Chains escrita por Passarinho


Capítulo 2
Outra dimensão


Notas iniciais do capítulo

Opa, Oi!
Cara, esse meu shipp um dia me mata. Tô insegura com esse cap? Tô sim, mas gostei muito de escrever ele. Boa leitura, no final do cap tem pão com mortadela pra você ♥



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Porém, também não parecia ser Elyos ou Hades.  

O céu era visível. Tinha estrelas em plena luz do dia, mesclando o azul de uma manhã, o laranja da tarde e o lilás do começo da noite. No horizonte, árvores altas e montanhas eram banhados por aquele céu. Pedaços de terra, semelhantes a pequenas ilhas, flutuavam em meio àquelas montanhas, com estruturas peculiares de castelos, casas, ou seja lá o que era aquilo, em suas superfícies. O local em si era conturbado, mas ao mesmo tempo, calmo.  
Uma floresta cercava metade daquela paisagem, e a outra metade era um campo aberto com nada mais que grama verde, um pouco amarelada e lilás por conta da iluminação.  

Veigas, curioso sobre todo aquele espaço novo, colocou sua cabeça para fora das portas, para conseguir ver com mais plenitude. Seus olhos arderam levemente, pois toda a claridade do exterior era muito mais forte que a fraca luz avermelhada de dentro da sala.

Dio, que também tinha em seus olhos aquela vista, desviou seu rosto do cenário, virando-se para trás. Algo tinha chamado mais sua atenção, por algum motivo.  

Aquele trono. O trono da sala que eles estavam. Observando mais atentamente, algo lhe era familiar; era um simples assento de pedra e madeira, acolchoado em veludo vermelho que, de alguma forma, fazia com que tudo o que Dio conseguisse sentir fosse algum tipo de nostalgia. Passado esse sentimento, subiu-lhe na garganta uma sensação de repulsão e ódio, que o fez caminhar até aquele monte de veludo e tocar as costas do trono levemente com sua garra, para então fechar o punho bruscamente, rasgando, assim, o tecido e parte da madeira que ficava ao fundo, deixando uma marca grotesca de arranhão.  

Fazendo isso, várias visões passaram pela sua cabeça, visões das quais ele tinha e não tinha conhecimento, deixando-o em um pequeno transe, mas logo retornando a seus pensamentos ao sentir uma leve brisa passar pelo seu rosto. Ao voltar a si mesmo, ele já tinha se esquecido do que viu em sua mente e o motivo de ter feito aquilo.

Sentiu seu pulso esquerdo sendo levemente puxado, retirando sua atenção dali. Veigas, que já estava para fora da sala, esticava a corrente pela distância, inconscientemente.   

Dio afastou-se do trono para perto das portas, e assim que se aproximou o bastante, colocou sua cara para fora, sentindo mais uma vez uma brisa calma. Olhou de um lado para o outro, encarando aquele céu praticamente multicolorido, com as ilhas flutuantes que o rondava e a paisagem dividida entre a floresta e o campo aberto. Depois de ter analisado tudo que estava em seu campo de visão, colocou-se para fora daquele lugar escuro que era sala em que se encontrava. Diferentemente do ar empoeirado lá de dentro, o ar de fora era tão puro que chegava a revigorar as forças que ele tinha perdido de tanto esperar parado Veigas acordar.

Quase que até ignorando o outro, Dio começou a andar para a esquerda, o lado da floresta. Depois de tomar um pouco de distância, a corrente começou a puxar Veigas junto, o que o fez dar um pequeno tropeço, mas sem cair.
            

      — O que você pensa que está fazendo? — Veigas tentava puxar de volta a corrente para a direção contrária.
    
              — Eu vou pela floresta. — Dio continuava a caminhar sem nenhuma dificuldade, arrastando Veigas contra sua vontade.
    
                — Não, não vai, eu vou pelo campo.

             — Tente não bancar o ridículo por um momento. Vamos logo pela floresta, ali é mais fácil de se sobreviver do que num campo onde só tem grama.

                — Eu não sei se você tem a capacidade de usar essa sua cabeça pra pensar, mas pelo campo é mais fácil de se chegar nas ilhas, e ilhas tem construções, construções tem pessoas e pessoas tem informação.

Os dois começaram a discutir sobre a direção que tomariam, com Dio ainda arrastando o outro com a corrente, e Veigas tentando puxar para o lado contrário, sem sucesso, por causa de sua inferioridade de força braçal diante de Dio. Em meio àquela disputa, o Tesserato, que não tinha falado nada, começou:

            — Mestre, senti alguma energia vinda do nosso lado direito. Parece algum ser vivo, e não está tão longe. Recomendo que todos nós tomemos o caminho do campo, para recolhermos informações sobre esta dimensão.

Ao ouvir isso, depois de tanta discussão, Dio sentiu uma pontada de raiva em sua espinha que quase o fez estremecer ao ver o rosto de Veigas com um sorrisinho triunfante e um olhar que dizia “eu estava certo”, coisa que o irritou ao extremo. Mas, como queria qualquer pista sobre como se livrar das correntes e sair daquele lugar estranho o mais rápido possível, tudo o que fez foi levantar uma sobrancelha e cerrar o punho com força. Parando de andar em caminho à floresta — e puxar Veigas —, virou-se, e avançou para o lado direito, em direção ao campo, com os braços cruzados, sem dizer uma palavra. Porém, logo encontrou uma pequena resistência na sua algema, que o deixou confuso o bastante para parar e ver o que acontecia. Do outro lado das correntes, havia um ser imóvel, massageando um pouco o pulso que a algema forçara quando ele foi puxado.  

    
        —  O que foi agora? — Dio continuava com os braços cruzados, ainda irritado.

    Veigas tinha mudado sua expressão para uma pensativa, que logo foi substituída por uma de esforço e outra de contentamento. Em seguida, começou a andar, calado, até alcançar Dio, que recomeçou sua caminhada também.

Os dois não emitiam sequer uma palavra durante o percurso, e mantinham a maior distância que podiam um do outro, de acordo com os limites da corrente. Parecia a opção mais saudável que eles poderiam tomar para acalmar a necessidade de quererem se matar a todo segundo.

Como é que, logo eles, inimigos de longa data e até de família, acabariam presos assim? Por que tinha de acontecer justamente quando a tão esperada vingança pelos acontecimentos de Calnat estava prestes a se realizar? Ambas as perguntas eram frustrantemente feitas pelos dois, mas somente em suas cabeças.
Entretanto, apesar da guerra que travaram no passado, das batalhas em que participaram, eles não se conheciam. Não gostavam um do outro, mas não se conheciam bem o bastante  para se odiar, apenas para "vivenciar" o sentimento do ódio quando se vêem. Eram inimigos por circunstância, e não por realmente se repudiarem a ponto de tal. Só "aprenderam" a se odiar. E assim permaneceram.

Eles estavam andando por aproximadamente quatro horas, em um ritmo constantemente rápido. Dio ainda não mostrava nenhum sinal de cansaço, mas Veigas estava exausto, e suas pernas começavam a fraquejar. Ele esforçava-se para manter o mesmo ritmo de Dio e não ser deixado para trás, mas os sinais de esgotamento dele eram muito perceptíveis. O suor escorria pelo seu pescoço, e ele estava com a respiração pesada. Até para o Tesserato, que tinha ficado junto de dele por muitos anos, não o via nesse estado com frequência. Mas era previsível para ele que Veigas não tenha muita resistência física, pois este levitava sempre que quisesse se locomover.

No entanto, desta vez, ele não estava levitando. E isso era tão raro quanto Veigas exausto, pois o cubo nunca tivera visto antes ele sequer andar com seus próprios pés por mais de um metro de distância.

        — Está perto. A energia que senti está muito próxima, só nos falta cinco minutos de caminhada. — O cubo alertou os asmodianos.

Ao ouvir isso, Dio diminuiu o passo por alguns instantes para olhar para o lado, e se deparou com aquele mesmo Veigas esgotado. Vê-lo o fez parar completamente de andar só para ficar olhando. Ele tinha conseguido ouvir a respiração pesada de Veigas pelo caminho, mas não tinha, em nenhum momento, parado para prestar atenção. Chegava a ser engraçado para ele o fato de que um ser tão tremendorosamente forte como aquele, que quase tinha tirado-lhe a vida anteriormente, estivesse tão acabado por uma simples caminhada de algumas horas.
Tendo parado de andar, Veigas por consequência também parou. Suas pernas estavam fracas o bastante para não poder mais ficar em pé com facilidade, porém, ele também não queria ser o primeiro a sentar-se. Notou que Dio estava o observando  com um pequeno sorriso no rosto. Um sorriso quase imperceptível, mas um sorriso. Retrucou-o com um olhar seco.

Recebendo isso, Dio fechou brevemente seus olhos e sentou-se na grama com as pernas cruzadas, apoiando a cabeça em sua mão e esperando a reação do outro, com o mesmo tênue sorriso sarcástico. Foi praticamente um deboche para Veigas, este que na mesma hora desviou seu olhar, irritado. Mas de qualquer modo, sentou-se também. Suas pernas estavam quase mortas de cansaço, e não era só de orgulho que ele conseguiria se manter de pé por muito tempo. Passando a mão em seu rosto para limpar o suor, fechou os olhos para concentrar-se em melhorar sua fadiga. Dio observava-o com uma atenção que não era de seu habitual, e logo que notou isso, virou seu rosto para o céu, tentando disfarçar-se. O céu tinha ficado um pouco mais violeta que antes.

Eles ainda mantinham a distância do limite das correntes, mesmo sentados. Ainda não tinham articulado uma sílaba um ao outro por praticamente as quatro horas em que passaram andando, e a única comunicação que tiveram foi essa troca de gestos de agora. Isso era o suficiente para eles, pois se tentassem falar um com o outro, entrariam em discordância mais uma vez e não levaria à nada.

Descansaram por alguns minutos, e Veigas, já um pouco mais recomposto, pôs-se de pé novamente; Dio também o fez. De acordo com o cubo, só lhe faltavam mais cinco minutos de caminhada, mas eles já se preparavam para uma grande decepção, pois se a energia que o Tesserato tivesse detectado fosse um animal insignificante ou algo desse tipo, todo aquele tempo teria sido em vão. E é claro que, como tinha ido nesta direção por contragosto, Dio reclamaria, e muito.

Andaram por alguns minutos, já em um ritmo um pouco mais reduzido. Era claramente notável que, por onde estavam indo, mesmo que fosse mais rápido de chegar, eles não estavam nem perto das ilhas flutuantes. Elas ainda pairavam no horizonte junto às montanhas, de bem longe dali. Só que, junto do horizonte, estava a silhueta de algo, e não era distante. Aparentava ser uma pessoa, agachada na grama. Ao passo em que se aproximavam, a figura tomava mais forma: era um homem de cabelo cinza escuro, com calça e blusa da mesma cor, uma faixa na cintura e um cajado na mão. Ele recolhia alguma coisa na grama, de costas à Dio e Veigas.

        — E... — Veigas pretendia gritar, mas sua voz falhou na primeira tentativa, por ter ficado tanto tempo quieto. — Ei, você aí!

Com esse grito, o homem vestido de cinza, tomando um pequeno susto, levantou-se da grama, ainda de costas, e respondeu:

        — Vocês são viajantes? Pois então, sejam bem vin... — ele tinha se virado, e ao olhar para os dois, estampou uma feição de seriedade em seu rosto — Vocês, de novo...? Por que vocês insistem tanto em nos atacar?
    
        — Você está confundindo com outra pessoa. Eu só quero saber onde eu estou e o que eu faço pra me livrar disso aqui. —  Dio apontava à sua algema.
        
        — Vocês, asmodianos, nunca mais destruirão nosso lar como fizeram da última vez! — O homem ignorou completamente Dio, apontando o cajado que tinha em mãos para o céu.

Aquele cajado brilhou um pouco, e repentinamente as nuvens começaram a fechar o céu, deixando o clima nublado e um tanto mais escuro. Os dois acorrentados, que estavam prestando mais atenção no céu escuro, tentaram virar-se novamente para o homem de cinza, mas não conseguiram mais achá-lo.
Em seu lugar, residia uma figura serpentina estranha; tão grande que parecia ter oito metros de altura, não contando com seu comprimento.  Era completamente cinza, assim como suas escamas e espinhos, que cobriam todo seu corpo em uma espécie de armadura. Um dragão serpente, provavelmente. Mas o maior que eles já tinham visto.

        — Ooh, agora as coisas estão ficando interessantes. — Veigas já estava com um olhar assassino.

        — Mestre, peço para que não o mate. Precisamos das informações. — O Tesserato alertava.

        — Eu sei, eu sei. Mas depois que pegarmos as informações, eu posso matá-lo.  

Durante isso, Dio tentava invocar a Deathstar. Tentou uma vez, duas vezes, e não conseguiu. Enquanto ele ponderava sobre o porquê de não poder invocar sua arma, o dragão atacou Veigas com sua cauda. Ele desviou para a esquerda, mas ao mesmo tempo em que desviou, puxou Dio pelas correntes, acidentalmente, para o local do ataque. Dio pulou para trás o mais rápido que pôde, fazendo Veigas ser derrubado.
Notando isso, a besta, com sua boca completamente aberta, atirou sua mandíbula em direção ao Veigas caído, numa investida para retalhá-lo com seus dentes afiados em uma mordida. Como não conseguiria levantar-se a tempo, Veigas desviou rolando no chão, mais uma vez puxando Dio, mas agora não para o local de ataque, e sim para muito perto dele, fazendo-o tropeçar no impulso e quase pisar em Veigas. Dio tomou distância dele de novo quase que imediatamente.

Veigas tentou levantar-se enquanto o dragão pegava arranque para um novo ataque, mas teve um pouco de dificuldade, pois além de suas pernas estarem um pouco fracas pela caminhada que fizeram, a corrente tinha se enrolado em volta dele quando ele rolou no chão.

Dio, que não tinha conseguido invocar nenhuma arma, pensou em conjurar alguma magia, afinal aquilo era uma luta, não uma dança, portanto não era obrigado a ficar só desviando. Ele atestou rapidamente se sua magia estava realmente funcionando ao invocar uma pequena chama de fogo maligno, e Veigas fez o mesmo, invocando uma diminuta quantidade de magia dimensional. Ao concluírem os testes, que mal duraram milissegundos, eles tentaram executar suas habilidades.

                                                          "Esquife de Ossos"
                                                         "Frenesi das Trevas"

Os golpes foram realizados. Porém, a caixa do esquife de ossos parecia frágil e desapareceu assim que entrou em contato com o ar, enquanto que o frenesi das trevas não tinha nem um centésimo de seu poder de pressão. Obviamente, não surtiu efeito perante o grosso revestimento escamoso da fera, só a fez enfurecer-se mais, lançando novamente sua cauda em um ataque, e em Dio. Ele esquivou-se para o lado oposto de Veigas, mas não o bastante para arrastá-lo junto, somente para deixar a corrente em seu limite. Aproveitando que sua cauda estava no meio dos dois asmodianos e da corrente, agarrou a corrente com ela e a suspendeu, como se fosse uma boleadeira viva, e jogou com força no chão novamente.

O impacto foi tão excessivo que levantou uma forte nuvem de poeira, destruindo a grama verde que tinha no local e formando duas pequenas crateras, onde localizava-se o corpo de Dio e de Veigas. Ambos estavam feridos e sangrando bastante.

Aquele gigante ser acinzentado, mesmo tendo tantas escamas que seria quase impossível fazer expressões faciais, parecia confiante ao olhar para a cena daqueles dois caídos no chão.
Dio ergueu-se novamente com a força que lhe sobrava. Veigas, que se reintegrava da tontura, usou o Tesserato como apoio, mas mesmo assim, não conseguiu se levantar, permanecendo agachado.  Como já estava com o cubo por perto, Veigas o envolveu em aura de magia dimensional, lançando-o em direção à criatura, e no momento em que o Tesserato tocou as escamas de sua cara, começou a fazer explosões, que não pareciam causar nenhum dano no dragão, mas eram brilhantes o bastante para cegá-lo. Somente para cegá-lo, não para o impedir.

A besta, furiosa, atacava com seus dentes e sua cauda onde ela tinha os visto por último e onde ela achava que eles estavam. Dio conseguiria desviar dos ataques com certo esforço, mas Veigas, que mal conseguia se manter de pé, não. Já em um dos primeiros ataques, a lateral da cauda da besta tinha o acertado em cheio no abdome, fazendo-o ser jogado em uma boa distância. Dio tinha sido puxado junto, e seu peso fez Veigas ser jogado um pouco mais longe. Ele já não estava mais consciente.

Não tinha nenhuma possibilidade de eles ganharem mais aquela luta. Não com aquela diferença de poder. Não com aquela limitação de movimento. Não com aquelas correntes. Esse era o pensamento de Dio, que, ao usar tudo de si para invocar suas asas, engoliu completamente o que sobrara de seu orgulho e abriu voo com a intenção de sair dali o mais rápido o possível, enquanto as explosões do Tesserato continuassem a bloquear a visão do dragão. Dio tentava subir até ultrapassar as nuvens do céu nublado, lugar em que, mesmo se as explosões se cessarem, eles continuariam fora de vista. Suas asas mostravam-se mais pesadas que o usual. Ele seguiu o caminho de volta à floresta, voando cada vez mais baixo quanto mais distância ele tomava.

Seu voo estava desajeitado como nunca estivera antes, parte por suas asas parecerem demasiadamente pesadas e movimentá-las ser uma tarefa estafante, parte por ele estar desequilibrado. Desequilibrado, porque era como se ele tivesse um peso preso em seu pulso esquerdo. Veigas estava pendurado pela algema, pelo seu pulso direito. Ele ainda estava desmaiado. O peso de Veigas não era muito, mas era o suficiente para oscilar o equilíbrio de voo do outro.

Passaram-se três horas. Dio, já mais cansado, sentiu uma tremulação estranha nas correntes. Abaixou sua cabeça para olhar, e deparou-se com o rosto de Veigas se contorcendo de dor. A batalha tinha deixado muitos ferimentos nele, mas não parecia ser só isso. Ao percorrer seus olhos por ele para descobrir a causa, viu que sua luva estava rasgada, revelando o seu pulso direito que estava completamente marcado com a algema, e seu braço, que aparentava estar quase se deslocando.  Parecia que qualquer movimento que Dio fizesse ia quebrá-lo. Começou a ter mais cuidado.

Parando para pensar, por que ele estava se preocupando com Veigas? Qual era o sentido de se preocupar se ele estava sentindo dor ou não? Bastava que ficasse vivo, não é?
Tentando encobrir sua pequena preocupação com algum motivo mais claro, não demorou muito para que lembrasse do Tesserato falando "se um morrer, os dois morrem", e pensar que "se esse nanico não estiver bem, vai lutar pior do que já luta, acabar morrendo e matando a mim no processo".

Contudo, para não correr mais o risco de deslocar o braço dele, Dio teria que fazer o que nunca fez por ninguém em nenhuma dimensão, nem mesmo por Rey, sua velha amiga de infância. Ele não queria ter de enterrar seu orgulho no chão desse jeito. Não queria, mas esse ato poderia custar a vida dele. Com um suspiro de conformação, foi diminuindo a altura do voo lentamente, até colocar seus pés no solo, fazendo suas asas desaparecerem.

        — Tch... Você ainda me paga. Será só dessa vez.

Com isso, Dio aproximou-se de Veigas, que estava no chão, ainda inconsciente, e agachou-se perto dele. Por um pequeno momento, ficou parado, sem saber o que fazer, hesitante em tocar naquele corpo, que parecia tão frágil como uma boneca de porcelana. Nunca tinha sequer encostado em Veigas sem a intenção de atacá-lo. Aproximou-se um pouco mais, pegando-o por baixo dos braços de modo desajeitado, erguendo-o e o apoiando sobre suas costas. Com Veigas acomodado em cima dele, Dio se levantou, ajeitando sua postura.

Suprimindo a súbita vergonha que sentia, começou a andar em direção à floresta. Veigas tinha escorregado um pouquinho.

        — Você escolhe o caminho, e depois não consegue voltar dele nem ao menos acordado? Que deplorável. — Dio sussurrava, dando um pequeno pulinho para ajeitá-lo em suas costas.

Por todo o trajeto, ele procurava não aplicar muita força em Veigas e tomava cuidado com a sua garra, já que não sabia medir ao certo o quanto de força era necessário fazer para que ele não caia, mas que não fosse forte o bastante a ponto de feri-lo ainda mais. Dio não estava mais pensando sobre estar preocupado ou não. Só fazia isso por reflexo.

Era uma sensação estranha para ele estar tão perto assim de alguém. Ele conseguia sentir o vai e vem da respiração de Veigas por detrás, sentir a orelha e às vezes o cabelo dele roçar no seu rosto. Sentir os brincos gelados que ele usava encostar em sua pele. Sentir o cheiro dele, misturado com o cheiro de sangue dos dois, o que não era ruim, por sinal. Sentir suas costas aquecidas; o que também não era ruim.

Notando que algo estava subindo sua cabeça muito rapidamente, Dio desviou seus olhos e tentou distrair-se, pensando em alguma outra coisa enquanto andava.

 

Duas horas depois, já havia escurecido. Nuvens ainda cobriam o céu. Entretanto, eles já haviam chegado no começo da floresta. Depois de adentrar um pouco mais, Dio foi em direção à árvore mais próxima. Colocou Veigas deitado, apoiado sobre o tronco, e foi para outra árvore, desta vez sentando-se para descansar.

Dio se pôs a pensar na situação, involuntariamente invocando suas asas de novo e mordiscando a direita.

Ele e Veigas estavam bastante machucados, não sabiam o que fazer, e nem onde estavam. Suas únicas certezas eram que ele estava fraco o bastante para não conseguir nem se defender, e que nada ali fazia sentido. Nem o porquê de ele estar acorrentado justo com Veigas, um inimigo jurado de sua família e de si mesmo. O que ele faria pra se livrar de tudo isso?

Enquanto refletia sobre essas perguntas, acabou cochilando. Cochilar não era a melhor escolha naquelas circunstâncias, mas no estado em que estava, inteiramente exausto e machucado, o que mais poderia fazer?
Pois continuou assim por algumas horas, que foi o tempo que lhe foi permitido para descansar até que ele fosse acordado.

Sons de metal se colidindo o despertou. Vinha de mais afundo da floresta; era um barulho muito baixo, mas não baixo o bastante para que as longas orelhas dele não conseguissem captar. Do mesmo lado em que esses sons vinham, uma luz opaca fez o céu escuro da noite se dividir, como um farol.

Dio já sabia onde queria ir. Veigas parecia ainda estar em repouso.


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Notas finais do capítulo

Desculpa, já comi todo o pão enquanto você lia. E a mortadela. Espero que não fique bravo/a.

É muito divertido escrever esses dois, porque ambos tem praticamente os mesmos traços orgulhosos e briguentos.
E desenhar eles, poxa, é meio difícil fazer um Dio que pareça envergonhado e P da vida ao mesmo tempo e um Veigas desacordado, então já peço desculpa pela cara de palerma dos dois ali~

Pra quem quiser a imagem completa (a do cap é só um recorte):
http://blackfoxu.deviantart.com/art/fanfic-cover-Idiot-646735934



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