Um Amor para Recordar escrita por GiullieneChan


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Fic de presente de amigo secreto à minha amiga Calls.
Faz parte do universo da fic Aurora, A Princesa e o Cavaleiro e Redemption.
As idades dos personagens não vão acompanhar a do anime (que para mim é meio bagunçada). Kanon relembra o passado dos 12 aos 18 anos, idade na qual imagino que Saga tenha traído o Santuário e acusado Aiolos (também com 18 anos) de traição. Shura aparecerá com 15 anos, Afrodite e o futuro Máscara da Morte aparecerão com 10 anos, ainda aspirantes a cavaleiros.

Betado por luanaraccos.
Arte da Capa da Priss.
Edição de Lisle e Pixiz.



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As risadas infantis de Serena invadiam a modesta residência a beira mar, enquanto Kanon erguia a pequena sobrinha ao ar e imitava um avião, mas segurando-a com todo o cuidado que seu pequenino corpo exigia. O bebê de pouco mais de cinco meses sempre fazia festa ao ver o tio, e para o ex-general marina não havia nada mais prazeroso do que brincar com a pequenina, chegando a surpreender o irmão com seu comportamento e carinho com a bebê.

—Ela te adora, Kanon! –Juliane dizia ao entrar no recinto, ficando ao lado do marido que assistia a cena familiar encostado em um pilar.

—Ela sabe que sou o tio preferido dela! –dizia o gêmeo entregando a criança para a mãe, fazendo careta para que a bebê desse risada.

—É o único tio que ela tem, bestão! –Saga disse rindo, desviando de um tapa do irmão.

—Por isso sou o preferido! –se gabava.

—Tenho certeza de que quando chegar a hora, vai ser um pai maravilhoso! –Juliane falava, pedindo licença para amamentar a bebê.

—Talvez...

Kanon diz essa última palavra com certa melancolia, percebida pelo irmão mais velho, que o fita intrigado.

—Kanon, algum problema?

—Não! Estou bem. –respondeu colocando as mãos nos bolsos e dando as costas para o irmão. –Bem, me vou. Até amanhã ou depois.

—Já vai? –Juliane perguntou, surpresa. –Não vai jantar conosco?

—Não! Hoje eu faço a vigília na Casa de Gêmeos, esqueceram? –ele sorri e se afasta. –Vassilou deve ter feito alguma coisa comível por lá. Não se preocupem comigo! Aproveitem a noite de folga em família!

O casal observa Kanon se afastando, cada um imaginando o que acontecia com o cavaleiro. Este, caminhava devagar pela trilha que levava ao Santuário observando o sol se pondo no horizonte, sua atenção se voltou para uma macieira que se mantinha em pé no alto de um pequeno morro.

Kanon desviou de seu caminho e se viu andando até a árvore frutífera, ainda sem frutos, mas exibindo suas flores naquela época do ano, enchendo o ar com um doce aroma. Ele deu um sorriso, ao tocar na árvore e ver entalhados no tronco as iniciais “C” e “K” entrelaçadas.

—Faz tanto tempo, ainda não me acostumei com sua ausência. –murmurou tocando as letras e deixando sua mente levá-lo anos atrás. Para uma época mais inocente em sua vida.

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Um jovem Kanon, de pouco mais de 12 anos, fugia de mais um treinamento administrado por Shion, correndo pelos campos, para o mais longe possível do Santuário. Se seu irmão pretendia perder aquele domingo maravilhoso e ensolarado com aquela tortura que o Grande Mestre chamava de treino, era problema dele. Não era o que o rapaz pretendia fazer em um dia como aquele.

Logo adiante ficava o mar, e ele pretendia passar o dia todo na praia, nadando. Parou próximo a uma frondosa macieira, carregada de frutos e imaginou levar alguns consigo para lanchar depois. Com isso em mente, ergueu a mão para agarrar um galho e subir nela, pensando que em seu alto estavam os frutos mais maduros e doces.

Foi quando alguém atingiu sua cabeça com os restos de uma maçã recém devorada.

—Ow, eu cheguei primeiro aqui. –dizia uma voz infantil, fazendo Kanon olhar para cima e fitar quem era o atrevido. –Se quer pegar maçãs da minha macieira tem que pagar um tributo!

Kanon não acreditou quando fitou aquele meninote magricela, de cabelos curtos e escuros, roupas largas e rosto sujo e surrado, que o fitava com ar divertido em seus olhos castanhos. Não devia ter mais do que dez anos e olhava divertido para ele.

—Como assim sua árvore? –Kanon estava indignado, erguendo o punho contra o moleque.

—Eu cheguei primeiro. Então é minha! –disse com calma.

—Acha que é chegando assim do nada e dizendo que é sua e pronto?

—Acaso plantou essa árvore? –perguntou com calma.

—Não... mas...

—Veio aqui todo os dias e a regou, a viu crescer, matou as pragas que a ameaçavam desenvolver?

—Eu não, mas...

—Então, por que está reclamando a minha posse da árvore?

—E você? –apontando para o garoto. –Acaso fez cada uma dessas coisas que me perguntou?

—Eu não! –respondeu sem se abalar, balançando as pernas relaxado no galho.

—Então como pode falar que a macieira é sua? –perguntou com ar triunfante.

—Cheguei primeiro, como não tinha dono, tomei posse. –Kanon ia replicar. –Como qualquer conquistador das terras além mar, na época das Grandes Navegações, que tomaram posse de terras ditas pertencentes a ninguém.

—Não tem lógica o que diz. –meio desanimado.

—Mas as pessoas acreditam nisso. –o menino pega uma maçã e a atira para que Kanon a pega. –Toma, gostei de você! Como se chama?

—Kanon. E você?

—Cora. –sorri. –Posso te pedir um favor, Kanon?

—Claro. –diz mordendo a maçã.

—Me ajuda a descer? –pede constrangido, para a surpresa do rapazinho. –Eu não consigo descer...

—Mas não conseguiu subir?

—Eu meio que pulei aqui... mas não consigo descer...

—Como assim “meio que pulou”?

Cora aponta na direção de uma pedra, onde um sapo estava em seu topo, olhando com desinteresse os dois.

—Eu subi aqui por causa dele...  e não consigo descer porque tenho medo de altura.

Kanon olhou para o sapo, depois para Cora, voltou a olhar o sapo e começou a gargalhar. Achou tanta graça que chegou a sentar no chão, sentindo dores de barriga e lacrimejar de tanto rir.

—Hahahaha... você pulou aí de medo do sapo e não consegue descer de medo de altura? Hahahahahahaha!!

—Não vejo muita graça. –Cora estava com a cara amarrada.

—É super engraçado! –tentando parar de rir. –Acaso está treinando para ser cavaleiro?

—Estou sim. –respondeu com sinceridade.

—E como vai ser cavaleiro com medo de altura e de sapos? –acusou.

—Eu dou meu jeito. –desviando o olhar, com expressão enfezada.

—Não vai sobreviver uma semana assim. –Kanon suspirou, tentando parar de rir e erguendo os braços na direção de Cora. –Vem logo, antes que eu mude de ideia e te largue aí até a Guerra Santa começar!

Cora olhou com desconfiança e em seguida respirou fundo.

—Não me deixe cair!

—Confie em mim, Cora! Não vou te soltar e te deixar cair!

Cora olhou para Kanon e decidiu que podia confiar naquele rapazinho, por causa do seu olhar. Criou coragem e desceu do galho, sendo amparado facilmente pelos braços dele. Afinal, em comparação, Cora tinha um corpo pequeno, leve e franzino em relação ao de Kanon, com músculos em formação apesar da pouca idade.

—Pronto, moleque! –disse colocando no chão. –OLHA O SAPO!

Cora deu um grito e um pulo, depois viu que não havia sapo algum ali e olhou com ira para Kanon que novamente voltava a rolar no chão em meio as gargalhadas, parecendo que até sentia dores de barriga com aquilo. Acabou recebendo um chute na canela de Cora, que provocou mais risos do que dor.

—Ah, chega! –Kanon recuperava o fôlego. –O que estava fazendo aqui?

—Fugindo da tortura que chamam de treinamento. –respondeu, subindo numa pedra e pegando algumas maçãs mais baixas. –Tá louco treinar nesse domingo de sol!

—Também acho. Também fugi! –apontou com o polegar para o peito. –Vamos, já que chegamos até aqui, que tal irmos até a praia?

—Por mim tudo bem. –Cora aceitou o convite, indo atrás de Kanon, que também levava algumas maçãs.

Algum tempo depois chegaram à praia, deixando as frutas em um canto e se aproximando das águas. Imediatamente, Kanon se desfez das roupas ficando nu e correndo para mergulhar no mar, Cora assistia a cena com as mãos atrás do corpo.

—Ow! Vem pra água! –chamou.

—Vira de costas! –pediu Cora.

—Qualé?! –Kanon achou que Cora sentia vergonha do corpo magro, mas virou as costas como pediu o novo amigo. –Assim?

—Assim mesmo! –gritou Cora, tirando as roupas e mergulhando no mar em seguida.

Nadou até ficar do lado de Kanon que rindo pegou a cabeça de Cora e afundou na água, de brincadeira. Cora se levantou e jogou água no rosto de Kanon, começou uma guerra de água, a ponto de começarem a apelar para ver quem ganhava.

Por fim, Cora pegou a cabeça de Kanon, o mergulhou na água do mar. Este olhou para o corpo de Cora, assustou-se com o que viu, ficou vermelho como um pimentão, engoliu água e subiu tossindo e cuspindo água.

—VOCÊ É UMA GAROTA?!?!

—Em que momento eu disse que não era? –Cora perguntou com uma expressão de paisagem no rosto.

—Você falou que estava treinando para ser cavaleiro! E está sem máscara! Parece um menino com esse cabelo e essa cara suja! –dizia sem parar, muito nervoso em tê-la visto nua.

—E desde quando Cora é nome de menino? –perguntou novamente com cara de paisagem.

—Eu conheci um moleque chamado Afrodite! AFRODITE! E outro chamado MISTY! MISTY! ACHEI QUE ERA MAIS UM MOLEQUE COM NOME DE MULHER NESSE SANTUÁRIO MALUCO! –dizia aflito. –E ONDE ESTÁ SUA MÁSCARA???

—Você é meio lerdo, né? Perdi a máscara quando as outras meninas me surraram mais cedo.

Cora começou a nadar para fora do mar e Kanon virou as costas para não vê-la nua de novo. Quando percebeu que ela já havia se trocado e estava se afastando da praia, saiu rápido do mar, colocou as roupas aos tropeções e correu para alcança-la.

—Espera, Cora! -A menina parou quando o escutou chamando-a. –Não... mandei você ir embora.

—Achei que tinha ficado bravo e...

—Bravo porque é uma menina? –ele a fitou com uma expressão zangada. –Não seja boba! Gostei de você, é divertida! Qual é o problema de sermos amigos? Não pode sair por aí sem a máscara, sabia?

—Eu sei, mas...

—Vamos. –pegando-a pelo pulso. –Vamos achar sua máscara antes que alguém apareça e a castigue.

Cora o acompanhou, mostrando o local onde mais cedo um grupo de meninas mais velhas, movidas pela inveja, a surraram por ser a aluna preferida da mestra. Vasculharam o local até que, finalmente, Kanon encontrou a máscara prateada que pertencia a ela.

—Aqui. –a entregou e Cora baixou o olhar. –Que foi?

—Tava pensando na regra do Santuário sobre as máscaras... sabe...

—Sei. –respondeu friamente. –Mas você não é uma amazona ainda, então a regra não vale pra você!

Cora sorriu com essa constatação, parecendo aliviada.

—Ufa! Ainda bem! Imagina ter que me casar com um lerdo igual a você? Ou ter que matá-lo?

—Eu que digo isso! Imagina casar com uma baixote reta igual a você!

—Reta? –olhando para a total ausência de seios dela e fita Kanon zangada. –Qual é o problema?

—Faz mais meu tipo isso aqui. –ele faz um gesto com as mãos, imitando seios de uma mulher. –Você parece um menino!

—Melhor parecer menino do que ter sua cara de lerdo! –Cora começa a tirar  onda com Kanon que começava a rir.

Juntos voltaram ao Santuário, entre risadas e provocações. Juntos enfrentaram seus respectivos mestres, furiosos por terem fugido de suas obrigações naquele dia e juntos pagaram o castigo de um rigoroso treino físico, mas nada havia abalado a sensação de que uma bela amizade havia nascido nesse dia, à sombra de uma macieira.

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Quatro anos haviam se passado desde aquele domingo. Kanon assistia naquela manhã, em especial, uma pessoa conquistar o direito de usar uma armadura sagrada. Estava ali no Coliseu torcendo pelo sucesso de Cora em conseguir sua armadura em um difícil teste de força e destreza com outra amazona, que aparentava ser tão forte quanto ela.

Kanon estava confiante, afinal ajudou Cora em seu treinamento quando se encontravam e tinha plena confiança que sua amiga conquistaria esse teste com louvor. Reparou no quanto Cora havia mudado em pouco mais de quatro anos. Seus cabelos curtos como os de um menino agora estavam um pouco acima dos ombros, e exibiam um castanho vivo quando refletia os raios do sol. O corpo reto de outrora agora exibia curvas mais femininas, de uma jovem em seus catorze anos de idade. Ela que antes se parecia com um menino delinquente agora, havia se transformando em uma bela e jovem mulher.

—Daria tudo para ver o rosto dela.

Dizia uma voz masculina ao lado de Kanon e ele reparou que eram dois aspirantes a cavaleiros e que falavam de Cora.

—E o que faria se visse o rosto dela? –o outro perguntou.

—Ainda pergunta?

O comentário e o sorriso malicioso, seguido da risada debochada do outro fizeram o sangue de Kanon ferver. Ele se levantou e caminhou até eles, e sem cerimônia os agarrou pelas golas e falou com uma voz fria e assustadora.

—Se tentarem algo hediondo com aquela amazona ou outra, vou arrancar seus olhos e língua e jogá-los aos cachorros!

Em seguida os soltou, fazendo-os caírem sentados e de modo humilhante, saíram correndo tropeçando pelo chão para fugirem de Kanon.

—Idiotas! –deu um sorriso que sumiu ao ver Saga aparecer do nada ao seu lado, usando sua armadura dourada. –Vai dar sermão? Desde que se tornou cavaleiro de ouro fica com esse ar de que precisa sempre ficar me controlando.

—Não vim dar sermão. Apesar que seria bom controlar seu gênio. –Saga sorri de lado. –Aqueles dois bem que mereceram o susto.

—Hunf... –virou para observar a arena e acenou para Cora, cuja atenção desviou-se para a pequena confusão na plateia. –Não gosto que folguem com uma amiga minha! GANHA ESSA, CORA!

Ela retribuiu o aceno e se preparou para a luta. O combate foi iniciado, seguindo os protocolos. A campeã levaria a armadura de bronze de Raposa, e ambas desejavam muito honrar Atena com ela.

Enquanto o combate era travado entre Cora e uma amazona de cabelos loiros, a plateia olhava ansiosa o desfecho. Foi quando Kanon e Saga notaram a presença de três figuras curiosas, observando a luta escondidos.

—Aqueles moleques não são..? –Kanon perguntou e Saga balançou a cabeça negativamente, andando até eles.

—Afrodite e Giovanni! –Saga os chamou e os meninos o olharam assustados. –Não deveriam estar aqui! Não deveriam estar com os outros treinando seus cosmos? Shura, por que os trouxe aqui?

—Ah, que custa deixar a gente ver uma luta na arena? –replicou o menino de cabelos curtos e olhar zangado.

—Deixa eles, Saga. Não tem problema assistirem! –disse Kanon e os meninos menores, sorrindo, correram para ficar ao lado dele para assistirem.

Saga desviou sua atenção para Shura, repreendo o jovem cavaleiro de Capricórnio com o olhar e este permanecia sério.

—Eles foram insistentes. Não vi mal algum em trazê-los. –respondeu apenas isso, voltando a atenção a luta. –A de cabelos curtos tem bons movimentos!

—Deveriam estar treinando. –disse Saga contando mentalmente até dez ao perceber que era ignorando.

—Eu que ensinei isso a ela. –disse Kanon.

—Sua amiga? –Afrodite perguntou curioso.

—Sim. E ela vai ganhar!

Os dois meninos olharam admirados para a Arena quando Cora finaliza a luta acertando um chute, com seu corpo envolvido por seu cosmo, em sua oponente e levando-a a nocaute. O grande mestre Shion naquele momento dá por encerrada a luta e a vitória a Cora, oficializando-a como amazona de bronze de Raposa.

—EU SABIA! –Kanon comemorou e os meninos pulavam ao seu redor, como se fossem uma torcida organizada.

Assim que todos saíram do Coliseu, Kanon foi até o centro da Arena acompanhado por Afrodite, Giovanni e Shura de Capricórnio para cumprimentá-la por seu feito. Cora olhava para a urna da armadura, sentada no chão, descansando.

—Que fossa é essa? –Kanon foi logo perguntando e Cora o olhou por sobre o ombro. –Devia estar comemorando sua vitória.

—Ihu! –ela ergue o punho numa comemoração desanimadora e volta a olhar para a urna.

—Qual o problema? –ele colocou a mão na cintura, estranhando o comportamento dela.

—Nada. Só que... estou com um pouco de medo.

—Medo? Mas o que tá falando?

—Medo? –Afrodite sentou do lado dela, perguntando, com o inseparável Giovanni ao seu lado.

Ela olhou para Afrodite e o pegou no colo, abraçando-o bem forte.

—Nhaiiii!!! Você é a coisa mais linda e fofa que eu já vi na vida!

—Isso não é jeito de uma amazona se comportar! –disse Kanon.

Ignorando o amigo, Cora pega Giovanni e faz o mesmo, com os dois meninos no colo e tirando a máscara, de costas para Kanon e Shura, dando beijos nos rostos dos meninos.

—São tão fofos!!! –dizia apertando eles. –Posso ficar com eles?

—COLOCA ESSA MÁSCARA!  -Kanon pedia, cobrindo os olhos de Shura. –ELES NÃO SÃO FILHOTES PARA FICAR COM ELES!

—Tá, seu bobo.

Cora recoloca a máscara e solta os meninos que estavam tontos e corados. Ela em seguida se levanta e com o rosto coberto fita o amigo.

—Que bobeira é essa de medo? –ele perguntou.

—Da responsabilidade que essa armadura representa agora.

—Não diga asneiras, Cora. Mas que droga! Você superou tudo até chegar aqui e ter essa armadura, dá pra ficar feliz ao menos por ter conseguido entrar para os cavaleiros?

—O que o Kanon quis dizer é que com certeza você conseguirá superar suas expectativas e será uma amazona a serviço de Atena a ser admirada. –explicou Shura com a expressão inalterada.

Cora coloca as mãos para trás do corpo e inclina a cabeça, fitando o rosto corado de Kanon.

—Ele sabe ser adorável com as palavras, não sabe? –ela disse, sorrindo por debaixo da máscara. –Só anda mal humorado ultimamente.

—Vocês são todos idiotas. –Kanon resmungou.

Shura nesse momento pede licença para se retirar e lembra aos meninos voltarem ao treinamento, e como pertenciam a um seleto grupo treinando especialmente para um dia usarem uma armadura dourada, tiveram que obedecer e reiniciar a dura rotina de exercícios.

Os meninos se afastam, deixando Kanon e Cora sozinhos, que ficaram um bom tempo se encarando, sem saberem o que falar um para o outro.

—Vamos caminhar? –ela sugeriu de repente, pegando a urna e carregando-a por uma alça no ombro. –Vamos deixar isso em minha casa antes?

Os dois caminhavam lado a lado, sem se dirigirem a palavra até chegarem na cabana que era a modesta residência de Cora. A jovem deixou a sua recém adquirida armadura no local e em seguida recomeçaram a caminhar, até que seus passos os levaram de modo inconsciente até a macieira onde se encontraram pela primeira vez. Aquele local se tornou o preferido dos dois amigos, onde se encontravam e treinavam ao fim do dia, ou para jogar conversa fora.

—Você anda estranha, Cora. –disse Kanon de repente.

—Você também, Kanon. Desde que seu irmão se tornou cavaleiro estou te achando um pouco amargo.

—Impressão sua. –desviou o olhar.

—Fala logo!

—Saga acha que engana a todos. –começou a falar, encostando-se na árvore, Cora faz o mesmo no lado oposto da árvore.

—Como assim?

—Desde que meu irmão passou a usar a armadura de ouro, ele tem tido atitudes estranhas. –continuou a falar. –Ele não é o senhor da bondade como todos pensam. Ele não é essa pessoa boa que tenta aparentar, é como se houvesse algo terrível dentro dele crescendo, eu consigo ver isso.

—Quem olha assim e não te conhece, acharia que está com inveja de seu irmão.

—Acha isso? –ele virou-se, se preparando para brigar com Cora pelo comentário.

—Claro que não. Eu te conheço bem, seu bobo! –ela chutou uma pedra para longe. –Seus problemas parecem bem maiores que os meus.

—Ah, para de dizer essas coisas. –voltou a se encostar na árvore, colocando as mãos atrás da cabeça e fechando os olhos. –Vai falar o que tem te incomodado?

—Estou gostando de uma pessoa.

Kanon arregala os olhos com aquela confissão e vira para Cora.

—Q-que? Quem?

—Não vou falar. Ele não sabe disso.

—Ah, vai me deixar nessa curiosidade? Eu tenho que saber quem é o futuro cadáver!

—Kanon! –Cora, virou-se para o amigo. –Não vai fazer nada com ele, já que ele nem sequer sabe que eu existo como mulher!

—Hein? Se ele não te vê assim é um idiota.

—Ele é um pouco lerdo mesmo. –continuou a falar. –Meu medo é de um dia ir em uma missão e não voltar mais, e ele não ficar sabendo o que sinto. Mas é bem capaz disso acontecer, já que ele não me vê diferente do que vê os amigos dele.

Kanon deu a volta na árvore, se apoiando em seu tronco, ele a fita um instante e em seguida desvia o olhar, parecendo um pouco constrangido.

—Devia... dizer a ele. Se não o fizer ele nunca vai adivinhar.

—Devia. Mas tenho medo de que ele se afaste de mim se souber. –Cora dá alguns passos, pegando uma flor do campo que crescia entre o gramado alto. –Ele já viu meu rosto uma vez.

Kanon fica surpreso com essa revelação. Como assim um desconhecido viu o rosto de Cora, sendo que ele, seu amigo de anos, nunca mais o viu desde que eram crianças!

—Mas ele não ligou para isso.

—Cora... esse cara... er... –coçando o rosto com o indicador, sem graça. –Como assim ele viu seu rosto? E a lei da amazonas? Quer dizer... ele deve ser cego, pois eu acho que você deve ser bonita e tal...

—Kanon... –Cora se vira e encara Kanon. –Você é muito lerdo!

Kanon pisca os olhos tentando entender o que ela quis dizer, depois ele percebe realmente de quem ela estava falando e fica surpreso com a revelação, sem saber o que falar. Cora leva a mão até a máscara, pronta para retirá-la e mostrar finalmente seu rosto agora mais velho para o rapaz, mas ele a abraça forte, impedindo seu gesto.

—Pense bem. –ele lhe dizia. –Se eu a soltar, verei seu rosto. Sabe as consequências disso?

—Sei bem. –ela suspirou, terminando de tirar a máscara e deixando-a cair ao lado do corpo, Kanon fechou os olhos sem relaxar aquele abraço. –Mas eu vou ser revolucionária, sabe? Se olhar meu rosto e não gostar do que ver, não vou te obrigar a nada e nem arrancar sua cabeça por isso.

—Como pode afirmar que eu não vou gostar do seu rosto, se sempre o achei bonito desde que eu a vi pela primeira vez. –ele diz, sorrindo. –E estou sempre imaginando o quanto deve estar lindo agora.

Hesitante, ele relaxa o abraço e se afasta fitando o rosto da jovem. Os mesmos olhos vivazes e castanhos fitando-o um pouco constrangida. A mesma boca de linhas fortes, cheios e o nariz que em sua opinião era perfeito.

—Não se parece mais com um menino! –ele comentou.

—Faz quatro anos que não vê meu rosto e só tem a dizer isso? Que não pareço mais um menino?

—Mas só sendo besta para te confundir com um menino agora. –ele disse, sem graça, fazendo um gesto com as mãos simulando seios. –Não está mais reta.

Cora solta uma imprecação, não acreditando no que ele havia dito, dando as costas para Kanon que a pega pelo braço, fazendo-a se voltar e encará-lo. Sem dizer nada, ele inclina a cabeça e deposita um beijo delicado e hesitante de início em seus lábios, depois ergueu o rosto e fitou o de Cora.

—Estava brincando.

—Pensei que diria algo mais profundo se visse meu rosto. Ledo engano, sutileza não faz o seu gênero...

—Você é linda, Cora. –ele a interrompeu e a jovem ficou ruborizada. –Ainda mais linda com as faces vermelhas.

O rapaz volta a beijá-la novamente, ainda de modo delicado, explorando e descobrindo aos poucos as sensações de beijar pela primeira vez alguém que realmente lhe despertava sentimentos puros.

A partir daquele momento, deram início a um namoro, que tornou os próximos meses da vida de Kanon um verdadeiro paraíso. Dois anos de amor verdadeiro, dois anos em que pareciam inseparáveis e que aprenderam a se amar de todas as formas possíveis.

Juntos compartilharam a descoberta do prazer com seus corpos, vencendo a timidez e se amando profundamente. Por dois anos, viveram o Paraíso, um Paraíso que logo iria terminar, e Kanon se veria arrastado ao inferno.

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Algum tempo depois, o grande Mestre Shion chamava ao Décimo Terceiro Templo o Cavaleiro de ouro Saga e a amazona de bronze Cora, ambos se encontravam ajoelhados diante do idoso Patriarca, esperando que este lhes dissesse o motivo daquela convocação.

—Recentemente recebemos uma mensagem sobre abalos sísmicos ocorrendo na Síria. –dizia o Patriarca. –Precisamente aos pés do Monte Hérmon.

—E por qual razão esses abalos seriam de interesse do Santuário, mestre? –indagou Saga.

—Há milênios atrás a deusa Atena selou nessa montanha o monstro Équidna, esposa do terrível Tiphon e mãe de todos os monstros. –explicou. –A razão desses abalos é que esse monstro sentiu o renascimento de Atena em nossa era e deseja romper o selo que a mantem aprisionada. Em breve, uma nova Guerra Santa irá surgir e não podemos nos dar ao luxo de uma batalha sem precedentes contra um ser como Équidna e as criaturas que ela pode vir a gerar para nos enfrentar.

—Entendo. –Saga baixa o olhar.

—Quero que os dois vão até o Monte Hérmon e selem novamente Équidna. –ordenou.

—Sim!

Cora respondeu solicita, mas Saga a olhou de lado e em seguida questionou o mestre.

—Patriarca, como cavaleiro de ouro posso resolver essa questão sozinho. Não há necessidade de uma amazona de bronze me acompanhar.

—Saga, peço que leve Cora de Raposa com você. –determinou o mestre. –Ela tem se mostrado uma poderosa amazona, com um cosmo impressionante em suas recentes missões. Desejo que aprimore suas técnicas e ela aprenderá muito ao seu lado.

—Mas...

—Saga, é uma decisão que não voltarei atrás. –disse o idoso encerrando o assunto. –Ao retornar de sua missão, o esperarei aqui para que me passe um relatório de seu sucesso. Também tenho uma importante revelação a fazer a você.

—Mestre... perdoe minha indiscrição, mas porque não pode me contar agora antes que eu parta?

—Porque desejo que Aiolos de Sagitário esteja presente e ele ainda não retornou de sua missão ao Egito, ao lado de seu pequeno irmão. –disse sorrindo. –Acalme seu coração e vá cumprir essa importante tarefa! Que Atena os acompanhe!

—Sim!

Disseram os dois ao mesmo tempo, se levantado em seguida e saindo do salão. Do lado de fora, Saga virou-se para a jovem amazona, ele sabia que Cora e o irmão estavam em um relacionamento.

—Tem uma hora para se despedir de Kanon, pegar suas coisas e me encontrar na saída do Santuário. –avisou Saga. –Quanto mais cedo partimos, mais cedo cuidaremos disso, concorda?

—Sem problemas! –ela faz um gesto imitando uma continência, Saga franziu o cenho. –Relaxa, Saga de Gêmeos. Não vou te atrapalhar, eu prometo! Pode me matar se achar que irei causar problemas durante a missão!

—Não vamos chegar a tanto, né? –Saga sorri de lado e se afasta. –Não seria legal se eu fizesse isso a namorada do meu irmão.

Cora sorri e corre na direção do pequeno morro, onde a macieira que tanto amava se encontrava. Lá avisou Kanon ocupando-se de entalhar algo em seu tronco e se aproximou dele.

—Oi!

Kanon virou-se e a abraçou pela cintura, com um sorriso retirou a incomoda máscara e beijou os lábios da garota, apertando-a em seus braços logo em seguida, como se não quisesse que nunca mais ela se afastasse dali.

—O que o velhote queria? –perguntou, acariciando seu rosto.

—Uma missão.

—Agora? –disse desanimado, depois beijou seu pescoço e a provocou com um sorriso cheio de malícia. –Justo agora que queria continuar o que começamos ontem à noite.

—Vamos continuar quando eu voltar. –ela lhe deu um beijo, se afastando em seguida ao ver o que ele acabara de fazer na macieira. –“C” e “K”?

—Oficializando a nossa posse na macieira! –respondeu, abraçando-a por trás. –Que tipo de missão?

—Algo grande envolvendo uma titã na Síria. –Kanon ficou tenso com a informação. –Acalme-se! Irei com um cavaleiro de ouro!

—Quem?

—Seu irmão.

—Saga? –ele parecia descrente.

—Não se preocupe. –ela deposita um selinho em seus lábios. –Volto em alguns dias. Até lá se comporte, viu?

—Está bem. –respondeu sem muita convicção, mas puxando-a quando a viu se afastando e a beijando com ardor, depositando naquele beijo todo o amor que sentia pela amazona. -Para que não se esqueça de mim na viagem.

—Não há como eu me esquecer de você.

—Só quero ter certeza. –disse colocando a mão no bolso. –Pode fechar os olhos?

O fitou desconfiada.

—Confie em mim. –ele insistiu.

Cora obedeceu e Kanon retirou do bolso um pingente com uma corrente delicada, colocando-a em seu pescoço. A jovem abriu os olhos, levando a mão até o presente, olhando admirada a plaquinha, com as iniciais de seus nomes entrelaçadas.

—Estarei aqui te esperando. –disse-lhe, acariciando seu rosto.

—Eu sei. –ela sorri e beija seus lábios. –Obrigada pelo presente.

Cora disse sorrindo e em seguida recolocou a máscara partindo dali. De longe, acenou para Kanon. Eles não sabiam, que aquela era realmente uma verdadeira despedida.

Dias se passaram e Kanon não conseguia controlar sua ansiedade com a demora no retorno de Saga e Cora. Ao final de cinco dias, ele ao longe avistou o irmão retornando a passos lentos ao Santuário, sem a amazona com ele. Notou o semblante entristecido do irmão, que ele carregava a urna da armadura de bronze às costas, e quando Kanon se aproximou deste, desviou o olhar sem coragem para fitá-lo. Nesse momento, Kanon sabia que ela não retornaria mais.

—O...o que houve?

—Équidna havia se libertado... não contávamos que fosse um inimigo tão poderoso. Eu sinto muito... –ele estende a mão, mostrando a Kanon o pingente com o qual ele havia presenteado Cora, com a corrente partida. -Eu... não consegui proteg... –não conseguiu dizer mais nada, sendo calado por um soco de Kanon em seu rosto.

O irmão o fitava com ódio mortal, mas Saga não reagiu, compreendendo bem a dor que ele sentia naquele momento.

—Maldito seja, Saga!

Kanon disse entre os dentes, erguendo o punho novamente contra Saga, mas se contendo. Lágrima amargas banhavam seu rosto quando se ajoelhou e pegou a corrente caída no chão, dando as costas ao irmão e saindo dali.

Daquele dia em diante, a relação entre eles havia se abalado de tal modo que parecia que o ódio e o rancor os movia. Até o dia em que Kanon provocou Saga sobre sua verdadeira natureza maligna, para que traísse Atena. E este o prendeu no Cabo Sunion acusando-o de traição. No fundo, Saga desejava que uma temporada no local abrandasse o ódio em seu coração e ele aprendesse a perdoar.

O perdão não veio nos anos seguintes. E somente depois da terrível batalha contra Hades é que Kanon aprendeu a perdoar o irmão pelo o que houve com Cora. Sabia que no fundo não podia culpá-lo pelo o que houve, pois cavaleiros do Santuário viviam e morriam por Atena, eram seus destinos e Cora o cumpriu bravamente.

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Hoje...

—Mas mesmo assim, não é fácil. –murmurou traçado com o dedo indicador as letras entalhadas no tronco da macieira. –Sinto sua falta, Cora.

Com um suspiro saiu dali, voltando a caminhar na direção das Doze casas, tentando esquecer novamente em vão o rosto, o sorriso e os beijos da única mulher que realmente despertou nele um sentimento puro e verdadeiro.

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Alguns meses depois...

Kanon observava com interesse o duelo entre dois aspirantes a armadura de bronze de Cruzeiro do Sul. Os dois garotos eram fortes e talentosos, o que tornava a disputa bem emocionante para os espectadores, a ponto de não perceber a presença de um cavaleiro que abria caminho entre a multidão para se aproximar do ex-general marina.

—KANON! –Saga praticamente gritou o nome do irmão, atraindo os olhares das pessoas próximas.

—Saga? –Kanon o fitou surpreso. –Que foi, homem? Já retornou de sua missão? Algo errado no que foi resolver lá na maldita Síria?

Saga parecia aflito, ansioso. Tentou recuperar o fôlego e segurou o irmão pelos ombros.

—Kanon... eu a encontrei... por Atena, eu a encontrei! E eu a trouxe de volta!

—Do que está falando? –não compreendo o que ele dizia.

Saga então o segurou a força pela camisa, arrastando-o para fora do Coliseu, e apontando para a figura de uma jovem de longos cabelos castanhos escuros, usando um modesto vestido azul, cuja saia chegavam até os joelhos. Ela olhava curiosa em todas as direções do Santuário, admirando aquelas milenares construções.

Kanon a fitou estático, não conseguia dizer nada. Não conseguia se mexer. A jovem desviou o olhar do que fazia e fitou o ex-Dragão Marinho, mas parecia não reconhecê-lo, parecendo confusa. Por fim, Kanon só conseguiu murmurar um nome:

—Cora?

Fim...

Não... um começo.

Aguardem. Continua em breve em outra fic. :3


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