Os dias eram frios e nublados naquela época do ano, não que houvessem muitos dias quentes na gélida Rússia, mas o inverno se aproximava passo a passo. Os habitantes do casarão não se comoviam com isso. As caleifação mantia tudo dentro das grossas paredes a uma temperatura confortável e agradável.

 Na cozinha, Darya ajudava a “avó” com o jantar, não que Nika fosse realmente sua avó pelo sangue, mas era assim que era tratada por todos. Exceto pelo Senhor da casa. Um silêncio tenso imperava no cômodo, quebrado unicamente pela pelo bater da faca na tábua de madeira.

— Darya, o que tinha Austin para estar não energético hoje? - Soltou a velha tentando puxar conversa.

— Hoje é dia... - Respondeu seca.

Nika balançou a cabeça intuindo o restante. Darya recolheu os vasilhames da mesa e começou a despejar as verduras na panela.

— E o que você tem?

— Nada não.

— Se não fosse nada, você já teria falado. - A velha tinha um sorriso preocupado - Vamos criança, fale…

— Não entendo o que tem essa menina de tão especial. - Como um balão de ar que finalmente explodiu - Toda a rotina da casa mudou em torno dela. Não entendo por que Nicolai tem que ficar cuidando dela, isso só está deixando ele irritado.

— Ele não está irritado, criança, ele está preocupado.  

Darya parou o que estava fazendo e encarou a velha com uma certa impaciência.

— Minha filha, aquela criança tem cicatrizes tão profundas, que seria preciso mais de uma vida para você compreender isso. - Jogando o restante dos legumes na panela - Mas se ela não reagir, é provável que tenham que destruí-la.

— Mas, Nicolai é inteligente o suficiente para compreender que não são todas as mentes que ele vai conseguir salvar.

— Você ainda é muito jovem para compreender que se ela precisar ser destruída. Não será apenas uma demonstração do fracasso das habilidades do Senhorio. Há muito mais por trás disso. Então eu lhe digo que se prepare para consolar nosso senhor, pois eu creio que a alma daquela menina, já se perdeu há tempos. E dificilmente alguém que chega onde ela está, consegue ter forças para nadar para fora do poço.

— A senhora acha...

— Nicolai sabe disso melhor que eu. Aquela menina é um caso perdido.

Houve um pequeno silêncio onde apenas o chiar da carne fritando no fogo pôde ser ouvido. Darya não estava inconsolada em pensar na tristeza que se abateria em seu senhorio diante do fracasso. Ele não podia, ele, a pessoa que ela tanto amava.

— Mas, Nikolai é muito habilidoso, ele pode simplesmente ordenar que ela volte a falar, que ela saia daquele canto, assim como ordenou que ela se alimente. - Retomou o assunto de súbito.

— Oh de fato ele poderia, mas como é incrível a mente humana. Imagine uma casa, ela tem um problema que é um incêndio em seu interior. O que vemos é a fumaça vazando pela janela. Você veda então a janela, o que você acha que vai acontecer?.

— A fumaça vai encontrar outro lugar para sair.

— Exato! Ordenar “fale”, “coma”, “ande”, é como vedar as saídas da casa. Mas o incêndio continua, e deus sabe por onde ele vai vazar dessa vez. Agora veja se o assado já esta no ponto.

— Você entende muito dessas coisas, não é vó?! - Abrindo o forno

— Ah, eu já fui jovem Darya, e eu queria desesperadamente chamar a atenção de Nicolai. Então eu estudei, como se não houvesse amanhã, tudo que pudesse interessar a ele. Só para puder ter o que conversar com ele.

— E deu certo?

— Bom, mesmo hoje, quando infelizmente seus dentes não encontram mais a minha pele. Nós ainda passamos tempo conversando juntos. - Encerrou com um sorriso satisfeito.

O silêncio se estabeleceu novamente, nele, Darya decidia que assuntos deveria estudar mais.