Giselle Crowe Hook

"Não há necessidade de grelhas, o inferno são os outros."

Jean-Paul Sartre

Giselle abriu os olhos de repente, mas logo os fechou. Sua cabeça latejava incansavelmente, pulsando a cada batida de seu coração. Ela sempre odiou as manhãs seguintes de ressaca, e agora se recriminava por ter exagerado na bebida de copo-de-leite, a qual ela sabia que Henry e Fabian tinham batizado logo depois da meia-noite. Pelo menos não estou com ressaca moral...

Ela tentou não rir, para não doer mais sua cabeça, ao se lembrar de algumas cenas da noite anterior. Daniella pular em cima de um cara chamado Haldor, o qual, risonho, a pegou para dançar mesmo cambaleando. A Edythe subir em cima da mesa para dançar e cair no colo do Petter, ao lado de Jay e Rosabelle. A Mal dançar até o chão, sendo pega no flagra pelo sogro que, por um motivo ainda desconhecido, voltou para a festa meia hora depois. Ainda bem que não aprontei nada demais dessa vez...

Ela tentou se lembrar de mais coisas que havia acontecido na festa, e diversos flashs passaram pela sua cabeça. Janessa dançando com Franklin; Eleanor quase ficando com Jason; Andrew andando com Addyson pelo salão; Henry se atracando com uma menina X num canto; Alderick dando em cima de Heather na frente de sua família; Matthew sentado na mesa, olhando o próprio copo; Pandora sumida; Fabian derrubando bebida na roupa de Teresa...

A garota fechou os olhos e tentou se lembrar do seu sonho, querendo esquecer dos micos dos outros para não acabar rindo e piorando a dor. Contudo, ela só se lembrava do rosto de seus pais, imaginando as suas reações costumeiras após uma noitada dela com os meninos. Seu pai iria apenas ameaçá-la para não aparecer grávida e sua mãe iria ignorá-la.

Gothel sempre tentou manipular a filha, desde pequena; contudo, quando a menina fez 12 anos, percebeu que ela não era como Rapunzel, então apenas passou a fingir que Giselle era apenas alguém que ela gentilmente deixara ficar por perto, sem se importar mais com ela. Giselle, no começo, se importou com esse distanciamento de sua mãe, a qual já nem próxima era antes. No entanto, passou a achar isso até melhor do que ficar ouvindo reclamações infundadas sobre ela sempre saber melhor das coisas. Mal Giselle sabia que seu visual de pirata ligeiramente antiquado era um reflexo dessa renúncia.

Giselle olhou devagar para o lado, querendo ver se Pandora ainda estava dormindo, porém a cama de sua colega de quarto já estava arrumada. A Hook se levantou devagar para ir até o banheiro, decidida a tirar a maquiagem, o que não teve condições de fazer após a festa. No caminho, não viu sinais nem da roupa da Black, a fazendo imaginar, lentamente, o que havia acontecido. Contudo, assim que entrou no banheiro viu um copo com água ao lado de um remédio para dor de cabeça.

— É Pan... - A garota pegou o lacre de plástico do remédio e o girou entre os dedos. - Você não é tão indiferente à gente quanto quer ser...

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Heather saiu do banheiro enrolada numa toalha rosa bebê (a qual ela odiava sinceramente) e se sentou em sua cama. Daniella ainda dormia, jogada sobre os lençóis e com um braço caído ao lado do colchão. A ruiva deitou suas costas no colchão e observou seu dossel vermelho, ansiosa pelo dia seguinte. Ela sabia que o povo de Auradon iria, no mínimo, ficar surpreso... Mas ela não dava a mínima para isso. A Heart não queria admitir, mas sentia falta deles. Eles a faziam se sentir em casa.

Heather balançou a cabeça e se levantou, indo até o seu armário e pegando o primeiro vestido que viu. Um vermelho um pouco mais escuro do que estava acostumada... Ela se lembrou das palavras de Alderick na noite anterior, o qual olhava sempre de relance para os pais, parecendo quase esperançoso que eles o vissem perto dela. A ruiva fechou a porta com força, imaginando que ele poderia estar tentando usá-la para algo; voltou até o banheiro, colocando antes o braço da colega em cima da cama.

Assim que fechou a porta, se olhou no espelho pela primeira vez desde que acordou: haviam bolsas escuras enormes embaixo de seus olhos e ela parecia um pouco mais pálida do que o normal. A ruiva sabia muito bem que seu estado não era por causa de uma noite mal dormida; até porque foi ela que acabou com a festa quando Henry e Fabian decidiram utilizar seus fogos de artifício caseiros malditos dentro do salão. Heather odiava esses fogos, sobretudo depois de ter sido vítima de um deles pouco antes de irem para Auradon. E ela não havia os perdoado completamente por isso, mesmo após mais de um mês. Ela sentira muito pela unha quebrada...

Heather ficou até aliviada por ter conseguido impedir que eles soltassem mais de um, e felizmente o que soltaram era pequeno. Contudo, isso não a impediu de finalizar a festa na hora, mesmo sob protestos. E pela primeira vez, sozinha. Pandora sumiu de repente, sem deixar rastros. E a ruiva imaginava que era por culpa de Giselle, visto que, se pudesse, também teria sumido. Ela definitivamente não queria saber o que a Hook sabia. Ela não queria que todos soubessem como a sua família fora traída pela Kingsley e pelo Hatter. Ela não queria que todos soubessem o quanto ela queria cortar-lhes as cabeças por isso, mesmo que tal ato seja quase uma tradição ultrapassada na realeza de Wonderland. Ela não queria.

No entanto, a ruiva deixou a mente esquecer disso por mais alguns momentos, enquanto terminava de ajeitar o vestido e voltava-se para o espelho, pronta para passar a primeira camada de maquiagem. Ela pensava que talvez quisesse saber o passado de Pandora e Petter; talvez quisesse saber o problema de Daniella; talvez ela quisesse ajudar Matthew como ele a ajudou nos primeiros dias em Auradon: a não se pressionar tanto, tentando alcançar a perfeição intangível que imaginavam que seus pais esperavam. Talvez ela quisesse fazer parte do grupo, e que eles também fizessem parte. De verdade.

Heather analisou o colar sobre seu pescoço, vendo o seu reflexo reluzir em cores vermelhas.

— Cartas... - E sua maquiagem estava pronta antes mesmo dela pegar no primeiro pincel. - Cartas. - E seu cabelo estava perfeitamente arrumado num coque lindamente desleixado. - É Heather... Você está começando a pegar o jeito...

A ruiva se olhou mais uma vez no espelho, piscou para o seu reflexo e saiu, imaginando quem deveria estar no refeitório para o almoço.

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Já passavam das 14:00 e Janessa estava sentada sob a sombra de uma árvore, numa parte do campus quase escondida de todos. Ela se lembrava perfeitamente de todos os detalhes da noite anterior: ela em cima do palco; ela sentada na mesa dos perdidos; ela não escutando mais elogios de sua mãe do que o suficiente; ela dançando com o Frank, sustentando um sorriso plastificado.

A loira queria ter ficado mais tempo com os ex-residentes da ilha, por eles não parecerem falsos ao lado dela. Eles agiam como queriam, falavam com qualquer um como queriam e não limitavam suas palavras temerosos com os sentimentos dos outros. Eles pareciam, para ela, os mais sinceros da festa. Algo que com certeza Janessa não fora. Que sua mãe não fora. Que Frank não fora. Nem Ezra e Andrew, que quase bateram boca durante o jantar. Tanto antes quanto depois da aparição repentina da Black. Aparição estranha, diga-se de passagem...

Janessa tomou coragem e se levantou; ela já estava ali desde as 9:40 e não havia colocado nada na boca desde o café da manhã fraco, o qual só tinha uma torrada e um copo de água. Seu estômago roncava a cada passo que ela dava, forçando seus lábios num sorriso leve. Ninguém precisava saber o que ela sentia ou pensava.

Assim que chegou na cozinha, encontrou Addyson sentada sob uma banqueta, comendo um sanduíche natural. A Frost hesitou e pensou duas vezes se não preferia voltar outra hora, mas a Kingsley escutou um barulho e olhou para trás, encontrando a outra parada com a mão na porta.

— Não vai entrar Frost? Ou tem medo de ser atacada por um sanduíche?

— Que sanduíche? Um atacado por você? Ele não teria força nem para me alcançar Kingsley... - Janessa respondeu, entrando devagar no ambiente.

— Está me chamando de fraca? - A loira girou sobre a banqueta, com o sanduíche em mãos.

— Se a carapuça serviu... - Janessa não falou mais nada. Apenas foi até a grande geladeira para ver o que tinha lá dentro. Nada além de ingredientes para o jantar. E com certeza ela não estava a fim de cozinhar numa hora dessas.

— Também não almoçou? - Addyson tentou puxar conversa, com um sorriso torto e irônico no rosto.

— E isso te interessa?

— Credo Frost... Quanta má educação você tem a oferecer às pessoas... - Janessa detestava ficar a sós com a Kingsley, sobretudo porque o esporte favorito dela parecia ser implicar quando estavam sozinhas. - Deve ser por isso que sua mãe não gosta tanto de você...

— Do que você está falando...?!?!?! - Janessa virou lentamente para a outra, segurando o gelo nas mãos.

— Do que todos já sabem... Do que todos perceberam na festa... Sua mãe não parecia tão entusiasmada com a apresentação que você montou... - Addyson sorria cada vez mais ao ver as bochechas da outra ficarem vermelhas. - Aposto que se tudo tivesse sido montado pelo Andrew, ela teria amado...

— Cala a boca Kingsley!!!

— Nossa!! Que linguajar princesa... Deveria aprender a escutar as verdades... Por que, convenhamos, faz tempo que sua mãe está te tratando assim, não está? A Tere me contou o quanto ela está sendo dura com você... Se você fosse menos arrogante e pedisse a minha ajuda... - Addyson transformou seu sorriso rapidamente para inocente e logo depois para malvado. - Eu te ensinaria a ser alguém decente; alguém de quem sua mãe poderia finalmente se orgulhar! Visto que a Janessa atual não a agrada muito...

A loira colocou o seu sanduíche no prato, enrolado no papel toalha, limpou rapidamente a mão e se levantou ainda sorrindo.

— É simplesmente curioso o fato de você ficar tão quietinha quando está sozinha, tão diferente do ar que carrega quando está com suas amigas...

— Olha quem fala! A garota falsa que finge ser uma completa Santa quando está em público!! - Janessa cruzou os braços em frente ao peito, se segurando para não fazer nada ou demonstrar qualquer outra emoção. Já Addyson, riu quase cruel para a outra, mostrando o quanto se importava por suas palavras.

— Se quiser, pode ficar com o resto do meu sanduíche... Eu não me importo de dividir com pessoas de almas menos afortunadas... - A loira piscou um olho e saiu rebolando da cozinha, deixando uma Janessa com os olhos marejadas para trás.

— Vadia...!!! Deve ter uma alma tão pura quanto a Ursula!! - A loira limpou uma lágrima teimosa e começou a ir para fora da cozinha, não querendo pensar nas palavras da outra. Contudo, parou ao ver o sanduíche no prato.

Janessa sentiu o sangue ferver ainda mais e pegou o sanduíche, tacando-o na parede do fundo do ambiente. Ela observou, como se acontecesse lentamente, o alface, o tomate e o queijo caírem sobre o balcão e no chão brilhante. Ela não sabia o que era pior: Addyson saber ou ela não ter respondido nada. Provavelmente a segunda opção...

A Frost ergueu novamente o rosto, limpou as lágrimas e andou como uma rainha até a comida jogada. Ela limpou tudo, deixando tão brilhante quanto antes e saiu da cozinha, sem ter pegado nada para comer. Se botasse qualquer coisa no estômago, sabia que iria jogar para fora no mesmo instante.

— Pode tentar Kingsley, mas eu não vou abaixar minha cabeça... - Ela forçou mais uma vez o sorriso e pensou apenas no quão poderosa ela era. Janessa era uma das herdeiras do trono de um dos reinos mais importantes afinal. - Eu sou da realeza... Você é apenas uma invejosa da ralé que, se chegar ao trono, vai ser apenas princesa consorte!! Uma coroa como a minha, você nunca terá!!!

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Matthew acordou devagar na segunda-feira, antes mesmo do nascer do sol. Ele não queria admitir, mas estava ansioso pela primeira vez desde que chegou em Auradon. Finalmente parecia que eles estavam avançando no plano, e isso faria seu pai se orgulhar dele.

Mor'du planejou ficar mais um pouco na cama, mas uma ruiva entrou no quarto com tudo, jogando o moreno para fora da cama.

— Isso são horas para se estar na cama Matthew??? Eles já vão chegar!!!

— Ainda tem tempo Heather!! - Matthew respondeu se segurando para não gritar, enquanto se levantava do chão. - Não vai se desculpar por ter me jogado da minha cama??

— Se toca! Sou uma princesa!! Eu não peço desculpas!! Eu não erro!! Quem faz isso são os outros!! Então trate de se arrumar rápido, porque temos muito a fazer hoje!!

Dizendo isso, a ruiva sai do quarto de Matthew, sem vê-lo rolar os olhos e voltar para a cama. Ela cruzou o Hall, querendo chegar ao seu quarto e ver se Daniella já estava pronta; contudo, uma mão segurou de leve seu ombro, a impedindo de continuar.

— Oi Heather... Você está me evitando? - Ela se virou e encontrou Alderick a olhando sorridente e ansioso.

— Por que pensa isso, Haddock? Eu não teria motivos para te evitar... Assim como não tenho para falar com você! Então, se me der licença...

— Eu disse algo na festa! Foi isso, não é? Me diga o que foi!

— O que você teria falado? Eu não sei do que você está falando agora... Então, se me der licença, tenho coisas mais interessantes a fazer do que olhar para você...

Assim ela voltou a ir para o quarto, com a raiva prestes a borbulhar em suas veias. Assim que chegou no corredor, foi parada de novo, mas dessa vez por Giselle.

— E aí princesa? Ansiosa? - A ruiva olhou para a outra, que estava apoiada na parede ao lado da porta de seu quarto, a qual ainda estava aberta.

— Que roupa é essa, Hook?? Você parece mais antiquada a cada dia... Fala sério.. Aliás, não vai fechar sua porta?

— Você vai me responder?

— Não! Chama a Pandora e vem pro meu quarto. Temos assuntos importantes a tratar.

— Ela não está no quarto. - Respondeu a Hook, fechando a porta.

— Onde ela está?

— Não faço a mínima ideia...

...

Heather estava parada ao lado de Daniella e Matthew, nervosa pela demora. Todos da ilha estavam no mesmo lugar em que chegaram, esperando. O Rei Ben estava ansioso e ao lado da namorada, debatendo consigo mesmo se aquela fora realmente uma boa ideia. Mais pessoas da ilha?! O Conselho vai me matar! Ele olhou para a estrada e viu ao longe uma limusine preta se aproximar, no mesmo instante que algumas pessoas de Auradon chegaram surpresas.

O carro parou em frente à eles, e a porta foi rapidamente aberta por um garoto de cabelos castanhos encaracolados, olhos muito azuis e um sorriso gigante no rosto. Ele, assim que sai, andou com a sutileza de um gato até Heather e a abraçou fortemente. Em seguida, saiu uma garota muito branca e com cabelos loiros muito claros amarrados numa maria chiquinha. Atrás dela, saiu um garoto de cabelos castanhos escuros lisos e jogados para trás e olhos verdes escuros.

— Não acredito que vocês chegaram!!! - Heather se encaminhou até os outros dois para abraçá-los também. Mal ficou parada ao lado de Ben, segurando uma careta para Heather. Eu não sei se ela estava com saudades dos amigos de casa ou se sentia falta de ser a abelha rainha com súditos andando lealmente sempre atrás dela... 

Os filhos dos heróis não sabiam o que fazer, estarrecidos por terem sido avisados dos novos alunos meia hora antes deles chegarem. Andrew e Rosabelle, que estavam ao lado de Petter, não se seguraram.

— Quem são eles Petter? E por que estão aqui só agora? - A voz de Rosabelle soou nos ouvidos do Black, mas ele estava artodoado demais para responder.

— Vocês viram a Pandora? Ela sumiu desde a festa...

— Eu achei que... - Andrew parou ao olhar em volta e não ver sinal dos cabelos negros dela. Ele abriu a boca para voltar a falar, mas a voz do Rei Ben o impediu.

— Sejam Bem-vindos em Auradon! E sobretudo à Universidade de Auradon. Espero que se sintam à vontade e escolham o bem! - Ele parecia estar soltando um monte de palavras decoradas, provavelmente querendo impedir um fracasso de apresentação como havia sido a anterior. - Esses serão seus colegas durante sua estadia aqui! Estudantes, - Ele finalmente se virou para os outros, quase levando a mão ao rosto para limpar um possível suor de nervoso. - estes são Chris Cat, Whitney Rabbit e Irvine Stayne, filhos de Cheshire Cat, White Rabbit e Ilosovic Stayne, o Valete de Copas.

Os alunos demonstraram diversas emoções diferentes, muitos sem saber o que fazer. No entanto, Chris não olhava nenhum deles à sua frente, e sim a loira que estava na entrada do prédio, surpresa, temerosa e com um meio sorriso no rosto. Addyson Kingsley.