoou a blusa quase toda escancarada.

— E-eu vou falar com ele. – sussurrou para o cara que me encarou com desprezo ao sair da sala. Ela saiu do quarto e encostou na parede, ficando em silêncio por um tempo – Jin...

— Por quê? – foi a única coisa que consegui pronunciar na euforia, mas ela não respondeu. – Você não tem noção do quanto ele te ama? – perguntei ao sentir a garganta se fechar. – Tem noção do quanto você é importante na vida dele? Você é tudo para o Namjoon, Joohyun! Ele sempre fez de tudo por você, fez de tudo para te fazer a mulher mais feliz do mundo e é isso que recebe em troca?

— Eu não te devo satisfações. – respondeu em um tom rude. – Nunca houve amor por ambas partes.

— ENTÃO POR QUE SE CASOU? POR QUE NÃO O DEIXOU SER FELIZ COM OUTRA PESSOA? – gritei ofegante.

— Alguém como você? – perguntou séria. – Namjoon sempre soube que eu nunca quis me casar, mas ele me me tratou tão diferente daqueles outros caras e me fez várias juras de amor. Suas promessas de vida boa e confortável foram tão interessantes... – Joohyun deu de ombros.

Minha vontade de dar um murro em sua face era tão grande que tive que semicerrar os punhos para me controlar.

— E as cartas? – perguntei entredentes.

— Eu recebi todas e estão fechadas do mesmo modo que chegaram. Não consegui escrever sobre sentimentos que não existem. Eu não vou mais escrever para ele.

Eu apertava o punho tão forte que minhas unhas estavam começando a machucar a palma da minha mão. Meus dentes rangiam em raiva, Joohyun me encarava com uma naturalidade sobre-humana.

— Se você se importa tanto assim com o Nam, por que não as escreve? – perguntou ao ajeitar seu uniforme.

— O-o quê? – Encarei-a perplexo.

— Não sou idiota como Namjoon, sei reconhecer um olhar apaixonado. É tão óbvio que até mesmo um cego consegue sentir. Eu não me importo, a ida de Joon para o exército veio em um bom tempo, não acha? Tanto para mim...

— CALE A BOCA! COMO VOCÊ OUSA? Como ousa dizer essas coisas? O Namjoon... O Namjoon não pode se apaixonar por outra pessoa que não seja você...

— Namjoon faz o que quiser da vida dele. Assim como eu, assim como você, Jin. – Joohyun suspirou impaciente. – Bom, eu te dei uma ideia, uma ótima por sinal. Faça o que quiser, só entenda que eu não escreverei sentimentos que não existem para Namjoon.

Os restos de meu coração desejavam ser vomitados naquele momento e a todo custo. A ideia de confessar a Namjoon meus verdadeiros sentimentos, mesmo que secretamente, fizeram com que eu me calasse. Joohyun sorriu. Um sorriso sincero e pequeno, talvez ela soubesse desde o começo. Talvez o meu amor por seu agora atual ex-marido era tão grande e impossível conter em minha alma.

Joohyun passou por mim sem dizer nada. Não havia mais palavras que pudessem ser colocadas entre nós. O silêncio profundo de ferir a alma e o sorriso da mulher perfuravam aos poucos minha sanidade. Quase enlouqueci ao receber as cartas que Namjoon enviou para ela. Duas delas ainda estavam lacradas como ela dissera.

Naquele dia, descobri que tinha mais líquido no corpo do imaginava e até cogitei escrever meu testamento para prevenir problemas no caso de uma possível morte por desidratação. Sua última carta me arrancou de vez o coração e ainda pisou nele, tirando qualquer esperanças de que um dia ele voltasse a bater.

“Olá meu amor,

Amanhã fará exatamente oito meses que beijei seus lábios pela última vez. Estou com tanta saudade que sinto que vou morrer.

Essa semana foi um pouco complicada. Houve uma briga entre os dois lados e colocaram alguns soldados na fronteira. Esperamos que uma guerra não aconteça. Eu admito, tive medo de segurar uma arma e morrer, mas a pátria estará sempre em primeiro lugar e minha vida depois. Se for para proteger a nação e você, eu não me importo. Porém agora minha arma é apenas um caneta – que por sinal está falhando – que dispara palavras de amor, na esperança de atingir seu coração e te fazer escrever para mim.

Por que não me escreve? Não me ama mais?

Eu passei a noite pensando nas coisas que amo em você, e por Deus, são tantas. Eu amo quando você acorda com aquela cara de sono e mau humor que te faz xingar meio mundo. Amo quando passa o dia despenteada com aquele pijama meu que cabe duas de você.

Eu só sei te amar mais e mais e é tudo o que eu preciso para continuar respirando.

O seu olhar, seu toque, seus beijos foram as melhores coisas que conquistei. Desculpa-me se não estou te dando o amor que precisa através dessas simples cartas, sei que pareço uma criança escrevendo uma carta de amor com todas essas frases, mas só peço para que tenha paciência. Logo estarei do seu lado para que possamos ir para Inglaterra, ter dois filhos e sermos eternamente felizes. Eu te amo tanto e tanto que o tanto parece tão pouco quando escrito.

Eu que sempre fui um homem forte estou chorando feito criança. Chorando de saudades. Chorando porque penso que fiz algo errado ou no caso que escrevi algo que não te agradou a ponto de não ter mais notícias suas. Eu queria pensar que o correio não está funcionando como já aconteceu algumas vezes, pois jamais quero pensar que o nosso amor já não é mais o mesmo.

Por favor! Por favor, meu amor. Responda, diga que me ama e que eu estou errado sobre essa insegurança que se apossa do meu coração.

Com amor, seu amor.

Kim Namjoon.”

 O papel em minhas mãos estava quase se partindo por contas das lágrimas salgadas lançadas contra sua superfície fina. Eram sentimentos tão verdadeiros e únicos que machucavam meu peito. Namjoon nunca mereceu isso. Eu preferia que meu coração fosse quebrado ao invés do dele, mais do que já estava.

 – Sei que não falo muito, mas isso não significa que eu não me preocupo com você. Já faz duas horas que está chorando, Jin. O que está acontecendo? – Suspirei, enxugando o rosto com as costas da mão e o encarei.

 – Não é nada comigo, Yoongi. Não se preocupe. – Tentei tranquilizá-lo, mas ele cruzou os braços e me encarou com um olhar solicito. – O que você faria se descobrisse que a esposa do seu amigo está o traindo?

 – Contaria a ele. É melhor ele saber por alguém de perto do que saber pela boca dos outros.

 – E quando ele é completamente apaixonado por ela e está no exército? – Yoongi arregalou os olhos e abriu a boca em surpresa. Não eram necessárias palavras para que ele entendesse. – O que eu faço? – Repeti me sentindo perdido.

 – Acho que você esqueceu de acrescentar “e quando ele é o cara por quem eu sou fodidamente apaixonado?”— respondeu.

 – Eu não acho que seja uma informação útil.

 – Seu achismo está errado. Se você o ama, agarre essa chance e concerte o coração que será quebrado. Não seja covarde novamente escondendo tudo o que sente por ele. – Abaixei a cabeça. Yoongi passou pelo balcão e me segurou pelos ombros. – PORRA, VOCÊ VEM FAZENDO ISSO HÁ QUASE DOIS ANOS! DECIDA!

Yoongi me me balançou e continuou ao perceber que não teria uma resposta.

— Usa esse sentimento para ser feliz ou se livra dele de uma vez por todas. Você não tem culpa da mulher dele ser uma vadia, muito menos pelo casamento fadado ao fracasso. Então, pare de chorar e decida o que quer fazer – disse antes de grunhir alto, me soltar e sair dizendo que faria as últimas entregas.

As palavras de Yoongi rodopiaram por minha mente durante dias. Aquilo poderia ser considerado uma chance? Eu sequer sabia se ele gostava de homens, mas quando se tratava de Namjoon era impossível não imaginar a maciez de seus lábios e a ternura de seu toque.

No final Joohyun vencera e de fato tentaria conquistar Nam com minhas palavras. Naquele mesmo instante busquei um papel e uma caneta e mesmo que eu não fosse tão bom com palavras, faria o possível para colocar todos os meus sentimentos naquelas frases.

“Olá, querido!

Eu não sou uma pessoa boa com palavras, mas farei o possível para passar tudo aquilo que está tomando meu coração. Esta carta expressará o mínimo do que eu coração não consegue explicar. A solidão tem sido minha única companhia nos últimos meses, nem a presença das milhares pessoas a minha volta reduz a solidão que sinto por não te ter aqui e só o pensamento de que você pode se machucar me destrói.

Perdão por demorar tanto tempo para declarar meus sentimentos por ti e por demorar para colocá-los em palavras. Não esqueci de nenhum sorriso seu e nunca deixei de te amar nem sequer por um segundo. Cada dia que passa longe de ti faz com que esse amor aumente mais e mais.

Mal cabe em meu peito de tão imenso. Espero te ver logo para que possa te abraçar e dividir todo esse sentimento com você.

Eu tenho inveja dessa tua arma que dispara palavras de amor tão bonita enquanto a minha parece ter sido dada a uma criança de cinco anos que está aprendendo a usar as palavras.  Sinto inveja da sua pátria e me sinto trocada. Será mesmo que ela vale mais que sua vida?, penso que não.

A pessoa que te deu essa arma de ferro certamente não conhece a palavra saudade.

Eu quero ter filhos com você, ir para Inglaterra e ser feliz por uma eternidade. Eu quero tudo isso, meu amor. É claro que te deixo ser uma criança, mas não posso concordar que use palavras como um homem qualquer. Você é o homem da minha vida, Kim Namjoon. Deixarei ser criança, um idiota, seja o for, pois foi por esse seu jeito desajeitado que me apaixonei por você. Tudo em você me encanta.

Lembra quando eu perguntava se você ia sentir minha falta? Não era por eu ter dúvidas, mas para guardar no meu coração as milhares de confirmações. Elas fizeram me sentir importante, uma pessoa única.

Está tudo bem em chorar, meu amor. Chorar significa que sente e isso é tudo que eu preciso. Quero que você sinta minha falta, pois já perdi a conta de quantas vezes chorei de saudades suas. Não chore pelo motivo errado. Não escrevi porque não sabia como colocar meus sentimentos no papel, não é porque não o amo mais. Amo-te a cada dia que passa, mais e mais.

Volte em segurança, meu amor. Estarei esperando por ti para que me abrace e me embriague com seu perfume que tanto amo.

Com amor, da pessoa que mais te ama no mundo.”

Com lágrimas nos olhos e o peito aliviado por finalmente ter colocado um terço do que sentia para fora, escrevi o endereço e sorri. Aquela seria apenas uma das primeiras cartas das quais eu declararia meu amor. Eu faria de tudo para conquistá-lo.

Continuei escrevendo por um ano e alguns meses, sempre sorrindo quando ele dizia que os sentimentos que eu passava através das palavras eram mais lindos do que ele poderia imaginar e que havia se apaixonado pela pessoa que conheceu nas cartas. Aquilo me deixou esperançoso.

Naquela sexta-feira de maio o clima estava ameno. Além de não estar fazendo muito calor, uma brisa fresca e o vento gelado vinha do norte e indicava que alguma mudança significativa finalmente estava por vir e eu desejava que não fosse só o inverno que estivesse dando seu aviso.

Meu coração seguia em taquicardia desde o dia que Namjoon me avisou que sairia do exército no começo de maio. Já era dia treze e a última carta que recebi havia sido dia vinte e sete de abril. Agora eu entendia a angustia que as esposas sentiam quando seus maridos iam para o exército, mesmo que eu não pudesse o chamar de meu, ainda. Meu coração se apertava sempre que eu lembrava que só sentiria seu perfume dali algum tempo. Eu tinha medo do futuro. Medo de que ele brigasse comigo por ter o enganado durante quase um ano e meio, mas meu medo de vê-lo sofrer era ainda maior.

Já havia anoitecido há algum tempo e a calada da noite aquiesceu meu coração. Chovia lá fora e o frio havia vindo para ficar, aquilo me deixa melancólico, eu não gostava do inverno. Não quando não tinha o sorriso de Namjoon para me aquecer.

Esparramei no sofá enquanto mudava os canais da televisão procurando alguma coisa para assistir, estava em abstinência de doramas desde que terminei de ver DOTS. Era quase uma missão impossível achar outro para repor seu lugar. Contentei-me ao achar um canal que passava algumas séries americanas, mesmo que eu já tivesse visto Friends milhares de vezes, aquilo nunca enjoava.

Estava quase terminando de beber meu chocolate quente quando o som da campainha ecoou pela sala. Estranhei, não estava esperando visita naquele dia e sabia que Yoongi havia saído para comemorar o aniversário de três anos de namoro com Jimin. Deixe a xícara morna sobre a mesa de centro e coloquei os chinelos que estavam na soleira e abri a porta do prédio.

A visão que tive de um Namjoon todo ensopado fez meu coração disparar como um louco. Ele não disse nada, apenas puxou-me para um abraço apertado.

— O que... – calei-me assim que ouvi seus soluços. Seu corpo inteiro tremia pelo frio. – Por que está chorando?

— O que eu vou fazer, Jin? – perguntou entre soluços.

Eu soube. Não precisava de explicações para entender a dor de seu choro.

— Você vai entrar e tirar essas roupas molhadas. – Puxei-o para dentro e fechei a porta.

Busquei por roupas e toalhas para que pudesse se secar. Namjoon ficou sentado no braço do sofá olhando para o chão, completamente arrasado. Entreguei a toalha para ele. Seu olhar pesou sobre minha mão estendida por um tempo.

— Eu não entendo... – Negou com a cabeça deixando as lágrimas caírem – Em todas as cartas ela disse que me amava e que estava ansiosa para me ver e me abraçar. Por que ela fez isso? Por que me traiu?

Eu não consegui dizer nada, apenas pousei sua cabeça em meu peito. Ver seu coração partido daquela forma me matava. Namjoon passou os braços em volta de minha cintura e chorou, suas lágrimas caíam sem parar e os soluços ecoavam pelo cômodo. Afaguei seus fios curtos enquanto murmurava que tudo ficaria bem, que eu estaria ali por ele. Depois de vinte minutos o choro cessou e ele deitou a cabeça em meu colo, ficando em silêncio por um tempo.

Ele suspirava vez ou outra enquanto eu enxugava seu cabelo.

— Como descobriu?

— O hospital foi o primeiro lugar que eu fui depois de ser dispensado... Quando cheguei lá, encontrei Joohyun aos beijos com outro, Jin. – Ele olhou para cima tentando impedir as lágrimas de escorrerem. – Ela disse que me mandaria os papeis do divórcio. Acredita que ela está morando com ele?

— Você encontrará uma pessoa que te ame de verdade, Nam. Uma pessoa que te trate como prioridade, uma que nunca te abandonará. Ela não merece você, nem um terço do que fez por ela.

— Eu apenas não sei o que fazer. Não sei se serei capaz de abrir meu coração para outra pessoa novamente. Ela foi meu primeiro amor. Você não sabe como dói ver a pessoa que você ama amando outra.

Eu sei, Namjoon. Sei melhor do que ninguém, completei mentalmente enquanto encarava-o.

— Um dia você se acostuma com essa dor. Percebe que realmente ama aquela pessoa quando deseja que ela seja feliz, mesmo que não seja com você. – Suspirei. – Você seguirá em frente, Nam. Eu estarei aqui para te ajudar. – Tentei sorrir.

— Obrigado, Jin. – Meu coração disparou quando ele pegou minha mão e a beijou. – Eu não sei o que seria de mim sem você. Você é a única pessoa que eu posso confiar no mundo. – Naquele momento, o medo se apossou de mim. Apenas assenti e me levantei dando a desculpa que tomaria um banho quente, já que ele havia molhado toda minha roupa – Eu queria te pedir um favor. – chamou minha atenção antes que eu pudesse entrar no meu quarto.

— Peça.

— Eu posso ficar aqui essa noite? Eu... Eu não quero voltar para casa, tudo lá me lembra Joohyun.

— É claro que pode. Não era necessário pedir. Eu não vou demorar muito, se quiser pedir comida, na geladeira tem o número de alguns restaurantes. – Ele aquiesceu e eu entrei no banheiro.

Meu peito doía pelo medo de perdê-lo, Namjoon disse que eu era a única pessoa que ele confiava. Eu. A pessoa que se passou por outra o enganando durante quase dois anos. A pessoa que esteve escondendo os sentimentos de si por tempo demais. Talvez, assim como Joohyun, eu não o merecesse.

Quando sai do banheiro encontrei Namjoon sentado na mesa da cozinha com um semblante sério. Sua testa estava enrugada e ele olhava para o nada, pensativo. Aproximei-me dele.

— Esse papel. – Ele segurou o papel que continha os números dos restaurantes. – É um papel personalizado, não? – Assenti um pouco confuso. – Onde você arranjou?

— É da floricultura...

— Por que nunca percebi isso antes?

— O-o que? – Aproximei da mesa. Namjoon se levantou de supetão, me fazendo dar alguns passos para trás.

— Todas as cartas de Joohyun foram escritas nesse papel e as suas também. – Seus olhos estavam grudados em meu rosto.  O olhar severo era tão acusador que minhas pernas estavam bambas. – Como, Seokjin?

— E-eu.. Eu não sei... – Abaixei a cabeça.

— Você também não sabe me dizer como todas as cartas que mandei para Joohyun foram parar em cima de sua geladeira?

Arregalei os olhos e meu coração foi tomado por um medo imenso, o fazendo bater tão forte que eu tive a impressão que a qualquer hora ele sairia da minha boca.

— Nam... Eu não... – Ele começou a andar um lado para o outro.

— Eu quero saber o que está acontecendo, Jin – disse austero – A caligrafia, o papel.... VOCÊ TEM TODAS AS CARTAS!! – sua voz grossa subiu alguns decibéis, fazendo-me encolher o corpo. – Essa será a última vez que eu pergunta. O que está acontecendo?

— Eu... – Sentia as lágrimas acumularem no canto dos meus olhos. – Escrevi. Me desculpa, Nam.

Abaixei o olhar. Eu não conseguia encará-lo, só de imaginar a dor que ele estava sentindo por descobrir a verdade daquela maneira, céus! Eu queria colar seu coração.

— Por favor, me perdoa... – Tentei me aproximar, mas Namjoon deu alguns passos para se afastar. – Quando eu descobri que Joohyun tinha outro, eu não consegui te contar. Não queria que você sofresse! Foi por esse motivo que escrevi todas as cartas, me passando por ela... Por favor, tente me entender. – O homem passou as mãos sobre os cabelos com raiva. – Eu só queria o seu bem.... – Riu sarcasticamente e olhou para mim.

— O meu bem? VOCÊ MENTIU PARA MIM! FEZ COM  QUE EU ACREDITASSE EM SENTIMENTOS QUE NÃO EXISTEM! VOCÊ DEVERIA TER ME DITO! ERA O MÍNIMO! EU CONFIEI EM VOCÊ E VOCÊ ME ENGANOU! – Namjoon berrava com tanta raiva e ódio que tive medo.

Eu me encolhia cada vez mais. As lágrimas ardiam em minhas bochechas, queria poderia abraçá-lo. Queria poderia mostrar que era tudo real.

— Nunca mais quero ver você. Você é igual a ela. – Ele pegou o casaco que estava pendurado na cadeira e rumou em direção a porta, mas antes que pudesse abri-la, o segurei pelo pulso.

— Eu errei, Namjoon. Eu sei muito bem disso, mas em momento algum eu escrevi sobre sentimentos que não existiam – disse atropelando as palavras. – Eu amo você! Droga, eu tenho te amado por tanto tempo que meu coração se quebrou ao te imaginar sofrendo sozinho! Foi por amor. – Ele me encarou perplexo por alguns minutos, mas logo puxou o pulso – Por favor, não vai embora. – Aproximei-me e o abracei. – Por favor – disse com a voz embargada.

Namjoon não hesitou, mas depois de alguns minutos em silêncio apenas ouvindo meus soluços, ele tirou meus braços de seu corpo e deu alguns passos para trás.

— Eu não confio mais em você. – Suspirou – Se você realmente sente algo por mim, não fale mais comigo. Não me procure mais. – Foi a última coisa que ele disse antes de bater à porta.

Ao sair por aquela porta, Namjoon levou consigo todas as estrelas da noite e o sol do dia. Seis meses que passaram e as batidas de meu coração ficaram fracas. Ninguém consegue sobreviver por muito tempo com um coração defeituoso. Toda aquela angustia e falta de vontade eram sintomas de depressão.

Perdi a vontade de querer ser alguém, de cozinhar ou até mesmo a vontade de sair de casa. Nem as antigas cartas me alegravam mais. Seis meses que eu não tive uma notícia de Namjoon. Ele trocou de número e apartamento, talvez tenha até mudado de cidade ou estava simplesmente me evitando. Eu queria crer na última opção e pensar que Namjoon estava me evitando era melhor do que cogitar que ele estivesse longe.

Talvez fossemos como Romeu e Julieta, simplesmente não nascemos para ter um final feliz. Quem sabe em outra vida eu possa fazê-lo feliz da forma correta. Eu esperaria; esperaria por uma oportunidade na próxima vida. E nas outras. Porque de uma coisa eu tinha certeza, meu coração jamais seria desleal a ele.

....

Namjoon

Quando era criança eu ouvi muitos ditados que falavam que uma hora parava de doer. Que o tempo era o melhor remédio para curar as dores do coração. Alguém, por obséquio, avisa a pessoa que inventou esse ditado que esse fármaco está fora da validade, sem eficácia. Meu coração continuava doendo a cada batida. Aquela raiva havia se dissipado conforme os meses passavam. Havíamos entrado em outubro naquela semana e não teve um dia do qual eu não sentisse falta das confidências a Seokjin, mas eu ignorava aquele sentimento. Eu ignorava a falta que o traidor trazia a minha vida.

Mas as coisas são assim, quanto mais você tenta afastar, mais elas se aproximam. Havia sido um dia atolado de problemas no trabalho e quando decidi sair para almoçar me deparei com a cabeleira verde inconfundível na recepção. O garoto batia os pés rapidamente no assoalho enquanto olhava de minuto a minuto para o relógio no pulso.

— Senhor Kim! Há um jovem que deseja falar com o senhor. Eu disse que precisa agendar um horário, mas ele insiste em dizer que é urgente. – Minha secretária me abordou rapidamente.

— Está tudo bem, Suzy. – Sorri minimamente. – É um conhecido meu. – Ela aquiesceu e saiu. Em passos duros fui até o garoto e quando ele me viu, se levantou e me encarou amargurado. – O que faz aqui?

— Sei que está no seu horário de almoço e também estou no meu. Precisamos conversar.

— Eu não tenho muito tempo.

— Qual a parte do “precisamos conversar” você não entendeu? Eu não estou aqui para brincar, Namjoon. Precisamos falar sério. –Encarei-o e suspirei fundo.

— Tudo bem. Almoce comigo.

 Yoongi concordou e seguimos até um restaurante pacato que havia em frente da empresa. Eu gostava da calmaria do lugar. Nos sentamos em uma mesa mais afastada, onde poderíamos conversar sem nenhuma interrupção e fizemos os pedidos.

— Sobre o que quer falar?

— Você sabe que é um filho da puta, não sabe? Um canalha dos maiores – disse calmo, olhando nos meus olhos – Por quanto tempo você continuará o ignorando?

— Quem? – Fiz-me de desentendido.

— Estou me segurando para não socar sua cara. Não se faça de louco, você sabe de quem estou falando. – Suspirou – Olha, Namjoon, eu não gosto de você. Nem um pouco e se eu pudesse quebrava sua cara agora, mas prometi a Jin que não faria. Contudo estou aqui hoje quebrando uma promessa que fiz a ele. Quebrar outra não faria tanta diferença.

— Era só isso? Eu estou muito ocupado e preciso almoçar, se me dá licença...

— Eu prometi a Jin que não te falaria, mas eu não posso deixar que a situação piore mais do que já piorou. Ele está doente. – Aquelas palavras rapidamente captaram minha atenção. – Está declinando cada vez mais. Faz dois meses que não sai de casa, parou de trabalhar, desistiu do restaurante. Ele desistiu de tudo, a única coisa da qual ele não desistiu foi de você. Ele continua te amando, Namjoon. Por favor, pare de ser um filho da puta e conserta essa merda. Mesmo que não seja do modo romântico, cuide dele como irmão que disse que era.

 – Ele me enganou.

 – E por ele ter errado uma vez você vai desistir dele? Que tipo de irmandade é essa? Eu não sei se ele te falou, mas foi a própria Joohyun que pediu para que ele escrevesse para você. Porque ela sabia que o Jin te amava.

 – Eu sei. Isso não muda nada para mim. Eu não me importo.

O soco que levei de Yoongi me deixou com uma marca roxa que permaneceu no meu rosto durante dias. O que foi bom, toda vez que eu olhava para aquele hematoma eu lembrava da conversa que tivemos. Lembrava de como estava sendo um idiota.

O motivo de eu ter evitado o garoto todos esses meses não foi raiva, foi medo. Medo de que meu coração continuasse batendo de modo diferente por ele. Para ser sincero, o modo como ele colocou seus sentimentos em palavras fisgou meu coração, mas eu era um idiota e estava com medo de admitir que estava apaixonado por ele. Afinal, eu nunca havia me apaixonado por um garoto. E droga, eu estava morrendo de preocupação.

....

Seokjin

Naquela sexta-feira era feriado. Um dia bom para ficar em casa o dia todo, debaixo do cobertor enquanto me empanturrava de porcarias. Como estava com preguiça de fazer algo elaborado para comer, resolvi fazer macarrão instantâneo. Era uma opção fácil e rápida. Estava vagando pelos corredores de um supermercado do centro comprando algumas coisas, com uma cestinha na mão com alguns doces. Comer doces de feijão me fazia lembrar de Namjoon; ele era fanático por esses doces. Havia encontrado o sabor de macarrão que gostava, contudo, quando estiquei a mão para pegá-los, uma mão parou sobre a minha.

Aquele toque quente. Eu o conheci tão bem, mas desejei não reconhecê-lo.

Virei para o lado e dei de cara com Namjoon me encarando com os olhos arregalados. E merda, eu fiquei com vontade de chorar, de me jogar nos seus braços e dizer o quanto estava sentindo sua falta, mas eu havia prometido que não iria lhe dirigir a palavra. Eu não quebrei a promessa, mesmo que sentisse falta de seus toques, do seu sorriso, da sua voz ou falta de cada partícula de seu corpo perto do meu.

 Deixei o macarrão para lá e peguei um de qualquer sabor, indo para o caixa pagar. Antes que eu pudesse ir embora, senti sua mão segurar meu braço.

— Olá – disse calmo, sorrindo para mim.

— N-nam... – sussurrei.

— Podemos conversar? – Seu tom era vacilante.

Eu queria gritar que sim. Queria disse mil vez que sim. Desvencilhei de seu toque, eu não poderia raciocinar bem, sentindo-o tão próximo. Fiquei em silencio por algum tempo.

— Jin?

— Não sei se é uma boa ideia.

— Jin... Por favor, será rápido. Eu juro.

E eu cedi. Cedi tão facilmente que me martirizei o caminho todo. Namjoon me seguiu em silêncio e logo chegamos ao meu apartamento. Deixamos o sapato na soleira e eu pedi para que se sentasse enquanto preparava algo para comermos. Um silêncio incomodo se apossou do local. Apenas ouvíamos o galho da árvore batendo na janela por conta do vento.

Sentei de frente para Namjoon e ficamos nos encarando por longos segundos. Estava cansado de fugir de seus olhos.

— Sobre o que quer conversar? – perguntei batendo os dedos sobre a mesa de madeira, tentando dissipar aquele nervosismo.

— Eu não sei ainda, é só qu...

— Você está com medo que eu diga para alguém o que aconteceu ou que eu vá atrás de você? Não se preocupe, nada disso acontecerá.

— Jin...

— Por que veio atrás de mim?

— Porque somos amigos... Eu me preocupo com você! Olha como está magro! – Suspirei fundo.

— Não somos.

— Não somos? – perguntou mais para si mesmo do que para mim.

— Não. A partir da primeira carta, Namjoon. A partir da primeira carta deixei de ser seu amigo... Aqui dentro – Pousei a mão sobre o peito – Não tem mais espaço para você como meu amigo. Eu prefiro ficar sem você do que ser tratado como um amigo novamente.

Levantei-me indo em direção a sala para tentar mandá-lo embora de vez. Estava cansado de sentir falta de uma pessoa que não sente a minha, cansado de ser o único a amar. Às vezes, correr atrás demais cansa.

 – Por favor, Namjoon, vá embo... – ele me puxou pela cintura antes que eu pudesse terminar de falar e me beijou.

Um beijo convincente, seus lábios grossos cobriam os meus de forma delicada, quase como um sonho de tão suave. Ficamos nos encarando por alguns segundos depois que paramos de nos beijar.

— O-o que significa isso?

— Eu quero você ao meu lado como amigo... – Olhou em meus olhos. – Os melhores namoros começam como amizade. – Arregalei os olhos e coloquei a mão sobre a boca espantado.

— Para com essa brincadeira. É de péssimo gosto – disse sério. Tentei afastá-lo, mas seu toque era rígido. – Tira a mão de mim, por favor.. – Seu braço permanecia em minha cintura.

— Não estou brincando. – Namjoon segurou minha cintura com firmeza. – Já fui um Idiota uma vez, não vou te deixar escapar de novo.

Ele forçou seus lábios contra os meus com mais brutalidade. Os socos que destinei ao seu peito se enfraqueceram aos poucos e o beijo se tornou calmo e doce. Namjoon sugou o lábio inferior no meio do beijo fazendo um gemido escapar por minha parte. Ele gostou, continuou com as mãos na minha cintura, acariciando-a de maneira ávida.

Aquela foi a primeira vez que nos amamos e a primeira vez que nos tornamos perpétuos.

....

Naquela sexta-feira de manhã, um ventinho frio soprava a cidade de Londres. Fazia cerca de meia hora que havia acordado com os mínimos raios de sol batendo em meu rosto. Deixei Namjoon dormindo calmamente e vestindo um de seus moletons que eram dez vezes maiores que eu, caminhei até a cozinha para preparar nosso café da manhã. Pouco tempo depois ouvi passos no assoalho.

— Bom dia, meu amor – sussurrou em meu ouvido fazendo meu corpo inteiro estremecer.

Enquanto preparava nosso café na bancada de mármore, Namjoon veio por trás de mim e abraçou minha cintura. Suas mãos desceram uma pequena parte do moletom que cobria a área do meu pescoço e distribuiu beijos naquele local, me fazendo gemer pelo contato quente e molhado de seus lábios.

— Bom dia, Nam. – Sorri recebendo um beijo rápido nos lábios.

Fazia cerca de seis meses que havíamos nos mudado para Londres. Namjoon foi transferido para uma filial daqui e eu finalmente consegui abrir meu restaurante. Não tínhamos ideia se voltaríamos para Seul um dia, já que essa cidadezinha nos fazia sentir em casa. O clima gélido me lembrava Seul, então não foi tão difícil me adaptar.

Com abraços quentes, beijos doces, amassos na cozinha do restaurante, noites quentes no inverno e sussurros de amor, Namjoon me mostrou que nem toda versão de Romeu e Julieta tinha um final triste; e continuava dizendo que eu era mil vezes mais belo que Julieta.

Às vezes eu me pegava pensando na ilustre história de Shakespeare. Se Julieta tivesse declarado todos seus sentimentos, anseios, e dito tudo entrelinhas, eles poderiam ter um final feliz. Assim como eu tive com Namjoon

Meu eterno Romeu.       


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado ♥



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