O Casebre escrita por Pedro Teressan


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem, esse é um conto escrito apenas para entreter nesse Halloween, então espero que se divirtam!!
Deixem um comentário dizendo o que acharam!



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Paulo parou o carro em frente a uma casa velha: a tinta verde-escura que pintava as madeiras da casa estava quase toda descascada, o telhado um pouco quebrado, as janelas empoeiradas, porém havia um carro em frente. O homem sentia a garganta seca enquanto o sol do meio-dia incidia fortemente sobre o automóvel. Tinha a esperança de conseguir, pelo menos, um copo d'água.

Saiu do veículo e foi em direção à casa, escolhera aquela para parar, pois havia sido a única que encontrara e que não parecia ameaçadora, apesar de ser velha. Subiu os três degraus e chegou à plataforma. Bateu na porta três vezes, não tinha grandes esperanças de alguém aparecer. A única evidência de sinal de vida ali era o carro bem cuidado estacionado na frente da casa.

Um som de madeira batendo no chão chamou a atenção de Paulo. O barulho foi aproximando-se e, de repente, parou. Parecia estar bem próximo à porta. A silhueta de um homem surgiu no vidro fosco.

Um som de chaves, um click e a maçaneta girou, a porta abriu. Parado em frente a Paulo, havia um homem velho. Devia ter por volta de oitenta anos, as rugas em seu rosto e as marcas do tempo, praticamente entregavam sua idade. A maneira de locomover-se também: andava apoiado sobre uma bengala bem maltratada pelos anos. O cabelo raro, quase inexistente, era grisalho e fino; os olhos castanhos pareciam vazios; o lábio fino, rachado; a pele branca coberta de marcas da idade.

O senhor perguntou em uma voz arrastada de impaciência:

— Pois não?

— Boa-tarde, senhor — disse Paulo — Venho de muito longe, de São Paulo, e a água que eu tinha no carro acabou, será que o senhor não podia me dar um copo d'água?

Paulo estava viajando para Goiás de carro, por morar sozinho e trabalhar em um emprego que não pagava muito bem, não tinha dinheiro para pegar um avião. A viagem ainda teria mais três horas.

— Um copo d'água? — repetiu o velho — Claro que posso! Entre.

— Eu posso esperar aqui fora. — respondeu o viajante tentando soar o mais educado possível.

— Não, garoto, eu faço questão! Entre, não fique aí fora tomando sol e sofrendo com o calor.

Há tempos que o rapaz que viajava não era chamado de garoto. Lembrou-se de quando seu tio o chamava assim, sempre se referia a Paulo como garoto.

Parecia até que não sabia o nome do próprio sobrinho. Mesmo sendo um homem de vinte e oito anos, ficou feliz por ser chamado de garoto depois de tanto tempo.

Os dois homens entraram na casa, Paulo entrou por último e fechou a porta: apenas virou a maçaneta e a fechou. O velho indicou com a mão um sofá velho verde-escuro e o viajante entendeu o recado, sentou-se no móvel. O velho foi, com a bengala, até a cozinha. Paulo começou a explorar a sala, com os olhos.

Estava tudo antigo, como se estivesse abandonado: o teto e as paredes descascando e cheios de umidade; o sofá no qual o homem se encontrava, rasgado; uma estante encostada na parede, próxima ao sofá, também parecia ser velha; sobre a estante, velas apagadas e largadas de qualquer jeito, uma fotografia do velho mais jovem com uma mulher e alguns livros. Paulo continuou revistando a sala visualmente, mas uma coisa interrompeu sua "investigação": encostada na porta pela qual Paulo entrara, estava a bengala do velho. A bengala idêntica.

O homem apurou a audição e percebeu algo, a falta de ruídos no local. Não havia nenhum som.

Com cautela, levantou-se do sofá e caminhou até a cozinha. Estava vazia. Um copo encontrava-se sobre a pia, cheio de água com uma jarra de barro ao lado; a luz do sol entrava pela janela suja e empoeirada; tudo lá estava velho também. Mas o que mais preocupava Paulo, não era a idade das coisas e sim onde estaria o velho.

— Senhor? — o homem não resistiu e chamou, não teve respostas — Senhor!

Ninguém respondeu.

"Melhor eu sair daqui" pensou ele. Voltou à sala-de-estar, sem tomar a água que pedira. Estava pronto para sair, mas lembrou-se da foto em que aquele senhor que o atendera estava com uma mulher, voltou a olhar para a fotografia.

Era uma imagem em preto-e-branco mostrando que era algo antigo; o velho devia ter, naquela época, cerca de trinta anos, a mulher também; ambos sorriam de verdade, não um sorriso forçado para foto, estariam se casando?

De fato, a mulher estava bem arrumada e, aparentemente, maquiada.

Paulo olhou a parte de trás na foto, lá estava escrito: Em memória de Adalberto Nogueira da Silva (1929-1980) e Letícia Aparecida Nogueira (1934-1980).

Sentiu um calafrio, um arrepio que subiu a espinha. Olhou para trás assustado, sentia algo na retaguarda, mas não havia nada lá. Correu até a porta da casa e, sem pensar muito, girou a maçaneta, sem resultado. Girou mais vezes, freneticamente, mas nada.

— Ei! — gritou Paulo — Alguém me ajuda! Ajuda! Por favor!

Sabia que ninguém ia responder, mas não custava tentar.

"Calma, Paulo" pensou consigo mesmo "Acalme-se, fantasmas não existem."

Não queria acreditar em fantasmas. Sua infância inteira, passou com medo de espíritos, medo do escuro, medo do demônio, medo de qualquer criatura sobrenatural envolvida com a escuridão. Decidiu então, com quinze anos, não acreditar mais em fantasmas e essas coisas, até esquecera das histórias. Mas ali, trancado naquela casa, o medo era inevitável.

Não sabia o que fazer, resolveu explorar a casa. Entrou na cozinha e revistou os armários e a geladeira, abriu cada porta encontrada; vazias. Nem formigas habitavam aquele lugar, parecia que o lugar estava abandonado há mais de cinquenta anos.

O copo de água caiu no chão, quebrando-se. Paulo virou rapidamente para trás, assustado. O coração batia rápido, suas mãos tremiam. Andou até os cacos de vidro, nada de diferente, eram apenas vidro, mas sua vontade de fugir de lá aumentara.

De repente, uma porta do armário bateu. O homem andou um passo para trás, ainda mais assustado. Outra porta do armário bateu, depois mais uma, outra, outra, todas bateram. Paulo de repente sentiu algo nas suas costa, olhou para a esquerda rápido e bateu o nariz na parede. Havia chegado em um canto da cozinha e nem percebera.

O homem começou a rezar em sussurros. Era uma reza estranha, de muitos anos atrás, que sua mãe o ensinara quando ainda tinha medo do sobrenatural. Nunca mais havia rezado aquelas palavras, havia até se esquecido delas, mas aquele momento o remeteu ao seu passado. Terminou a reza e começou outra, agora, rezando com mais intensidade.

As portas dos armários pararam de bater, ficaram abertas. Paulo deu um passo em direção à saída da cozinha, silêncio; deu mais um passo, silêncio; inspirou o ar profundamente enchendo seus pulmões e saiu correndo, as portas voltaram a bater.

Entrou na sala-de-estar, não pensou muito e abriu uma porta (não aquela da entrada, uma outra). Estava em um quarto: uma cama de casal no centro do cômodo, um criado-mudo de ambos os lados da cama, um tapete velho e carcomido no chão, um lustre pendurado e bem antigo, e uma janela empoeirada. A porta do quarto fechou às costas do viajante.

Paulo não pensou duas vezes, correu até um dos criados-mudos e atirou-o contra a janela. O vidro estilhaçou-se e o móvel caiu fora da casa. O homem correu até a janela e estava pulando-a quando a grade desceu. Sentiu seu calcanhar estourando, a grade subiu e Paulo caiu para fora da casa, o corpo encheu-se de cacos de vidro, sangue começou a escorrer de diversas feridas pequenas.

O viajante levantou-se com dificuldades, colocou-se de pé meio trêmulo, o pé esquerdo estava doendo muito; os braços, tronco, pernas e rosto estavam cortados e sangrando por causa dos cacos de vidro; o sol continuava forte. Paulo tirou de seu bolso, o seu celular e olhou a tela: tinha sinal. Desbloqueou a tela e começou a fazer uma ligação, mas parou no meio. Não sabia pra quem ligar. Decidiu ir até seu carro.

Estava bem próximo do automóvel quando ele explodiu. Um clarão de luz lançou-se aos olhos do viajante, um calor tomou seu corpo e suas roupas, foi lançado para trás e caiu de costas no chão, as roupas chamuscadas. Um barulho estrondoso tomou conta do lugar abandonado, seus ouvidos começaram a apitar. Na estrada, os carros buzinaram e aceleraram.

O clarão e o estrondo prejudicaram a visão de Paulo, o homem foi tateando o chão até encontrar seu celular. Pegou o telemóvel e, com a visão já melhorando, começou a ligar para uma ambulância, mas apagou antes. Quando acordou, estava em uma cama de hospital. A sala estava vazia, tudo estava silencioso.

Vestia um macacão branco de hospital, tudo era exageradamente branco, era um hospital comum.

Levantou da cama com um pouco de dificuldade, caminhou, lentamente, até a porta e a abriu, mais silêncio. Levou as mãos aos bolsos, vazios. Andou pelos corredores do hospital chamando pelos funcionários:

— Olá! Alguém aí? Olá! — ninguém respondeu.

O coração voltou a bater, tinha certeza de que o espírito daquele velho o seguira até ali. Olhou, assustado, para todos os lados, não viu ninguém. Entrou em pânico, tinha que sair de lá.

Tentou, desesperadamente, abrir todas as portas do hospital, em vão. Seguiu as placas até a saída, se conseguisse sair, sua preocupação diminuiria. Passou por corredores, desceu escadas (céus, como era difícil descer escadas sem o movimento de uma perna!), gritou por ajuda. Sentia algo em suas costas a todo momento, algo o perseguindo.

Finalmente, chegou à saída. Empurrou a porta, nada. Bateu na porta com força, nada. Fez de tudo, até arremessou coisas contra a porta, contra as janelas do local, nenhum resultado. Estava realmente preso!

O silêncio era desesperador, consumia até mesmo a última gota de esperança que Paulo tinha. A falta de som o incomodava, o fazia querer gritar até a garganta estourar, mas sabia que nada disso adiantaria. Pensou até mesmo em tirar sua própria vida para dar um fim nesse cenário perturbador e doentio.

Toda aquela claridade, todo aquele branco estava cansando sua visão, queria dormir, mas o espírito não deixaria. De repente, sentiu algo passando atrás dele, um vulto, e um som tomou conta de todo o hospital: um choro vindo de uma mulher.

O som escandaloso ecoou por toda a estrutura ficando insuportável, mas parecia chamar Paulo ao seu encontro. O homem de calcanhar quebrado seguiu o som. Quanto mais andava, mais alto o choro ficava, tornava-se insuportável. Quando entrou no corredor do qual vinha o som, a coisa ficou seriamente irritante. As luzes piscavam de acordo com a intensidade do lamento.

Paulo estava totalmente amedrontado, queria e não queria abrir a porta do fim do corredor, pois de lá vinha o choro. Caminhou até a porta e colocou a mão na maçaneta, tinha que parar com aquilo logo! Abriu a porta e o volume do choro diminuiu. De repente, não estava mais no corredor de um hospital, estava em um lugar com gramas, pessoas vestidas de preto e chorando, um céu cinza e nublado. Mas o choro continuava.

Olhou para o emissor de tanto barulho, era sua própria mãe. Ao lado de sua mãe, seu pai, abraçando-a em forma de consolo. Paulo descartou a opção de conversar com a mãe, foi ver o motivo de tantas lamentações. Deu-se conta de que estava, na verdade, em um cemitério.

Entrou na multidão, desviou de pessoas e viu rostos conhecidos: parentes, familiares, até a sua namorada chorava em excesso. Desviou das pessoas que não pareciam interessadas em saírem de seu caminho, e chegou a um caixão.

Quando viu o cadáver quase morreu: ficou branco, pálido; sentiu a cabeça arder, latejar; as pernas ficaram bambas; e seu coração teria parado de bater se estivesse batendo.

Sim, naquele caixão, com os cabelos chamuscados, o rosto queimado, porém de roupas novas e limpas, estava Paulo.


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Notas finais do capítulo

Comentem aí, por favor!!!
Obrigado por lerem espero que tenham gostado!



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