O vento sopra forte. Uma chuva de verão está a caminho.

Tudo anda. Tudo roda. Mas a minha cabeça permanece no lugar.

Meus olhos permanecem fixos em você.

Fixos na minha Sacerdotisa.

O vento acaricia seus cabelos presos em um penteado simples, mas que ao mesmo tempo ressalta suas feições tão serenas para as crianças risonhas do vilarejo que correm ao seu redor.

O mundo ao seu redor brilha com a luz enquanto permaneço neste quarto escuro.

Somos como luz e trevas.

Uma grande revoada magnética que se atrai, mas eu estou tentando apagar você perfeitamente.

Você não me pertence. Nunca pertencerá.

Nascemos em mundos opostos, inalcançáveis um ao outro por mais que essa força nos atraia.

Você é uma Sacerdotisa. Eu, um Samurai.

Você viaja por essas vilas destroçadas pelas nossas guerras levando a luz, um sorriso, um acalento aos corações machucados. Eu levo a dor. A escuridão.

Queria poder tocá-la. Queria poder te dizer o que tanto preenche o meu peito. Queria te contar sobre essa dor que parece cada dia mais intensa.

Queria poder te dizer tudo ao mesmo tempo que preciso esquecê-la. Ao mesmo tempo que preciso parar de falar com você.

Eu pensei conseguir, mas continuo a falar de você.

As paredes testemunham minha insônia que balbucia o seu nome em segredo. Esse céu vê a minha impotência e minha cama parece mais vazia cada dia que se passa.

Minha mente é uma guerra sem fim. Meus demônios moram em meu corpo e minhas mãos estão manchadas de um sangue que nunca poderá partir.

Dizem que Sacerdotisas afastam os demônios. Nunca acreditei. Fui um pagão. Um grande tolo que viu seus demônios, seus terrores noturnos, os gritos de piedade dos inocentes, partirem quando suas mãos tocaram o meu corpo tão cheio de cicatrizes que ardia em febre.

Eles a trouxeram até mim. Acreditaram trazer apenas uma Sacerdotisa itinerante ao meu socorro, mas o que não sabem é que trouxeram a minha luz e meu maior desespero em meio ao sorriso cálido que você me demonstrava; uma tentativa de me transmitir forças enquanto suas mãos acariciavam meu rosto como uma amada mãe faria.

É assim que uma mãe acalenta o seu filho?

Eu não sei, Sakura. Minha mãe era apenas uma nobre tola que se apaixonou pelo rei. Ela não era rainha e eu não sou um príncipe. Sou apenas uma criança entregue aos Samurais depois que minha mãe sofreu nas mãos da verdadeira rainha.

Eu não sei o que é o amor. Apenas aprendi o que era dever, mas em suas mãos, vi algo além dos gritos e dos olhos aterrorizados que me olhavam antes que eu ceifasse uma vida.

Eu vi a vida, a beleza e a tranquilidade no seu olhar. E naquele momento, eu desejei ser como você. Desejei não ter mais esse corpo tão manchado pelas marcas que só eu posso ver e só você pode afastar.

Eu sei. Eu não acho que posso esquecer. Porque as memórias são perfeitas demais, mas eu vou tentar de novo, afinal é muito mais difícil esquecer um amor do que se apaixonar.

Você me faz viver e morrer de novo.

Eu não estou vivo sem você.

Você sabe que eu morreria sem você.

Eu sei. É tolo, mas eu me descobri um tolo. Um grande e imensurável tolo que se apaixonou por uma Sacerdotisa que se hospedou em sua casa, que cuidou de você, que lhe ofertou os sorrisos mais sinceros e as conversas mais amáveis enquanto de ti só saía escassos sorrisos de canto. Mas isso parecia o suficiente para ela.

Ela nunca reclamaria. Sempre estava satisfeita com o que tinha e o que lhe era dado.

A felicidade dos outros, era isso o que você dizia que era o seu maior pagamento por ajudar aos necessitados. Eu nunca entendi. Sempre fui um homem que almejou o reconhecimento, que cresceu e hoje é um Samurai de posses e respeito, mas olhando para sua face serena observando as crianças, eu compreendo o que é desejar a felicidade dos outros, pois eu desejo a sua.

A chuva forte vem vindo assim como você vem vindo para a minha casa.

As crianças se despedem com bravos acenos antes que você desapareça por completo por trás das estruturas da casa do tão temido Samurai.

As gotas caem com força e como as gotas de chuva caindo na janela, minha cabeça está tomada por você.

Tão dominada por você que a certeza dos meus próximos pensamentos é incontestável, pois eu preciso de você.

Por que eu sinto sua falta.

Sakura, você está me ouvindo? Você pode ouvir a minha voz? A minha confissão a você? Você pode ouvir o meu coração?

Pode ouvir o meu coração que grita que te ama? Que é tolo, que se despedaça e não suporta a ideia de partir para longe sabendo que você também partirá para o outro lado e talvez eu nunca mais possa te ver. Você é capaz de ouvir o meu coração?

Ele grita. Ele clama. Ele implora para que você fique.

Ele está em prantos.

Ele quer seus toques. Quer que você afaste os demônios que me envolvem. Quer que você me acalente. Quer que você fique. Quer que você escute a minha confissão a você. Pois eu preciso de você.

Pois cada minuto que eu ficar longe de você, sentirei sua falta.

Cada segundo que se passar, eu me recordarei dos seus sorrisos, das suas palavras e dos seus toques.

Eu me lembrarei como eu guardei minhas palavras para te esquecer e como pensei conseguir, mas continuo a falar de você.

Pois eu te amo, Sakura.

Amo uma Sacerdotisa. Uma mulher inalcançável às minhas mãos tão sangrentas.

Mas eu quero alcançar. Quero ter para mim, pois os meus demônios desaparecem perto de você e tudo o que eu penso é como é bom estar com você.

Por isso, eu só te peço...

— Sasuke-sama? – Sua voz ressoa atrás de mim e inspiro mais uma vez antes de focar o meu olhar nos verdes tão belos. E aquele aperto incômodo volta a se alastrar em meu peito. – Seus servos pediram para avisar que suas bagagens já estão feitas. Creio que você partirá antes do amanhecer – ela sorri com a docilidade que ninguém nunca antes me ofertou.

Por isso eu só te peço...

Meus passos quebram a nossa distância. A dor é intensa. Não posso suportar. Eu sei que o jeito seria aceitar, mas eu estou parado aqui. Eu ainda estou parado aqui olhando para os seus olhos tão arregalados.

Sei que tudo seu que eu puder tocar, vai se espalhar.

Sei que sou um maldito monstro. Sou um maldito Samurai ordenado a matar. Um Samurai que não é dono nem do seu próprio destino, mas...

Se eu fosse um príncipe seria diferente Sakura?

Se eu não fosse um bastardo indesejado seria diferente?

Se fossemos de outra época, eu teria você, Sakura?

Provavelmente o destino brincaria mais uma vez com nossos corações e mais uma vez eu sofreria por você.

Por isso, seguro sua face com as minhas mãos. Com as mãos de um assassino. Toco o que eu sempre desejei tocar com a crença de que sua luz é superior às minhas trevas e eu não a intoxicarei com os meus demônios. Toco com a crença de que para os seus olhos eu não sou um monstro. Toco apenas para te pedir:

— Nunca me esqueça. Nunca. Jamais.

Porque minha cabeça está tomada por você.

Porque eu preciso de você.

Porque eu amo você.

— Eu esperarei.

E com a sua promessa eu posso partir com a certeza de que eu retornarei para os seus braços, porque eu sinto a sua falta, Sakura.

Porque eu sentirei falta dos seus lábios que agora eu provo.

Sentirei falta dos seus braços ao redor dos meus ombros largos e do seu corpo caindo sobre a minha cama.

Porque eu preciso de você, Sakura.

FIM!