Complicado escrita por Laura H


Capítulo 1
de inícios e finais


Notas iniciais do capítulo

Apenas uma nota de esclarecimento que, relendo esse texto, achei necessária: a fic se passa no período entre julho de 2006 e junho de 2009, exceto pelo primeiro trecho, que acontece em algum momento indefinido no final de 2015.

Aproveitem a leitura, baes! ♥



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Era um sonho.

Logan não sabia dizer como sabia, mas a certeza estava ali. Não havia um contorno esfumaçado rodeando a todas as coisas, nem mesmo algo inacreditável demais para fazer parte da realidade, mas nada daquilo estava realmente acontecendo.

Tudo parecia estar em seu devido lugar, e, ainda assim, havia o estranho pressentimento de que tudo estava errado. Também não sabia dizer o porquê, não ainda; esforçava-se para descobrir.

Até que alguém empurrou a porta do recinto para o qual seu subconsciente o levara. Com dentes brancos como nos comerciais de pasta de dente e olhos tão verdes quanto o mar, o invasor lhe sorriu.

— Ei. Sentiu minha falta?

Logan engoliu em seco, seu coração batendo alucinadamente contra suas costelas. Entendeu o motivo pelo qual duvidara da veracidade do que estava acontecendo, muito embora a vividez do sonho não denunciasse que era disso que tudo aquilo tratava – um sonho.

Logan não via aquele sorriso havia quase seis anos.

Da primeira vez em que Logan vira Asher Dallas, ele ainda não passava de um calouro de Washington perdido em meio a um mar de veteranos nova-iorquinos. Estava jogado no sofá, começando a se perguntar se não teria sido uma tremenda estupidez deixar a segurança da capital por uma cidade onde não conhecia ninguém além de seu vizinho – um rapaz franzino chamado Josh que, embora cursasse o segundo ano da universidade, mais se parecia com um pré-adolescente – quando, pela primeira vez, ouviu o som de uma chave girando na fechadura.

(Não conseguiu dar muita importância ao fato de estar praticamente nu; àquela altura, qualquer indício de companhia já o deixava animado o suficiente para que conseguisse ignorá-lo. Poderia se sentir envergonhado depois.)

Mas, quando a porta finalmente se abriu – pareceu levar uma eternidade, e talvez realmente tivesse levado porque Logan conseguia ouvir a voz de Josh do lado de fora de sua porta e sabia muito bem da queda do vizinho por quem quer que fosse que seria seu companheiro de quarto pelos próximos anos –, Logan não estava preparado para aquela visão.

O homem que adentrava o apartamento tinha cabelos dourados e despenteados, olhos verdes profundos e um sorriso tão branco que seria capaz de cegá-lo, se ele não achasse que seria um grande desperdício ser cego tendo de conviver com um deus grego daquele porte.

— Bom — o estranho falou, fechando a porta atrás de si, o sorriso ainda estampado em seu rosto como se fosse uma constante –, isso é o que eu chamo de uma boa recepção.

Logan sequer se deu ao trabalho de corar.

Nunca parecera complicado para ele, toda aquela história de “gostar de garotos”. Talvez devesse ter sido, se considerasse o quanto o senador Wright, seu pai, era popular entre os conservadores; mas nem seu pai, e tampouco a mídia, se importavam muito com o que ele fazia. Tinha meios-irmãos mais bonitos e interessantes do que ele, de qualquer forma. Manter a reputação da família não estava em suas mãos.

Por outro lado, garotos ou não, não era de seu feitio ir para a cama com desconhecidos. Não era de seu feitio sequer ir para a cama com alguém. Todo o contato físico que tivera com outras pessoas se resumia a alguns amassos e a mãos em lugares indevidos, nada mais.

E, até ali, Logan estivera bem com nada mais. Não pensava como o resto de seus amigos, que pareciam tratar sexo como uma grande prioridade em suas vidas. Em sua opinião, aquilo poderia esperar.

Mas o tempo de espera talvez estivesse se estendendo demais, ele sussurrou para si mesmo em pensamento, com os lábios de Asher cobrindo os seus pela primeira vez e as mãos dele se infiltrando por baixo de sua camisa.

(Não era nada complicado, gostar de garotos.)

 — Eu não posso fazer isso.

Logan umedeceu os lábios, parte de si temendo se mostrar desesperado demais, parte de si desesperada demais para se importar com algo tão pequeno. Procurou os olhos de Asher com os seus, mas ele estava distante, o olhar perdido em um ponto fixo no carpete.

— É claro que pode. Por que não poderia? Você não está fazendo nada de errado. — emendou, bastante consciente de estar falando tão rápido que atropelava suas próprias palavras.

O riso de Asher veio sem humor algum e atravessou seu coração como uma série de facas.

— Talvez não — admitiu, amargurado —, mas é muito mais provável que eu esteja.

O outro homem deu de ombros, fazendo o possível para parecer displicente.

— Ok, então você não se assumiu ainda. Grande coisa. Eu posso te ajudar. Nós podemos fazer isso juntos, e você não precisa terminar comigo por uma coisa tão ridícula...

— Terminar o quê, exatamente, Logan? — Asher interrompeu, em um tom de voz que estava em algum lugar entre o sarcasmo e a angústia. — Estamos dormindo juntos quase todas as noites desde que eu cheguei e ainda não demos nem um nome para essa... Relação.

— Bom, pelo menos você admite que é uma relação — Logan murmurou, soando mais triste do que intencionara a princípio. Pela primeira vez desde que aquela conversa se iniciara, Asher levantou os olhos para ele.

— Logan, você faz alguma ideia do que aconteceria comigo se eu sonhasse em contar a alguém que sou gay? — indagou, e, daquela vez, soou mais sério do que infeliz; não esperou resposta para prosseguir — Eu perco tudo. Perco os meus amigos, o meu emprego, o maldito dinheiro que eu uso para pagar os meus meses de aluguel desse lugar decadente... eu perco até os meus pais. E você sabe o que isso significa? — voltou a perguntar mas, mais uma vez, não esperou que Logan respondesse. — Significa que eu perco Columbia. Eu perco o meu sonho, Logan. Eles não vão continuar pagando essas taxas altíssimas se souberem que têm uma aberração de filho.

Logan comprimiu os lábios.

— Você acha que eu sou uma aberração?

Asher entreabriu os lábios, mas voltou a fechá-los em alguns instantes, assim que percebeu que não havia uma resposta adequada. Suspirou, balançando a cabeça em negativa – se para Logan ou para si mesmo, não sabia dizer.

— Você consegue entender o que estou tentando dizer agora? — levantou as sobrancelhas, parecendo exasperado. — Eu não posso continuar fazendo isso. Você quer um relacionamento de verdade, alguém que possa exibir você para o mundo, e eu não posso te dar isso.

Um silêncio constrangedor se instalou entre eles por alguns momentos, embora ainda fitassem um ao outro como se fizessem uma análise. Por fim, foi a vez de Logan de suspirar, como se toda aquela discussão fosse cansativa demais.

— Eu nunca gostei muito de me exibir, Asher.

— Eu não posso te dar nada — Asher retrucou, e Logan precisou se esforçar para não revirar os olhos – o quão insistente uma pessoa podia ser em tomar uma atitude que nem ela mesma queria tomar?

— Tenho vários motivos para discordar disso, mas, como você não me ouviria mesmo, acho que nenhum deles importa muito — disse, fazendo o seu melhor para se manter inexpressivo. — Você acha que eu quero um príncipe encantado, Ash, mas príncipes encantados não existem. — Mesmo se existissem, nunca gostei muito de contos de fadas, completou, mas não ousou externar o pensamento.

— O que você quer, então?

O primeiro sorriso da noite ameaçou surgir nos lábios de Logan.

— Bom, estive a noite inteira tentando te convencer a não terminar comigo, então... Achei que fosse óbvio. — encolheu os ombros, apoiando uma das mãos no joelho de Asher.

— O que é óbvio? — as íris verdes estudaram o rosto de Logan com cautela, como se procurassem algum traço que denunciasse a mentira.

— Que o que eu quero é você, idiota.

— Às vezes eu acho que você é um anjo, sabe?

— Não, não sei. E os seus elogios bizarros estão começando a me assustar. — Logan replicou, erguendo as sobrancelhas. — Não é porque estamos no dia das bruxas que você precisa se esforçar tanto em fazer isso, Ash. Esse filme de terror horrível que você alugou está fazendo um bom trabalho.

Asher revirou os olhos.

— Você pode, por favor, calar a boca? Estou tentando me declarar. Você está acabando com o clima, Wright — sibilou, cruzando os braços sobre o abdome e capturando a atenção de Logan para aquele ponto.

— Hmm — foi, por alguns momentos, tudo o que o rapaz em questão conseguiu dizer, ainda distraído pelo tórax de Asher. — Ok, não vou dizer mais nada. Pode continuar falando sobre como eu sou absolutamente maravilhoso.

Mas Asher, em sua tentativa de procurar as palavras certas para dizer aquilo que precisava dizer, se manteve em silêncio por um tempo longo o suficiente para causar curiosidade e fazer com que o outro homem levantasse os olhos para o seu rosto.

— Eu não sei o que você continua fazendo comigo — admitiu, mordendo o lábio inferior.

— Nós já não tivemos essa conversa antes? — Logan perguntou, em uma tentativa bastante falha de soar entediado; todos os sinais de seu corpo retesado demonstravam que não tinha boas expectativas pelo que estava por vir.

— Será que dá pra você ficar calmo? Eu não vou tentar terminar com você de novo.

— É, porque você não é louco — o mais jovem retrucou, mas pareceu bem mais relaxado com a afirmação.

— Mas eu realmente não entendo, Logan. Você não pode me apresentar para os seus amigos, não pode me apresentar para a sua família...

— E nem faço questão — Logan apressou-se em dizer, torcendo o nariz ao imaginar Asher e seu meio-irmão Aaron, cujo cérebro parecia ser inexistente, apertando as mãos um do outro.

— ... E continua comigo mesmo assim. E eu fico me perguntando, o tempo todo...

— Talvez você devesse estar cursando Filosofia. Já pensou na possibilidade?

— ... Como você ainda não desistiu de tudo isso? Por que eu sou tão especial para você que essas migalhas de relacionamento são o suficiente? Até eu me sinto mal quando vejo outros casais... Sei lá... Andando de mãos dadas por aí. E esconder tudo foi minha escolha. Eu não consigo imaginar como você se sente.

Logan suspirou.

— Sabe, Ash, nós realmente não precisamos falar mais sobre isso. Eu estou com você porque eu te amo incondicionalmente e não consigo mais viver sem esse seu tanquinho maravilhoso. Era isso o que você queria ouvir?

— Na verdade não, mas tenho que admitir que isso me deixa bem feliz. — Asher deu de ombros, um traço de sorriso surgindo no canto de seus lábios. Então limpou a garganta, como se estivesse se preparando para dar um anúncio extremamente importante. — Eu acho que você deveria morar comigo.

O absurdo da questão era tamanho que Logan se permitiu erguer as sobrancelhas mais uma vez.

— Asher, você bebeu alguma coisa? Não me diga que você batizou a sua Cherry Coke de novo. Esse negócio é horrível com ou sem álcool — cruzou os braços. — Eu já moro com você. Dormimos na mesma cama e tudo.

— É, você mora comigo. Em um apartamento decadente. Como meu colega de quarto da universidade. — Asher ironizou. — Não é isso que estou te pedindo. Quero que se mude comigo para algum lugar decente. Como meu namorado.

Por alguns instantes, Logan sequer teve reação.

— Você... Está me oficializando?

— Sim. Bom, quer dizer, não — Asher se corrigiu apressadamente —, ainda não, não posso fazer isso até concluir o curso, você sabe. E é claro que isso só vai acontecer em um ano e meio, e talvez você já tenha desistido de mim até lá, mas... É, eu acho que seria um bom momento para oficializar você, se você não desistir.

O outro homem riu.

— É, talvez eu não desista.

Asher não se incomodou em responder antes de se inclinar para beijá-lo.

— O que você acha de... Amarelo?

O ceticismo de Logan quanto a pergunta forçou-o a erguer os olhos de seu Orgulho e Preconceito e arquear uma sobrancelha na direção de Asher, que o encarava com a típica expressão de cachorrinho abandonado.

— Não. — foi tudo o que disse antes de voltar sua atenção para o livro.

— Ah, vamos lá. Por favor. — Asher insistiu, jogando-se ao seu lado na cama. A réplica de Logan foi virar uma página e fingir extrema concentração. — Amarelo nem é uma cor tão ruim assim.

— Você não vai comprar cortinas amarelas para o nosso apartamento novo, Asher — Logan pontuou, sem se incomodar em desviar o olhar de sua leitura. — Se é para nos mudarmos para outro apartamento, que seja um menos deplorável do que esse.

Asher revirou os olhos.

— Tudo bem. — respondeu, resignado. — Mas espero que você repense essa decisão. Amarelo é uma cor maravilhosa. E, aliás, você vai ser meu marido quando nos mudarmos, então precisa aprender a ceder.

— O casamento homossexual não é legalizado em Nova York — Logan respondeu, finalmente desistindo de ler, ao menos enquanto Asher parecia decidido a atrapalhá-lo.

— Ainda não, mas de qualquer jeito nós só podemos nos casar quando eu terminar a faculdade, e eu tenho certeza de que daqui a um ano e meio nosso belo e moderno estado vai ter aprovado alguma lei que nos dê esse direito. — o outro rapaz deu de ombros, despreocupado, e afastou uma mecha loira de seu rosto.

— Ok. Então nós vamos nos casar e mudar para um belo apartamento de cortinas amarelas no belo estado de Nova York. — Logan ironizou, embora sorrisse. — Que apartamento? Não se esqueça de que os seus igualmente belos pais conservadores não vão poder te ajudar com isso. Ainda estarão se recuperando do choque que é descobrir que o precioso filho deles gosta de p...

— Nós vamos dar um jeito até lá — Asher se apressou em interromper. Então um sorrisinho surgiu no canto de seus lábios. — E, ei? Você acabou de concordar com a cor das cortinas.

— Achei que você quisesse cortinas amarelas.

— Faz meses que eu disse isso. Além do mais — Asher prosseguiu —, esse é o meu presente para você. Vou gastar tudo o que tenho comprando a mobília desse lugar, então não vai restar muita coisa para o nosso aniversário em dois meses.

— Achei que você ia negociar os preços com o Josh. — Logan estreitou os olhos, desconfiado.

— Eu estou negociando os preços com o Josh. Ele está me cobrando muito mais do que aquelas coisas velhas realmente valem. Acha que conseguiu a sua vingança pela minha rejeição. Ou algo do tipo.

— Hm. Garoto esquisito. Bom —, Logan encolheu os ombros, sem dar muita importância ao fato de que não haveria presentes aquele ano — desde que eu possa ajudar na escolha dos móveis. Sem ofensas, mas você tem um péssimo gosto.

— Não estou ofendido, mas você deveria estar. Eu teoricamente escolhi você também — o loiro deu de ombros. — Enfim, o que você acha? Cortinas brancas, paredes azuis, podemos até ter um papel de florido se você quiser.

— O que te leva a pensar que eu quero um papel de parede florido? — Logan franziu o cenho.

— Não sei, mas parece o seu tipo de coisa.

— Me sinto honrado pela visão que você tem de mim, Ash — revirou os olhos, embora sorrisse — Ei, espero que você tenha comprado uma cama de casal. Me desculpe, mas eu não planejo ficar dormindo em um sofá.

— Bom, então espero que você não resolva comer o que eu deixar guardado para mim, ou o sofá é exatamente onde você vai terminar.

— Duvido muito. Você sentiria a minha falta na cama. — Logan provocou, mordendo o canto do lábio de modo sugestivo.

— Bom, eu sempre posso te visitar no sofá. — Asher ponderou, parecendo perdido em pensamentos.

— Não acho que isso seria muito confortável.

A afirmação pareceu trazer Asher de volta ao mundo real, seu sorriso malicioso surgindo nos lábios dele em questão de segundos.

— Pois eu acho — começou, dando tapinhas no lugar vago a seu lado — que nós deveríamos testar.

— Eu não acredito que você vai se formar em seis meses. — Logan abriu um sorriso na direção do namorado, mas Asher não o acompanhou; limitou-se a olhar no espelho mais uma vez e a procurar defeitos em sua aparência.

— Por que, você duvidava da minha capacidade? — rebateu, sarcástico; não havia traços de humor em sua voz. Logan deu alguns passos para trás, colocando certa distância entre eles e tentando não soar muito amargurado quando respondeu. Hoje é um grande dia. Ele só está nervoso.

— Não, nunca — replicou, em um tom de voz suave que, em sua opinião, contrastava demais com a agressividade de Asher. Poderia tê-lo estapeado, mas não achava que ter uma marca vermelha no rosto causaria uma boa impressão nos homens com quem o namorado estava prestes a se encontrar, e algum daqueles homens poderia se tornar seu empregador.

— Ótimo — foi a resposta que recebeu. Asher ajeitou sua gravata uma última vez antes de se voltar bruscamente para ele. — Preciso ir. Não posso chegar atrasado.

— Não iríamos querer isso, não é? — Logan brincou, se forçando a sorrir outra vez.

— Essa foi uma pergunta idiota. É claro que não.

O sorriso desapareceu de seus lábios.

— Bom, eu...

— Não importa, Logan. Tenho que ir. Boa noite. — Asher o interrompeu, impaciente. — E não me espere acordado — acrescentou, antes de irromper porta afora em toda a sua imponência de garoto universitário que recebia a primeira grande chance na vida.

Logan tentou não se chatear.

[fez-se de triste o que se fez amante, e de sozinho o que se fez contente]

— Seis meses passam rápido demais.

— Eu não estaria reclamando, se fosse você — Asher pontuou, embora não soasse muito convincente, ao menos não enquanto sua boca estava cheia de pasta de dente. — Isso significa que falta menos de uma semana para nos mudarmos daqui.

— Graças a Deus. Andei achando que você tinha desistido desse plano. — Logan resmungou, despenteando o cabelo com os dedos. — Na verdade, esse seu convite me surpreendeu. Estava começando a pensar que você tinha me excluído de sua vida permanentemente.

— Eu nunca faria isso — Asher se defendeu, embora manchas rosadas surgissem em suas bochechas. — Agora vamos, se apresse. Estamos quase atrasados, Wright.

— Ninguém chega cedo em uma festa de universitários, Dallas — Logan retrucou, revirando os olhos. — E eu estou pronto. É você quem nem terminou de escovar os dentes ainda. Se vamos nos atrasar, a culpa não vai ser minha.

— Ah, pare de me julgar — Asher reclamou, embora estivesse rindo.

— Bom, eu só te mostrei os fatos — o outro encolheu os ombros, também risonho; um pensamento que cruzou a sua mente, entretanto, fez com que assumisse uma expressão séria. — Ei, Ash?

— Hmm? — o rapaz mais velho se voltou em sua direção.

— Essa festa... Bom... — Logan inspirou profundamente, sentindo-se como um adolescente inseguro (coisa que ele se orgulhava muito em nunca ter sido). — É hoje que você planeja contar a todos? Sobre... Você sabe. Nós.

Pareceu levar um longo tempo até que Asher respondesse; e, quando o fez, não havia firmeza alguma em sua voz.

— Eu... É... Sinto muito. Não posso fazer isso hoje. — suspirou. Logan entreabriu os lábios, mas não encontrou palavras a serem ditas. — Me desculpe. Você entende, não é? É a minha formatura, então... Bom, todos que eu conheço vão estar lá. Eu não queria que você perdesse, por isso...

— Tudo bem. — Logan interrompeu, sem interesse em ouvir o restante da bela narrativa que Asher provavelmente estava preparando para lhe contar. — Eu entendo. É melhor irmos logo. Não quero chegar atrasado.

Antes que ele pudesse atravessar a porta, no entanto, Asher agarrou sua mão.

— Uma semana — sussurrou, indicando as pilhas de caixas de papelão espalhadas pelo apartamento. Logan não ousou dizer coisa alguma, mas apertou os dedos do rapaz com força entre os seus.

Só mais uma semana.

(Ou era o que ele esperava.)

[e da paixão fez-se o pressentimento, e do momento imóvel fez-se o drama]

— O que você quer dizer com “não pode”?

O apartamento dava a impressão de ter sido atingido por um furacão. Havia papelão por todos os lados, caixas de pizza vazias largadas sobre o piso de madeira escura e algumas camisas jogadas em lugares aleatórios.

E, obviamente, havia os dois homens enfurecidos ocupando o pouco espaço livre que ainda existia na sala de estar.

Céus, Logan detestava mudanças.

— Bom, eu achei que você tivesse imaginado, não é, com todo o seu talento para fazer suposições — Asher cuspiu, a face lívida devido à raiva. — Meus pais me conseguiram esse emprego, e é tudo o que eu sempre sonhei, sabe, então você não pode esperar que eu vire as costas para eles...

— Não estou pedindo isso! — Logan bufou, exasperado. — Estou pedindo para que você não dê as costas para mim, Asher! Não estou falando para você cuspir na cara da sua maldita mãe conservadora ou seja lá o que for que você está pensando, eu só quero...

— Eu sei muito bem o que você quer! — Asher interrompeu, furioso. — Mas é algo que eu não posso te dar, ou será que é muito difícil para você entender isso? — ironizou. — Você disse que queria a mim, que eu era o suficiente, ou será que se esqueceu?

— Acho que foi você quem se esqueceu, Asher — o outro homem rebateu, friamente. — Toda essa ideia de comprar um apartamento, assumir a relação, se casar... — acrescentou, sarcástico. — Foi você quem pensou em tudo. Eu só disse sim.

— Então talvez devesse ter pensado duas vezes! — o grito de Asher fora o mais alto de todos até ali, e chocou Logan o suficiente para calá-lo por algum tempo. — Talvez não devesse ter acreditado em tudo o que eu disse, talvez não devesse ter vivido a droga de uma ilusão!

— Eu estou vivendo a ilusão, Asher? Eu? Você tem certeza disso? — Logan cuspiu, seu tom de voz destilando veneno. — Não sou eu quem está pensando que vai se mudar com um homem para um apartamento que só tem um quarto e uma cama de casal e ainda ser visto como a personificação da heterossexualidade, sabe? Não sou eu que tenho negado quem eu sou por anos só para agradar a outros, nem sou eu que tem medo de se assumir porque não acredito que nenhum dos meus amigos seja verdadeiro e que vão me deixar assim que descobrirem que eu sou gay!

As palavras de Logan instalaram um longo e constrangedor silêncio entre eles; e, porque Logan adorava o silêncio, foi Asher quem decidiu quebrá-lo.

— Acho que você está certo — afirmou, simplesmente. — Você pode ir buscar os seus objetos de decoração de muito bom gosto amanhã, então. Boa sorte encontrando um lugar para colocar todos eles nesse lugar minúsculo.

O choque não impediu que Logan fizesse a pergunta estúpida.

— O que você quer dizer com isso?

— Quero dizer que acabou, Wright. — Asher respondeu, em um tom de voz que indicava a obviedade da resposta. — Olhe pelo lado bom. Pelo menos não vai ter de fazer a mudança.

Os olhos azuis de Logan mantiveram-se fixos nas íris muito verdes de Asher pelo que lhes pareceu uma eternidade, mas, daquela vez, nenhum dos dois pôs um fim ao silêncio.

Logan se limitou a dar as costas a Asher, saindo do apartamento e batendo a porta de madeira com força atrás de si.

Retornou mais tarde naquela noite para encontrar um apartamento mais espaçoso do que jamais estivera antes. Ainda havia algumas caixas de papelão aqui e ali, mas as caixas de pizza não estavam mais espalhadas pelo chão, e a camisa xadrez que era a favorita de Asher desaparecera de cima do sofá.

Não havia sinal do homem com quem compartilhara o apartamento por tantos anos. (Nunca mais haveria sinal algum dele por ali, Logan imaginava.)

Depois de tudo o que Asher dissera naquela noite, não deveria doer tanto.

Mas doía.

Gostar de garotos era complicado demais.

Talvez fosse humilhante demais procurá-lo depois daquela noite. A que nível alguém – mesmo ele – poderia chegar?

Talvez fosse humilhante demais procurá-lo depois daquela noite, de dezenas de mensagens de texto deixadas sem resposta e de recados ditados para a secretária eletrônica, chamadas nunca retornadas.

Talvez fosse humilhante demais sequer fazer o esforço de procurá-lo após tudo aquilo, especialmente quando tivera que ir até ali para procurá-lo. Deveria ser a sua casa também, o prédio imponente parecia insistir em lembrá-lo.

Logan nunca se importara muito em se humilhar em prol de um bem maior.

Mas bens maiores, tal como contos de fadas, não passavam de mera ficção.

(“Sinto muito, senhor Wright. O senhor Dallas insistiu para que eu não o deixe subir.”)

[fez-se do amigo próximo o distante, fez-se da vida uma aventura errante

de repente, não mais que de repente.]


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