I don't deserve to be here escrita por Camy


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Gente, tudo bem? Só vim trazer essa dor pra vocês mesmo ♥

Não consegui marcar o Peter nos personagens, mas ele aparece ♥

~~enjoy



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Ele não merecia estar ali. Olhou o caixão aberto, sentindo o peito apertado. Como chegaram àquele ponto? Peter chorava alto. Tony conseguia ver a mão do cadáver entre as de seu filho. Aproximou-se devagar.

Não merecia estar ali.

— Tony!

— Procurando alguma coisa, Cap?

Encararam-se. Tony segurava o escudo de Steve.

— Me devolve.

— Vem buscar.

Começaram a correr pela sala. Steve era bem mais rápido, porém Tony conseguia sempre fugir dele de alguma maneira. Apenas o sofá os separava.

— Devolve meu escudo.

— Não até você me contar como foi o encontro com a Sharon. Não pode só me dizer que vocês saíram e não me dar detalhes!

Sentia-se incomodado. Queria que Steve saísse por aí, porém imaginá-lo com Sharon fazia seu estômago revirar. Entretanto já estava acostumado a esse sentimento.

— Eu… Vamos lá, me dê o escudo!

— Vocês se beijaram?

— …

— Steve…

— Sim. Ok? Sim. Mas…

— Mas?

— Eu não sei. Não foi do jeito que eu esperava.

— Por que não?

Tony pulou para o sofá e estendeu o escudo. Steve suspirou e se sentou ao lado dele.

— Só… Não teve faíscas.

Segurou o soluço. Peter sussurrava algo, mas Tony não conseguia ouvir. Colocou uma das mãos sobre o ombro dele.

— Pai…

Não respondeu. Abraçou-o, sentindo os soluços balançarem o corpo do jovem herói. Desceu o olhar, encontrando a expressão vazia do homem com quem se casara. Steve tinha os olhos fechados. O que Tony não daria para ver aquele azul mais uma vez? Apertou o abraço.

— Pai… Isso não é justo!

— Não, Peter. Não é.

De novo soube que não merecia estar ali. Sabia que muitos nem queriam que estivesse. O funeral seria transmitido pela televisão, afinal, todos amavam o Capitão América. Apertou Peter em seus braços, sentindo as mãos tremerem. Prendeu a respiração por tanto tempo que o peito ardia.

Um braço de metal tocou o caixão. Subiu o olhar para encontrar os olhos azuis de Bucky.

— O que está fazendo aqui, Stark? Veio celebrar?

Os dois estavam machucados. A batalha final, decisiva, quando Steve ficou ao lado de Bucky, acabou por matá-lo. Foi tudo culpa de Tony.

— Não fale do que não sabe — Tony resmungou.

Peter saiu do abraço e encarou o amigo mais antigo de seu outro pai. Segurou a mão de Steve novamente, como se o desafiasse a mandá-lo embora.

— O que você quer, James?

O antigo soldado encarou o filho adotivo de Steve. Ouvira-o falar tantas vezes sobre aquele garoto… Caramba, Steve não conseguia calar a boca quando começava a dizer o quanto Peter era inteligente, gentil ou o que fosse. Só parava de falar no filho para sofrer pelo marido. E agora estava morto.

— Nada, Peter. Meu problema não é com você.

— Você não devia nem estar aqui. Ele só morreu por sua causa!

— Minha causa? Seu pai provavelmente não te contou a história certa.

— Ele não precisou me contar nada. Antes de você aparecer, nós estávamos bem. Você chega e menos de um ano depois ele está morto!

O choro havia deixado a voz do garoto rouca e falha. A dor dele era tão grande que machucava Tony ainda mais. Ninguém no salão dizia nada.

— Não foi minha arma que o matou.

— Claro, porque você não lutou contra ele no meio de Nova Iorque, não tentou matá-lo várias vezes antes de o pops conseguir te trazer de volta.

— Mas eu nunca matei, né?

Peter teria continuado. Brigar preenchia seu corpo de raiva e aliviava aquela dor tão intensa. Era como se pudesse respirar de novo. Tony não tinha a mesma sorte.

— Peter, está tudo bem. Bucky não está mentindo. Eu matei ele. Eu matei seu pai.

Por mais incrível que pudesse parecer, não chorava. Seu orgulho não permitia. Afastou-se do filho para chegar perto do marido. Nunca haviam assinado os papéis de divórcio, então, no papel, continuavam casados. Acariciou os cabelos loiros e fechou os olhos, apreciando a textura.

— Seus cabelos são tão macios.

— Cala a boca.

— Oh, meu Deus! Capitão “Perfeitinho” América usou palavras assim tão baixas? É com essa boca que beija a sua namorada?

Chamar Sharon Carter de namorada era um exagero, Tony sabia. Mas usava a palavra mesmo assim, só para se lembrar constantemente da verdade: Steve Rogers não lhe pertencia. Nunca pertenceria.

— Ela não é minha namorada, que coisa! Nós saímos uma vez.

— E se beijaram.

— Meu Deus, Tony, será que dá pra parar? Isso já faz meses!

— Ela gosta de você.

— Mas eu não gosto dela.

Steve estava mal. Peggy Carter havia morrido há poucos dias, então Tony vinha lhe fazendo companhia. Com o objetivo de tirar uma casquinha, convencera Steve a deitar a cabeça em seu colo enquanto lhe fazia carinho. Agora assistiam a um filme. Só Steve mesmo para acreditar que fazia tudo aquilo “só na brotheragem¹”.

— E gosta de quem?

Desceu o olhar para encontrá-lo sorrindo. Era um sorriso um pouco diferente.

— Alguns dias atrás, Natasha disse que tem alguém que gosta de mim.

— Ela disse? E quem é? A agente nova? Aquela morena bonita que vimos do lado de fora da S.H.I.E.L.D aquele dia? Porque, se for, já aviso que é problema. Ela…

— Não é uma garota.

As carícias pararam. Steve agora tinha as bochechas coradas, porém continuava sorrindo. Por que aquele maldito sorria? E o que diabos aquela louca da Natasha havia dito?

— E quem é esse garoto inconsequente? Quer dizer, gostar do Capitão América é quase um suicídio amoroso. Você é todo hétero.

Para enfatizar o “todo”, Tony gesticulou sobre o corpo dele.

— É… Mas aqui estou, no seu colo, recebendo carinho. Muito hétero.

No homo², cara.

— Certeza?

Aquilo o pegou de surpresa. Steve se sentou, ficando com o rosto perigosamente próximo do de Tony.

— Porque eu talvez também goste dele.

Afastou a mão dos fios loiros para limpar as poucas lágrimas que se acumularam em seus olhos.

— Você não…

— Sim, filho. Eu matei.

Abaixou-se em frente a todos eles e beijou a testa fria, pegajosa, do marido morto. Os lábios tremiam pelo choro preso.

— Desculpa, baby. Desculpa por te matar. Eu… Se eu pudesse mudar, eu mudaria tudo. Eu tiraria toda a nossa felicidade pra você respirar de novo. Eu anularia nosso casamento logo após Peter, porque não podemos perdê-lo, certo? Teria te deixado livre e ficaria bem longe só pra você não estar nessa situação. Apagaria nossas faíscas, se preciso. Eu sinto tanto… — Precisou parar um pouco e respirar fundo, ou começaria a soluçar. — Desculpa, Steve. Desculpa, amor.

Beijou-o mais uma vez antes de se afastar e sair. Não merecia estar ali. Peter ainda o chamou, porém não o ouviu. O soluço que não se deixou soltar em frente aos outros escapou. As pernas teriam falhado se não sentisse alguém segurar seus braços para mantê-lo em pé.

— Você não pode dirigir assim.

Clint e Natasha o haviam seguido. Deixou-se ser guiado até seu carro e entrou. Sempre podia chamar sua armadura, porém não estava em condições de voar. No banco traseiro, apertou o peito.

— Tony…

— Só me tira daqui.

A Viúva Negra entrou no banco do motorista e começou a dirigir. Tony não seria capaz de ficar ali e ver o caixão ser fechado. Não conseguiria ver a bandeira dos Estados Unidos ser dobrada, ou ouvir os tiros. Era como se fosse morrer a qualquer segundo. De certa forma, esperava por isso.

— Você sabe… Eu acho que a gente podia sair de férias.

— Os Vingadores? Não sei se eu conseguiria ficar muitos dias naquela fazenda do Clint de novo, Cap. Não tinha internet lá!

— Não os Vingadores, Tony… Nós dois.

Estavam “juntos” há seis meses. Ainda era tudo tão novo, tão excitante…

— Como numa viagem a dois?

— Quero dizer, só se você quiser…

Seu peito apertou e Tony chegou bem perto do namorado. Sentou-se no colo dele, sorrindo. Beijou-o devagar antes de deslizar a boca até seu ouvido.

— Se quiser, podemos começar a treinar. Sabe, se eu estiver numa cabana no meio do nada com você, sem internet, vou querer transar a noite inteira. Será que você consegue?

Mais sentiu a risada dele do que a viu. Estava todo arrepiado, quente.

— Não sei… Acho que precisamos treinar.

Tony soluçou mais uma vez. Dessa vez teve testemunhas. Natasha o encarava com o peito doído, mas não havia nada que pudesse fazer. Ela também sentia pela morte de Steve. Eram amigos, afinal. Mas sequer conseguia imaginar a dor de Tony.

— Peter?

— Ele ficou com Wade. Não é que Deadpool é um bom amigo?

Deveria ficar irritado com isso. Deadpool não era boa influência para seu garoto. Apesar disso, só conseguiu se alegrar por Peter não estar sozinho. Não conseguiria ser o pai de que ele precisava nesse momento. Não conseguia ser nada além de um marido de luto.

— Adotar, Steve?

— Estamos prontos. Eu sei que estamos.

A ideia encheu o peito de Tony de esperança. Acariciou o rosto do marido, sentindo-se feliz.

— Nós acabamos de nos casar e você já quer um bebê?

— Pra que perder tempo?

Riram. Tony não podia deixar de concordar com aquilo: por que perder tempo? Ficaram noivos por cinco anos, não era como se já não tivessem aproveitado o tempo a dois. Aproximou-se mais uma vez, beijando-o.

— Ok. Vamos adotar um bebê.

— Mesmo?

— Mesmo. Com tudo o que temos direito: vamos fazer um quarto só pra ele, com um enxoval e um chá de fraldas. Natasha será a madrinha, talvez o Clint também, ele já tem filhos, vai saber o que fazer.

— Não acredito que você concordou tão fácil…

— Eu quero um menino. Uma menina ia me deixar maluco, eu ia morrer de ciúmes. E se alguém se apaixonasse pela nossa menininha? Eu nunca suportaria um namorado dela. Acho que usaria a armadura para bater nele.

Encarava o teto ao falar, mas sabia que os olhos de Steve brilhavam em seu rosto. Foi puxado para se deitar sobre o peito dele e foi de bom grado. Aquela era uma das mais importantes conversas pós-sexo que estavam tendo.

— Tony… Vamos mesmo adotar um bebê?

— O que você pensa sobre nomes? Eu gosto de Peter. Não sei, parece certo, não acha? Ele vai viver sob pressão, por ser filho de super-heróis e tudo mais, então precisamos de um nome que marque. Peter Stark-Rogers é um nome forte. O que acha?

— Acho que eu te amo. E que Peter vai ser a criança mais mimada do universo.

— Ah, isso vai. Também, com o Capitão América como pai, o que você esperava?

— Só eu que vou mimá-lo?

— Óbvio! Alguém vai precisar criá-lo com mãos de ferro.

Riram da piada boba, mas sentiam o peito cheio de felicidade. A família deles estava a ponto de aumentar.

— Quer que te deixemos em casa, Tony?

Chegaram à Torre Stark. Saiu sem esperar por ajuda, sentia-se sufocado. O peito doía tanto que Tony não entendia como ainda não havia parado de respirar. Desceu as escadas até o laboratório. Deitou-se no sofá. Gritava. O choro, os gritos, seu corpo batendo no chão… Não ouvia nada disso. Não sentia o frio, não percebia que Sexta-Feira o chamava. Só conseguia sentir aquela dor aguda, aquela falta de ar.

Por que não morria logo? Gritou mais alto, porém ainda não tinha total consciência do que acontecia ao seu redor. Podia sentir a morte ali, olhando para ele, rindo do seu sofrimento. Por que não acabava? Era impossível sentir aquilo e continuar vivo. O ar não entrava em seus pulmões, a cabeça latejava de dor. Pontadas no peito e na barriga.

— Eu te amo.

Um beijo.

— Eu te amo.

Outro beijo.

— Eu te amo.

Mais um beijo.

— Eu te amo.

De novo, seus lábios se encontraram. Tony tentava não rir, manter a pose irritada, mas não conseguia. Steve segurava seu rosto e o beijava.

— Isso não impediu Sharon de dar em cima de você.

— Eu te amo.

— Sério, ela não se enxerga?! Nós temos um filho juntos! Caramba, e você precisava mesmo…

— Eu te amo.

— Ficar olhando pra ela? Quer dizer, eu sei que não…

— Eu te amo.

— Tenho aqueles peitos… Steve, para.

— Eu te amo.

Os beijos haviam descido para o pescoço. Ele movia os lábios devagar, numa carícia gostosa, antes de voltar a falar. Tony tentava manter a linha de raciocínio, porém estava complicado.

— Eu não sou uma mulher, não tenho aqueles olhos dela…

— Eu te amo.

— Mas, sério, eu tô irritado aqui. Você não tirou os olhos daquela mulher a noite inteira!

Aquilo era um exagero. Se Steve havia passado cinco minutos a encarando, era muito. E só quando Sharon resolveu conversar com eles. Não que isso importasse.

— Eu te amo.

— Eu só…

Perdeu-se quando sua camiseta foi removida. Steve o pegou no colo, obrigando Tony a fechar as pernas ao redor de sua cintura. Agradeceu pela força absurda dele.

— Ainda estou irritado, ok?

— Eu te amo.

Beijaram-se. Antes de chegarem à cama, já estavam nus. Tony abraçou o marido o mais forte que pôde e apertou os olhos. O peito apertava ante a possibilidade de perdê-lo para Sharon.

— Eu também te amo.

Onde Steve estava agora? Por que ele não o havia impedido de fazer tanta besteira? Por que não havia obrigado Tony a entender que não deviam ir à guerra por causa de um tratado estúpido? Agora estava tudo bem. Haviam alterado tantas vezes aqueles papéis que não passavam mais de mera formalidade. Os Vingadores poderiam agir como sempre, porém precisariam se responsabilizar pelos estragos feitos. Não apenas com dinheiro, mas também em missões de resgate e reconstrução. Era um bom acordo. Por que não haviam conversado sobre aquilo desde o começo?

Estavam em paz, mas não valera a pena. Não quando aquilo podia ter sido evitado. Mas é que sentia tanto ciúmes de Bucky! Tanto, tanto, tanto! E com razão, visto que o Idiota Invernal era apaixonado por Steve. Quem não seria?

— Como assim “Bucky voltou”?

Peter inchou as bochechas, irritado. Até três segundos atrás, Tony dava toda sua atenção para o garoto. Brincavam com um pedaço de armadura que, agora, estava escondida em suas costas. Com a chegada surpresa de Steve, agiu rápido para evitar uma repreensão. Tony teria ajudado a esconder a armadura se não estivesse tão frustrado.

— Ele estava lá hoje. Eu o vi, Tony.

— Viu?

— Eu estava com a Natasha e o Sam, e…

— Ah, foi quando você atacou a S.H.I.E.L.D. sem me avisar?

— Eu não podia colocar você ou Peter em…

— Não diga “perigo”, ou vamos brigar. Eu sou um Vingador, sabe? E seu marido. É minha obrigação saber dessas coisas, Steve!

— Foi tudo muito rápido, eu…

— PAREM!

Olharam para o garotinho de oito anos. Peter levantou-se e jogou a mão de metal no chão.

— Não pode brigar!

— Não é uma briga, Pete. Por que não vai pro seu quarto, hein? Daddy e eu precisamos conversar.

Tony apenas ouviu o marido conversar com o garotinho. Sentia o peito arder de raiva. Tudo andava bem no casamento até aquele fantasma voltar. Steve contou-lhe que, quando mais novo, havia beijado Bucky Barnes. Foi o primeiro beijo dele. Desde então passou a entender melhor a dor do marido, que sempre se culpou pela morte do sargento.

Agora tudo estava mais complicado.

— Não quero! Eu tava brincando com os lasers do daddy!

— Você estava o quê?! Tony, já conversamos sobre isso!

— O garoto tem poderes de aranha, pelo amor de Deus! Ele não é uma criança normal. Além disso, eu estava aqui, supervisionando tudo! Não sou tão irresponsável quanto você pensa, eu posso cuidar do nosso filho!

— Eu nunca disse que não sabia cuidar do Peter!

— Pois foi exatamente o que pareceu!

— Parem de brigar! — Peter gritou de novo.

Perdendo a paciência, Tony apontou para o corredor.

— Peter, vai pro seu quarto.

— Mas eu não…

— Agora!

Emburrado, o garoto cruzou os braços e pulou para cima, fazendo questão de ir até o aposento pelo teto. Isso irritava Steve, e tudo o que Peter queria era deixar o pai furioso. Por que eles tinham que brigar justo quando na melhor parte da brincadeira?

— Tony, olha…

— Não, Steve, você que me escuta. Somos casados, caso tenha se esquecido. Isso significa que, quando for atacar a S.H.I.E.L.D., ou qualquer outro lugar, você me avisa antes!

— Não deu tempo de pensar, tudo aconteceu muito rápido…

— Eu tenho um celular pra isso! Mas em vez de ir lá te ajudar, eu precisei acompanhar tudo pela televisão com o Peter me perguntando o que tava acontecendo e eu não sabendo responder!

— Desculpa, ok? Eu só…

— Se distraiu demais com seu amiguinho pra se lembrar de mim?

O peito de Tony ardia. Apesar de todo o seu orgulho, ainda se sentia um pouco inseguro. Porra, era o Capitão América ali! Será mesmo que ele nunca encontraria alguém melhor? Alguém que não fosse tão complicado? Que o entendesse…? Bucky o entendia.

— Tony, não fala assim. Eu te amo, o Bucky…

— Não quero saber. Você dorme no sofá hoje.

Não queria pensar nas brigas. Os primeiros anos de relacionamento foram bons, muito bons. Tony e Steve mudaram depois que descobriram que Bucky ainda estava vivo. Peter, mesmo aos nove anos, percebeu isso.

Steve passava horas fora de casa e, mesmo quando conseguia ficar com eles, parecia distante. Tony, irritado e ofendido com aquilo, afastava-se dele também. Peter, entre os dois, não sabia o que fazer. Mas não era sempre assim. Às vezes, passavam meses como se nada tivesse acontecido e ainda fossem aquela família feliz de anos antes. E então alguma coisa mudava, e os dois se afastavam de novo.

Apesar disso, Peter nunca pensara que os pais pudessem se divorciar. Honestamente, eles se amavam demais para isso. Tony, no fundo, pensava a mesma coisa. Até a guerra começar.

— Pai!

Com os olhos inchados, Tony ergueu o olhar. Peter, preocupado, andava de um lado para o outro.

— Cadê o pops? Eu vi tudo aquilo pela TV… o que tá acontecendo?

Silêncio.

— Você tava chorando?

Aquela era a notícia mais difícil que já havia dito. Tony limpou a garganta e esfregou o rosto. Tentou deixar sua voz o menos rouca possível.

— Seu pai… ele… — respirou fundo. — Bucky matou algumas pessoas, explodiu um lugar. Depois fugiu da gente, e Steve ajudou ele. Eles fugiram, eu não sei pra onde…

— O quê?

— Alguns Vingadores foram com eles. É sobre o tratado, eu não sei o que vai acontecer agora…

— Pai, como assim o pops fugiu com o Bucky?

Tony balançou os ombros, sem conseguir dizer mais nada.

— Eu… Depois conversamos, Peter.

Sem conseguir conter o choro, Tony se trancou no quarto que, até o momento, dividia com Steve. Peter ainda o chamou, porém não podia atender o garoto. Precisava se livrar daquelas coisas. Com raiva, começou a jogar todas as roupas do marido no chão.

Como ele podia fazer aquilo? Como tinha coragem de abandoná-lo?

Apesar de tudo, por um tempo, Tony ainda pensara que Steve perceberia a besteira que fazia e voltaria para ele. Depois de algumas discussões e de mil pedidos de perdão, Tony estava disposto a aceitá-lo de volta (a quem queria enganar? Tony sempre estaria de braços abertos para Steve. Puta que pariu, como podia amar alguém tanto assim?).

Depois de mais de meio ano de brigas e batalhas, a saudade já deixava sua marca.

— Pai? O que está construindo?

Meio envergonhado por ter sido pego no flagra, Tony estalou a língua contra o céu da boca.

— Só uma coisa…

Desistindo de esconder, Tony terminou de ajeitar a máscara e os mostrou a Peter. Sabia que estava sendo ridículo, entretanto o peito doía demais de saudade.

— Só um simulador. Para batalhas, e coisa…

— Mesmo? Parece a o visor da sua armadura.

— Não. É quase isso, eu… Eu sinto falta do seu pai. Programei isso aqui pra ficar rodando algumas das imagens bacanas que a Sexta-Feira filmou nesses anos todos.

Como já moravam ali há muito tempo, desde antes de Peter, a quantidade de gravações seria suficiente para Tony passar dias perdido em memórias. E isso era bom, porque, puta que pariu, como sentia saudades de Steve.

— Quer ver seus primeiros passos?

Animado, Tony entregou o objeto a Peter, logo depois de escolher a filmagem que queria. Viu o sorriso no rosto do filho e sorriu também; não precisava da máscara para se lembrar daquele momento.

— Isso é muito real… Parece que eu vou poder encostar em vocês daqui a pouco…

— Essa é a intenção, pirralho. Quando seu pai voltar pra casa, vou esfregar na cara dele as coisas que eu tive que fazer pra aguentar essa merda toda.

Peter riu, ainda entretido com a visão.

— Ele vai se sentir culpado por meses.

— É exatamente essa a intenção.

Os dois riram e passaram horas ali, olhando imagens e divagando sobre como Steve reagiria ao voltar para casa. Fariam questão de mostrar a ele que nunca, em qualquer hipótese, aquele idiota poderia se afastar de novo.

Sorriu, com o peito apertado. Ele nunca voltou para casa. Tony soluçou mais uma vez. Não queria pensar em quando Steve escolheu Bucky, na guerra civil, na batalha final… No coração dele parando de bater.

Steve morreu em seus braços. Acertou-o bem no peito, mas isso não deveria tê-lo machucado tanto. Não tinha, na verdade. O problema foi ele ter caído sobre um pedaço de metal. Empalado. Seu coração, destroçado.

Tony voou. Bucky ainda estava ali, jogado no chão, machucado. Não se importava. Tony conseguia ver o metal saindo pelo peito do Capitão América, e isso apagou tudo o que os rodeava.

— Steve, Steve! Me escuta, você não pode morrer. Estamos brigando aqui, lembra? Se você morrer, eu ganho. Não pode me deixar ganhar.

Steve sorriu. Foi aquele sorriso de canto, conhecido. O coração de Tony falhou uma batida.

— Eu nunca te deixo ganhar. Você só ganha.

— Shi! Eu vou te levar pra um hospital. E depois você vai acabar numa prisão por ser tão idiota e inconsequente, mas primeiro o hospital, ok?

— Eu não sou o idiota aqui. Você sabe que está tudo errado. Não teria vindo aqui se não soubesse.

— Ele matou meus pais.

— Então admite que isso tudo é porque você não gosta do Bucky, não por causa de…

A tosse o impediu de continuar.

— Cale a boca! Não ouse deixar nosso filho sem um pai!

— Peter tem você.

— Não diga isso. Peter tem nós dois. O pirralho já tá sofrendo bastante com essa guerra toda, não piore a situação.

Steve ainda conseguiu rir um pouco. Sangue escorria pela sua boca, fazendo Tony sentir-se ainda mais agoniado. Esticou a mão e quebrou o metal nas costas de Steve. Pegou-o no colo, resistindo ao impulso de retirar aquilo do peito dele. Não podia, precisava deixar essa tarefa para os médicos.

— STEVE!

O grito de Bucky foi ignorado.

— Não mate ele — Steve pediu.

— Cale a boca. Nada de me fazer últimos pedidos, ou o quer que seja. Eu vou te salvar.

Voou ainda ouvindo os lamentos do Soldado Invernal. Ignorou-o, desejando que ele soubesse como era quando o amor da sua vida te abandona por outra pessoa. Algumas lágrimas escorriam pelo seu rosto.

— Eu nem sinto mais dor, Tony. Pode parar.

— Cala a boca, cala a boca, cala a boca. Se deixar nosso filho sem pai, Rogers, eu vou ao inferno e te trago de volta!

— Não vou deixar Peter sem pai, já disse. Ele tem você.

— Eu sou um péssimo pai. Você sabe disso.

— Você não é um péssimo pai.

— Calado. Se sobreviver a isso, eu aceito seu amigo idiota. Até assino os papéis de divórcio e aceito seu casamento com ele, ou sei lá o que planejam.

Steve riu com gosto, mas precisou cuspir o sangue que se acumulava em sua boca. Estendeu o braço, tocou o rosto de Tony. Ele sorria, era aquele sorriso.

— Como você é bobo.

— Você é o bobo aqui, Rogers. Para, ok? Para de morrer.

— Desculpa por… te deixar sozinho.

Tony tentou ir mais rápido, porém sua armadura já estava acima da capacidade. Sentiu os olhos marejados, porque percebia a respiração de Steve ficando mais fraca e o sangue aumentando na boca dele.

— Cala a boca. Já mandei calar a boca, não mandei?

— Desculpa… Só quero que saiba…

— Não diga que me ama, ok? Não…

— Mas eu amo…

Ele não disse mais nada. Tony acordou de supetão. Estava deitado no chão do laboratório. O coração batia a mil e, por um momento, ele pensou que aquilo tudo fosse um pesadelo. Correu escadaria acima e invadiu seu quarto. A cama estava bagunçada, as garrafas de uísque jogadas pelo chão.

— Sexta-feira, cadê o Capitão América?

Capitão América está morto, senhor. O velório foi ontem, e Peter ainda não voltou para casa.

Caiu no chão de novo, sentindo aquele aperto. Não foi um sonho ruim. Desceu as escadas ainda com a dor destruindo seu peito um pouco mais a cada segundo.

Pegou a máscara que criara durante a guerra civil. Colocou-a.

— Sexta-feira, ligue a simulação, por favor — sua voz estava rouca.

À sua frente, Steve ria.

— Tony, isso é hora de acordar? Eu fiz o café!

Estendeu a mão, querendo alcançar aquela que Steve lhe oferecia. A dor pareceu aumentar. Era como se a voz dele fosse ficar marcada para sempre em seus ouvidos. Gostava de usar aquilo como uma promessa de que um dia tudo voltaria a ser como era, de que teria seu marido de volta. Agora era só uma tentativa de fazer a dor passar.

Não adiantava.

— Eu te amo, sabia? Mesmo você acordando tarde assim.

Jogou o objeto longe e ouviu o som metálico de quando atingiu o chão. Descobriu-se sozinho ali naquela sala. Chorou mais. O soluço quebrava o silêncio, mas nem seus gritos preenchiam o vazio que o consumia. Como poderia continuar vivo? Não sentia o ar entrar nos pulmões.

Horas depois, Peter encontrou o pai na mesma posição, chorando. Não soube o que fazer além de se juntar a ele para chorarem juntos.

Steve Rogers estava morto. Nada mudaria isso, nem mesmo a dor de seu marido e de seu filho.

 

 

¹”Só na brotheragem” é algo que se diz quando dois homens fazem algo considerado gay, mas apenas como amigos. Há muita sátira a respeito disso, então há várias fotos em que há um casal gay se beijando com essa legenda. Vem de “brother” (irmão, em inglês) para indicar que a atitude tem intenções fraternas.

“No homo” é uma gíria parecida com “brotheragem”, mas que é usada nos EUA. Tem o mesmo objetivo. Dois homens se abraçam, por exemplo, e um deles diz isso. Quer dizer que o abraço foi amigável, sem segundas intenções. Também já foi transformado em piada.


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Notas finais do capítulo

Olá!
Então, essa é minha segunda fanfic nesse universo (Agridoce Paternidade é a primeira; uma long Stony). Espero que tenham gostado!

Por favor, venham conversar comigo nos comentários! Sou nova aqui nesse fandom ><"

Bjs e teh + ^3^//



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