Ocultos escrita por TheDarthLady


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Esta história foi escrita para o 13º desafio do Café com Letra (CcL) intitulado "Red Eye".



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O último mês foi o pior da minha vida. Em resumo a minha mãe se casou e, nesse mesmo mês, nos mudamos para a casa do meu padrasto. Minha mãe é uma pessoa legal, meu padrasto também. O grande problema eram as regras e uma delas é que eu deveria ir dormir, impreterivelmente, às 23 horas. Meu padrasto sofria de insônia e, por isso, qualquer ruído que perturbasse o seu sono poderia arruinar sua noite. Pois bem. A mim também restava o sofrimento, mas era diferente. O horário se aproximava e eu vestia o meu pijama, no banheiro, me preparando para dormir. Notei que meu reflexo no espelho suava, mas não sabia dizer se era calor ou temor. Talvez fosse os dois. Escovei os dentes, demoradamente, como se esperasse que aquele momento se prolongasse para sempre. Mas ele teve seu fim e eu precisava ir para o meu quarto. O corredor já estava escuro, com suas luzes apagadas, e preferi mantê-las dessa forma. Talvez tentando ocultar minha presença. A lentos passos me aproximei do quarto. A respiração ofegante. O suor inundando minha camisa. Abri a porta. Acendi a luz. Entrei. E, então, sem que eu tivesse tempo de reação, a luz se apagou e a porta atrás de mim se fechou. Se trancou. E eu estava lá, sozinho, com eles. Algumas religiões acreditam que exista um anjo da guarda para cada pessoa existente. Um único anjo da guarda, esse é o problema. Hoje somos em 7 bilhões de habitantes no planeta. 7 bilhões de anjos. O problema é que estamos no ano de 2016. Ou seja, se cada pessoa nesses 2016 anos viveu em média 80 anos, tivemos pelo menos 25 gerações. Aproximadamente 176.400.000.000 anjos. Só o que ninguém te conta é que quando alguém vem a falecer, o anjo vai junto. Ele cumpriu seu papel com aquela pessoa, então, ele deixa o nosso plano. Ele pode. Mas, eles, eles não podem sair. Eles estão presos. Eles são muitos. Eu me lembro como se fosse ontem, o dia que vi em algum seriado na televisão uma citação ao livro do apocalipse. “Sua cauda arrastou consigo um terço das estrelas do céu, lançando-as na terra.” Um terço deles foi precipitado, lançado, abandonado. Para termos uma pequena média, divida 176 bilhões por três. São 58.800.000.000 deles, presos aqui, para sempre, para apenas 7.000.000.000 de nós. Fez as contas? Existem, pelo menos, oito demônios para cada pessoa. Oito criaturas diabólicas dedicadas exclusivamente a você. E apenas uma para te proteger. A mim, acho que fui esquecido, nunca conheci meu anjo. Mas eles, meus demônios, eu conheço. Estou debaixo da minha cama, escondido, mesmo sabendo que é inútil. O silêncio era interrompido apenas pelo ruído provocado pela minha respiração ofegante. E pelas risadas. Acho que fui otimista. Oito é pouco. Aqui tem mais, bem mais. Eu então sinto o peso sobre o colchão acima de mim. Eles sabem onde eu estou, eles estão brincando comigo. A risada é distante, como se assistisse. E ela varia. Acho que, pelo menos três, vieram apenas para assistir. O peso sobre o colchão desaparece e as risadas cessaram. O silêncio reina e, preso em minha própria agonia, me vejo forçado a pressionar minha boca com ambas as mãos. Como se ao me proibir de emitir ruídos eu estivesse me protegendo. No fundo, acho que meu grito os alimenta. Grito esse que só eles parecem ouvir. Uma risada. Nova, profunda, determinada. Eu congelo, sinto meu sangue parar em minhas entranhas devido a minha aflição. E, então, eu escuto. Os passos se aproximando. O ruído de largas unhas se arrastando sobre a superfície de madeira da minha cama. O cheiro não apenas se torna insuportável, mas parece me impedir de respirar, penetrando cada célula da minha existência. Como uma nuvem de enxofre aprisionada dentro daquelas quatro paredes. Eu não consigo mais respirar. E o meu pijama, encharcado, me deixa confuso. Não sei se é calor, não sei se é temor. Só sei que já é a hora.


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Notas finais do capítulo

Durma bem, afinal, você tem companhia. :)