“Pode me dar uma carona? Allison vai com Scott e minha tia precisou do carro...”

Stiles encarou a mensagem em seu celular, em pé no meio do seu quarto. Não podia ignorar o pedido de Lydia, não depois de tê-lo lido... Ou será que podia? Não, claro que não podia. A distância entre a casa deles não era tão grande, e ela não tinha quem a levasse.

“Por favor?”

Será que estava com medo de ficar sozinho no mesmo carro com ela? Estava com medo do que podia acontecer, do que podia acabar sentindo? Ridículo. Não havia nada a temer. Stiles definitivamente não estava preocupado com as coisas que ele achou ter sentido da última vez que ficaram sozinhos. Estava decidido a não dar importância a coisas que não eram... Bem, importantes. Lydia era sua amiga, ele podia muito bem lhe dar uma carona. Porque é isso que amigos fazem. Dão caronas.

“Tudo bem se n puder, eu pego um taxi”

“N, eu já passo aí”, ele respondeu rapidamente, colocando o aparelho no bolso em seguida. Pendurou a mochila no ombro, pegou as chaves e foi para a escada. Trancou a porta da frente e andou até seu Jeep azul, velho e amassado, sua maior preciosidade. Sentou no banco do motorista, jogou a mochila no banco de trás e ligou o carro. O trajeto até a casa de Lydia durava menos de quinze minutos, então logo estava estacionado próximo a sua calçada. Mandou uma mensagem avisando que havia chegado e ela não demorou a aparecer, fechando a porta e andando até o carro.

– Carro legal – disse ela, sorrindo. Franziu a testa e ergueu o corpo, tateando no banco até tirar uma embalagem de chocolate de debaixo dela. – Bem... sua cara.

– O melhor elogio que um carro pode receber, muito obrigado – disse ele. Lydia bufou e revirou os olhos, sem poder evitar sorrir um pouco.

– Seu rosto está melhorando – ela comentou, virando-se no banco para olhar o perfil do garoto. Stiles deu de ombros.

– Eu não acho – disse. A maçã do seu rosto agora estava manchada com tons de roxo e um leve esverdeado, assim como seu olho, que ainda estava um pouco inchado. O corte em seu lábio não havia cicatrizado e incomodava bastante. Stiles já podia até imaginar os olhares que receberia durante o dia. – Parece que está ficando pior.

– Não, está melhorando – disse ela, erguendo a mão e aproximando-a do rosto dele, apontando sem tocá-lo. - O verde nas bordas do machucado significa que está cicatrizando. Vai sumir em alguns dias.

Stiles ignorou a leve sensação de antecipação causada pela proximidade do seu toque e apenas revirou os olhos.

– Por que você tem que saber tudo sobre tudo?

– Eu leio – respondeu ela, orgulhosa, ajeitando-se no banco. Ele apenas bufou e balançou a cabeça. O resto da viagem seguiu em um silencio confortável, e Stiles perguntou-se por que diabos havia se preocupado tanto com aquilo. O medo não fazia mais sentido, se é que tinha feito em algum momento.

Parou o carro em uma das vagas do estacionamento do colégio e os dois saltaram. Enquanto colocava a bolsa no ombro, Lydia avistou Malia.

– Ei, Stiles – disse ela, cutucando-o com o cotovelo. Ele olhou na direção que ela apontou com a cabeça e respirou fundo.

– Ok, lá vou eu – disse ele, respirando fundo mais uma vez e indo atrás da loira que andava em passos largos até o prédio.

– Boa sorte! – disse Lydia, alto o suficiente para que ele escutasse. Stiles ergueu ambos os dedões e correndo para alcançar a namorada.

– Malia! – chamou. A loira parou de andar imediatamente, virando-se para encará-lo. Stiles desacelerou o passo ao chegar até ela, levemente ofegante. O garoto havia passado o resto do sábado e o domingo inteiro tentando entrar em contato com a garota, embora entendesse que ela tinha todo o direito de ignorá-lo. Havia ensaiado aquele momento, pensando nas palavras certas que diria para ela. – Podemos conversar, por favor?

Malia o olhou nos olhos por um tempo, com uma expressão dura no rosto, que o deixou ainda mais nervoso. Por fim, suspirou.

– Tudo bem – disse.

Ela andou até a mesa mais afastada e sentou-se no banco de madeira, cruzando as pernas e os braços, olhando para ele com uma sobrancelha arqueada. Stiles umedeceu os lábios nervosamente, respirou fundo e sentou-se ao lado dela.

– Eu sinto muito pela briga que tivemos no sábado – começou. – Eu não soube me expressar direito, e a coisa toda foi um mal entendido...

– Ah não, eu acho que entendi muito bem a parte que você é apaixonado por Lydia – disse ela, com a voz fria.

– Eu era apaixonado. Era, passado. – Stiles suspirou e virou o corpo para Malia, que ainda olhava para frente. – Você precisa saber a história toda.

A loira deu de ombros, como se não se não fizesse questão de ouvir o que ele tinha para falar, mas ele sabia que ela se importava. Stiles conseguia ver por trás da armadura que a garota vestia, entendia o que ela sentia mesmo quando ela se esforçava para não demonstrar fraqueza. Malia tinha seu próprio mecanismo de defesa que a impedia de se machucar, e ele apenas de fortaleceu depois do que aconteceu com Theo. Stiles sabia que a única forma de desligá-lo era sendo sincero, e esse era o plano.

–Como você já sabe, Scott, Allison, Lydia e eu éramos melhores amigos quando crianças. Eu não lembro muito bem quando comecei a me apaixonar por Lydia, mas aconteceu. Scott era o único que sabia... Bem, recentemente eu descobri que meu pai também sabia, então muita gente devia saber. O importante era que Lydia não sabia... Pelo menos eu acho que não – disse ele, sem tirar os olhos dela. Malia tinha a cabeça baixa, e ouvia a tudo silenciosamente. – E então ela foi embora, e eu... Eu fiquei destruído. Eu não conseguia acreditar que eu estava perdendo mais uma pessoa que eu amava. Foi simplesmente... horrível. Foi um inferno.

Stiles fez uma careta ao se lembrar do tempo depois da partida de Lydia. Ele já sabia qual era a sensação de ter o chão tirado de debaixo dos seus pés, de sentir as paredes caindo ao seu redor; havia perdido sua mãe aos sete anos, conhecia muito bem aquele tipo de dor. Mas isso não fazia com perder alguém tão importante ficasse mais fácil. Mesmo que Lydia estivesse apenas se mudando, ele sofreu. Apoiava-se na troca de mensagens e emails, nas ligações que aconteciam de tempos em tempos, mas aquilo não passava de um band-aid; não era o suficiente. Quando o contato tornou-se escasso e sumiu, ele sangrou. O mundo não parecia a mesma coisa, as coisas não tinham mais a graça ou a cor de antes.

Ele balançou a cabeça, livrando-se da memória. Não podia se perder no passado, tinha que focar no presente.

– Eu levei anos para me recuperar. Eu não podia continuar apaixonado por Lydia, não fazia sentido. Eu me obriguei a me acostumar com a ideia de que ela não estava mais aqui, que eu precisava seguir em frente... Até que, eventualmente, eu não sofria mais. Eu a esqueci. Aí eu conheci você – ele continuou. O sinal havia tocado e a área esvaziava rápido, mas nenhum dos dois fez menção de se levantar. – Tenho que admitir que te achei meio intimidadora quando Allison me apresentou a você. Acho que na época você meio que odiava garotos. Eu pensei: bem, se eu for legal o suficiente, talvez ela não queira me bater. Você sabe que eu tenho um certo talento em fazer as pessoas quererem me bater, então meu plano tinha tudo para dar errado.

Malia riu de leve, e ele sorriu ao perceber que ela lutava para manter a expressão séria no rosto.

– Eu te conheci direito e percebi que você é incrível. Não só porque você é linda, engraçada e confiante, mas também por causa da sua personalidade e o fato de que você é mais forte que eu. Em todos os sentidos. Mesmo sendo intimidadora, é difícil não gostar de você, Malia. Mesmo eu, recém recuperado de um coração partido, não pude evitar. – Stiles umas das mãos que estavam no colo da garota e a apertou de leve. Malia levantou o rosto e o olhou nos olhos. – Não estou com você porque você me ajudou a esquecer completamente de Lydia. Estou com você porque eu te amo. E eu não quero que você duvide disso, porque é verdade.

Malia permaneceu em silêncio, mas seu lábio trêmulo mostrava que ela estava se segurando para não chorar. Stiles esperou, tendo dito o que queria, sem tirar seus olhos dos dela. Então, finalmente, a loira inclinou-se e colou seus lábios nos dele. O garoto suspirou no beijo, repousando sua mão na bochecha da garota.

– Isso significa que estamos bem? – ele perguntou, afastando seus rostos minimamente.

– Só cale a boca e me beije – a loira disse rapidamente, voltando a beijá-lo. Stiles obedeceu sem reclamar.

Xxxx

– Nossa, você viu o rosto dele?

– Ele é tão gato, chega dá pena.

– Soube que o outro cara ficou bem pior. Parece que ele nem apareceu hoje.

Lydia, que estava ocupada guardando alguns livros no armário, imediatamente parou ao ouvir as suas garotas conversando. Olhou para o lado e viu Theo andando no corredor com seus amigos igualmente musculosos ao seu lado. Aquela garota tão podia estar mais errado; ele estava bem pior que Stiles. Theo tinha ambos os olhos roxos, e um deles mal abria de tão inchado. Tinha cortes na sobrancelha e nos lábio, também inchado, e machucados nas maçãs do rosto.

Ao ver seu rosto machucado, Lydia lembrou-se da promessa de vingança que ele havia feito na noite da festa, e gelou. Embora tivesse quase certeza que não, Lydia não pode evitar se perguntar se Theo tinha alguma coisa a ver com a suposta ausência de Stiles. Se era verdade que o garoto não havia aparecido nas aulas, algo deve ter acontecido depois que chegaram no colégio.

– Theo! – ela chamou. O garoto virou-se para ela e um sorriso malicioso se espalhou pelo seu rosto. Disse algo para o amigo que estava ao seu lado e foi andando sozinho até a garota, que engoliu a seco. Seu rosto era até assustador de perto, mas Lydia logo se recompôs e levantou o queixo.

– Lydia, Lydia – disse ele, parando em frente a ela. – Em que posso ajudá-la?

– O que você fez? – perguntou ela, sem rodeios. Theo ergueu as sobrancelhas.

– Não entendi a pergunta, linda.

– Não me chame de linda – cuspiu ela. – Stiles não foi para as aulas, e eu sei que ele veio para o colégio. O que você fez com ele?

Ele a olhou por alguns segundos, depois soltou uma gargalhada.

– O que, você acha que eu dei um sumiço nele? – Lydia estreitou os olhos enquando ele dava outra gargalhada. – Acha mesmo que eu seria tão idiota?

– Eu não ficaria surpresa – disse ela. Ele balançou a cabeça negativamente, como se estivesse desapontado com a garota.

– Eu não estou com pressa de ter minha vingança – disse ele. – Não precisa ficar esperando.

Lydia respirou fundo, tentando se acalmar. Agora que estava cara a cara com o verdadeiro Theo, sentia nojo de si mesma por sequer ter pensado em se envolver com ele.

– Eu não vou deixar você chegar perto de Stiles – ela sibilou. Theo ergueu as sobrancelhas, fingindo o choque de ouvi-la dizer tais palavras, o que apenas a irritou mais. – Seja qual for o seu plano, ele não vai dar certo.

– O que você vai fazer, falar com a polícia?

– Exatamente.

– Não vai não, e sabe por quê? – Theo apoiou a mão no armário atrás da garota e inclinou-se, aproximando sua boca da orelha dela. – Porque se você abrir a boca, eu acabo com ele antes que me peguem. Eu não estou brincando. Se a polícia vier atrás de mim, você vai se arrepender. E ele também.

Sua proximidade a fazia prender a respiração, e suas palavras fizeram um arrepio descer pela sua espinha. Theo tinha um brilho perigoso de loucura em seus olhos, e ela sabia que ele estava falando a verdade. Lydia não quis imaginar as coisas que ele tinha em mente quando fazia ameaças tão sérias. Ela era uma das únicas – talvez a única – pessoa que sabia dos planos dele, e não havia nada que ela pudesse fazer para impedi-lo? Lydia não aceitaria esse acordo.

– Theo, por favor – disse ela, controlando sua voz. Segurou a frente da camisa dele com ambas as mãos e o olhou nos olhos. – Não faça isso. Por favor, estou pedindo... Não, estou implorando. Eu faço o que você quiser, só não o machuque...

Theo olhou para as mãos da garota, agarrando sua camisa, depois lentamente levantou os olhos. Um sorriso malicioso se espalhou pelo seu rosto e Lydia teve medo do que vinha a seguir. Teve medo, mas faria o que estava a seu alcance para proteger Stiles.

– O que eu quiser? – perguntou ele.

– Qualquer coisa – ela respondeu, decidida.

– Seja minha vingança. – Lydia franziu a testa, confusa.

– Como assim?

– Imagine ver uma pessoa que você ama namorando alguém que você odeia. Bem chato, não é? Ainda mais se você não puder fazer nada para mudar isso. – Lydia soltou a camisa dele e o afastou, entendo imediatamente o que ele tinha em mente.

– Você é nojento – cuspiu.

– Ei, a ideia foi sua – disse ele, sorrindo. – Você vai ser minha namorada, e quero que seja convincente. Quero que ele acredite que você está apaixonada por mim. Simples assim.

Lydia se segurou para não plantar sua mão no rosto dele. A proposta era indecente e absurda, nada surpreende vindo de um maluco como Theo. Fingir ser namorada dele iria ser um trabalho sujo e difícil, e a colocaria em uma posição que ela nunca imaginou que estaria. Mas valeria pena quebrar algumas das suas regras, se isso significasse que Stiles ficaria em segurança. - Se eu aceitar, – disse ela, controlando sua voz -, você promete que deixa Stiles em paz?

– Prometo. – Theo ergueu uma das mãos como quem faz um juramento. Não que ela acreditasse muito em sua palavra, mas a promessa a aliava um pouco.

– E por quanto tempo terei que fazer isso?

– Tempo indeterminado – disse ele. Lydia abriu a boca para argumentar, mas ele levantou um dedo para silenciá-la. – A vingança é minha, Lydia, eu digo como ela vai funcionar. Você aceita ou não?

Lydia respirou fundo. Stiles já havia a protegido antes, agora era a vez dela de protegê-lo. Ele teria que perdoá-la, mas era para o bem dele.

– Aceito.