Capítulo 3. Pronto?

Alexandria

"A morte não é mais que uma troca de missão." 

— Leon Tolstoi.

Abertura

Li Wan andava rapidamente pelos corredores de um prédio dos vários que existiam em Auradon Prep. Estava animada para poder finalmente retornar ao seu quarto. Não que não gostasse de ir visitar seus pais, muito pelo contrário, adora; mas odeia ter que ficar viajando por horas só para poder ir até lá. Chegar a escola, ou em sua antiga casa, ah, isso sim é animador para a morena.

A filha de Mulan e Shang continuou andando apressadamente pelo corredor dos quartos femininos, ansiando chegar ao seu, e não estranhando o fato de que a escola em si parecia muito quieta, quando no meio do caminho encontrou o filho do inimigo de seus pais saindo de um dos quartos.

Wan teria ignorado. Wan queria ignorar. Mas Jin Hu Yu tinha uma presença muito forte. E ignorar o Urso não era algo que Devilfish deveria fazer, especialmente quando no Clube eles eram muito amigos. É, mas no Clube, Wan, fora dele vocês nem trocam palavras.

Então a garota apenas suspirou, baixou a cabeça e agarrou ainda mais as suas mochilas. O fato de Jin Hu Yu ser filho do inimigo de Mulan e Shang não fazia a garota temê-lo, muito pelo contrário. Wan gostava demais da companhia de Jin. Ele era forte, tanto no sentido físico quando emocional, era inteligente e era corajoso. Jin era alguém que Wan realmente gostava, mesmo ele sendo filho do temível e aterrorizante estúpido Shan Yu.

Wan observou os sapatos escuros de Jin Hu se aproximarem, mas continuou andando, fitando o chão a sua frente, e ignorando completamente a sua presença. Só quando deixou de ver os sapatos do homem que ergueu o rosto e então escutou a voz do Urso.

— Você está bem?

Wan parou, e lentamente se virou pro rapaz, que a fitava de maneira intensa — como sempre fazia quando estavam no Clube, sendo apenas Urso e Devilfish. A menina então ergueu uma de suas sobrancelhas.

— Porque está falando comigo? — indagou, tentando soar normal, e ignorar o fato de que lá no fundo eram amigos. Jin revirou os olhos fortemente e então deu dois passos na direção de Wan.

— Sério, Wan, não tem ninguém por aqui, você pode parar com isso — pediu com os olhos atentos na menina. Wan continuou muda, tentando entender o porquê do menino estar falando com ela. — Eu só queria saber se você está bem, só isso. Mas não precisa responder se não quiser, vou entender, afinal, a filha da Mulan falando com o filho do Shan, que Deus nos acuda, não? — falou e logo em seguida deu um mínimo sorriso sarcástico.

— Eu... Eu estou bem — Wan respondeu rapidamente, porque ela sabia muito bem que o rapaz sabia o quanto ela odiava aquele discurso de que só porque eles eram filhos de inimigos não poderiam se tornar amigos. — E você?

— Não, na verdade — Jin retrucou e logo em seguida franziu a testa, passando a mão pelo nariz.

— Aconteceu alguma coisa? — Wan indagou se aproximando do colega. Geralmente Jin não se apresentava daquela forma. Era muito raro vê-lo tão aberto daquele jeito.

Jin ergueu os olhos um tanto quanto assustados para Wan. E então reparou que a menina carregava duas mochilas e uma bolsa a tiracolo. Logo juntou os fatos e fitou a menina.

— Onde estava?

— Visitando meus pais — Wan respondeu com certo receio pela mudança brusca de assunto. — Por quê?

— Wan... — Jin rapidamente se aproximou da menina, mas ficando ao menos um passo longe dela. — Norwood morreu — soltou. Jin não era muito uma pessoa de rodeios, e se fosse fazê-la sofrer, que fosse rápido.

Wan sorriu ao invés disso.

— É, sim, claro que morreu. E ressuscitou como? Jones? — a garota brincou com um sorriso divertido nos lábios, mas ao perceber o rosto sereno do colega e ainda sério, a menina parou na hora. — Jin, não se brinca com isso, você sabe, não? — falou convicta e com uma vozinha gritando de si que ele não estava brincando nem um pouco.

Jin negou com a cabeça.

— Ele morreu mesmo, Li Wan. Anteontem encontraram o corpo dele, e hoje foi o velório, ele se foi — falou com a voz calma, e Wan rapidamente colocou a mão na boca, a afirmação lhe pegando de surpresa e a assustando. Como assim ele morreu? Ele não podia morrer! Norwood era tipo o imortal, a Águia, o gigante. Norwood era... Norwood.

— Ele não... Ele não pode... Jin, ele não... — sua voz falhou no exato momento em que as lágrimas invadiram seu rosto. Jin mordeu o lábio fortemente, não sabendo como agir naquela situação. Não era bom com palavras, muito menos com confortos, por isso apenas colocou sua mão no ombro da menina, esforçando-se ao máximo para demonstrar que estava com ela, que ela inda podia contar com ele.

Ele só não esperava o abraço da menina, e suas lágrimas molhando sua camisa branca social.

Mas mesmo pego de surpresa, Jin retribuiu o abraço da forma que podia. Wan, por mais que nunca admitisse isso, foi sua primeira amiga ali. Ela foi se aproximando, e quanto mais se aproximava, menos Jin conseguia se afastar. E quando menos percebeu era grande amigo da Devilfish, porque mal falava com a Wan. Mas naquele momento não existiam Urso ou Devilfish, apenas Jin e Wan. E Jin, no final, era amigo de Wan. Ele querendo ou não.

[...]

Faye Fitzherbert Zörn não estava disposta a ter que acordar no dia seguinte e enfrentar um longo dia de aulas entediantes e chatas. Ela definitivamente não estava a fim de ter que olhar na cara de cada aluno ali e ter que enfrentar a pura verdade: Norwood estava morto. Enterrado. Embaixo da terra. Longe de si. Sem mais risadas, sem mais afeto, sem mais carinho, sem mais piadas sem graça que no fundo tinham uma pitada de graça, sem mais amigo para lhe poder ajudar, sem mais... Sem mais Norwood Jones. Como Faye poderia sequer continuar sorrindo sem ele ao seu lado lhe fazendo cócegas e brincando com ela para deixar Avery com mais ciúmes?

A filha de Rapunzel e Eugene soltou um suspiro entalado, e apoiou sua cabeça em suas mãos, que estavam sobre a mesa de seu quarto. Sua colega de quarto, Katherine, ainda não havia chego do velório, e Faye agradecia a isto. Ela não havia ido ao velório de seu melhor amigo, porque não tinha forças para ir. Faye não conseguia sequer cogitar a ideia de ir para um lugar onde veria o corpo do amigo morto, e depois ele sendo levado para debaixo da terra. Não, não. Ela não queria isso.

Por isso não foi.

E esperava do fundo do seu coração que ninguém ligasse para esse fato.

Afinal de contas, Fay não queria que as pessoas ficassem falando sobre o fato de que não havia ido para o tão esperado e tão lotado velório e enterro de Norwood, sendo que ela era a melhor amiga de Norwood, a que sempre estava ao seu lado, e que muitas vezes acabava por gerar controvérsias de que eles teriam um rolo. Faye soltou outro suspiro e então se deitou em sua cama, os olhos no tecido rosa que formava uma cortina em volta de sua cama.

Fechou os olhos na tentativa de pegar no sono, entretanto logo escutou batidas fortes na porta e se sobressaltou, abrindo os olhos rapidamente e ficando de pé. Fay levantou-se com cuidado e então abriu a porta com certo receio — talvez o fato de que Norwood havia sido morto por sabe-se lá quem deixava a menina meio receosa.

Entretanto encontrou apenas Ethan White, o quieto e recluso Ethan White.

Faye deu um pequeno sorriso e então deu espaço para o loiro adentrar ao quarto — o que ele fez rapidamente. A morena fechou a porta atrás de si e esperou que Ethan começasse com algum discurso sobre o quanto ela fez falta no velório de Norwood, no entanto, ele apenas sentou na cama da menina e juntou suas mãos, fitando-as.

— Eles... — sua voz parou, e então o rapaz soltou um suspiro entalado antes de erguer os olhos e fitar Faye, que permanecia em pé, esperando o menino. Depois de algum tempo de convivência, sabia que Ethan só precisava de espaço para poder falar o que queria falar. — Aaron, Finnegan, Avery e Phoenix estão montando um plano louco para poder descobrir quem matou Norwood — soltou ainda fitando Faye.

A morena se aproximou de Ethan, sentando ao seu lado, não perdendo o contato visual com o garoto.

— Como assim, Ethan? — indagou, franzindo a testa. Ela havia escutado. Só não estava conseguindo sentir noção no que o rapaz estava falando.

— Aaron descobriu que a Fada Madrinha está culpando o Clube Turvo pela morte de Norwood — sussurrou para a menina. Falar sobre o Clube fora do Clube era proibido, uma das regras que todos seguiam a risca. Mas naquele momento Ethan tinha de falar. Por isso quanto mais baixo falasse, melhor.

— O que? — Faye espantou. — Como assim? Do nada? Ela nem sabia o nome dele e agora o está culpando? — bombardeou o rapaz de perguntas, e Ethan segurou um sorriso. Era bem provável que levasse um tapa da menina se sorrisse abertamente. Mas toda a vez que Faye começava com um monte de perguntas ele instintivamente lembrava-se do dia em que acabou soltando sobre o Clube Turvo após as quinhentas perguntas da menina.

— Nós não sabemos. A Jane que contou ao Aaron e ele foi falar conosco — Ethan prosseguiu, desviando o olhar do dos olhos verdes da menina. — E agora eles tiveram essa ideia maluca de procurar pelo culpado da morte do Jones — sussurrou um tanto quanto baixo, que Faye teve de se aproximar para escutar. — Eu aceitei, mas... Mas só porque assim eu poderia ficar de olho-

— Fay! — Katherine gritou abrindo a porta do quarto das duas. Katherine Westbrook Solberg, a filha da Rainha Elsa e do Rei Consorte Devon; provavelmente uma das melhores amigas de Faye. As duas quase sempre andavam juntas, quando Faye não estava perto de Norwood ou de Ethan. Por algum motivo, mesmo participando do Clube, Kathe não gostava muito da presença dos dois.

Por isso quando adentrou ao quarto e viu Ethan sentado ao lado de Faye, seu sorriso calmo desmanchou imediatamente.

— Hei Kathe! — Faye cumprimentou ao ver sua colega de quarto e também amiga.

— Eu atrapalho alguma coisa? — indagou com cuidado, apontando para os dois sentados juntos.

Ethan prontamente negou.

— Não, não — respondeu levantando-se da cama, ação esta que Faye seguiu. Ele não ia sair assim do nada e deixá-la sem mais informações, iria? — Na verdade, eu já estava de saída — deu um pequeno sorriso para a loira afronte dele. É ele iria.

— Mas Ethan — Faye começou, chamando a atenção do loiro para si, que focou seus dois olhos azuis nos olhos verdes da menina, ação que ela já estava acostumada. — Você-

— Eu realmente preciso usar o banheiro, Fay — Ethan deu um sorriso meio torto, e então num gesto meio complexo para o rapaz, aproximou-se da garota e a abraçou, encaixando seu rosto próximo ao ouvido da morena. Faye, por sua vez, mesmo assustada com o gesto (já que Ethan nunca a abraçava, ou sequer se aproximava da menina), retribuiu o abraço sem jeito. — Não diga nada, isso é um segredo nosso — o rapaz murmurou no ouvido da menina, fazendo com que os pelos da garota se eriçassem.

E mesmo sem especificar qual era o segredo, Faye assentiu com o ombro do menino; porque ela havia entendido. Só não estava entendendo o porquê dele não querer contar para Kathe. Okay, talvez ele também tenha algo contra ela.

— Vejo você na janta? — Faye indagou assim que Ethan se afastou.

— Provavelmente — respondeu com um pequeno sorriso, e então se virou para Kathe. — Até mais, Kathe — falou com um pequeno aceno de cabeça, o qual Kathe prontamente respondeu. Depois virou seu rosto para Faye e lhe deu um pequeno sorriso, que Faye também respondeu. Por fim, apenas saiu do quarto das duas colegas.

— Eu não sei se é a morte de Norwood, ou se ele é assim mesmo e eu nunca reparei, mas... — Kathe começou atraindo a atenção de Faye. — Ele está estranho.

— Ele é estranho, Kathe — Fay comentou soltando uma pequena risada, e então logo depois se deitou em sua cama, olhando para a amiga que retirava os brincos e colocava na penteadeira. — Como foi? — indagou com cuidado, e certo receio. Queria mesmo saber?

E mesmo sem dizer o que, Kathe havia entendido muito bem a sua pergunta: ela gostaria de saber como foi o enterro de Norwood.

— Bem... Normal — Katherine soltou um suspiro, virando seu corpo para a amiga, encarando-a. — Teve todo aquele discurso do Rei Ben, depois a Fada Madrinha falou um pouco, e por fim, nós colocamos nossas flores em cima do caixão e ele foi enterrado — deu de ombros, fitando a amiga com cuidado. Não que Katherine fosse fria ou algo do gênero; mas, por mais que Norwood fosse um dos líderes do Clube, eles não tinham tanta amizade como Faye tinha com o garoto.

E Katherine nunca se sentiu a vontade com ele. Talvez com o Norwood Jones, filho do Capitão Gancho; mas não com o Águia, um dos líderes do Clube Turvo.

— Muita gente não foi? — Faye retomou a pergunta.

— Poucos, na verdade — Kathe passou a mão no cabelo loiro, desfazendo a trança que havia feito para não ficar com tanto calor. — Só você, um pessoal da Ilha dos Perdidos, a Li Wan, o Finn, a Olivia, e mais alguns por ai — concluiu com os olhos perdidos pensando em quem havia notado a ausência por lá. — Mas só tinha o pessoal da escola — terminou, e Faye apenas assentiu.

— Será que já contaram para o Capitão Gancho? — Faye indagou com certo receio. Faye nunca conheceu o Capitão Gancho, ou Killian Jones (como Norwood falava) pessoalmente. Apenas por histórias e por Norwood. Mas sempre pensava nele como alguém que ansiava o poder, como todos os outros vilões no geral. Todos eles ansiavam o poder de alguma forma.

— Eu não sei — Kathe confessou, fitando suas mãos e soltando um suspiro. Pensar na Ilha dos Perdidos lhe dava uma ampla linha de raciocínio que fazia a menina querer logo um abraço. — Ele não reagirá bem.

— Não mesmo — Faye soltou um suspiro, e então virou para encarar a amiga. — Faz muito tempo que ele não vê o filho pessoalmente, e então descobre uma notícia desta — a garota recebeu o olhar de Kathe, e logo se sentiu intimidada. — Não que eu esteja criticando a escola, Kathe, é só que-

— Eu entendo, Fay, deve ser horrível para um pai descobrir que seu filho morreu justo num lugar onde seria o último lugar a se pensar que ele morreria — completou a linha de raciocínio da amiga, que lhe deu um pequeno sorriso, feliz por ter entendido seu pensamento.

— Será que os vilões vão querer tirar seus filhos daqui? — Faye indagou a amiga, que deu de ombros.

— Se eles amarem seus filhos o suficiente, quem sabe.