Acordei com meu celular tocando. A foto de Shawn apareceu na tela. Olhei pela janela e já era noite. Eu havia dormido mais do que deveria. O que mais gostava em meus pais, era isso, nunca, por mais que eu havia dormido, eles me acordavam.

— Oi? – Atendi o telefone com a voz mais rouca que um rouxinol.

Shawn resmungou algo como “Você estava dormindo?” e eu concordei, num resmungo quase inaudível.

— Meus pais vão fazer poutine hoje... – Ele começou, pude vê-lo sorrir do outro lado da linha. – Pensei em você vir para cá. Poutine sem você não tem graça.

Tive que sorrir. Ele era fofo demais para agir do jeito que agiu. Não podia ser verdade.

— Se seus pais não se importarem... – Falei baixinho.

— Vou te buscar! – Shawn respondeu, animado.

— Não... – Falei, de supetão. Logo continuei, tentando disfarçar: - Pode deixar que eu vou, não é bom você ficar andando por ai, pode ter paparazzi ou sei lá. – Ouvi Shawn estranhar do outro lado. – Em meia hora estou ai – Falei, desligando o telefone, não esperando ele responder.

Não sei de onde tirei isso. Mas acho que não estava preparada para encara-lo de frente sozinha assim. Shawn não parecia se importar muito com a fama quando estava aqui, mas por algum motivo isso me veio à cabeça. Para ser sincera, era apenas uma desculpa para não ter que enfrenta-lo assim. Se ele viesse me buscar, o máximo que aconteceria seria eu explodindo em cima dele, jogando juras mal cumpridas em sua cara e eu não queria isso. Queria ser civilizada, pelo menos uma vez ao invés de abrir a boca a chorar na frente dele de novo. Precisava ser adulta.

Me arrumei e pedi para que meu pai me deixasse lá.

— Você parece meio esquisita, bonequinha. – Meu pai falou, enquanto dirigia.

Pensei em várias formas de explicar para ele o que estava acontecendo dentro de mim, mas nada parecia ser capaz disso.

— Fui falar com Ethan – Não olhei para meu pai. – Ele faltou jogar na minha cara que Shawn era famoso e que nunca ficaria comigo – Minha voz falhou na última parte e uma mão gigante pareceu apertar meu coração.

— Filha, - Meu pai levou a mão até minha perna – Você conhece Shawn desde pequena. Nós conhecemos. E você sabe que mesmo depois da fama, Shawn ainda é o mesmo. - Respirei fundo. Será mesmo que é, pai?, pensei. – Ethan só esta magoado por ter sido trocado, é o ego masculino ferido. – Sorriu e me deu dois tapinhas na perna.

— É, talvez você tenha razão – Concordei, para não ter que explicar toda a história da mensagem. Seria cansativo demais repetir tudo. Dei um sorriso forçado a ele.

Queria que todos os homens do mundo fossem iguais ao meu pai.

Desci do carro e me pus a frente da porta de Shawn; respirei fundo, criando coragem para tocar a campainha. Precisava agir normal. Queria tocar no assunto como se fosse algo que não me afetasse. Infelizmente, tenho essa mania idiota de querer parecer indestrutível para as pessoas. Mas o negócio, era que Shawn me tornava fraca com um simples olhar.  Quando levei a mão para tocar a campainha a porta se abriu e Shawn apareceu, todo sorridente.

— Oi – Shawn sorriu de lado, aquele sorriso que ele dá quando começa a cantar uma música que gosta muito. E sem perceber, eu já estava sorrindo de volta. – Que demora! – Exclamou, me dando um selinho e me puxando para dentro. – Olha quem chegou!

Tinha que ser sincera também, estava morrendo de medo de todos me recriminarem lá por Shawn estar todo machucado. Mas o tratamento foi totalmente o contrário. Eles eram demais.

— Leah! – Manny, Karen e Aaliyah falaram em uníssono.

— Oi, gente – Sorri. E foi um sorriso verdadeiro. Como eu adorava aqueles três. Já estava esperando que Manny fizesse uma piada da qual eu não fosse entender, mas o que ele fizera foi levantar e me abraçar.

— Você mora a algumas quadras daqui e eu nunca te vejo! – Manny falou, se afastando para me olhar.

— Ela é dessas que só aparece quando o Shawn esta, né, Leah? – Aaliyah falou, cruzando os braços e Shawn deu um peteleco em seu braço. Eu ri.

— Desculpa, Aliyah, achei que você não precisasse de mim mais para brincar de boneca... – Falei e ela fez uma careta misturada com um sorriso.

— Sente-se, querida – Karen me deu um beijo no rosto. Como sempre, numa postura impecável.

Karen era uma daquelas mãezonas, bem chiques mesmo, que não desciam do salto por nada, mas que mesmo assim, conseguiam ser simpáticas e maternal. Sempre sentia uma paz enorme quando estava junto deles. Me sentia em casa. E isso me fazia um bem danado naquela hora. Aaliyah realmente havia crescido desde a última vez que a vi. Acho que foi quando Janine morreu, a gata que eles tinham. Ela se sentou do meu lado, mexendo no celular.

— Você e Shawn estão juntos de novo? – Falou, ainda com os olhos colados no celular.

Engoli em seco e olhei para Shawn, que estava chegando com o violão nas mãos.

— Como sempre, inconveniente. – Falou, bagunçando os cabelos dela.

— Hey! Só estou querendo saber, o que tem de mal? – Aaliyah resmungou, arrumando os cabelos. – Eu até gosto dela. – Aaliyah deu de ombros.

— Que bom saber disso – Falei brincando. – Pelo menos a mais difícil da casa eu conquistei. O Shawn nem importa pra mim mais. – Levei a mão à frente da tela do celular dela, tentando chamar sua atenção.

— Eu gosto, mas não abusa, Leah, posso mudar de ideia rapidinho – Comecei a rir.

Encostei os cotovelos na mesa e a cabeça na mão e fiquei olhando enquanto Shawn tocava violão. Era tão lindo que eu poderia ficar ali a noite inteira apenas olhando ele tocar, mesmo sem cantar nada, ele ainda fazia umas caretas, como se sentisse naquelas notas musicais algo acontecendo. Suas feições iam de dor, para paixão e eu tinha certeza absoluta que na minha cara só se via uma coisa: amor. Só faltou eu suspirar, porque sorrindo eu já estava feito uma boba.

Vi Aaliyah se mexer ao meu lado e virei o olhar para ela, dei um pulo para trás quando vi que ela estava me filmando.

— Que isso, menina? Que você fez? Apaga – Disparei em direção dela, tentando tomar o celular da sua mão. 

Aaliyah ria descontroladamente, uma risada maligna que só ela tinha. Ela parou, e me encarou. – Você sempre gostou dele, né, Leah? – Perguntou baixinho.

Não podia mentir. Até mesmo se mentisse, minhas atitudes e minha cara de adolescente apaixonada me entregariam na hora. E cá entre nós, eu estava conversando com Aaliayh, e aquela ali ninguém conseguia enganar. Apenas encarei Shawn, sem responder e Aaliyah entendeu.

— Sabe que não é culpa sua, né? – Ela falou, se aproximando de mim. E eu a encarei, tentando entender do que ela falava. Ergui a sobrancelha direita, como se perguntasse “o que?” E ela continuou: - O Shawn ter apanhado e tudo...

— Por que você esta falando disso agora?

Aaliyah se remexeu, inquieta, o que me deixou com certa dúvida, porque ela quase nunca se constrangia com algo. O que me fez endireitar mais em direção a ela, como se a obrigasse a falar.

— Porque foi eu – Ela começou – Eu descobri o número daquele seu namorado sem sal e mandei mensagem para ele do celular do Shawn e apaguei para que ele não visse – Ela disparou a falar.

Fiquei parada a encarando, a feição de espanto na minha cara devia ser visível, visto pelo modo que ela se remexeu novamente. Eu devia a estar fuzilando com os olhos.

— Aaliyah! – Sussurrei – Você causou uma confusão enorme! – Exclamei, ainda sem acreditar em tudo que ela tinha falado.

Pensando bem, isso era bem a cara dela mesmo.

Ela abaixou a cabeça perto de mim, quase se dependurando na mesa e sussurrou, abafando a voz pelo som do violão de Shawn: - Eu não achei que seu namorado fosse fazer aquilo – Exclamou, com uma pontada de raiva. – Ele parecia ser tão molenga!

Eu não sabia se eu ria ou se eu chorava. Rir, pelo fato de não ter sido o Shawn e toda aquela paranoia da minha cabeça ser bobeira, ou chorar porque Ethan agiu de uma forma que ninguém esperava e podia quase ter matado o Shawn de porrada.

— Eu queria que vocês se acertassem, Leah, você e aquele garoto – Ela balançou a cabeça – Não eram certos. Da última vez, Shawn saiu daqui transtornado, como eu nunca tinha visto ele ficar e eu sabia que tinha alguma coisa a ver com você, porque é sempre você. – Ela revirou os olhos. - Quando ele voltou do show, todo machucado, ele estava radiante. Eu quase morri do coração, porque não imaginei que ele fosse voltar arrebentado do jeito que voltou, mas ele estava feliz. Mesmo que você tenha dado o fora nele antes de ir embora. – Eu a encarei, semicerrando os olhos. – É, é, ele me contou.

Encarei Aaliyah com o maior amor do mundo. Nunca pensei que aquela pestinha pudesse pensar daquela forma e a vontade que tive foi de abraça-la e aperta-la até não poder mais. Mas eu sabia que ela acharia ruim, então, fiquei apenas a encarando com o olhar de agradecimento. E ela entendeu. Sorriu de volta, balançando a cabeça e pude escutar ela dizendo “eu sei, eu sou demais mesmo”.