Como cães e gatos escrita por kelly pimentel


Capítulo 22
Que palhaçada é essa?




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/716104/chapter/22

Por incrível que pareça, Fábio Jr – como Fábio insistiu em chamar nosso bebê para o projeto de responsabilidade parental de Belotto e Renato – não sofreu grandes traumas e conseguimos uma boa nota. O que deixou Fábio radiante. Passamos a semana nos revezando com o bebê, o que foi a desculpa perfeita para que pudéssemos conversar na escola sem levantar suspeitas, embora Bruna tenha feito questão de pontuar o modo como eu e Fábio estávamos nos dando bem e ainda aproveitar a ocasião para deixar claro que a história entre eles ainda não estava no passado. Em casa as coisas melhoraram um pouco, ou pelo menos não pioraram. Eu e Bárbara adotamos a política de não entrar no caminho uma da outra, passei um pouco de tempo com a Joana assistindo um dos jogos do torneio de vôlei com ela e meu pai, o que foi bacana. Também passei um tempo com Tio Caio, Tânia, Fábio e Luiza num dos jogos, o que foi estranho e engraçado ao mesmo tempo. Gosto de ver como meu tio está feliz ao lado da mãe de Fábio, e também gosto de ver como Fábio é ciumento com a mãe. Deve ser irritante para ela, mas para mim é hilário. Tio Fábio e Caio não se dão tão bem, meu tio é uma pessoa que gosta de ordem, Fábio está mais para um rebelde sem causa, mas percebo que ambos se esforçam pela Tânia.

Aproveitei para conversar um pouco com a Luiza sobre o “caso Larissa”, mas ela não sabia muito mais do que eu. Ainda assim, aquilo serviu para que eu me sentisse mais segura com relação ao meu namoro. É claro que eu imaginava que ele não era virgem, é um garoto bonito que tinha namorado com uma deusa loira que esbanja sexualidade, mas ter certeza realmente me incomodou, me fez pensar quais expectativas eu teria que manter, mas Fábio foi incrível em todos os aspectos e sei que ele foi verdadeiro, então, depois de muito pensar, resolvi desencanar. Quando eu estiver pronta, vou estar. Talvez seja com ele, talvez seja daqui a vários anos, com outra pessoa. Eu sei como eu me sinto quando chego perto dele, quando estamos sozinhos, quando ele me toca, mas tem tanta coisa que eu não sei. De qualquer forma, sei que não tem pressa e que preciso conversar com alguém experiente, provavelmente Juliana.

 E por falar nela, minha irmã tem estado bem melhor. A amizade com Martinha, aparentemente, voltou ao normal, então acho que ela está bem. Martinha ainda não revelou a paternidade do filho, mas Juliana me contou que questionou se Jabá era o pai e a amiga negou. Não sei se Juliana está convencida ou se resolveu simplesmente desencanar.

Depois de uma semana cheia de emoções, tudo que eu preciso é de uma pouco de distração. Isabela me convenceu a ir numa festa no Hostel, claro que isso envolveu um pouco da mágica de Juliana no quesito “convencer o seu Ricardo”. Minha irmã se comprometeu de ir depois da aula e voltar comigo. Outro que precisou de um pouco de convencimento foi Fábio, “eu não gosto de baladas, principalmente quando não posso beijar a minha namorada na frente de todo mundo”, foi o que ele disse quando o convidei, mas dei meu jeito. Sei que é só uma festa, mas é engraçado e ao mesmo tempo assustador ter noção do quanto ele gosta de mim, do quanto ele faria por isso.

—Sabe, eu nunca pensei que diria isso, mas namorar com o Fábio realmente te fez bem. Você está mais alegre, sorridente. – Isabela diz enquanto termino de me arrumar. Minha amiga está sentada na minha cama junto com Luiza.

—Ele é maravilhoso.  – Digo um pouco sem graça. Luiza ergue a sobrancelha me encarando.

—Isso é estranho. Vai ser complicado para me acostumar. Além disso, eu ainda não superei o fato de que a Isa ficou sabendo dessa relação antes de mim.

—Ah, mas eles não me contaram. Eu peguei os dois no flagra. Meus olhos ardem até hoje do que vi. – Isa afirma sorrindo. Pego a tampa do batom e jogo nela.

—Não estávamos fazendo nada demais. O Fábio só estava...

—Procurando alguma coisa dentro da sua boca. Sei como é. – Isabela retruca.

—Vamos mudar de assunto? – Luiza propõe. – Os detalhes da Manuela e meu irmão se beijando realmente são demais para mim. Qual a mentira que você contou para sua mãe dessa vez Isabela? – Luiza questiona.

—Nenhuma. Eu conversei com ela e disse que ela precisava confiar em mim. Afinal de contas, eu nunca fiz nada de errado. Pelo menos não nada que ela saiba.

—Você é terrível! Acho que a minha mãe estaria aqui agora, dando opinião na minha roupa, me dando conselhos sobre como não me deixar definir por garotos. – Pensar na minha mãe me deixa um pouco triste. Como eu gostaria que ela estivesse aqui.

—Você sente muita falta dela não sente? – Luiza pergunta.

—Às vezes eu não consigo lembrar dela direito. Mas em alguns momentos eu tenho essa onda de sentimentos e memórias que eu não sei se são reais, mas que me enchem de uma sensação boa.

—Se você sente, é real. O resto é tecnicalidade. – Isabela diz.

—Você sempre tem que usar palavras grandes, não é? – Luiza afirma. Ela pega o telefone e encara a tela, deve ser a décima vez que faz isso desde que chegou aqui em casa.

—É uma doença. Não acho que ela pode controlar. – Completo.

Luiza tira o telefone do bolso e parece desapontada com algo.

—Droga! – Ela bufa. – Lucas vai demorar um pouco. Ele vai levar a Martinha em casa antes de ir para o Hostel. Eu adoro que o meu namorado é um fofo que ajuda a amiga, mas ele realmente tem gastado muito tempo com ela.

—Ela deve estar passando por uma barra danada. – Digo.

—Verdade. Nem consigo imaginar, mas também, quem é que esquece de usar camisinha em pleno século 21? – Luiza questiona.

—Mais gente do que você imagina. – Isabela afirma. – É bom que ela tenha os amigos por perto já que decidiu ter esse filho.

—Como assim decidiu? Você acha que ela considerou a possibilidade de abortar? – Luiza questiona.

—Eu abortaria. – Afirmo. – Eu não teria um filho aos dezessete anos.

—Simples assim? – Luiza questiona me encarando.

—Não. Não é simples assim. Claro que seria terrível, mas eu não teria um filho sem planejar a gravidez. É irresponsabilidade colocar uma criança no mundo sem estar pronto para lidar com ela, para oferecer todo amor possível, todo o suporte necessário.

—Eu acho que também abortaria. – Isabela afirma.- Minha tia fez um aborto, ela fala disso sem problemas. Na verdade, todo mundo fala sobre tudo na minha família, psicólogos demais juntos. Mas enfim, ela sempre diz que não se arrepende, que nunca quis ser mãe. E eu respeito isso. É o corpo dela, a vida dela.

—Também é a vida de uma criança inocente.

—É a vida de uma criança inocente. E é por isso mesmo que ela não deve vir ao mundo para ter uma vida ruim. – Isabela argumenta.

Meu telefone toca interrompendo o debate.

—Insuportável? É assim o nome do Fábio no seu celular? – Luiza indaga sorrindo. – Posso atender?

—Não! – Avanço em direção à cama e pego o telefone.

..................................x..................................

—Você e a artilheira? -Tiago pergunta. – Bom, estava bem claro que você queria isso, mas se eu tivesse apostado teria perdido meu dinheiro, não achei que ela fosse cair nesse teu papinho.

—Tiago, você precisa parar de apostar cara. Seu palpite é sempre ruim. Até um dia desses você achava que eu ia voltar com a Larissa.

—Meu querido, a Larissa é sem explicação. Se aquela mulher tentasse me matar eu ainda voltaria com ela. – Encaro Tiago. Não quero falar de Larissa, ela é um assunto morto e enterrado pra mim. -  Larissa, Manuela... ô sorte que tu tem pra pegar mina gostosa!

—Dá pra você respeitar a Manuela? – Questiono. Não pretendia contar nada para Tiago, mas somos amigos há muito tempo e eu precisava explicar porque estava indo para uma festa no Hostel e fazendo-o me acompanhar, considerando que eu quase nunca vou pra festas.

—Sinto muito. Vou me corrigir: mas ô sorte que você tem para pegar, com todo respeito, claro, mina gostosa. – Tiago sorri e eu não consigo me segurar e acabo fazendo o mesmo.

—Mas lembra que nós estamos mantendo a coisa em segredo por enquanto. Não vai dar com a língua nos dentes.

—Você me arrasta da santa paz do meu lar, logo eu, um cara caseiro. E ainda me pede para guardar um segredo? – Meu amigo questiona cheio de ironia.

—Eu tô falando sério cara. A Manuela não quer confusão com a Bruna e eu respeito isso. Vamos esperar mais umas semanas.  

—Juro, juradinho. – Tiago diz beijando os dedos cruzados com uma expressão de deboche. – Mas falando sério: pode deixar!

Chegamos no Hostel e Tiago rapidamente se anima. O local não está muito cheio, mas o pessoal da noite do Dom Fernão ainda não largou, o que justifica. A banda ainda está terminando de montar os instrumentos enquanto um DJ toca. Vejo Manuela, minha irmã e Isabela assim que entramos, elas estão numa mesa bem próxima do bar.

—Boa noite! – Tiago diz cumprimentando-as. – Luiza, é sempre um prazer, principalmente, considerando que você fica cada vez mais bonita.

—Você não tem jeito! – Luiza diz corando. Minha irmã costumava ter uma certa, bem... para usar o termo que ela mesma usaria: uma certa queda pelo Tiago. Mas isso era antes, agora ela namora com um garoto três anos mais velho. Tiago certamente está arquivado.

—E você, quando vai jogar com a gente novamente? – Ele pergunta encarando Manuela. – Sabe, nos trocamos o Carlos e até mesmo o Fábio por você rapidinho.

—Você já jogou com os garotos? Quando foi isso? – Luiza questiona.

—Um tempo atrás. - Manuela responde – Tiago, essa é a Isabela, ela estuda com a gente no Dom Fernão.

—Eu sabia que deveria ter trocado de escola junto com o Fábio. – Tiago diz beijando a mão de Isabela que não parece impressionada.  

—Ok, Dom Juan. – Digo batendo nas costas do meu amigo. – Vamos sentar.

Manuela está com o cabelo preso numa trança e usa uma blusa com estampa xadrez, me aproximo e beijo seu rosto. Ela fica constrangida e eu acho graça. “Você está linda”, digo. Percebo que todos na mesa nos observam, mas não me importo. Todos eles sabem e ninguém mais nesse Hostel poderia deduzir qualquer coisa por um beijo no rosto. Além disso, suponho que ninguém aqui saiba quem somos ou se importe com isso.

—Eu não acredito que vocês foram pra Praia Vermelha juntos. Quando foi isso? – Luiza questiona. Olho pra Tiago e ele ergue os ombros fazendo sua típica expressão de “foi mal”.

—Tem mais de um mês. – Manuela responde.

—Não foi nada combinado. – Argumento. – Olha o seu namorado ali. – Digo pra Luiza indicando Lucas. Ele está acompanhando por Juliana, Martinha, Jabá e Júnior, como quase sempre. Todos de mochila, mas vestidos para festa. Luiza levanta e vai ao encontro do namorado.

—Aquele é o namorado da Luiza? – Tiago pergunta.

—Infelizmente. – Digo. Manuela me olha de forma repreendedora.

—Ele é um cara bacana. O Fábio que é extremamente implicante.

—Que calúnia! – Isabela fala sorrindo. Olho para garota que me encara de forma desafiadora.

—É bom ver que a sua fama continua a mesma. – Tiago diz se juntando do recém-formado complô contra mim.

—A Luiza não disse que a Martinha ia pra casa? – Isabela pergunta à Manuela.

—Disse que o Lucas ia levá-la em casa. – Manuela responde.

Lucas se aproxima com Luiza e nos cumprimenta. Os amigos passam direito, com exceção de Juliana que faz questão de falar com Manuela e me olhar de com um ar de riso.

—Sua irmã e Jabá estão bem? – Pergunto.

—Eu achei que estavam. Mas já devo ter perdido as contas.  - Manuela diz.

O Hostel vai lotando, bem como ficando mais barulhento. Luiza e Lucas levantam para dançar, Manuela faz o mesmo junto com Isabela, ficamos apenas eu e Tiago na mesa.

—Porque você não vai dançar com a sua garota e desmancha essa cara emburrada? – Meu amigo sugere.

—Eu até poderia dançar com ela, mas só isso. É bastante irritante não poder ter nenhum tipo de intimidade com receio de que alguém esteja vendo. Além disso, eu me sinto idiota dançando música eletrônica.

—Então, se você me der licença, eu vou dançar. – Thiago diz levantando da mesa.

Observo enquanto ele se aproxima de Manuela e Isabela e dança com elas. Manuela olha na minha direção e ergue as sobrancelhas sorrindo. Depois de algumas músicas, decido me juntar a eles.

—Olha quem se rendeu. – Tiago diz. – Ficou com medo que ambas se apaixonassem pelos meus dotes na dança?

Ignoro o comentário do meu amigo e tento acompanhar os movimentos do grupo.

—Achei que você ia ficar a noite inteira ali. – Manuela fala próximo ao meu ouvido.

—A vista estava ótima. – Respondo. Para uma lutadora marrenta você até que é boa dançando.

Antes que Manuela possa responder, Luiza se junta ao pequeno círculo que formamos. Ela está chateada, conheço-a o suficiente para saber disso.

—Cadê o Lucas? – Questiono. Imagino que meu cunhado seja o motivo da chateação.

—Foi ficar um pouco com os amigos. Eu preferi não ir. 

Penso em dizer que Luiza precisa aprender a não depender da companhia do namorado para se sentir bem, mas desisto, não é a hora nem o lugar para um sermão. Além disso, uma música começa a tocar e Manuela me encara sorrindo, não percebo de imediato o porquê do sorriso, mas então o refrão deixa tudo mais claro, é a música que tocou na festa da Carla quando nos vimos, no dia em que achei que fosse ficar maluco ao ver aquela cara com a Manuela, no dia em que, finalmente, começamos a nos entender. Pego Manuela pela cintura e trago-a para perto de mim.

 -Você lembra? - Manuela questiona.

            -De cada detalhe. Dos bons e dos ruins. - Respondo aproximando meu rosto do dela.

—Fábio.. – Ela começa a dizer. Mas aceno minha cabeça negativamente.
       
              -Ninguém se importa. Ninguém está olhando. Vem aqui. – Digo aproximando nossas bocas. Manuela passa seus braços no meu pescoço e nos beijamos. A próxima coisa que escuto é a voz de Bruna dizendo “Que palhaçada é essa?”.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Como cães e gatos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.