A verdade sobre uma pequena mentira escrita por calivillas


Capítulo 5
Às vezes, é melhor não sabermos a verdade




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Ainda estava em dúvida quanto aquele convite, contudo, pensei que conversar com uma pessoa seria melhor do que com um gato, e, há muito tempo, não falava com nenhum ser humano por mais do que cinco minutos.

James abriu a porta, estava com um avental florido sobre as calça e camisa sociais, dando-lhe um ar engraçado, convidou-me para entrar e ficar à vontade, pois estava finalizando o nosso jantar.

— Eu trouxe para você – disse, entregando-lhe uma garrafa de vinho, que havia achado no armário da minha avó. James leu o rótulo e sorriu.

— Excelente escolha, Julia! Um dos meus vinhos prediletos!

— Para falar a verdade, era da minha avó, mas achei que poderíamos tomar hoje – Contei-lhe a verdade, mas não queria falar que estava comemorando o final do meu livro.

— Sente-se – ele me indicou o caminho da sala, que era parecida com a do meu apartamento lá embaixo, mas muito bem arrumada, haviam estantes com muitos livros e CD e vários cartazes de filmes enfeitavam as paredes, a maioria policiais. A mesa já estava arrumada para duas pessoas.

— Você gosta muito de filmes, não é? – comentei, alto para ele me ouvir da cozinha, admirando os cartazes.

— Sim, bastante – Ele voltou com duas taças de vinho nas mãos e me entregou uma delas – Espero que goste de peixe. Eu havia comprado um belo salmão para hoje.

— Para mim, está ótimo. Eu gosto de salmão. Você mora sozinho, James?

— Moro – ele respondeu, enquanto voltava para a cozinha, sem cerimônia.

Eu o segui e parei na porta, encostando-me no batente, tomava o vinho, que era muito bom, observei-o, enquanto cozinhava com destreza.

— Você gosta de cozinhar?

— Sim, eu gosto, principalmente, quando se mora sozinho por tanto tempo, como eu.

— Nunca foi casado? – Eu sempre fui curiosa e perguntadora.

— Não, oficialmente. Tive uma companheira por muitos anos, mas, infelizmente, ela morreu há algum tempo – James respondeu, pacientemente.

— Tem filhos? – indaguei, ele demorou para responder.

— Não, mas, eu gostaria de ter tido. Vamos! Ajude-me a levar essas travessas para mesa, Julia. – Ele me entregou uma travessa com uma bela salada mista e carregou a com o salmão, que tinha um cheiro delicioso.

Era bom comer uma boa refeição quente e caseira, outra vez.

— Você conhecia a vovó há muito tempo? – Continuei minhas perguntas.

— Desde que vim morar aqui, há alguns anos.

— Estranhos, vocês se tornarem amigos. Minha avó era uma mulher muito fechada, não me lembro de ela ser amiga de alguém.

— Julia, nós éramos apenas dois velhos solitários, então fazíamos companhia uma ao outro. E você?

— Eu?

— Sim. Você também não parece ter muitos amigos?

— Não sou uma pessoa muito sociável, mas tenho alguns poucos e bons amigos, daqueles que não se precisa falar toda hora.

— E você fez jornalismo?

— Como você sabe disso?

— Sua avó me contou. Ela tinha muito orgulho de você, da sua irmã e de sua mãe.

— Tinha?

— Tinha.

— Inclusive da minha mãe? Sabe, elas não se davam muito bem.

— Por quê?

— As duas tinham gênios difíceis. Além disso, minha mãe nunca perdoou minha avó por não contar quem era o pai dela.

— Talvez, sua avó achasse que há coisas que são melhores não saber.

— Mas, agora minha avó está morta, nunca saberemos a verdade.

— Às vezes, é melhor não sabermos a verdade. Mais vinho, Julia?

— Não, obrigada. Está tudo excelente. Você cozinha bem!

— Como eu disse, tive que aprender, afinal moro sozinho há muito tempo.

— Qual é a sua profissão, James.

— Atualmente, estou aposentado, mas antes eu trabalhava no mercado financeiro. Porém, de vez em quando, ainda faço alguns trabalhos com freelancer. E você, Julia, por que não trabalha como jornalista?

— Não sei, sempre quis ser escritora.

— Então você quer escrever livros? Já tem algo publicado?

— Ainda não, mas quem sabe em breve?

— Nunca vejo ninguém a visitando. Você tem namorado, Julia? – ele perguntou, levantando-se e retirando os pratos.

— Atualmente, não. Não sou uma pessoa muito popular, sempre fui mais reservada. Ao contrário de Aline, essa é a superpopular, também do jeito que ela é bonita – respondi o ajudando com a louça.

— Você também é muito bonita, Julia – James me falou, com um sorriso bondoso no rosto, devo ter ficado corada, pois meu rosto queimou.

— Obrigada – respondi, timidamente.

— Tenho sorvete de chocolate para a sobremesa, você aceita?

— Claro! É o meu sorvete predileto.

— Como está Aline em Nova York? – perguntou, já na cozinha, eu colocava os pratos sobre a pia, enquanto ele pegava as taças e servia o sorvete.

— Como você sabia disso, que ela está em Nova York?

— Sua avó me contou, um pouco antes de morrer, estava um tanto apreensiva por causa da sua irmã.

— Ela está adorando, tem trabalhado muito, nos falamos todos os dias. Você e minha avó conversavam muito, não é?

— Sim, bastante, sinto muita falta dela.

Dava para perceber que James falava a verdade, por causa sombra de tristeza que passou pelos seus olhos, quase perguntei se eles eram somente amigos, mas deixei para lá.

Foi um final de dia perfeito, depois daquele ótimo jantar, ele não aceitou quando me ofereci para ajudá-lo a lavar a louça, e da conversa muito boa, meu livro acabado, que em breve, mandaria para as editoras, logo amanhã cedo. Depois, era só cruzar os dedos e esperar por alguma resposta.

Já havia passado um bom tempo, que mandei o meu livro para as editoras. E estava ainda sem receber nenhuma resposta, tinha perdido a esperança de alguma delas se interessar em publicar o meu livro, quando recebi um telefonema.

— Julia Carson, sou Patrícia Well, trabalho na editora Primus, e ficamos muito interessados em publicar o livro, que você nos mandou. Quando poderemos conversar?

Primeiro, achei que fosse alguma brincadeira de Aline, alguma amiga dela me passando um trote, enquanto minha irmã ria ao seu lado, mas depois notei que era mesmo sério. Tive que me segurar para não dar pulos de alegria, nem gritar que iria lá naquele instante.

— Claro. Quando seria melhor para vocês?

— Poderia ser amanhã, tenho um horário às 10 horas.

— Amanhã para mim, está ótimo – E pensei que não tinha nada para fazer mesmo.

— Então, está marcado, vou passar nosso endereço

Depois de anotar o endereço, desliguei o telefone e fiz uma dancinha de felicidade, não podia acreditar, que meu livro seria publicado. Bem, na verdade, o livro da minha avó, entretanto, ninguém precisava saber disso.

— Não tenho nada o que vestir! – gritei para mim mesmo, correndo para o quarto, tirei tudo do armário.

— O que será que uma escritora de romance policial veste? Vou pesquisar na internet!

Como esperava, não tinham muitas mulheres que escreviam este tipo de história. Não havia um estilo definido. Então, achei que teria que comprar algumas roupas para aquela reunião, que me fizesse parecer uma pessoa mais séria. Para isso, fui a uma loja que nunca entraria na minha vida, daquele tipo de roupas sofisticadas que executivas usariam. Isso seria um desfalque nas minhas economias, mas valeria a pena, afinal aquela poderia ser a reunião da minha vida. Apesar de não ser meu estilo, a vendedora me convenceu a levar um vestido, reto, com uma estampa discreta, sapatos de saltos altos e uma bolsa enorme para combinar. Fiquei muito bem, mas não era eu refletida naquele espelho, parecia mais com Aline, claro, que ela ficaria muito mais bonita do que eu com aquela roupa. Mesmo assim, estava pronta para começar minha nova carreira de escritora.


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