Reiko.

Dizer que o induzi não era exatamente uma mentira, mas acho que a colocação ficaria melhor se eu dissesse que o provoquei e isso gerou uma consequência já esperada. E por isso não era exatamente tudo culpa dele.

— Porque Reiko-chan ? - Ela dizia um tanto surpresa.

— Por favor use o “san.” - Falei. - Reiko-san.

Olhei para a água, apertei mais minhas pernas mais contra meu corpo.

Não gostava de me lembrar daquela noite, mas era inevitável que a  lembrança não viesse a minha mente. Naquela noite eu estava especialmente irritada por não ter as respostas que queria. Queria saber o motivo de estar ali e porquê não podia ser outra garota em meu lugar. Eu estava ciente que havia pessoas com a vida pior que a minha, minha vida não era lá tão ruim, afinal nada me faltava. Embora eu soubesse de tudo isso eu não conseguia deixar de me irritar com a minha situação atual, por que eu deveria estar a mercê dele, ou melhor deles ?! Por que eu deveria ser humilhada e aceitar isso de forma obediente ?! Isso tudo para mim era um ultraje! Eu que nunca deixei que pisassem em mim, que sempre dei a ultima resposta e que se necessário entraria em um briga por um motivo qualquer apenas para defender meu orgulho, estava agora tendo que acatar ordens, fazer o que não queria para atender o desejos dos outros, dessa forma eu me perderia e deixaria de ser eu mesma, qual seria a diferença  entre mim e um fantoche ?

Olhei para o céu escuro, as nuvens escondiam as estrelas a única coisa que ficava a mostra era a lua.

— Reiko-san você parece tão solitária. - Ouvi a voz de Kanato, embora as palavras fossem gentis a entonação na voz dele o fazia parecer alegre por minha situação.

Olhei para o lugar de onde vinha o som, senti meu coração disparar por um momento. Kanato estava muito próximo com seus olhos pregados em mim. Por que eles tinham sempre que surgir do nada ? Revirei os olhos e olhei para frente, para a lua.

— Mas tudo bem. - Falou ele usando um mansidão na voz. - Essa aura solitária a deixa mais bonita.

Havia muitas coisas que eu odiava naquela mansão e com certeza Kanato estava entre elas. Odiava o fato dele ser tão imprevisível, ou o fato de ser tão difícil compreendê-lo e por esse motivo eu tinha sempre que ser cuidadosa no que falava ou fazia em sua presença para não irrita-lo.

— Ela está nos ignorando Teddy ? - Ouvi Kanato sussurrar.

— O que há de tão ruim em ser ignorado ? -Indaguei. - Você não poderia simplesmente me ignorar agora ?

Ele ficou em silêncio durante alguns segundos. Olhei para ele, nunca havia visto a expressão de raiva dele ser tão intensa. Kanato se aproximou e eu me afastei, talvez tivesse sido uma má ideia responde-lo, mas agora já estava feito. Kanato agarrou meu pulso e o apertou infringindo em mim a dor e me impedindo de fugir.

— Com quem pensa que está falando ? - Gritou ele com raiva. - Como você ousa falar assim comigo, quando não passa de uma mortal nojenta e inútil ?

Engoli em seco e forcei meu maxilar contra a minha mandíbula tive medo que caso não fizesse isso começaria a tremer. Eu estava com medo, eu tinha medo dele, afinal eu era tão fraca comparada a ele e a qualquer um nessa mansão e na lista das coisas que eu odiava nesse lugar estava sempre estar com medo.

Kanato puxou meu pulso para frente e assim que eu fui para frente ele levou a mão a minha garganta a apertando. Será que seria hoje que meu sofrimento acabaria ?

— Desobedecendo a mim! - Gritou ele. - Mesmo sendo só uma bolsa de sangue…

Puxei o ar, mas estava difícil respirar. Kanato se aproximou e sem se demorar puxou minha camisa para o lado e cravou seus caninos na curva entre meu pescoço e meu ombro. Senti a presas irem fundo em minha carne, emiti um grunhido de dor. Quanto mais ele drenava meu sangue mais ele apertava minha garganta.

Se fosse para mim sofrer eu sofreria com um mínimo de dignidade e se eu morresse pelo menos morreria com minha personalidade e caráter intactos, afinal fora isso eu não tinha mais nada a perder mesmo.

— Mortal nojenta e inútil ? Talvez eu seja. - Disse. - Mas não quero ouvir isso de um Imortal doente que tem como hobbie conversar com urso feio inanimado e sem vida!

Kanato parou de chupar meu sangue e ficou imóvel por um instante e após afrouxou sua mão em minha garganta. “A calmaria antes da tempestade.” Pensei. Ele deslizou a mão para o meu ombro e apertou fortemente o local a dor era tanta que soube que se ele apertasse mais talvez meu osso se quebrasse. Mordi meu lábio inferior não queria dar a ele o prazer dos meus gritos de dor.

— Ninguém que fala mal do Teddy merece perdão! - Gritou ele.

Kanato puxou meu ombro para o lado e eu fui junto mas antes ouvi o estalo que o meu ombro fez ao se deslocar, soltei um grito involuntário e cai no chão. Ouvi Kanato rir, olhei para ele e o mesmo colocou a mão na barriga.

— Você é tão fraca que chega a ser patética! - Ele disse entre as gargalhada.

Kanato abriu um sorriso desagradável que deixava claro que ele tinha algo diabólico em mente. Ele se aproximou de mim e se abaixou, o mesmo levou a mão ao meu queixo e o ergueu lentamente me obrigando a olhá-lo, com sua outra mão ele roçou as costas dos dedos em minha bochecha.

— Isso não é ótimo Reiko-san. - Ele disse de forma sorridente e calma. - Se me pedir perdão e se arrastar da forma mais humilhante  e repulsiva, quem saiba eu te perdoe.

Olhei para os lábios dele, eu odiava aquele sorriso psicopata. Abri um sorriso.
A dor era intensa eu não estava mais aguentando aquilo, tudo logo acabaria. “Aguente por apenas mais um momento, só mais um pouco.” Pensei me auto encorajando.

— Quem faria isso ? - Indaguei. - Não posso pedir perdão se não me arrependo!

A expressão no rosto dele mudou drasticamente no mesmo momento. Ele me olhou sério seus olhos encaravam os meus de uma forma que não me permitiam desviar o olhar, Kanato escorregou sua mão do meu queixo para o meu pescoço novamente, ele apertou e me ergueu do chão, fechei os olhos logo essa dor iria passar… só mais um pouco. Abri os olhos a expressão dele era de indiferença.

— Se não vai me obedecer… - Falou ele em uma mistura de calma e descaso.  - Apenas morra.

Kanato me arremessou pela sacada, assim que senti minha garganta livre de sua mão abri um sorriso. Minha visão estava voltada para o céu, e dessa vez havia pelo menos uma estrela no mesmo. Senti o vento passar por minha pele e era essa minha última lembrança daquele dia.

— Por que Reiko-san ? -Ela repetiu melancólica.

— Apenas porque havia cansado. - Falei. - Assim como já me cansei desse assunto.