Minhas pálpebras estão pesadas, como se eu tivesse colocado cimento nelas. Abro meus olhos e pisco devagar. Estou acordando de um ângulo diferente da cama. Me dou conta de que estou coberta com o edredom branco e estou em cima dele. Do mesmo modo como adormeci. Tenho receio de me mexer. Não sei se ele está dormindo e não sei que horas são. Estou fitando seu pescoço, alguns pelos loiros subindo por sua garganta até seu queixo. Sinto meu corpo dolorido e cansado, não quero me mexer, estou relaxada. Toda a tensão dos dias e semanas que se passaram se esvaíram ontem de uma só vez, meu corpo relaxou, se desligou. Mas eu já estava pronta para sentir toda aquela tensão novamente. E agora, ela voltaria ainda pior.
Levanto um pouco a cabeça e olho para o rosto de Matt. Ele está olhando para a janela, contemplando a vista, pensativo. Sinto meu rosto corar. Gostaria que ele estivesse dormindo para que não visse eu o olhando.
—Vista interessante? - quebro o silêncio.
Ele olha para mim e diz:
—Esses prédios não são uma vista interessante.
Arqueio as sobrancelhas.
—Você não acha? Eu posso perder horas contemplando eles.
—A vista que eu contemplei ontem era muito mais bonita.
Nossos olhos se encontram e eu entendo do que ele está falando. Desvio o olhar e acabo olhando para seu peito. Encaro uma pequena pinta marrom perto de seu peito.
—Você está... arrependida? - ele me pergunta.
Olho para seu rosto. Acho que me surpreendo com o tom da sua pergunta; é hesitante, como se de alguma forma, receasse ouvir a resposta.
—Não. - respondo.
Não sei se isso é cem por cento verdade, mas não quero magoá-lo e não foi como se eu não tivesse sentido nada na noite passada. Minha resposta parece satisfazê-lo e aliviá-lo. Ele sorri sem mostrar os dentes. É algo característico de Matt. Ele quase nunca sorri mostrando os dentes, apesar de eles serem bonitos. Encaro seu piercing preto em contraste com sua boca rosada.
—Você gosta?
Franzo o cenho confusa quando olho em seu olho.
—Do piercing. - ele explica.
—Ah. - lá está meu rosto ruborizando novamente. - Sim.
Nós nos encaramos por um longo tempo sem dizer nada. Ele estava sério, mas não bravo. Apenas sério e me olhando. Ele analisava e gravava cada centímetro do meu rosto e eu fazia o mesmo com ele.
—Então... - ele diz esticando a mão para pegar algo debaixo do edredom. Matt tira de lá uma caixa preta quadrada amarrada com um laço dourado. - Feliz aniversário.
—O quê? Ah Deus, Matt eu...
—Só abre. - ele ms interrompe com divertimento nos lábios. - Nossa, você não gosta de ganhar presentes?
Sento-me e pego o roupão preto de mangas cumpridas que está em cima da cama. Não olho para o rosto de Matt enquanto amarro um laço para manter o roupão fechado, mas vejo de relance que ele me observa. Eu achara que já havia perdido a vergonha de ficar nua na frente de alguém. Mas era só de Kyle.
—Eu me sinto desconfortável. Não gosto muito do meu aniversário.
Ele parece achar isso muito esquisito pois franze o cenho e balança a cabeça negativamente.
Suspiro e pego a caixa preta e quadrada. Ela é do tamanho de um cd.
—Obrigada. - digo antes de abrir.
Eu desfaço o laço da fita dourada e tiro a tampa da caixinha. Minhas sobrancelhas se arqueiam  e eu olho para o rosto de Matt que parece ansioso e está analisando meu rosto cuidadosamente com atenção.
Tiro a pequena folha, uma folha de bloquinhos de nota, branca com uma caligrafia de letra de forma.
"Ei Alice, uma pena que você não veio ao nosso show. Espero vê-la em algum.
J Rutherford".
— O quê?! - exclamo e olho para Matt que sorri.
Pego os dois cd's da banda na mão. Ambos estão autografados por todos os integrantes. Olho para Matt.
—Como...
Ele dá de ombros.
—Chloé uma vez me apresentou a banda e disse que tinha conhecido porque você falava muito e era fã. Bem, nós abrimos o show então, após eles se apresentarem, fui no camarim e conversei com os caras. Eu tinha comprado os cd's e pedi para eles autografarem.
Estou boquiaberta segurando os cd's na mão.
—Eu... obrigada Matt, eu... - respiro fundo e dou um sorriso de lado. - amei. Obrigada.
—Não foi nada. - ele diz e coloca as duas mãos atrás da cabeça.
—Eu.... - guardo os cd's e o bilhete do Jesse de volta na caixa. A fecho e faço um novo laço com a fita dourada. Coloco a caixa de lado e fito os olhos azuis que parecem esverdeados. - não esperava isso de você. Significa muito pra mim.
—Só fico feliz que tenha gostado. -ele dá de ombros.
Sei que se fosse Kyle que tivesse me dado aquilo, eu teria pulado em seu pescoço e lhe agarrado, mas eu não conseguia fazer aquilo com Matt. Estava constrangida e ao mesmo tempo surpresa e emocionada por aquele gesto. Contudo, a noite passada se repetia em minha mente a todo momento. Aconteceria de novo? Eu queria que acontecesse?
Eu me sentia culpada, mesmo tendo a certeza de que não devia já que Kyle estava transando com aquela vagabunda de cabelo lambido. Ele não estava pensando em mim, ele me vira na noite anterior e não sentiu um pingo de remorso, fora embora com ela enquanto me afoguei nas minhas mágoas.
Me dou conta de que estou encarando a caixinha enquanto Matt me olha.
—Como... foi pra você? - pergunto hesitante.
Ouço um trovão e um relâmpago ilumina o quarto. Minha atenção é desviada para a janela. Vejo que o céu está completamente escuro, coberto de nuvens negras e carregadas. No mesmo instante pingos de chuva começam a bater com força contra a janela. Torno a olhar para Matt, seus cabelos loiros em contraste com o lençol branco.
—Como foi o quê?
— A noite passada.
Observo seu sorriso se alargar lentamente.
—Foi melhor do que eu sempre imaginei. E olha que imaginei muito, Alice. Acho... que nunca gozei tanto.
Sinto meu rosto em chamas e engulo em seco.
—Eu... vou fazer um café.
Faço menção para sair da cama mas Matt segura meu pulso. Olho para sua mão ao redor dele e depois observo seu rosto.
—Como foi para você?
Tudo bem, eu não esperava por aquela pergunta. Eu esperava que ele não fizesse uma pergunta pior do que aquela.
—Foi bom. - tento soar indiferente mas sem magoá-lo.
—Melhor do que Kyle?
Reviro os olhos e levanto-me da cama soltando meu pulso da mão de Matt. Pego a caixinha e coloco em cima do criado mudo.
—Vocês são diferentes, tudo bem? Eu... não quero falar sobre isso.
Estou procurando um par de meias debaixo da cama que sei que não vou achar.
—Ele fez você tremer do jeito que eu fiz?
Me irrito e levanto-me do chão. Olho para os olhos azuis de Matt.
—Muitas vezes.
Matt fecha a cara e eu balanço a cabeça.
—Por que vocês dois sentem essa necessidade de ser um melhor do que o outro? Quer saber de uma coisa, Matt? - suspiro e olho bem para seu rosto cansado. - Não faça eu me arrepender do que fizemos. Por favor. Não seja um idiota e estrague a opinião que eu estava reconstruindo de você esse último mês.
Acho que ele não esperava por isso porque saio do quarto e ele fica perplexo no mesmo lugar.