Um Refúgio em Silent Hill escrita por Mara S


Capítulo 4
Rosewater




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Dois meses se passaram...

A conversa com o padre Vincent e a loja de antiguidades pareciam pertencer há um passado distante. Assim como James Sunderland, que nunca mais apareceu na boate. Naqueles dois meses as coisas pareciam voltar ao normal lentamente... Emily conseguira viajar para Ashfield e permaneceu o tempo suficiente para pensar seriamente em mudar-se para lá. Contudo, Silent Hill continuava atraindo-a e parecia que nada poderia mudar a sua maré de sorte.

O outono iniciara naquela semana e as árvores já começavam a apresentar um amarelado tom em suas folhagens. O frio também já era presente, e foi trajando um longo casaco de gabardine branco que Emily decidiu caminhar pelo parque Rosewater naquela manhã. Era raro acordar cedo, mas não fora trabalhar ainda naquela semana, decidindo, então, respirar um pouco do ar matinal.

Não passava das nove da manhã quando Emily adentrou os portões de ferro do parque, caminhando lentamente pelos corredores de pedra, parando aqui e ali para observar as estátuas repletas de inscrições estranhas remetendo ao período da guerra civil.

– Se fosse você pararia de ficar lendo essas inscrições...

Ouviu uma voz atrás de si. Ao virar deparou-se com o vizinho Joseph Barkin.

– Algumas são bem mórbidas mesmo... Quanto tempo, Joseph – Emily sorriu.

– Apesar de sermos vizinhos – ele falou rindo. Parecia com olhar menos doentio que das últimas vezes que o encontrou. Joseph começou a caminhar na direção do píer acompanhando Emily. – Eu venho aqui quase todos os dias com a minha filha. Ela gosta de andar de bicicleta.

– Aqui é bonito. Calmo. Deveria vir mais vezes quando está vazio, claro.

– Não gosta de movimento?

Emily fez que não com a cabeça.

– Já escuto barulho demais todos os dias...

– Onde está sua filha? – Emily perguntou ao alcançarem o píer.

– Ela não veio... – ele suspirou como se houvesse lembrado algo que gostaria de esquecer. – Preferiu ficar com a avó essa semana. É bom ter uma presença feminina perto dela...

– Onde está mãe, se não for incômodo perguntar, claro.

– Não é... A mãe foi embora. Não agüentou a pressão de se mãe. Sophie tinha dois anos. Eu praticamente a crio sozinho...

– Deve ser difícil.

Joseph concordou com a cabeça apoiando-se na grade de segurança do lago Toluca. Emily fez o mesmo tentando enxergar o lago através da penetrante neblina que o cobria.

– Enfim, parece que gostou da cidade! Por um momento pensei que não duraria muito aqui! Vindo de uma cidade grande e tudo mais...

– Não vou negar que algumas vezes tenho vontade de pegar minhas coisas e desaparecer. Mas depois as coisas voltam ao seu lugar. De qualquer forma, não vou voltar pra Chicago mais.

Joseph gostaria de saber a razão daquela frase, mas resolveu não perguntar naquele momento.

– Acho que estou me acostumando com o lugar, apesar de algumas coisas estranhas.

– Tipo?

Emily o encarou pensando se deveria falar do que ainda a deixava curiosa. Finalmente disse:

– Tipo um padre. Existe alguma igreja fora a protestante e a católica?

– Bem... Não é bem uma igreja, apesar de estarem crescendo consideravelmente. É mais um culto religioso, para ser exato.

– Você vai me explicar. Eu fiquei curiosa com esse assunto...

– Eu não conheço muito disso. Só o que sei é que eles são extremamente fieis e gostam de criticar o catolicismo e qualquer outra religião que não sejam a deles. Bem extremistas todos eles. Eles têm uma igreja na cidade, a Balkan. Nunca entrei... Por que a curiosidade?

– Um padre veio falar comigo sobre isso.

– Talvez eles queiram te levar... Limpar sua... Desculpe-me – apressou-se a dizer, constrangido.

– Não tem problema. É... Limpar minha alma suja. Bem provável que seja isso. Como se houvesse salvação nesse mundo. Não acredito nessas merdas pregadas... – foi interrompida ao notar um casal atrás de Joseph que também se apoiava na beira do lago. A mulher parecia fraca e era segurada por um homem de cabelos loiros que Emily reconheceu ser James. Então aquela era a esposa doente dele...

– Algum problema? – Joseph perguntou ao perceber que Emily estava distante.

– Nada. Pensei que conhecesse uma pessoa. De qualquer forma, – Emily sorriu tentando parecer normal – essa cidade é bem diferente. Deve ser a localização... É bem afastada.

– Você deveria ler um pouco sobre o lugar. O passado é cheio de histórias estranhas. Esse lago mesmo, um navio desapareceu aqui e outros acidentes ocorreram nele.

– Isso é bizarro... – respondeu vagamente ao notar que James caminhava na direção oposta do píer, deixando a esposa apoiada observando o lago pelo binóculo.

– Vá um dia na Sociedade Histórica. Você iria gostar de saber mais sobre aqui.

– É... Eu vou fazer isso qualquer dia. Aí você vai comigo para servir de guia turístico – piscou. – Joseph, eu preciso ir. Esqueci que minha amiga iria aparecer lá em casa ainda hoje. Vou correr pra lá... Obrigado pelo passeio – sorriu para o homem e antes que ele dissesse qualquer coisa, andou depressa na direção onde James havia ido.

Ele havia subido a mesma escada que Emily descera com Joseph, talvez para buscar alguma coisa para a esposa. Já estava quase na entrada do parque, que começava a receber alguns habitantes da cidade, quando o avistou de longe. Emily bufou irritada com a sua ação e apoiando-se na parede gelada, pensou em dar a volta no parque e sair pelo outro lado somente para James não a vê-la. Por que prejudicar aquele momento do casal? Talvez ela estivesse melhorando e sua visão não deixaria James feliz. Começou a descer lentamente os degraus em direção ao píer, dessa vez decidida em dar a volta e fugir do casal quando ouviu chamarem seu nome.

– Jillian?

Demorara tanto na entrada que James conseguira alcançá-la. Emily virou-se lentamente na direção de James.

– Olá – ele falou.

Emily notou que estava abatido.

– Eu o vi com sua esposa lá no píer – Emily disse fingindo um sorriso.

– Sim. E eu te vi com um cara também... – falou se aproximando. – Mary recebeu alta hoje. Ela queria ver o lago antes de partirmos – apesar de sorrir, James não parecia contente com o fato de a esposa ter saído do hospital.

– Então tudo leva a crer que as coisas ficarão bem para vocês. Viu? Foi bom ter sido forte – falou com uma pontada de ironia.

– Não sei ao certo. Ultimamente olho para minha esposa com olhar de pena e não amor. Não sei se estou sendo sincero com ela.

– Bem. Boa sorte com ela – Emily disse voltando a caminhar para a saída.

– Você ainda está trabalhando lá? – perguntou para Emily que disse sem se virar:

– Eu nunca saí.

Sentiu que ele ainda a observava de longe, mas continuou a seguir em direção de sua casa. Como ela imaginara não fora agradável James tê-la visto ali, tão perto de sua esposa, mas não adiantava reclamar. O estrago já estava feito...


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