De Repente Papai escrita por Lady Black Swan


Capítulo 39
Um cigarro viria a calhar...


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoinhas!
Como estão os ânimos depois do último capítulo? XD



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Havia momentos, como agora, em que Sesshoumaru sentia falta de seus cigarros, aquele seu imensurável e tóxico desperdício de anos de dinheiro, afinal eles sempre o ajudaram a espairecer e pensar melhor, ele ainda se lembrava de quando seus dias eram mais simples e tranquilos, como quando Inuyasha decidiu passar uns tempos na casa da Domadora e foram apenas Rin e ele no apartamento… e agora ele estava ali, em frente à casa dos avós de Rin. 

Francamente, se fosse para se meter em uma discussão com a terceira idade, Sesshoumaru teria preferido até mesmo estar preso em alguma reunião com Myuga do que isso, pois mesmo que discutisse com o velho e que ele o pressionasse com seus prazos inúteis e reclamasse de suas viagens repentinas, no fim tudo ainda se tratava de seus livros, seu mundo particular onde ele era um deus e governava as vontades e ações de cada mísero personagem, como peças em um tabuleiro… no entanto com humanos a história tendia a ser diferente, já que eles costumavam ser bem intransigentes.

“Ela é tudo o que restou de Mariko!”.

Especialmente um par de velhos teimosos que achavam que sua filha era o backup da falecida filha deles.

E por que, além de tudo, o dia precisava estar tão ridiculamente ensolarado? 

Sesshoumaru desceu do carro já com os óculos escuros postos, ele tinha certeza de que havia marcado aquele dia e hora com os avós de Rin, mas parece que alguém havia se antecipado, pois foi capaz de ouvir as vozes exaltadas discutindo dentro da casa assim que começou a se aproximar da porta.

O dia mal havia começado e ainda assim já lhe parecia tão longo… Sesshoumaru bateu na porta por três vezes, que se abriu com um solavanco quase imediatamente, ele ainda lembrava-se de Rin descrevendo o avô como alguém que sempre portara uma “barriga multiuso”, mas agora o velho havia nitidamente perdido peso, e não por boas razões, havia bolsas debaixo de seus olhos e ele carregava uma expressão furiosa em seu rosto encovado.

—Bem, e aqui está você! Já não era sem tempo, não é mesmo? — cuspiu o velho ranzinza, dando meia volta e retornando para dentro de casa.

Que falta fazia um cigarro… tirando os óculos escuros Sesshoumaru o seguiu.

Obviamente também não ficou surpreso quando se deparou com os pesados coturnos negros já na entrada e logo depois encontrou a prima punk de Mariko lá dentro.

—… importa se conheceram os pais dele?! — a mulher estava falando por entre os dentes enquanto abraçava-se pelos cotovelos, mas Sesshoumaru via que ela tremia — Ele ainda poderia ser um yakuza, ou um traficante de órgãos. — assim como a prima mais nova ela também parecia assistir televisão demais… ou então simplesmente lera alguns de seus livros. — Ou até um pedófilo serial killer! Não tinha como vocês saberem e ainda assim a deixaram com ele! 

—Antes pensávamos que ela estivesse com você. — a avó de Rin defendeu-se torcendo as mãos do mesmo jeito que a neta costumava fazer.

—Sim pensaram, mas nunca ligaram para confirmar se ela havia chegado bem, nunca nem sequer quiseram saber como ela estava… mas eu também tive culpa, quando Rin me disse que não iria mais… eu deveria ter ligado para perguntar o que tinha acontecido. Algo assim não poderia ter acontecido. — Ela suspirou parecendo esgotada e jogou-se no sofá atirando a cabeça para trás, foi quando o viu ali: — Eu vim tirar toda essa história a limpo.  

Declarou olhando-o penetrantemente.

—Nós estávamos tomados pela dor. — alegou a senhora ainda torcendo as mãos. — E esse senhor aproveitou-se disso.

Seu tom de voz deixava claro que ela pretendia chamá-lo de qualquer coisa, menos de “senhor” Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha diante daquilo.

—Não foi o que me pareceu quando estive aqui para devolver Rin e a senhora bateu a porta em minha cara, vociferando que a levasse. — declarou, certificando-se de emular o seu mesmo tom de voz.

Um silêncio mortal se instalou naquela sala, Keiko ficou parada como um cadáver com a cabeça ainda jogada para trás e os olhos agora bastante arregalados, a avó de Rin afundou o rosto entre as mãos e começou a chorar, e então o velho cambaleou um passo para frente, e mais um, até que passou ao lado de Sesshoumaru e correu até a esposa.

—Naoko, o que é isso que esse homem está dizendo?! Você realmente entregou nossa neta a ele?! — a velha calou-se e chorou, ele a sacudiu — DIGA!

E com palavras trêmulas a velha recorreu novamente àquele que parecia ser o seu único argumento: insanidade temporária.

—Eu estava doente de dor… a minha Mariko, a nossa preciosa menina… ela havia acabado de partir… tinha um futuro tão brilhante, mas desgastou-se até o fim tentando suportar sozinha o peso que ele lhe deixou… eu achei… eu achei que agora era sua obrigação cuidar dela, ele precisava pagar por…

—Peso?! Pagar?! — Kinoshita Keiko a interrompeu com os olhos tornando-se vermelhos — Tia, a senhora acreditou que Rin fosse algum tipo de peso ou punição?!

—Não! — a velha ergueu a cabeça no mesmo instante — Isso nunca! Isso jamais! Eu não estava pensando direito eu…!

—Estava doente de dor. — Sesshoumaru completou ironizando-a. — E o que teria feito se, de uma forma ou de outra, eu tivesse me recusado a levá-la de volta e simplesmente a tivesse deixado na sua porta? Teria-a enfiado em outro táxi de volta para o meu prédio? Ou simplesmente a teria entregue para o próximo estranho que passasse? 

Lançou um olhar de relance a Kinoshita Keiko, mas ela estava observando a tia sem nem piscar.

A mulher mais velha ergueu-se com um salto.

—Eu jamais faria algo assim! — negou enraivecida.

Sesshoumaru a encarou seriamente.

— Foi exatamente o que fez. — afirmou.

E como não tinha intenção alguma de ficar de pé ali o tempo todo, ele avançou e sentou-se numa poltrona. Um cigarro viria bem a calhar agora.

—Você disse que nossa Mariko tinha acabado de partir e ainda estava doente de dor. — o velho recomeçou a falar, com a voz trêmula. — Então quando foi isso? Desde quando você sabia que Rin estava em posse desse homem?

—Eu tentei devolver Rin na primeira oportunidade que obtive, menos de um mês após sua chegada. — Sesshoumaru respondeu quando a mulher manteve-se calada.

O avô de Rin olhou para a esposa como se a estivesse vendo pela primeira vez.

—Não foram assim que as coisas aconteceram! — ela negou — Quando me dei conta do que havia feito, que havia afastado a última parte de Mariko que nos restava, eu tentei recuperar nossa menina, mas ele recusou-se a devolvê-la! 

Apontou-o de maneira tão acusatória como se acreditasse que Sesshoumaru fosse a origem de todos os males desse mundo. 

—E isso foi há apenas quatro meses. — fez questão de pontuar enquanto cruzava as pernas, apenas para deixar bem claro quanto tempo aquela senhora “doente de dor” havia levado para voltar a si, e tinha certeza de que o juiz gostaria bastante de saber a respeito daquilo também, já que evidentemente tudo os estava direcionando para o tribunal.

A mãe de Mariko fez como se nem o escutasse, virou-se para o marido e agarrou-o pelos ombros.

—E depois Keiko começou a ligar querendo saber de Rin, querendo falar com ela! E a situação estava se tornando tão… tão insustentável, porque eu sempre precisava atender ao telefone com medo de que fosse Keiko novamente, ao mesmo tempo em que o mantinha longe de você e tudo sem que desconfiasse, e eu não podia recuperá-la… querido, você me entende, não é? — questionou suplicante — Quando lhe confessei toda a verdade, você também tentou recuperar Rin e falhou!

—Mas você não me disse toda a verdade, Naoko! — o homem ressaltou acusadoramente, afastando as mãos da mulher. — Nunca me disse que estava a par da situação há tanto tempo! Praticamente desde o começo! E não fez nada a respeito, pelo contrário: encobriu seus erros!

Apoiando o cotovelo sobre o braço da poltrona e sustentando o rosto de lado com a mão, Sesshoumaru assistiu em silêncio o desenrolar das coisas. O lábio inferior da mulher tremeu.

—Mas o que eu podia fazer? — reclamou torcendo as mãos logo antes de apontar Sesshoumaru novamente — Esse homem é completamente intransigente, ele apoderou-se de Rin e fez lavagem cerebral na nossa menina para prendê-la ao seu lado!

Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha, daqui há pouco a velha também o estaria acusando de tê-la manipulado mentalmente para que abrisse mão de sua querida netinha.

—E quem devolveria uma criança a vocês?! — por um segundo, Sesshoumaru julgou que havia dado voz aos seus próprios pensamentos, mas então se deu conta de que fora Kinoshita Keiko aquela que falara, pondo-se de pé e olhando furiosamente para os tios — O que poderia fazer?! Poderia ter chamado à polícia! Poderia não ter esperado mais de meio ano para só então tê-la procurado! Poderia tê-la pegado de volta quando ele ainda estava disposto!

—Eu já disse que estava doente de dor! — a mulher mais velha defendeu-se, voltando sua ira agora para a própria sobrinha — Não sabia o que fazia!

—Podiam nunca ter posto em sua cabeça que a morte da própria mãe foi sua culpa!

O golpe não poderia ter sido mais certeiro, Sesshoumaru observou enquanto o casal se quedava paralisado com seus rostos se tornando cinzentos, pareceu-lhe que o avô de Rin havia começado a balbuciar qualquer coisa, mas Kinoshita Keiko ainda não havia terminado em seu ataque:

—Rin tem certeza de que foi a causadora da morte de Mari-nee-chan, e prefere agarrar-se a esse homem praticamente desconhecido em detrimento de sua própria família, isso porque vocês a fizeram acreditar que ela é a culpada pela partida de Mari-nee-san! Como puderam?!

Ela deteve-se ofegante, ainda mantendo os punhos firmemente fechados e, parecendo em choque, o pai de Mariko caiu sentado no sofá, afundando o rosto entre as mãos.

—Ela ouviu! — lamentou-se — Naoko veja o que suas palavras inconsequentes causaram: Rin a ouviu! — balançando lentamente a cabeça ele começou a erguê-la novamente — Por isso é que ela fugiu daqui e foi procurar esse homem, então ela não nos odeia afinal… mas Naoko não sabia o que fazia, eu vou explicar tudo a ela hoje mesmo e assim poderemos deixar tudo para trás e…

Aquele homem estava realmente pensando em retomar a guarda de Rin depois de tudo? Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha, mas quem pareceu ficar mais ultrajada ali foi Kinoshita Keiko:

—Mas o senhor sabia! E mesmo assim, por que nunca sequer me telefonou para saber do bem estar dela? Confesse tio, o senhor também não queria ter Rin por perto! Também a estava culpando pelo que aconteceu a Mari-nee-san!

—Absurdo! — o velho vociferou — Eu precisava cuidar de Naoko, você nunca veio aqui Keiko, não sabe como ela estava despedaçada, olhar para Rin ou mesmo apenas falar dela já a despedaçava, Mariko era nossa única filha!

—E era a mãe de Rin, ela também estava despedaçada! — Keiko reagiu — Como puderam deixá-la desolada e sozinha dessa forma? É apenas uma menininha!

As vozes de ambos os lados se alteravam cada vez mais, e a essa altura certamente já era possível ouvi-las da rua, tal como no momento em que Sesshoumaru chegara ali.

—Meça suas palavras, Keiko! Respeite-nos! — a mãe de Mariko reagiu furiosamente.

Mas Keiko não se deixou intimidar.

—E como vou respeitá-los se vocês nunca respeitaram a memória de Mari-nee-san?! Vejam o que fizeram a Rin! O peso que puseram sobre os ombros da minha pequena priminha!

As coisas não estavam caminhando bem, os ânimos já estavam alterados demais ali e Sesshoumaru tinha certeza que logo algum vizinho acabaria chamando a polícia, isso sem falar que aquilo não os estava levando a lugar algum, Sesshoumaru girou os olhos, e ele não tinha o dia inteiro — mesmo que tivesse, estava longe de ter disposição para isso — só por isso decidiu intervir:

—E é justamente por isso que estou aqui hoje: quero assumir legalmente a guarda de Rin. — declarou.

—Isso jamais! — o velho reagiu na mesma hora.

O olhar de Sesshoumaru endureceu.

—Não estou aqui para pedir-lhes permissão. — afirmou levantando-se seriamente — Embora pense que se concordassem tudo se daria de forma bem mais fácil para Rin, porém já que querem fazer as coisas dessa forma iremos a julgamento, e depois que expor a loucura e a negligência de ambos, juiz nenhum na face da Terra concordará em deixar a guarda dela com vocês, e então tomarei legalmente a guarda para mim. Portanto, aconselho-os que arrumem logo um advogado, porque o meu entrará em contato em breve.

A mãe de Mariko cobriu o rosto com as mãos e voltou a chorar ruidosamente, mas o pai dela veio atrás de Sesshoumaru.

—Espere, espere maldito bastado! — urrou agarrando-lhe o ombro quando Sesshoumaru abaixou-se para calçar os sapatos na saída — Não pense que vai conseguir nos tomar nossa neta assim! Rin é tudo que restou de Mariko e jamais permitiremos que você nos tome…!

—Vocês mesmo se desfizeram dela, queiram admitir ou não. — Sesshoumaru respondeu-lhe olhando-o do alto ao levantar-se — E agora sou eu que lhe digo: não pensem que serão capazes de tirar Rin de mim.

Colocou os óculos de sol e saiu, ele quase não se dera conta do tempo passando, mas quando olhou o relógio em seu pulso, percebeu que faltava agora menos de uma hora para ter de ir buscar Rin na escola, e a casa dos pais de Mariko não era exatamente próxima ao colégio, mas mesmo assim se ele saísse agora não haveria problema algum… no entanto antes que Sesshoumaru pudesse abrir a portar do carro, uma mão agarrou-o pelo cotovelo.

—Nós não temos mais nada a tratar… — já foi dizendo ao virar-se, pensando se tratar de um dos avós de Rin, mas deteve-se ao deparar-se com a prima punk. — O que é?

—Você. — ela o olhou furiosamente — Quero que venha a um lugar comigo.

Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha.

A garota havia dito que queria que ele fosse a um lugar com ela, mas foi ela quem entrou no carro, esperando que ele a levasse enquanto Sesshoumaru fazia uma ligação.

—A…?

—Quero que vá buscar Rin na escola. — avisou ao meio-irmão idiota assim que ele atendeu ao telefone.

—Sesshoumaru! — o idiota o reconheceu, mas parecia ser estúpido demais para decifrar sua mensagem, quando dita tão rapidamente — Como assim ir buscar Rin?!

—Vou me atrasar e não poderei ir buscá-la na escola, então quero que você se faça útil uma vez na vida e na saída do colégio faça um desvio do seu caminho para parar na escola de Rin e pegá-la. — explicou pausadamente.

—Não…! Espere um pouco Sesshoumaru, eu já tenho meus próprios planos! — o meio-irmão protestou.

—Cancele-os.

Can…?! — ele soou como se estivesse prestes a ter um infarto — Seu estúpido, não posso cancelar!

—Então adie ou a leve com você. — e antes que o idiota pudesse reclamar mais alguma coisa completou: — É melhor ir buscar Rin ou juro que você não terá uma casa para voltar. 

Kinoshita Keiko estava sentada ao seu lado com o cinto de segurança já posto, mascando um chiclete e olhando para o lado de fora enquanto esperava que ele terminasse a ligação.

—Quero visitar Mari-nee-san. — afirmou quando o ouviu ligar o carro — A direção…

—Eu a conheço. — interrompeu-a.

Seguiram assim o resto do caminho em silêncio quase absoluto, exceto pelo irritante barulho do mascar de chiclete da garota, entrecortado vez ou outra por uma bola estourando.

—Quando foi que Rin-chan o trouxe aqui? — perguntou a certo momento, quando já estavam quase chegando.

—Há algum tempo. — respondeu vagamente.

O cemitério estava quieto e vazio, e mesmo só tendo ido ali por umas poucas vezes Sesshoumaru já havia decorado o caminho até Mariko, havia um enterro sendo realizado ao longe, mas ambos o ignoraram.

—Mari-nee-san, me perdoe, eu fui até sua casa e nem sequer parei para cumprimentá-la. — Kinoshita já foi dizendo assim que pararam diante da lápide, juntando as mãos e batendo palmas por duas vezes diante do rosto e baixando a cabeça, e então lançando um olhar severo a Sesshoumaru antes de sibilar: — Demonstre respeito.

Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha, mas inclinou a cabeça em direção à lápide.

—Realmente pretende levar adiante o que você disse lá na casa dos meus tios? Vai ficar com a guarda dela? — ela perguntou-lhe depois de um longo momento em silêncio.

Sesshoumaru a olhou pelo canto dos olhos, fazia apenas alguns dias que aquela mulher estivera em sua casa também tentando levar Rin consigo, será que ela também pretendia entrar na luta pela guarda? Porque francamente, ele não precisava de mais aquela complicação desnecessária.

—Você tem algo a dizer contra isso? — arqueou uma sobrancelha.

Ele não sabia quando Keiko havia se livrado do chiclete, mas enquanto a olhava esperando por uma resposta, Sesshoumaru viu-a tirar uma carteira de cigarros do bolso da jaqueta e puxar um dali.

—Aceita? — estendeu-lhe a carteira de cigarros.

—Passo. — ergueu a mão recusando.

Já não estava mais tão tentado.

Kinoshita Keiko deu de ombros, guardou o resto de seus cigarros e tateou os bolsos até encontrar ali um isqueiro, suas unhas estavam pintadas com um esmalte azul escuro que já descascava.

—Quando fui à sua casa e não o encontrei, foi Rin quem ligou para você, não foi? Ela estava desesperada para ficar ali. — perguntou enquanto acendia o cigarro, Sesshoumaru anuiu — Ela realmente se agarrou a você, não é? Claro que sim, suponho que você foi o único que secou suas lágrimas durante todo esse tempo. — suspirou soprando a fumaça e empurrando uma mecha de cabelo para trás da orelha — A despeito do que alegam, é inegável que meus tios a abandonaram… e eu também não estive lá para ela. Eu estava muito alterada naquele dia, por isso não me dei conta de imediato, mas Rin parecia bastante bem cuidada na sua casa, não que ela fosse maltratada quando morava com Mari-nee-san e meus tios, mas já fazia tempo que eu não a via sorrir tão sinceramente, sem parecer que estava se esforçando para não preocupar ninguém… por isso fico aliviada que ao menos houve uma pessoa ali para ampará-la.

Sesshoumaru olhou-a de canto, enquanto ela levava o cigarro de volta aos lábios.

—Mari-nee-san odiava que eu fumasse, e nunca me deixava chegar perto de Rin se eu estivesse cheirando a cigarros, e ainda assim sempre que venho aqui vê-la, acabo fumando diante de sua lápide. — comentou com um sorriso triste — Acho que, de alguma forma, fico esperando ouvi-la gritar comigo, besteira, não é?

—Me fale sobre ele. — ordenou de repente. 

—“Ele”? — ela o olhou de canto, soltando lentamente a fumaça do cigarro — O que quer saber? Se for quanto à aparência ou sua identidade, eu lamento, mas não posso ser de muita utilidade nesse quesito. Mari-nee-san era muito reservada quanto a esse aspecto… — fez uma pausa para uma nova tragada no cigarro, enquanto desviava o olhar novamente para a lápide à sua frente, e Sesshoumaru não foi capaz de dizer se ela dizia a verdade ou não, ainda assim Keiko prosseguiu falando: — Mas ele era um homem mais velho, disso eu sei, ele já estava na faculdade… imagino que Mari-nee-san o tenha conhecido quando visitava as faculdades nas quais tinha interesse. — olhou saudosamente para a lápide à sua frente e sorriu tristemente ao comentar: — Ela tinha apenas começado o colegial e já estava pensando em qual faculdade queria ingressar.

—Mariko queria ser professora. — ele relembrou.

—Professora do primário, ela amava crianças. — Keiko concordou — Com certeza foi assim que Mari-nee-san o conheceu, lembro-me que nessa época ela falou-me sobre alguém “educado, inteligente e gentil”, mas obviamente Mari-nee-chan tinha um péssimo olho para avaliar pessoas. — lançou-lhe um olhar significativo pelo canto dos olhos e então puxou do bolso um cinzeiro portátil para apagar ali a bituca de cigarro — Eu nunca gostei da relação que vocês dois tinham, não sabia quem você era, mas sabia que era uma bosta de namorado, deu-lhe um medalhão de ouro, mas e o que mais? Nunca foram a encontros, nunca assumiu qualquer relação com ela, nunca lhe disse algo minimamente carinhoso… mas Mari-nee-san ainda assim riu quando eu disse-lhe que você era só um playboyzinho de m…!

—Você sempre teve uma boca realmente suja, não é? — comentou casualmente.

—Que seja. — Keiko passou a mão pelos cabelos — E aí ele surgiu, com fala doce e delicada, ele a elogiava e a tratava bem, lembro-me que uma vez lhe deu flores, flores! Quem ainda presenteia os vivos com flores nos dias de hoje? E então ele também começou a aconselhá-la, embora eu não soubesse disso na época, disse-lhe coisas como você não ser bom o bastante, e que não adiantava insistir numa relação unilateral, não sei por que ela escutou-o, mas nunca escutou a mim… mas Mari-nee-san o amava muito, você sabia disso? Ela te amava demais e quis pô-lo à prova… e então você a chutou, e ela ficou arrasada, chorou tanto como se fosse morrer, eu estava lá para consolá-la, mas eu não era o bastante… foi quando ele lhe cravou as garras. Admito que também fui enganada.

—Ah, foi? — perguntou desinteressado.

Kinoshita Keiko deu de ombros e, sem desviar os olhos da lápide da prima, proferiu em tom monótono, mas decidido:

—Eu só espero não estar sendo enganada novamente dessa vez, pois quero lhe dizer que, pelo bem de Rin, se você precisar de mim, eu estarei lá para testemunhar a seu favor no julgamento pela guarda de minha priminha. — Sesshoumaru ouviu aquilo em silêncio, meditando por um momento ou dois, o significado de tais palavras, até a mulher voltar-se para ele já impaciente e com as mãos nos quadris: — Bem! Diga alguma coisa!

Mantendo as mãos nos bolsos, Sesshoumaru virou-se para ela.

—Gostaria de vir tomar um café comigo? — convidou juntamente com um arquear de sobrancelha.

Sesshoumaru apenas omitiu propositalmente que aquele “café” seria na sala de seu advogado, se ela estava realmente se oferecendo a testemunhar a favor dele, então ele queria uma declaração por escrita o quanto antes, e embora o olhasse claramente desconfiada ela acabou aceitando seu convite, mas como não marcou hora, ambos tiveram que esperar por mais de quarenta minutos na sala de espera até poderem ser atendidos. 

—Você sabe que vendem café até nas máquinas de bebida, não é? — Kinoshita Keiko ironizou mexendo inquietamente a perna direita, cruzada sobre a esquerda. — Sempre deixa Rin sozinha assim por tanto tempo?

—Ela está com o inútil do meu meio-irmão.

—Ele é um inútil e mesmo assim você a deixou com ele? — olhou-o de canto de olhos, mas suspirou logo em seguida — Se bem que Mari-nee-san era a mãe e os deixava com meus tios, não é?

Ela realmente estava irritada com seus tios, isso era bom, Sesshoumaru poderia usar essa raiva toda a seu favor.

—Taisho-Sama, o doutor irá recebê-los agora. — a recepcionista avisou-os.

Diante do advogado Kinoshita Keiko voltou a jurar que não conhecia o progenitor de Rin, embora garantisse que não havia nenhum risco de ele procurá-la.

—E quanto a você senhorita? Não pensa em tentar ficar com a guarda da criança você mesma? — o advogado perguntou — Afinal fui informado que a senhorita já fez uma tentativa dessa natureza recentemente.

Mais do que simplesmente “ter sido informado”, afinal Sesshoumaru vinha enviando periodicamente “boletins informativos” por e-mail ao seu advogado sobre cada mísero detalhe que ele achasse que pudesse ter alguma relevância para o caso de Rin… aquele bando de parasitas deviam se contagioso de alguma forma.

Devia ser irônico para aquele homem ter deixado Sesshoumaru nos braços do pai e cuidado do divórcio de Arina e Inutaisho, e agora ser ele próprio quem estava cuidando do processo de adoção movido por Sesshoumaru.

Kinoshita Keiko descruzou e cruzou as pernas novamente.

—Sou maquiadora profissional e, mesmo que more com minha mãe, tenho plena certeza de que seria capaz de criar minha priminha. — afirmou. Maquiadora profissional? De verdade? Sesshoumaru nunca teria adivinhado… — mas desejo acima de tudo o bem estar e a felicidade dela. Esse homem cuidou dela e esteve ali por ela quando ninguém mais esteve… — ela baixou o rosto — nem mesmo eu.

Mas seu advogado ainda não se mostrava convencido da resolução dela e parecia acreditar que tão logo a raiva pelos tios passasse ela voltaria seu apoio para eles ou tentaria brigar pela guarda de Rin para si mesma, mas ainda assim tomou nota de seus números para contato.

—Avisei em casa que voltaria cedo e olhe as horas!

Ela reclamou enquanto saíam do prédio, embora houvesse apenas acabado de dar 17h30min.

—Posso levá-la em casa. — ofereceu sem disposição alguma.

Na verdade, sua verdadeira vontade era, no máximo, pagar-lhe um táxi, mas não iria dar-se ao luxo de perder o valioso testemunho favorável de uma parente de Rin que a conhecera e convivera com ela desde bebê.

—E dar assunto para aquelas vizinhas fofocarem e minha mãe fazer-me todo um interrogatório? Passo. — ela respondeu procurando algo nos bolsos — Não precisa me adular só para garantir que eu não mude de ideia. — ela continuou vasculhando os bolsos repetidas vezes por tempo o suficiente para Sesshoumaru arquear uma sobrancelha, até que ela olhou-o pelo canto dos olhos e umedeceu os lábios — mas… talvez eu aceite uma carona até a estação de metrô mais próxima e, quem sabe, algum dinheiro para a passagem?

Sesshoumaru voltou a arquear a sobrancelha, Kinoshita Keiko havia trazido consigo a carteira de cigarros e o cinzeiro portátil, mas dera um jeito de esquecer a bolsa com todas as coisas — incluindo sua carteira com documentos, dinheiro e passe digital — na casa dos tios.

E ainda assim se achava plenamente capaz de ficar com a guarda de Rin caso fosse preciso…

—Eu soube que Rin tem um celular agora, quero o número dela. — Kinoshita afirmou quando ele a deixou em frente à estação de metrô, mas quando Sesshoumaru pegou o celular, descobriu-o descarregado. — Esqueça, eu pego na próxima.

Kinoshita girou os olhos e desceu do carro.

Dando partida novamente, Sesshoumaru estava planejando voltar para casa e dar continuidade a seu livro enquanto comia alguma coisa, quando avistou alguém familiar esperando próxima à faixa de pedestres para atravessar a rua e, baixando o vidro da janela, encostou no meio fio.

—Não está um pouco longe de casa, Madame? — questionou.

Eleonor arqueou-lhe a sobrancelha.

—Estava com a cabeça voando longe e desci na estação errada. — explicou aborrecida — Você tem planos para agora?

—Estava indo para casa. — Acenando, Eleonor não esperou por um convite e deu a volta no carro para entrar. — Então devo levá-la para casa antes?

—Faça-me esse favor. — ela suspirou puxando o cinto de segurança, enquanto ele punha o carro em movimento novamente — E como anda seu livro?

Não sabia que livro ele estava escrevendo agora, mas sabia que ele sempre estava escrevendo alguma coisa.

—Meu protagonista começou a acreditar que seu irmão estava solitário naquela parede, por isso começou a matar os amigos dele um a um e esconder seus corpos na parede também.

—Mórbido como sempre. — Eleonor sorriu-lhe de lado. — Avise-me da data de lançamento, eu gostaria de um exemplar autografado.

—Sempre odiei tardes de autógrafos. — comentou.

—Mas as faz mesmo assim, são parte de seu trabalho. — ela salientou — Também sempre disse que não gostava de entrevistas, mas eu li uma sua recentemente.

Sesshoumaru parou no sinal.

—E Myuga está querendo empurrar-me outras, ele fica tentando usar Rin contra mim.

Apoiando o rosto de lado, Eleonor olhou-o pelo canto dos olhos.

—Façamos o seguinte: você para na próxima loja de conveniência, eu compro algumas cervejas e vamos os dois para meu apartamento reclamar de nossos problemas.

—Estou com fome também.

—Posso pedir comida para entregarem. — ela assentiu — Mas já que pagarei a cerveja, você paga a comida.

O sinal ficou verde, Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha.

—E os seus problemas, eu suponho, tem haver com a razão que te deixou tão aérea a ponto de descer em uma estação totalmente equivocada.

—Precisamente.

—Outro namorado terminou com você?

—Não estávamos namorando ainda e eu é quem acabei com tudo.

Sesshoumaru refletiu por alguns instantes.

—Você terá outra crise de choro?

—Tão insensível. — Eleonor o olhou pelo canto dos olhos — Mas um canalha só pode terminar com você oito dias depois de tirar sua virgindade uma vez na vida, então não se preocupe.

Por um mero segundo os lábios de Sesshoumaru moveram-se para demonstrar algo que, com alguma imaginação, poderia ser chamado de sorriso.

—Tem uma loja de conveniência bem ali. — comentou.

Antigamente ele teria deixado-se ficar por uns dias — ou talvez semanas — na casa de Eleonor, mas agora ele era pai e tinha que levar Rin para a escola na manhã seguinte, então passava apenas um pouco da 1h da madrugada quando o táxi o deixou em frente a sua casa, três latas de cerveja não eram realmente capazes de deixá-lo alcoolizado, mas ainda assim havia optado por não dirigir.

Entrou o mais silenciosamente possível e sem acender as luzes, por isso não se deu conta quando aquele pequeno vulto veio correndo velozmente em sua direção, até que se atirasse contra ele.

—Rin? — chamou estranhando e ela abraçou-o em silêncio, enquanto Sesshoumaru sentia como tremia, embora fosse uma noite quente e abafada, arqueando uma sobrancelha ele tocou-lhe o topo da cabeça. — O que houve?

Recusando-se a responder ela abraçou-o ainda mais forte, e começou a soluçar audivelmente logo antes de se pôr a chorar, Sesshoumaru não entendeu absolutamente nada do que estava acontecendo, mas enquanto a erguia do chão, para acomodá-la em seus braços, teve a nítida impressão de ouvi-la dizer “Eu sinto muito”.


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Notas finais do capítulo

E é isso... até mês que vem! ♥



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