Entre as flores escrita por Eric Elgae


Capítulo 1
Capítulo único- Entre as flores


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas!
O doido do Eric postando uma shot de Yuri On Ice a essa altura...
Por que?
Eu explico.
Um ser- não humaninho(a)- foi no face me dizer que eu não conseguiria escrever sobre Yuri On Ice por que eu não saberia captar a "essência do anime, que tem uma pegada mais pura apesar de rolar uma romance gay assumidamente disfarçado. Sua escrita é muito pornográfica pra se encaixar em YOI!"

Criatura, sou sagitariano. Isso já soou como um desafio, e eu sou competitivo e paranoico e... Oras, já escrevi mil fics sem sexo, putaria e etc. Obviamente que esse ser não deve ter lido nem as originais nem as shots amorzinho. Portanto, aqui está a prova que eu consigo escrever qualquer coisa sim.

Como estávamos debatendo teorias do que iria acontecer no anime, e eu sei que a que eu usei na fic o serzinho detestaria... Fiz com a teoria mais doida por que sim, sou desses.

E acho que vai acabar assim mesmo o anime....haha

Bom, é um songfic, embalada pela música "Uma vez mais"- do Ivo pessoa. Deixarei o link nas notas finais, claro.

Sem mais enrolação e explicada minha sede de calar a boca alheia que duvida de coisa já feitas antes, espero que curtam a fic.

Boa leitura, nos vemos lá embaixo.



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Voa minha ave
       Voa sem parar

O som da multidão podia ser comparado ao barulho de um terremoto. Do subsolo da arena, Yuri sentia as paredes tremendo com a vibração do público. Além dos urros e palmas, o pessoal que assistia a final do mundial de patinação batia na arquibancada, fazendo tudo tremer naquele pedaço.

O evento estava fazendo tanto sucesso que poderia dizer que havia conquistado mais público do que as últimas olimpíadas.

Bom, afinal de contas era a final do mundial. Após disputas mais do que árduas, surpresas que emudeceram quem acompanhava o campeonato e muito suor e lágrimas, chegara o dia da grande final.

Em número de público, premiações, e popularidade aquela edição já era confirmada no próximo livro dos recordes. O mundo inteiro -literalmente- estava com as atenções voltadas para o último dia do evento.

E a última apresentação era a mais esperada.

A de Yuri. Yuri Katsuki.

Desde o início do campeonato desse ano, ele surpreendera em cada apresentação. O tema que usou foi  “Vida”.

Já participara no campeonato do ano anterior com o tema “Amor”. E conquistara coisas que jamais pudera imaginar.

Superou a si. Descobriu um lado seu que nunca imaginou possuir. Competiu, deu seu sangue, seu melhor para chegar até o final.

A cicatriz na testa, coberta pela longa franja, coçava às vezes. Conquistada por conta de uma batida severa na mureta de uma pista, ela era um símbolo para Yuri.

Uma medalha de honra. Prova marcada no corpo de sua vitória.

Sua maior vitória.

Não foi apenas a medalha. Ou a posição. Não.

Sua vitória foi a de estar ao lado dele.

Victor Nikiforov.

O maior patinador no gelo que já existiu. Pelo menos para Yuri. Desde pequeno acompanhava cada apresentação e disputa do seu ídolo.

Como vibrava com cada salto. Cada toe loop. Cada flip. Cada salchow.

Cada sorriso.

Quando o via pela TV esquecia-se de respirar. Cada vez que os cabelos claros se moviam graciosamente sobre seu rosto, Yuri sentia-se como se derretesse por dentro.

Victor era perfeito.

O melhor patinador.

O mais belo.

O mais gracioso.

O mais intenso.

Victor era seu ídolo. Sua inspiração. Sua paixão.

Era sua vida.

A penúltima apresentação estava acabando. Chegara a hora de subir ao palco.

Por que se decidira a dar um verdadeiro show.


Viaja pra longe
Te encontrarei
Em algum lugar

 

A medida que subia os degraus terminando seu alongamento, Yuri se lembrava cada vez mais de Victor. Quantas vezes subira por escadas como aquela com pressa, ansioso, na expectativa não apenas de competir, mas de ver seus olhos azuis fixos nele.

Aqueles malditos olhos azuis.

Inúmeras vezes dormira enxergando o olhar de Victor, que praticamente desvendava sua alma. Expunha seus segredos. Mostrava lados seus que ele jamais pensara em ver.

E quantas outras vezes acordara com ele o encarando fixamente. Com aquele sorriso perfeito, a expressão divertida e cheia de carinho. Então sua voz chegava a seus ouvidos, encantadora e sensual como se fosse o canto de uma ave exótica:

—Olá Yuri.

Não precisava de mais nada para que o dia fosse perfeito. Mas tinha muito mais do que aquilo.

Victor tomava café com ele. Saia para caminhar. Conversava sobre tudo e sobre nada. Fazia planos.

Planos de vida.

Até pouco tempo Yuri sequer pensava em qualquer coisa que fosse o dia seguinte. Depois que Victor chegou, ele passou a sonhar de verdade com um futuro.

Um futuro lindo. Glorioso. Cheio de louros.

Louros da vitória.

Mas a maior vitória era estar sendo treinado, observado e acompanhado por Victor.

Yuri se assustava quando pensava no quanto crescera. Em como se tornara agressivo.

Saiu do extremo da timidez, da ansiedade e da autocomiseração para o campo da audácia, da frieza calculada e da arrogância.

A surpresa foi coletiva. O próprio Victor não acreditou quando em uma disputa direta contra Yuri Plisetsky, um jovem russo que queria a atenção de Nikiforov, no Japão era chamado de Yurio, ele praticamente humilhara o garoto na disputa.

E não disse uma palavra sequer. Apenas fez o que todos achavam impossível naquele momento.

Quando Yurio partiu para cima dele em um acesso de cólera, Yuri fez questão de ficar de frente para as primeiras câmeras que aparecessem. Desviou-se uma, duas, três vezes de uma agressão direta, mas na quarta vez revidara.

Claro, por legítima defesa.

Mas o seu maior prazer foi ver Nikiforov surgindo do meio do público, os braços abertos a sua frente, defendendo-o.

Acabando com Yurio.

Como patinador.

Como artista.

Como pessoa.

Todos entenderam que ele estava em choque, observando Victor destruir Yurio verbalmente. Na verdade ele estava estático por puro prazer.

Êxtase definiria melhor.

Aquela sim era a prova cabal e definitiva de que Victor era seu.

Apenas seu.

Inteiramente seu.

Mesmo que pouco tempo antes ele houvesse partido seu coração. Havia ido embora.

E longe como estava daquele que representava tudo de melhor que conhecia, Yuri por um segundo se entregou a um desespero que jamais imaginou ser possível.

 

Permaneço em ti
    Como sempre foi
           Mais perfeito e mais fiel

 

Parte da pista saltou a seus olhos quando se aproximou dos últimos degraus. O branco reluzia, trazendo lembranças mais fortes e vívidas.

A expectativa da multidão era enorme. Podia ouvir os gritos enlouquecidos de fãs, amigos, e muitos que nem sabiam por que estavam gritando.

Não importava muito na verdade.

Yuri saberia que conseguiria seu objetivo quando fizesse o mundo se calar. Sua apresentação agora era completamente focada nisso.

Arrancar o silêncio de todos com sua dança. Fazer com que todos que o vissem naquele dia, naquele momento, perdessem qualquer capacidade natural de emitir algum som.

Luzes piscavam. Flashes espocavam. Câmeras giravam.

Tudo a espera dele.

Apurou os ouvidos. Quando a voz firme do locutor o anunciou, ele entrou, acenando para a multidão.

Sério. Sem um sorriso sequer.

Dirigiu-se aos bancos onde colocaria os patins. Encarou as peças pretas e prateadas do que usaria naquele dia.

Um presente de Victor. Que já lhe trouxera muito mais do que achava que um dia poderia conquistar.

Nas laterais dos patins estavam gravadas as iniciais dos dois.

VY.

Como deveria ser desde o início.

Juntos.

Victor e Yuri.

Yuri e Victor.

Como sempre seria.

Não queria mais ninguém alem dele a seu lado. Não se sentia ninguém sem ele a seu lado.

Quando ele se fora, abandonando-o propositalmente para quebrar seu coração e assim despertar seu lado combatente, Yuri passou alguns dias entregue ao desespero e a loucura.

Não queria comer, beber nem dormir.

Por que dormir significava sonhar com ele.

Mas ficar acordado lembrava de que ele partira. Por vontade própria.

Deixando mais sozinho do que nunca.

Por que se antes de Victor se sentia sozinho, ainda tinha a impressão de que no fundo não era assim. Mas depois de conhecer o arco íris, nunca mais ele poderia achar graça na tempestade outra vez.

Após se calçar, ele se posicionou em frente a pista. A plateia gritava seu nome como um mantra.

Yuri.

Yuri.

Yuri.

Yuri.

Mas ele trocaria toda aquela agitação por uma única voz chamando seu nome.

A voz de Victor.

Não importava quanto tempo passasse. Ele estava marcado por Nikiforov.

Era dele, assim como ele era seu.

Respirou fundo. Por mais estranho que fosse, estava calmo.

Sabia que era o melhor. Sabia que ganharia. Sabia que nunca poderiam igualar a apresentação de hoje na história da patinação.

Isso para ele era tão certo quanto o fato de após o dia vir a noite.

 

Mesmo sozinho sei que estás perto de mim
Quando triste olho pro céu

 

Estava vestindo um boné e um moletom preto, comprido. O primeiro momento de surpresa aconteceu quando ele retirou o boné.

Os cabelos pretos estavam compridos. Compridos o bastante para formar um rabo de cavalo.

Mas ele os deixara soltos. Sacudiu a longa cabeleira negra, deixando que caíssem soltos nos ombros.

Um “ohhhhh” de surpresa já tomara a multidão.

Por que Victor tinha os cabelos na mesma altura quando estava no ápice da carreira.

“Eu aposto que por essa você não esperava, não é?”

Deixou que se passassem alguns segundos até que um dos locutores falasse algo sobre seu visual. Os elogios foram sem igual.

Mas isso não era nada ainda.

A cada apresentação ele desejava surpreender. Por que sabia que Victor gostava de surpresas. Gostava de impressionar, de marcar tanto o público quanto a história da patinação no gelo.

Victor era surpreendentemente previsível na sua ânsia de surpreender.

Agora era hora de dar início. Retirou o moletom vagarosamente. Mais uma vez a multidão soltou uma exclamação de surpresa.

Usava uma camiseta de mangas compridas. Em um tom de verde folha, toda lisa.

Incomum para uma apresentação daquele nível.

Certo burburinho começou. Mas não pensem que ele estava preocupado.

Ao contrário.

Entregara em mãos do locutor oficial o cronograma de sua apresentação. A música iria tentar expressar o que era a vida aos olhos de Yuri.

Portanto cada trecho exigia uma explicação.

Após tudo que conquistara, podia se permitir o luxo de fazer pequenas exigências. Uma delas fora de que aquele texto fosse aberto apenas cinco minutos antes da sua apresentação, ainda assim apenas para ser lido rapidamente pelo comentarista.

Olhando em volta, Yuri se dirigiu ao centro da arena. As luzes se apagaram, apenas um holofote voltado para o patinador.

Procurou na multidão, como sempre fazia, os olhos azuis.

Pois queria mais uma vez dedicar tudo a ele.

Quando a música iniciou-se muitos ainda conversavam. Mas qual não foi a surpresa quando a voz do locutor invadiu a arena onde o show acontecia.

Carregada de emoção.

Yuri fechou os olhos. Levantou a cabeça.

Era a verdadeira expressão de calma e serenidade.

—E agora a apresentação de Yuri Katsuki. A última da final dos melhores do mundo. E a mais aguardada também.

“Essa é para você, Victor! Como sempre!”


Quando eu te vi o sonho aconteceu
Quando eu te vi meu mundo amanheceu

 

Deslizando graciosamente pela pista, Yuri iniciou sua apresentação.

Na primeira parte, estava dando voltas simples. Seus olhos permaneciam fechados. Mas já conquistara parte de seu objetivo.

—A apresentação de Katsuki é baseada no tema “Vida”. Nesse início estranhamente simples, podemos ver o início de tudo. Quando ocorre o nascimento, uma nova vida vindo ao mundo, temos um momento cheio de esperança. Por isso ele veste verde, que é a cor oficial desse sentimento...

O silêncio chegava aos poucos, com a multidão cessando o falatório.

“Passadas largas. Voltas completas. Reconhecendo a pista como se estivesse reconhecendo o mundo. Assim iniciamos nossa trajetória no mundo, não é Victor? Calmos e curiosos, analisando sem pressa, descobrindo o que nos rodeia, e até onde podemos ir...”

Sentia o vento da movimentação batendo no rosto, remexendo o cabelo. Sabia que Victor entenderia essa parte, quando ele sentiu que nasceu para o mundo, no dia em que seus olhos pousaram nele através de uma tela de TV.

Descobriu que estava vivo.

Após alguns segundos retornou ao centro da pista. A música parou abruptamente e prosseguiu em um ritmo mais agitado, levemente cômico por assim dizer.

Mais um holofote se acendeu. Yuri levou as mãos aos ombros...

E retirou a camiseta verde.

Por baixo dela estava uma amarela clara, no mesmo modelo da anterior.

—Katsuki agora dançara sobre a alegria da infância. A época que nos é mais colorida e divertida, cheia de descobertas e sonhos, representada pela cor amarela, representando iluminação...

“Apenas os meus passos favoritos. As brincadeiras que jamais alguém faria numa competição. O modo torto de andar... A falsa impressão de queda...”

Um grito coletivo de surpresa ecoou quando Yuri começou a fazer movimentos repetitivos como se estivesse prestes a cair, e de repente...

—Um salto perfeito... A elegância do pouso demonstra...

“Lembra-se de quando me fez recordar como me senti pelas primeiras vezes numa pista de patinação, Victor? Quando me pegou pelas mãos, me mandou fechar os olhos e então me entregar apenas ás boas sensações, sem me preocupar com mais nada a minha volta? Foi pensando nisso que ensaiei essa parte...”

Yuri lembrava também de como se sentia vivo quando estava com Victor. De como sentira que estivera vivenciando uma longa noite e quando Victor chegou, ele experimentou a doçura de um novo amanhecer.

“Você me deu um novo significado a palavra vida...”

Mas você partiu sem mim
E sei que estás em algum jardim
Entre as flores...

 

A música então fez uma nova pausa, e mais uma vez Yuri se encontrava no centro da pista. Um terceiro holofote se acendeu e ele levou apenas uma mão ao ombro direito.

Um puxão bastou para livrá-lo da roupa amarela e revelar uma peça laranja. A canção ecoou com uma batida mais rápida, mais agitada.

—Da infância a juventude. A agitação frenética. A energia que parece não se esgotar. A impulsividade, o fazer antes de pensar...

Dessa vez as passadas eram acompanhadas de giros e saltos duplos.

“Como quando comecei, obcecado em ser o melhor. Sonhando que um dia eu poderia patinar ao seu lado, mas jamais imaginado que seria da forma que aconteceu...”

Yuri estava com uma expressão feroz, captada por várias câmeras e espalhada por vários telões. A multidão quase emudecida levava as mãos à boca, surpresa com a audácia crescente de Yuri a cada mudança na música.  

—E ele acaba de fazer uma sequência incrível de saltos e giros que deixariam qualquer um no mínimo desorientado. Mas Katsuki parece tranquilo.

E o silêncio absoluto deu início em um giro triplo, que terminou perfeitamente no centro da pista. Um quarto holofote se acendeu e com um puxão pela parte de baixo, a peça laranja deu lugar a uma vermelha.

A música ecoou com uma batida latina. A sensualidade estava explícita nos movimentos de Yuri.

—Então chegamos à paixão. Ao momento em que descobrimos que somos donos da sensualidade e das brasas incandescentes que nos fazem arder ao por os olhos na pessoa amada.

“Lembra-se quando me desafiou a fazer a coreografia baseada no ‘Eros’, Victor? Como demorei a entender a profundidade do amor e da paixão... O que me deixava desejoso era o desejo por comida... Engraçado lembrar aquela época, em que eu prometi que ao dançar, seria o macarrão mais delicioso que você já havia provado...”

Yuri tentara na época do desafio de Victor seduzir como um amante apaixonado. Mas só conseguiu mesmo se destacar ao dançar como uma mulher conquistada por um sedutor.

Mas não daquela vez.

Agora ele dançava com a intensidade de um amante insaciável. Era quase obsceno o modo como ele deslizava pela pista, e não foram poucos expectadores que se abanaram de forma inconsciente quando ele elevava as pernas, deslizava as mãos pelo tórax, girava a cabeça e então...

—Observem esse olhar. Com certeza vocês já viram isso diante da paixão de suas vidas. Acho que o gelo não vai durar muito mais tempo se continuarmos com essa parte da apresentação...

Yuri olhava diretamente para Victor.

“Lembra-se de quando me fez descobrir a intensidade do amor verdadeiro? Como eu te disse que quase derreti ao sentir o que era realmente se entregar aos meus desejos mais... Profundos?”

—E ele surpreende com um salto quádruplo perfeito! Quem é esse amante? Nunca vimos nada igual a essa altura da apresentação...

Sorriu timidamente, satisfeito com o resultado. Programara-se para terminar cada trecho exatamente no centro da pista.

“Agora é a parte mais calma... Consegue ver daí o que farei Victor?”


Anjo, meu tão amado anjo
Bem sei que estás
E eu do brando sono hei de acordar

 

A música deu uma breve parada e então retomou como um balé clássico, calma e ritmada.

Dessa vez retirou a peça vermelha puxando-a pela cabeça. Sacudiu os cabelos com graciosidade, e uma camiseta azul perolada surgiu junto com o acender de mais um holofote.

—Então chegamos a fase da serenidade. A fase em que conseguimos conquistar nossos sonhos, ou os meios para chegar a eles. Aqui é onde sentimos que podemos relaxar e prosseguir com mais calma...

Yuri deu início a uma nova sequencia de giros sem saltos, de complexidade alta e que quase nunca eram utilizados por que geralmente saiam com algum tipo de imperfeição.

Mas não vindo dele. Ele dedicara horas e horas a aquilo, a ser perfeito em cada volta.

E assim fez.

“Eu lembro Victor, lembro de como me senti mais calmo e centrado quando estava do seu lado. Lembro de sentir que não precisava chegar a mais nenhum lugar, pois estava exatamente onde queria. Ao seu lado. Era tudo tão perfeito... Um sonho que virou realidade.”

Os juízes sequer piscavam. A plateia a essa altura esquecera-se de respirar por alguns segundos.

Yuri lembrava-se dos dias pós-competição, onde seus medos de ser abandonado por Victor afloraram, uma vez que fizeram tudo que tinham para fazer em termos de competição já tinham sido cumpridos.

Mas foi surpreendido com uma declaração simples.

—Não vou sair do seu lado Yuri.

E ele fora fiel em sua promessa.

 

Para os teus olhos ver uma vez mais
             O verdadeiro amor espera uma vez mais

 

—E agora vamos ao final. Com certeza Katsuki fez o impossível até o momento, mas parece que...

O último holofote programado se acendeu. Yuri finalmente exibiu a última peça.

Um figurino preto de um lado, e prateado do outro.

A parte prateada era a última peça que Victor usara na vida. O figurino da sua última apresentação em competições oficiais. A parte preta era o seu figurino favorito.

Ou de Victor, tanto fazia aquela altura.

Silêncio absoluto e completo. A música começou a ecoar.

As notas eram tristes. Tristes em demasia.

O ringue de patinação adquiriu um tom lúgubre. Yuri dançava como se perseguisse algo.

Algo que se distanciava cada vez mais.

—E finalmente chegou a parte da vida em que a despedida é inevitável. A morte chega para todos e não há como evitá-la... Por mais que...

“Exato. Não podemos negar que a morte faz parte da vida. Fez parte da nossa vida...”

—E prestem atenção, ele está executando... NÃO É POSSÍVEL!


Quando eu te vi o sonho aconteceu
Quando eu te vi meu mundo amanheceu

 

—Estamos aqui com o campeão do mundial de patinação no gelo. Yuri Katsuki exibiu uma apresentação inimaginável, que com certeza não poderá jamais ser reproduzida. Yuri, poderia nos dizer como conseguiu tal feito?

—Bem, foram horas e horas de treino e dedicação. Mas eu tive muita sorte, meu técnico sempre exigiu o melhor de mim e isso com certeza me motivou a chegar até aqui.

—Você foi treinado diretamente pela maior lenda desse esporte, Victor Nikiforov, o campeão russo. Pudemos ver claramente o estilo dele na sua apresentação, mas a parte mais surpreendente foi quando você além de reproduzir todos os passos dele em sua última apresentação, ainda conseguiu um feito inédito ao realizar um giro de cinco voltas, seguido de um spin triplo, para então repetir o giro quíntuplo. E ainda finalizou com outro spin, mas quádruplo. Isso era impossível até essa noite. Como foi que conseguiu realizar esse feito?

Yuri sorriu timidamente.

—Victor me ajudou.

—Sim, quando ele te treinou. Vocês chegaram a ter tempo de ensaiar isso?

—Não. Ele morreu antes mesmo que eu pudesse imaginar em tentar fazer isso. Eu digo que ele me ajudou por que não fosse por ele, jamais eu chegaria sozinho até aqui.

—Ainda custamos a acreditar que ele faleceu da forma que aconteceu.

Yuri ficou mais sério.

—Realmente foi uma fatalidade. Ele só revelou que estava doente duas semanas antes de...

Todos silenciaram, sinceramente constrangidos e chateados com aquela situação.

Quando eu te vi o sonho aconteceu
                 Quando eu te vi meu mundo amanheceu

 

—Consegui Victor.

Yuri estava diante de uma lápide prateada. Ele mesmo fizera questão de que a lápide Victor fosse daquela forma, na cor favorita dele...

O Cemitério de Komarovo na Rússia era conhecido por ser o lugar de descanso de figuras históricas, de personalidades da elite intelectual, das ciências e do mundo das artes e das letras, geralmente russos. Era agora onde Yuri podia encontrar-se com Victor.

Diante da lápide do patinador, Yuri observava a foto dele com saudade.

—Eu venci o campeonato mundial por você. Conquistei a medalha. Sou o melhor do mundo.

Yuri abriu o sobretudo preto e puxou dali o símbolo de sua vitória.

—E vim aqui te entregar isso. Por que essa medalha...

As lágrimas começaram a correr sem pedir licença.

—Essa medalha só está comigo por sua causa. Ela é mais sua do que minha.

O rapaz caiu de joelhos.

—Eu sinto tanto a sua falta... Tanto... Por que você tinha que ir embora assim? E a sua maldita promessa de ficar comigo?

A raiva se misturava a saudade. Yuri sentia-se como se finalmente deixasse correr livres os sentimentos que aprisionara no coração.

—Eu fiz tudo que fiz... Vivi como vivi... Por que você me inspirava. Me motivava. Me estimulava a ser e fazer o melhor.

A vista estava turva.

—Agora eu não tenho mais você. Você era minha vida Victor. Você era tudo que eu queria. Você sempre foi tudo que eu sempre quis...

Não conseguiu mais falar. Chorou, deixando sair pelos olhos a dor que não cabia mais no peito. A realidade era cruel, e fria como o solo em que se encontrava ajoelhado naquele momento.

Victor morrera. Jovem demais. Cedo demais.

Por isso ele parou de patinar e decidiu se transformar no técnico de Yuri. Por que ele viu ali alguém que poderia carregar seu legado. Alguém que tinha a mesma paixão pela patinação, que podia sentir de forma tão intensa quanto ele.

Victor não poderia ser curado. Sua doença era progressiva e silenciosa. Como Yuri pode ser tão cego? A cada treino ele ficava cada vez mais cansado, apesar de apenas mostrar um ou outro movimento que queria que Yuri executasse. Já não comia como antes, enrolando e bebendo chás a todo tempo. As vitaminas eram na verdade morfina, e por causa disso ele passava grande parte do tempo aéreo, desligado e sorrindo bobamente.

Ele estava definhando bem debaixo do seu nariz e Yuri sequer notou isso. Quando finalmente recebeu a notícia que de Victor estava internado, estava competindo nos EUA e estranhou a ausência do técnico.

Como sempre, Victor tomou as rédeas da situação. Quando Yuri chegou ao quarto de hospital onde ele estava, seus olhos se cruzaram uma vez mais.

—Se você chorar dessa vez Katsuki, eu juro que te mato.

—Não brinque com essas coisas.

—Não estou brincando.

—Victor, eu... Quando...

—Vem aqui Yuri.

O rapaz sentou-se na cama. Sua mão entrelaçou-se a de Victor.

—Eu exijo que você viva a sua vida, independente do que aconteça comigo. Do que não, de quando acontecer...

—Não... Eu não...

—Você pode e você vai. Vai viver por nós dois. Vai ganhar o mundial e vai ser o melhor patinador que esse mundo já viu. Vai surpreender a mim e ao mundo uma vez mais, entendeu?

Os olhos azuis continuavam brilhando como sempre, apesar da dor.

—En... Entendi.

—Tenho sua palavra?

—Sim.

—Bom. Tem outra coisa que eu preciso te falar.

Yuri secou os olhos. Tentou sorrir.

—Pode dizer.

—Eu te amo Katsuki.

Yuri sentiu como se explodissem um predio dentro dele.

—Droga Victor. Eu também te amo.

—Eu sei. E quero que saiba que nada fez minha vida valer a pena tanto quanto esse amor. Se eu parti seu coração, saiba que foi para que ele se mostrasse inteiramente capaz de superar qualquer coisa. Inclusive superar a minha perda.

—Vic...

—E saiba que você nunca vai me perder. Por que eu vou estar sempre com você.

Yuri deitou-se ao lado de Victor, e assim eles permaneceram abraçados naquela noite.


Mas você partiu sem mim
E sei que estás em algum jardim
entre as flores..

—Eu sei que sempre vai estar comigo. Também sempre te trarei aqui...

Yuri apertou a medalha no peito.

—Só vim trazer o que é seu. A medalha, por que sempre serei seu Victor. Por inteiro.

Nevava naquele dia. Yuri deixou a medalha na lápide de Victor e gentilmente beijou a foto.

—Nos vemos por aí.

Virou as costas e saiu caminhando, sem querer olhar para trás.

Tinha uma promessa a cumprir. E sabia que Victor poderia descansar em paz, pois ele sempre cumpriria suas promessas.

Onde quer que estivesse, ele poderia sorrir tranquilo. Sabendo que Yuri viveria.

Pelos dois.


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Notas finais do capítulo


https://www.youtube.com/watch?v=nK8d_0kxC0Q

Link da música que embala nossa história.

E então? O que acharam? Poderiam me falar suas opiniões? É importante demais dessa vez pra saber se mandei bem ou não...

Desde já agradeço o carinho e a paciência, e fico feliz que tenham chegado até aqui.

Há sim, pelo que eu pesquisei o limite máximo de giros que tem nos campeonatos é quatro. Pro Yuri fazer cinco, ainda duas vezes, é só movido a paixão mesmo...haha

Nos vemos por aí. E não me apedrejem se o anime realmente acabar com a morte do Victor ^^

Beijos e abraços e até mais !!!



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