Para não esquecer: Carta para mim mesmo, de Y. S. escrita por starpower Ander


Capítulo 2
Capítulo I


Notas iniciais do capítulo

Finalmente a história começa! Espero que gostem, sinceramente eu acho tão divertido imaginar os pensamentos do Sotaro... foi muito fácil escrever usando o ponto de vista dele.



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Capítulo I

 

26 de novembro de 1995

 

Todos já ouviram falar dos rumores que circulam o colégio Fukatsu, e provavelmente não deve existir um único aluno em toda a escola que nunca tenha escutado pelo menos uma ou duas histórias sobre os supostos fantasmas que assombram os estudantes daqui. Todas são sempre muito parecidas e se repetem a cada novo boato: são espíritos que aparecem para alunos, estudantes que desaparecem misteriosamente e sala de aula que são interditadas sem nenhum motivo aparente.

Eu conhecia muito bem esses boatos, mesmo que nunca tenha me importado ou acreditado neles.

— Ei! Você ouviu que um garoto desapareceu? – disse um colega de classe próximo da minha carteira.

— Não, quem foi? – Respondeu uma garota que eu não lembro o nome.

— Um tal de Momozono-kun da sala B do primeiro ano. Ele não vem pra escola há uns dois dias, antes disso os colegas dele disseram que ele andava meio estranho... – Respondeu ele. Qual era o nome desse cara também?

Eu escutava a conversa de longe, sem realmente me interessar por ela, esses assuntos me cansam. Porém esta não é a mesma opinião do resto da escola, cada vez que um novo boato surge, se espalha como fogo e rapidamente se torna o assunto preferido dos estudantes.

— Talvez ele tenha sido levado por um fantasma! – Respondeu um terceiro que se juntou a conversa.

— Um fantasma?! – A menina estremeceu.

Ou talvez ele só esteja matando aula... Eu pensava.

— Eu ouvi dizer que ele foi comido... Pela sala de aula! – Disse o primeiro.

Isso é ridículo, eu franzi a testa. 

— Comido? A última sala do segundo andar foi interditada, não foi? Ouvi dizer que foi lá que ele desapareceu.  – Respondeu o outro.

Eu volto os meus olhos para o meu caderno, totalmente desinteressado nas suas suposições. Naquela época nunca tinha acontecido nada de esquisito ou sobrenatural comigo então eu não acreditava em nenhum desses boatos. Mesmo assim, era impossível não conhecer alguns deles, todos eram muito estranhos, inclusive havia um sobre um espelho mágico que te leva para outra dimensão.

Concentrei-me em ler o meu caderno, relendo pela quinta vez uma história que escrevi. Procuro por erros gramaticais e palavras que podem ser substituídas para expressar melhor minhas ideias. Não sei de onde surgiu meu prazer em escrever, mas inventar histórias na minha cabeça era uma coisa que costumo fazer desde criança e ao longo do tempo comecei a colocar no papel as ideias que eu tinha. Juntando as partes e conectando-as entre si, eu terminei escrevendo uma história inteira do tamanho de um romance. Esta foi a história mais longa que já escrevi, ela ocupou um caderno inteiro, eu a desenvolvi com muito cuidado e procurei deixa-la bem interessante, no entanto, não consigo parar de pensar que posso melhorá-la e que ainda não está boa o suficiente. Por isso meu caderno possui muitos borrões de palavras apagadas, cortadas ou substituídas.

— Ei, cara! O que você está fazendo? – Perguntou Tsubasa. Ele veio em minha direção com seu sorriso habitual.

— Dever de casa... – Respondi indiferente.

— Não acredito em você. – disse ele se aproximando para olha o meu caderno. – Vamos! Deixe eu ver isso! – Eu cobri o caderno imediatamente com meu braço antes que ele visse qualquer coisa e depois o fechei.

— Ah, porque tanto segredo? Você sabe que eu sou louco pra saber o que tem esse caderno. – Ele estendeu o braço para tentar pega-lo, imediatamente tirei o caderno de seu alcance.

— Não tem nada para ver. – Disse eu mal-humorado.

— Por favor, mesmo que seja hentai eu prometo não contar pra ninguém! – Disse ele chateado.

Hentai? Eu suspirei. Tudo bem, pense o que quiser... Eu não me importo. Revirei os olhos, entediado.

Tsubasa e eu nos conhecemos desde o ginásio, quando eu o defendi de uns garotos valentões certa vez, e desde então ele nunca largou do meu pé. É um dos pouco que falam comigo, e ao contrário de mim, ele é sempre sorridente, popular e costuma estar sempre rodeado pelos seus amigos. Com tanta popularidade, eu não entendo porque ele ainda insiste em falar comigo e ainda tem coragem de pedir que eu mostre-lhe o meu caderno.

Eu nunca mostrei os textos que faço para ninguém, porque eu iria mostrar pra ele? Eu posso ter terminado a história mas ela ainda não está perfeita, ou pelo menos não está boa o bastante para que eu tenha coragem de mostrar para alguém, se eu um dia resolver mostrar. O texto ainda está uma aparência de trabalho amador, e além disso eu sei que Tsubasa iria rir se soubesse que escrevo e como escrevo.

— Não é nada interessante. Deixe pra lá. – Eu suspirei, levantei ainda com o caderno na mão e me afastei de Tsubasa.

— Ei, onde você vai, Yonuki? – Perguntou ele.

— Armários. – Respondi sem me virar pra ele.

— Temos aula de matemática daqui a pouco, não se atrase de novo! – Ainda de costas eu assenti com a minha mão e fui em direção aos armários.

Coloquei meu caderno no armário e o tranquei. Eu sempre o guardo trancado no armário ou o levo comigo, nunca o deixo encima da minha mesa e nem na minha mochila sem que ela esteja comigo, Tsubasa é muito curioso e eu não duvido que ele tentaria lê-lo se tivesse uma chance.

Eu bocejei. Não estava com a mínima vontade de voltar para a sala de aula, o professor de matemática tem uma voz sonífera, e eu já estava cansado. Caminhei na direção oposta a minha classe, decidido a matar aula. Entrei na enfermaria do colégio. Como sempre, olhei em direção a escrivaninha, onde estavam um jarro de flores, um porta retrato e as outras decorações femininas, mas nenhum sinal da Sra. Araki, a professora enfermeira. Para minha sorte ela nunca está aqui.

Venho sempre aqui quando estou entediado para tirar um cochilo. Com um pouco de tempo aprendi a ter um sono leve, então se eu pego a cama próxima da janela, posso acordar e rapidamente saltar por ela se ouvir algum barulho. E mesmo que eu seja pego, a enfermeira sempre acredita quando eu digo que tive uma crise de asma.

Aproximei-me da segunda cama e puxei a cortina, mas já havia alguém lá. Sentada na cama estava uma aluna de cabelos longos, que eu nunca tinha visto antes. Ela segurava a cabeça e parecia um pouco desorientada. A fitei em silêncio por um tempo, com a expressão impassível de sempre. Ela olhou pra mim de volta, com expressão surpresa.

— Hum... Quem é você? – Ela finalmente falou alguma coisa.

Continuei em silêncio, ligeiramente irritado. Como eu nunca a tinha visto antes, imaginei que fosse um ano mais velha ou mais nova do que eu, mas seu uniforme era um pouco diferente...

— Hum... Onde está o Yunoki-sensei? – Ela perguntou novamente.

Quem? Pensei.

— Quem é você? – Perguntei com certa rispidez.

— O que? – Ela me olhou confusa.

— Este é meu lugar. – Disse eu indiferente.

— O que? – Perguntou ela novamente. Ela só sabe dizer isso? Que idiota...

— Aqui. – Apontei para a cama com o queixo, mas a menina mesmo assim continuou confusa. Então ela olhou para a cama e finalmente pareceu entender.

— Oh, está falando desta cama. – Ela disse.

Eu fiquei em um silêncio com minha atitude impassível de sempre. Ela começou ficar desconfortável e eu, a ficar impaciente. Eu me aproximei dela com uma cara irritada.

— O-o que? – Ela perguntou.

— Dá pra você sair daí? Eu quero usá-la. – Eu disse com impaciência.

— Hum... S-sim – Ela respondeu obedientemente.

— Ou quer se deitar ao meu lado? – Provoquei, com um sorriso metido.

— É claro que não! – Ela pulou da cama depois disso.

—Ha! Para que está se apavorando? – Eu dei um sorriso travesso e me aconcheguei na cama de costas para ela.

Pensei que ela iria embora depois de se levantar, mas em vez de ir ela continuou na enfermaria como se procurasse algo pra fazer. Eu virei o pescoço e a encarei.

— Quanto tempo vai ficar aí? – Perguntei irritado. – Estou incomodado só de você estar aí. – Ela é idiota?

— Hum... Sinto muito! – Ela se desculpou.

— Quer mesmo se deitar ao meu lado? – Zombei dela novamente.

— Não... – Ela fez uma expressão ofendida.

Eu olhei para seu corpo de cima a baixo.

— Não estou interessado em garotas como você. – Brinquei com um sorrisinho maldoso.

— Espere aí! – Ela me olhou ofendida.

— Tá, Tá. Então saia daqui. – Acenei com a mão com um gesto que dizia, “Xô, xô”.

Ela me olhou irritada e começou a sair, no entanto, parou e deu meia volta.

— Com licença... – Ela se aproximou.

— O quê? Ainda está aqui? – Eu suspirei irritado.

— Hum... onde está o Yunoki-sensei? – Ela perguntou.

— Yunoki-sensei? – A olhei confuso. O quê? 

— Sim, o professor enfermeiro... – Disse ela.

— Não sei. – Respondi mal-humorado.

— Como? – Ela insistiu, olhando para mim com confusão.

Não conheço nenhum professor com o mesmo nome que o meu nessa escola. De quem ela estava falando?

— O que está dizendo? O nome do professor enfermeiro não é Yunoki. - Virei-me para ela e respondi, confuso suas perguntas estranhas.

— O que? – Disse ela. Garota estranha... Eu pensei. Ela parece completamente perdida. Acho que foi transferida a pouco tempo.

— O nome da professora enfermeira é Araki-sensei, e é uma mulher. – Respondi.

— Araki... – Ela repetiu.

— Não sei se você foi recentemente transferida para cá, mas vou dormir um pouco. – Fechei as cortinas rapidamente.

— E-espere... – Ouvi ela chamar e ignorei.

Virei-me de costas para a cortina e fechei os olhos. Senti que ela continuou ali parada, não ouvi o passo nenhum, mas ouvi um outro pequeno barulho quando ela começou a abrir a cortina. Eu a parei com um resmungo.

— Espero que saiba o que vai acontecer se atrapalhar meu sono. – Ameacei enquanto estava com os olhos fechados. Ela parou e finalmente decidiu me deixar em paz, ouvi seus passos quando deixou a enfermaria.

Finalmente, doce silêncio... Aconcheguei-me na cama e adormeci.

 

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Depois de um rápido cochilo, retornei para a minha sala de aula antes que a Sra. Araki voltasse. Por sorte, professor de inglês ainda não tinha chegado na sala. Tsubasa deu-me um olhar de censura quando eu voltei para o meu lugar, eu o ignorei.

Continuei na escola mesmo depois das aulas terminarem, fiquei na biblioteca revisando minha história, pensando em como melhora-la, estava pensando em reescreve-la em outro caderno mas mudando algumas coisas. Eu estive tão concentrado que nem sequer vi o tempo passar, e quando percebi, estava muito tarde. O relógio da biblioteca marcava seis e meia, já havia passado do horário em que a pessoas que participam das atividades dos clubes começam a voltar para casa. Eu passei muito tempo aqui. Percebi que estava cansado quando bocejei. Levantei-me da cadeira e estiquei os braços para me alongar, então caminhei para fora da escola.

Os corredores estavam vazios e iluminados pelo pôr-do-sol alaranjado. Provavelmente sou o único aluno na escola a sair a essa hora. Peguei a saída pelo campo e então notei que estava enganado. Ao virar o meu olhar para os bancos vi uma garota de cabelos longos sentada sozinha de cabeça baixa. O que ela está fazendo aqui a uma hora dessas? Porque não voltou para casa? É perigoso para uma garota andar sozinha depois de escurecer. Que idiota... Suspirei e decidi ir falar com ela.

— Você... – Eu chamei.

— O quê? – Ela levantou a cabeça e olhou para mim, surpresa. Reconheci o seu rosto imediatamente.— Você... – Ela falou ao olhar para o meu rosto. Era a mesma aluna que conheci hoje cedo na enfermaria.

— O que está fazendo? – Disse eu com um ar de cansaço, ela olhou pra mim com cara de choro. Notei um rastro de lágrimas na sua face. – Ei... Está chorando? – Disse eu surpreso, de repente me sentindo preocupado e desconfortável. – Aconteceu alguma coisa? – Ela não respondeu, apenas olhou-me mais triste, como se não soubesse o que dizer.

Tive pena dela ao ver o seu olhar desamparado, ela deve ter ficado aqui sozinha por muito tempo, visto que suas mãos estavam vermelhas pelo frio e seu queixo estava batendo. Eu suspirei e estendi minha mão para coçar a minha cabeça, sentindo-me mais desconfortável com a situação. Que aborrecimento... Ela pareceu ficar curiosa com o meu gesto, mas continuou em silêncio. Ah... parece que ela não tem onde ficar. 

Não tem outro jeito... O que mais eu poderia fazer? Não podia deixa-la ficar na escola. Mas no fundo eu sabia que isso seria um problema.

— Ahhh.... Se não tem pra onde ir, quer vir pra casa comigo? – Eu propus, desconfortável. 

— Como? – A menina olhou surpresa.

Ok, isso é realmente estranho, eu sei.

— Não sei o que houve, mas você passou o dia inteiro aqui, certo? – Eu expliquei.

— Mas... – Ela começou.

— Você vem ou não? – Perguntei impaciente com sua indecisão.

— Bem... Não... – Ela respondeu bruscamente, inquieta.

— Está planejando acampar aqui? – Eu questionei.

— Hã... – Ela não soube responder. Provavelmente estava se perguntando se devia confiar em mim ou não.

— Além disso, parece que você está aqui a muito tempo. – Argumentei.

— Acho que você percebeu... Ok... – A menina deu um sorrisinho sem graça.

— Droga. Uma garota sempre deve ser sincera. – Coloquei a mão em sua cabeça casualmente, pensando que isso poderia tranquiliza-la, para que confiasse em mim.

Virei-me para andar à frente, ela seguiu logo atrás. Acho que ela decidiu acreditar em mim. Como eu poderia suspeitar que minha vida nunca mais seria a mesma depois deste dia?


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