Eu não gostava de ver seu rosto desaparecendo, aos poucos você ia indo embora e não me dizia pra onde ia, isso me assustava, porque a garota cheia de sardas no rosto, sorriso brilhante e cabelos tão despretensiosos, arrumou seus problemas, os ditos defeitos que não tinha e a fragilidade que lhe era jogada na cara todos os dias dentro duma mala tão pequena quando ela mesma e se jogou pra fora do meu campo de visão pra sempre.

O pior de tudo é que grande parte da culpa por vc ter ido, é minha. Porque de todas as coisas que deixei por dizer, "eu te amo" é a que mais deixa minha boca com gosto amargo, mais amargo que aquele chá horrível que me ofereceu naquela tarde de verão quando ninguém mais se importou em enxergar um cara vestido de cachorro-quente sentado na causada.

Naquele dia, o seu rosto pacifico não me transmitiu nenhum dos seus problemas. 

Mas eu sempre soube que tinha problemas, você sempre os deixava passar sem que percebesse, de forma sutil - seja um "arranhão" novo, ou com um sorriso embargado - mas eu os ignorava, porque 'tava preocupado demais tentando decifrar o que tinha naqueles risquinhos que formavam-se nos seus olhos quando você sorria - devo dizer que a resposta não me agradou - e ficava fascinado como você só comprava calças com um número menor.

— ESSA MERDA NÃO ENTRA!

— Devia então experimentar algo que lhe caiba.

— O problema é que eu sou grande demais! Você não vê?

Eu não via

— Nada me cabe, tudo é apertado e eu não consigo respirar.

— Eu acho que você cabe no meu coração - você me olhava de forma espantada, se eu tivesse analisado melhor, veria o que você tinha visto.

— E eu acho que você é gentil demais.

— Olha só - peguei suas mãos que teimavam machucar sua cintura e as pus junto as minhas - ta vendo, parece que foi feita pra ficar desse jeito, e olha, ainda sobra espaço.

Você gargalhou de um forma tão bonita, que pensei que finalmente tinha achado o meu pedaço de céu, mas infelizmente eu não pude ser o seu. E naquela ultima noite, onde cantei uma canção onde dizia que todos aqueles  seus problemas eram perfeitos até você dormir, e poder finalmente me falar a verdade em palavras desconexas, rasgando segredos nos meus ouvidos, eu percebi isso. Por mais que eu te amasse, por mais que aquelas palavras cantadas fizessem sentido pra mim, o que você me dizia naquela não tão mais acolhedora noite não fazia.

Então você me deixou, e eu só pude ver por trás das minhas pálpebras quase fechadas, um curva sinuosa formada em seus lábios.

Eu não deveria ter aceito aquele chá.