Prom Queen escrita por Izzy Aguecheek


Capítulo 1
You'll be my king, and I'll be your castle


Notas iniciais do capítulo

Ahoy~~
Então, cá estou eu com mais fanfic gay. A ideia surgiu no meu momento Glee da vida, quando tudo era gay e feliz e colegial...O que nos leva a:
a) Essa história não tem nenhuma pretensão de retratar a realidade dos colegiais norte-americanos ou de qualquer outro lugar.
b) Minha maior inspiração escrevendo essa história foi o livro "Garoto Encontra Garoto', do David Levithan, e, se tudo parecer mais "leve" do que na realidade, é principalmente por isso (e porque essa é pra ser uma fanfic feliz e fofa mesmo, cansei de escrever angst) e
c) Se você gostou da arte da capa, dá uma olhadinha nas redes sociais da artista. Os links estão nas notas da história.
É isso, espero que gostem xD



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You’ll be my king

And I’ll be your castle

 

Você será meu rei

E eu serei seu castelo

            Rent – I’ll Cover You

Sei que as campanhas começaram porque, assim que chego na escola, Carter está esperando junto ao meu armário com um cartaz, pronto para rir da minha cara.

— Olha só, vocês têm até uma logomarca – aponta ele. – Que bonitinho.

Quase o empurro com o ombro, mas me detenho a tempo. Carter é uns vinte centímetros menor do que eu, e pelo menos cinco quilos mais leve. Um empurrão poderia derrubá-lo. Ao invés disso, me inclino para beijá-lo na bochecha.

— Bom dia para você também, Carter.

Ele me segura pela jaqueta e me beija nos lábios. É um gesto surpreendente vindo de Carter, considerando que estamos em público, mas não me importo.

— Bom dia, Jake.

Ao nosso redor, estudantes passam apressados, falando alto e esbarrando uns nos outros. Um ou dois grupinhos nos lançam olhares de reprovação. Algumas garotas nos lançam olhares de inveja. A maioria sequer parece notar que estamos aqui. Os olhares não me incomodam, mas Carter se afasta, ainda segurando o cartaz, e murmura:

— Acho que vou acabar estragando sua candidatura.

— Bem, não tem problema – Tiro o cartaz da mão dele, delicadamente. – Quem quer ser o rei do baile, de qualquer forma? Quer dizer, todos os holofotes são para a rainha, no fim das contas.

Carter aponta para o cartaz, onde uma foto minha divide espaço com a foto de uma garota negra e sorridente, com dreadlocks jogados por cima do ombro.

— Sua candidatura está atrelada à da Maureen. Ela vai me matar.

— Ela vai dizer que não precisa de mim. Maureen poderia ganhar essa coisa com dez segundos de discurso.

E é verdade. Maureen é uma das garotas mais inteligentes que já conheci. Ela pode passar horas discutindo com você sem ficar sem argumentos, e resolver dez cálculos de física antes do café da manhã. Eu sou péssimo em física, especialmente com fome. Carter sempre tenta me consolar dizendo que pelo menos sou bonito; Maureen é os dois, bonita e inteligente, e uma dúzia de outras coisas. Se ela não for eleita rainha do baile, tem alguma coisa muito errada acontecendo.

O sinal toca, anunciando o início das aulas. Carter enrola o cartaz e fecha meus dedos em torno dele.

— Cole em algum lugar visível – aconselha. – Vocês formam um belo casal.

Tento identificar algum traço de ciúme em sua voz; não há nenhum. uma pontada de algo infeliz, que não consigo identificar, mas me faz ter vontade de segurar a mão dele e sugerir que matemos a primeira aula para dar uma volta.

Mas a primeira aula dele é de ciências, e Carter não perderia isso por nada. Então, ele diz:

— Te vejo no almoço?

— Antes – prometo, porque sei que vamos nos esbarrar no corredor nos intervalos entre as aulas. Ele ri.

— Grudento.

Sorrio de volta, me despeço dele e sigo em direção à aula de geografia. Mal noto o cartaz em minha mão; como eu disse, é tudo ideia de Maureen. Ela só me envolveu porque precisava de alguém para concorrer para rei, e sou, segundo ela, o menino mais bonito disponível (há pelo menos quinze caras mais bonitos do que eu na escola, incluindo alguns dos meus ex-namorados, mas ela não gosta deles). Ela também acha que estar no time de futebol vai ajudar.

Encontro-me com Maureen no segundo tempo, na aula de álgebra. Como ela não precisa prestar atenção e eu preferiria morrer, passamos agradáveis cinquenta minutos conversando em voz baixa no fundo da sala. Nosso professor, o Sr. Thompson, não dá a mínima. Segundo Carter, ele só está aqui porque teve sua carreira de ator frustrada.

— Você viu os cartazes? – pergunta Maureen, em um sussurro teatral. Tiro da bolsa o que Carter me entregou. Quase o amassei e joguei no lixo, simplesmente porque há muitos deles, mas me contive, pelo bem de Maureen. E pelo meu também, caso ela descobrisse.

— Carter enfiou isso na minha cara assim que pisei na escola – digo.

Um sorriso curva os lábios de Maureen. Quando ela me pediu para ser seu candidato a rei do baile, perguntei se o fato de eu e Carter sermos abertamente um casal há mais de seis meses não atrapalharia. Ela disse que apelaria para o lado LGBT+ da escola: uma garota bissexual e um garoto gay concorrendo juntos. Representatividade, ela disse. É uma ideia legal. A comunidade LGBT+ é bastante presente em nossa escola.

— Ele está com ciúmes?

— Deus, espero que não – Penso no sorriso dele ao me apresentar o cartaz. – Na verdade, acho que está se divertindo com a minha falta de jeito para isso.

Maureen me cutuca na altura das costelas.

— Vamos, ânimo. Nossa campanha nem começou. Faça um esforço.

Suspiro, embora não possa deixar de sorrir.

— Tudo bem, vou me esforçar. Só porque você quem pediu.

— Veja pelo lado bom – diz ela. – Você agora sabe se pode formar um casal fofo com uma menina.

Penso nas palavras de Carter. E penso que talvez ele esteja com ciúmes, afinal.

— Carter disse que formamos um belo casal – digo, sem pensar. Minha voz soa quase melancólica, e Maureen me dá tapinhas nas costas.

— Nunca seríamos tão fofos quanto você e Carter – diz, em tom tranquilizador. Sorrio.

— Porque eu jogo no outro time?

Maureen sorri de volta, exibindo os dentes perfeitos que invejei durante todo o fundamental, quando usei aparelho ortodôntico.

— Porque vocês foram feitos um para o outro.

A frase é melosa de um jeito que combina comigo, mas não com Maureen, e lembro por que aceitei ajudá-la.

— Você é uma fofa – digo, e ela imediatamente fecha a cara, fingindo raiva.

— Não sou fofa, sou punk rock – Ela não resiste, e sua careta se desfaz. – Você é o fofo.

— Por isso que você me quis como seu rei?

Ela me dá um tapa fraco, de brincadeira.

— Não, idiota. Porque é você.

***

Antes do quarto tempo, pelo menos três pessoas – dois caras e uma garota - me param no corredor para fazer comentários ofensivos sobre minha candidatura a rei da formatura. Na hora do almoço, já estou com pena das pessoas que concorrem a cargos públicos importantes de verdade.

— Eu teria um colapso nervoso – digo a Maureen. – Quer dizer, agora não estou incomodado, mas isso é em uma escala bem menor.

Estamos sentados na mesa de sempre, esperando Carter se juntar a nós. Nossa outra acompanhante de costume, uma menina loira chamada Denise, faltou à aula, por estar doente.

— Elas sabem que estão fazendo algo importante – aponta Maureen. – Os lucros superam os prejuízos, eu acho.

Ela parece despreocupada como sempre, comendo seu prato vegetariano de costume. E não é que eu esteja preocupado de verdade com os comentários maldosos; aguentei coisa pior quando saí do armário, e muito pior quando dei um beijo no meu ex-namorado em plena final de campeonato (claro, ele ainda era meu namorado na época).

Eu só realmente não entendo por que as pessoas se importam tanto. Quer dizer, é só uma coroa de plástico, e somos só eu e Maureen. As pessoas nos conhecem. Elas até gostam de nós. Bem, as que não se incomodam com banalidades, como o gênero das pessoas que nós beijamos. Mas não somos nada especial.

Maureen e eu interrompemos o assunto quando Carter se junta a nós. Não há nenhum acordo verbal sobre isso, mas acho que nenhum de nós acha que ele vai se interessar pelo assunto; Carter, porém, prova que estamos errados.

— Então, já descobriram quem são os concorrentes de vocês? – pergunta ele alegremente, espetando um pedaço de carne com o garfo. – Para rei e rainha do baile, quer dizer.

Olho para Maureen, porque não, ainda não descobri. Ela não me decepciona, não hesitando em começar a desfiar uma lista de nomes, acompanhados de longos comentários sobre os candidatos. Carter ouve tudo atentamente; eu não. Reconheço apenas dois nomes: o de um ex-quase-namorado, com quem ninguém além das pessoas ao redor desta mesa sabe que já me envolvi, e o de uma ex-namorada dele, que, aparentemente, não é mais ex. Não me preocupo. Se Maureen enfiar na cabeça que vai vencer essa competição, ela vai. Ela é incrível assim.

E suponho que meu rostinho bonito vá ajudar. Deixo a cabeça cair no ombro de Carter, o que me deixa em uma posição esquisita, já que ele é mais baixo que eu.

— Meu Deus – digo. – Isso já começou a me cansar.

Carter cutuca meu ombro.

— Pare de ser molenga. O que seu treinador diria?

— Hmm – Meu pescoço começa a doer, mas não me movo. – Para parar de pensar nisso e me concentrar no jogo?

Do outro lado da mesa, Maureen revira os olhos, se levantando.

— Dramático. Bem, de qualquer jeito, vocês dois estão me dando vontade de vomitar, e eu fiquei de procurar a Claire antes do próximo tempo, então, se me dão licença...

Ela se afasta, os dreadlocks balançando hipnoticamente enquanto ela anda. Carter olha para mim e dá risada.

— Você realmente não nasceu para posições de poder, né?

Franzo a testa, me afastando para poder ver a expressão dele.

— O que você quer dizer?

— Você não sabe lidar com a atenção das pessoas – diz Carter, gesticulando vagamente. – É, tipo, quase como se você não notasse o quanto você se destaca.

— Eu noto – protesto. – Eu só... Não me importo? Não entendo, na verdade.

Carter aponta o garfo na minha direção, ameaçador.

— Se você disser que é “só” você, vou enfiar isso aqui no seu olho – ameaça. Dou uma risada desconfortável.

— Mas sou só eu, mesmo.

— Ah, claro. Estrela do time de futebol, garoto mais bonito da escola, ótimo aluno, e futuro rei do baile de outono – Ele revira os olhos. – “Só” você.

Começo a argumentar que, na verdade, sou só um jogador mediano, com uma beleza mediana e notas medianas, mas Carter parece irritado de verdade. Imediatamente, seguro a mão dele debaixo da mesa, afagando-a carinhosamente.

— Tudo bem, tudo bem – digo, já esquecendo meus argumentos. – Eu realmente não nasci para posições de poder – Faço uma pausa, pensativo. – Acho que foi por isso que nunca virei capitão do time.

— Deve ter sido – concorda Carter. Ele parece mais tranquilo agora, e até apoia a cabeça no meu ombro, coisa que dificilmente faz, em público ou não. – Você é bom o suficiente para isso.

A melancolia na voz dele me deixa inquieto. A verdade é que, apesar de estarmos juntos há mais de seis meses, tenho a impressão de que nunca vou entender Carter completamente.

— Bem, eu sei lidar com a sua atenção – digo, segurando o queixo dele para fazê-lo olhar para mim. – Mas faz um tempo que você não tem tempo para me ceder um pouco.

Balanço as sobrancelhas maliciosamente, o que faz com que ele ria.

— Você pode ir pra minha casa depois da aula – sugere. Não soa nem um pouco malicioso, porque nós nunca realmente fazemos nada, mas há uma pontada de esperança. – Quer dizer, se Maureen não quiser que você ajude em alguma coisa da campanha.

— Não dou a mínima para a campanha – confesso. – Prefiro passar meu tempo com você.

Inclino-me para beijá-lo, porque, bem, essa declaração pede por um beijo, mas Carter está rindo de novo.

— Mas você se importa com a Maureen – aponta ele. – E eu totalmente apoio que você dê o seu melhor para ajudá-la. Quer dizer, Deus sabe que precisamos de uma rainha do baile que nos represente. A todos nós.

Não sei se ele está falando do fato de eu ser gay e ele, bissexual, ou se está se referindo ao fato de sermos todos meio esquisitos, mas concordo. Roubo um beijo rápido dele; meu coração dói ao vê-lo olhar discretamente para os lados.

— Eu vou ajudar – prometo. – Mas vou à sua casa, também. A Maureen vai entender. Ela sabe que nenhuma rainha vai realmente dar certo comigo.

Carter sorri, levantando as sobrancelhas.

— E quanto a um rei?

É preciso muito esforço para não beijá-lo de novo.

— Só um.

O sinal anunciando o fim do horário de almoço soa, interrompendo nosso raro momento de casal meloso. Carter e eu nos despedimos rapidamente, mas, enquanto caminho para a aula de – eca – química, continuo pensando na nossa conversa. Não é só sobre ser gay; é sobre estar apaixonado por Carter. Quer dizer, as rainhas que me desculpem, mas este rei já tem dono. Bem, este candidato a rei. Tanto faz.

Enquanto finjo prestar atenção nos cálculos de estequiometria na lousa, uma ideia começa a se formar em minha mente. É insana, e soa quase como uma traição a Maureen, mas sinto que ela me apoiaria. Torço para que sim. Afinal, é como Carter disse: precisamos de alguém que nos represente. Algo que nos represente.

Arquivo a ideia para contar a ela mais tarde.

Por favor, por favor. Seria tão incrível se funcionasse.

***

No fim das contas, acabo ajudando Maureen com a campanha depois da aula, na casa de Carter mesmo. Bem, mais ou menos isso. Ela pediu a ajuda dele para editar imagens para a divulgação online, e minha ajuda se resume a trazer copos d’água para ele enquanto ele mexe no Photoshop e tentar com afinco distraí-lo da tarefa com beijinhos estratégicos.

— Se você não parar, vou colocar chifres na sua imagem do cartaz – ameaça Carter. Ele está sentado de pernas cruzadas na cama, com o computador à sua frente, enquanto eu me debruço por trás dele e distribuo beijos em seu pescoço.

— Pode colocar – murmuro. – Não dou a mínima.

— Mas ninguém vai votar em você, e aí a Maureen vai te matar.

— Não ligo – repito. Afasto-me um pouco para espiar a tela do computador por cima do ombro dele. – Ei, você já devia ter terminado. Não tem mais no que mexer aí.

Carter me olha de cara feia, mas sua voz tem menos certeza quando ele diz:

— Preciso ter certeza de que vocês vão ganhar. Sabe Deus o prestígio que namorar o rei do baile vai me trazer.

A última frase é repleta de sarcasmo. Escondo o rosto no ombro dele, fechando os olhos e inalando o cheiro familiar. Hesito. Penso na expressão que ele fará quando ouvir minha ideia, imagino-o se afastando para poder me encarar, e a discussão que teremos depois. Respiro fundo e digo:

— Você poderia ser o rei.

A reação de Carter não é tão exagerada quanto eu pensava. Ele nem se mexe. Não acho que ele tenha entendido direito.

— E me candidatar contra você? – Carter ergue as sobrancelhas, ainda concentrado na tela do computador. – Eu não teria a menor chance.

Estico o braço para pegar uma das mãos dele, impedindo-o de continuar modificando a foto.

— Contra mim, não. Comigo.

Demora alguns segundos para que todo o significado do que falei seja absorvido por Carter, e, quando ele se afasta para me olhar, como eu sabia que faria, o faz devagar, cuidadoso, como se eu tivesse feito uma piada.

— Você não pode estar falando sério – diz, por fim.

— Estou – respondo. – Quero que você se candidate comigo.

— Maureen vai me matar.

— Eu falo com ela. Ela vai entender.

Carter continua me encarando, e eu sustento o olhar. Os olhos dele são enormes, francos e assustados, e têm uma ponta de algo que quero muito acreditar que seja esperança. Tento fazê-lo entender como eu o quero ao meu lado, e o quanto isso seria importante, para mim e para tantas outras pessoas da escola. Do mundo. A voz dele soa fraca quando diz:

— Não parece justo com ela.

— Ela vai entender – repito. Tomo o rosto dele nas mãos, impedindo-o de desviar o olhar. – Carter, ela vai nos apoiar.

Há um momento de silêncio, então Carter morde o lábio inferior, pensativo. Parece quase triste, e eu sei exatamente por quê.

— E você acha que poderíamos ganhar? – pergunta, cético. Ele se vira completamente, dando as costas ao computador. – Eu e você, dois reis do baile de outono? Sério, Jake?

 Entrelaço meus dedos aos dele, com delicadeza. A ideia também me deixa nervoso, mas é como a perspectiva de saltar de um trampolim: você sabe, ou pelo menos espera, que haja algo para aparar sua queda. Carter é pessimista. Para ele, deve ser como saltar de um penhasco direto para um mar tempestuoso: as chances de sobrevivência são mínimas. Não sei se é porque a família dele é mais rígida em tudo, ou se é porque ele é franzino e tem jeito de nerd e, portanto, tem mais chance de ser um alvo, mas sempre foi mais difícil para ele do que para mim.

— Lembra do que Maureen disse? – pergunto. – Sobre nossa candidatura apelar para a comunidade LGBT+ da escola?

— É completamente diferente – A mão de Carter aperta a minha, e quero abraçá-lo, dizer a ele que vai ficar tudo bem. – Ela é uma menina. Vocês não vão ser lidos como um casal LGBT ao se candidatar.

— Tudo bem se você não quiser – Suavizo a voz, tentando acalmá-lo. – Mas pense a respeito, Carter. Pense no que significaria para todos eles se nós ganhássemos.

— Nós não ganharíamos! – explode Carter, e a frustração na voz dele faz meu peito doer. – O mundo não é esse lugar maravilhoso e cor-de-rosa que você pensa, Jake. O mundo é um lugar ruim.

Puxo o rosto dele mais para perto, pressiono meus lábios contra sua testa. Baixinho, digo:

— Essa seria uma chance de torná-lo um lugar melhor.

Ficamos assim por alguns instantes, congelados, sentindo a respiração um do outro e pensando nos cartazes multicoloridos espalhados nos corredores de nossa escola. Finalmente, Carter quebra o silêncio.

— Se Maureen concordar, e ela não vai... – começa ele, e eu o interrompo.

— Ela vai concordar.

Ele me olha feio e continua:

Se ela concordar... – Ele suspira. – Pode me inscrever.

Sorrio e o beijo nos lábios.

— Eu amo você. Já falei que amo você?

Carter ainda parece um pouco receoso, mas sorri de volta.

— Não, acho que ainda não tinha dito.

Congelo. E percebo que ele está certo: eu nunca disse que o amo antes. O que é estranho, porque, agora que disse, percebo que é verdade. Tão verdade que achei que não precisava falar, talvez.

É minha vez de morder o lábio, olhando para ele, querendo ouvir a resposta e querendo beijá-lo para não ter que ouvi-la.

— Bem, eu amo – digo. Carter me beija de novo, depois me puxa para perto, escondendo o rosto no meu pescoço.

— E eu também te amo – A voz dele é pouco mais que um sussurro, mas eu sinto a forma das palavras em minha pele, deixando uma marca.

— Ótimo – Quase-sussurro de volta. – Você vai dar um ótimo rei.

Carter me empurra fracamente, rindo um pouco.

— Não estraga o clima.

Puxo-o de volta, sem conseguir evitar rir também.

— Mas é verdade.

***

— Tá, eu admito: isso é brilhante – diz Maureen, levando a mão direita à boca. Sei que ela vai começar a roer as unhas, e seguro o pulso dela delicadamente.

— Você não está com raiva?

Estamos no corredor, nos últimos minutos antes do início das aulas. Abri mão de meu encontro matinal com Carter para contar minha ideia a ela, para ter uma desculpa para sumir, caso ela ficasse irritada.

A expressão de Maureen, porém, não é nada mais que pensativa, como se ela já estivesse calculando nossas chances contra minhas chances com Carter.

— Raiva? Não – responde ela. – Talvez. Tá, como é que eu não pensei nisso antes? Quer dizer, falei tanto de representatividade!

Rio. Maureen é a única pessoa que consegue ser tão prática o tempo todo e, ao mesmo tempo, não ser séria quase nunca.

— Mas você não vai ter mais um rei para concorrer contigo – observo. Ela franze a testa na minha direção.

— Concorrer comigo? Jake, meu amor, eu não vou concorrer contra você e seu lindo namorado. Aliás, vocês seriam um casal imbatível.

Sinto uma onda de alívio me invadir. Nós não teríamos a menor chance contra Maureen, e há dezenas de caras melhores que eu que ela poderia arranjar. Ao mesmo tempo, me sinto mal por ela. Ela queria tanto a coroa.

— Desculpe – falo, sem pensar. – Sei que você queria ser a rainha.

Maureen joga o cabelo para trás, despreocupada.

— Ser rainha é o de menos, sério – diz. – Quer dizer, eu tenho minhas prioridades no lugar. Já estou preparando minha candidatura ao conselho estudantil. Você sabe que é isso que importa para mim: a mudança.

Sorrio.

— Então, você vai nos ajudar?

Maureen retribui o sorriso.

— Claro que vou, idiota.

Não consigo esperar até o almoço para contar a Carter, então o procuro no intervalo entre a primeira e a segunda aula e o arrasto para o corredor do segundo andar.

— Maureen disse que não se importa – anuncio. O rosto de Carter fica meio verde.

— Oh, céus.

É só nesse momento que paro para pensar que talvez ele realmente não se sinta confortável com isso. Imediatamente, me sinto culpado.

— Quer dizer, se você ainda quiser – emendo.

Carter demora, mas assente devagar.

— Eu quero – Ele ergue o rosto para olhar para mim, e vejo que ainda está receoso, mas há determinação em sua expressão. – Bem, então temos que fazer isso direito, certo?

Sorrio. Carter, pragmático como sempre.

— Quer se reunir hoje à tarde para fazer cartazes? – Juro que minha intenção não é soar malicioso, é só força do hábito. Carter nem parece notar.

— É, mas não com você.

— Ei!

— Você me distrai – justifica ele, sem nenhuma pontada de remorso. – E todos nós sabemos que a Maureen deve ser nossa gerente de marketing.

Faço beicinho, porque sei que ele está certo, mas realmente adoraria passar mais uma tarde tentando distrai-lo de suas tarefas. É divertido.

Carter não se impressiona. Ele se vira, me puxando pela mão na direção das escadas.

— Ela sabe o que está fazendo. Você, não. Ela ganha, e eu vou me atrasar pra aula de história se ficar aqui discutindo isso.

— Você nem gosta de história – protesto.

Carter não se dá ao trabalho de responder.

***

Não participo do processo de criação dos cartazes, mas estou presenta na hora de colá-los nas paredes. Carter, Maureen, eu e Denise – que se recuperou de sua doença e ficou mais do que satisfeita com nossa candidatura – chegamos mais cedo na escola no dia seguinte, e aproveitamos o tempo extra para concluir o trabalho.

Os cartazes ficaram ótimos, embora a imagem de Carter dê a impressão de que ele está com medo da câmera. Passo algum tempo fitando-os, meio sem acreditar. Inicialmente, eu nem queria participar dessa competição idiota. É difícil engolir que agora não só participo entusiasticamente como convenci meu namorado – meu namorado quieto, tímido e meio nerd – a se juntar a mim. Insano.

Comento sobre isso com Maureen, quando nos encontramos na segunda aula. Ela apenas dá de ombros.

— É diferente quando tem um princípio por trás, eu acho.

— E quando é tão gay assim – observo. Maureen sorri.

— Você realmente não queria uma rainha, né?

Sorrio de volta e passo um braço ao redor dos ombros dela.

***

Dessa vez, na hora do almoço, chego no refeitório com cinco comentários negativos nas costas. A maioria veio de colegas do time de futebol, e não tinha a intenção de ser maldosa, ou ao menos gosto de pensar que não; de todo jeito, foi desanimador. Quer dizer, eu achava que eles já tinham superado isso depois do episódio do beijo pós-final de campeonato.

Por outro lado, três pessoas me pararam no corredor para dizer que apoiavam a iniciativa. Duas delas foram um casal de lésbicas que eu já conhecia. Elas disseram que se sentiam representadas por nós, e agradeceram por termos tido a coragem. Uma delas parecia à beira das lágrimas.

A outra foi o Sr. Thompson, o professor de álgebra. Ele me parou na saída da segunda aula, quando eu geralmente corro o mais rápido possível para escapar do inferno que ele chama de matéria, e me analisou por detrás dos óculos redondos.

— Vi o seu cartaz, filho – disse ele, o que foi estranho, porque ele não é velho o suficiente para me chamar de filho. – É muita coragem.

Fiquei lá parado, sem saber bem como reagir. Ele me deu um tapinha no ombro e disse:

— Boa sorte. Vou torcer por vocês – E acrescentou, já se afastando: - Qualquer problema, podem falar comigo.

Conto essa história a Carter, Maureen e Denise assim que eles se sentam ao redor da mesa. Carter não diz nada. Maureen sorri e bate palmas, entusiasmada, e Denise diz:

— Uau, o Sr. Thompson. Quem diria que ele era capaz dessa bondade, né?

Não entendo exatamente o que ela quer dizer com isso. Se eu fosse escolher um professor para acusar de homofobia, o Sr. Thompson definitivamente não seria minha primeira opção. Ele foi bastante legal comigo durante toda a merda que aconteceu depois da final do campeonato.

— Estão vendo só? – diz Maureen. Seus olhos até brilham, e, pela primeira vez, tenho certeza de que ela estava falando a verdade ao dizer que não se incomodava em perder a coroa se fosse por uma boa causa. Maureen é uma revolucionária, e eu a amo por isso. – É como eu falei: as pessoas estão se sentindo representadas. Quer dizer, mesmo que vocês não ganhem, isso é importante, certo?

Não respondo, porque estou ocupado tentando ler a expressão de Carter, que não disse nada desde que nos sentamos. Ele me surpreende ao retribuir meu olhar, sorrir e responder a Maureen:

— É, acho que é importante.

Denise dá um tapinha no ombro dele e muda de assunto, começando a falar sobre roupas: ternos, paletós, fraques. Loira, pálida e completamente avoada, ela é o oposto de Maureen, exceto pelo fato de que ambas são muito inteligentes, cada uma à sua maneira. Enquanto Maureen é um gênio em todas as disciplinas da escola, Denise consegue pegar a coisa mais sem graça da face da Terra e transformar em uma pintura deslumbrante. Ela tem um estilo longe do realista, quase impressionista, que é de cair o queixo.

Além disso, ela é apaixonada por moda. Portanto, quando Maureen sugere que ela escolha algo para usarmos no baile, Carter e eu nem pensamos em negar. É uma questão de bom senso.

Terminamos o almoço com a promessa de uma hashtag para divulgar a campanha nas redes sociais e esboços de ternos feitos em um guardanapo. Ao menos temos certeza de ter uma equipe de campanha bastante dedicada, independente dos comentários maldosos no corredor.

Acompanho Carter até a porta da sala dele, já que a minha próxima aula é no mesmo corredor.

— Está arrependido? – pergunto. Ele não precisa perguntar sobre o que estou falando.

— Nem um pouco – responde, para minha surpresa. – Na verdade, estou feliz por você ter ido essa ideia.

Dou um beijo nele, rápido o bastante para ele não reclamar.

— E eu estou feliz por você ter concordado – digo.

***

Nas semanas seguintes, Denise e eu nos dedicamos à campanha quase em tempo integral. Maureen e Carter têm aulas avançadas e atividades extracurriculares demais para isso, mas ajudam sempre que podem. No começo de setembro, as fotos que postamos com a hashtag que Maureen criou chegam a ter mais de 200 curtidas no Facebook e no Instagram. A maioria dos cartazes que espalhamos pelo colégio ainda está intacta, o que é um bom sinal, considerando que alguns foram rasgados quando os colamos, no início da campanha.

Faltam apenas duas semanas para o baile quando meu ex-quase-namorado (e, agora, rival na eleição do rei do baile) decide se pronunciar sobre minha candidatura e de Carter.

Acontece depois do treino de futebol americano, quando estou terminando de guardar os materiais. Eu me ofereci para guardar tudo hoje, então achava que estava sozinho até ver Brad Miller andando na minha direção.

Brad é um cara bastante popular. Alto, loiro, bonito, tudo que todo cara sonha em ser. Ele é até inteligente. Também era capitão do time de futebol americano, antes de sofrer uma lesão no ombro e ter que dar um tempo. Agora, só joga na temporada de basquete, até onde eu sei. Acho que ele ficou com medo de jogar futebol de novo.

Levanto-me para falar com ele quando o vejo se aproximar. Ele acena, parecendo sem jeito.

— E aí, cara.

Na verdade, Brad, ao contrário da maioria dos rapazes da escola, merece a popularidade que tem. Ele é um doce de pessoa, o que é possivelmente a única coisa que tem em comum com Carter, e o motivo pelo qual eu me apaixonei por ele, para começo de conversa.

Claro, os pais dele são altamente conservadores, e Brad nunca teve coragem de enfrentá-los por mim, como Carter fez. Não guardo rancor dele por isso, e não acho que ele seja o culpado de não termos dado certo. As coisas simplesmente são mais difíceis para algumas pessoas.

— E aí – respondo, retribuindo o aceno.

Brad fica em silêncio por alguns minutos, balançando-se para frente e para trás nos calcanhares, como se não soubesse o que dizer. No fim, sou eu quem quebra o silêncio:

— Então, você e a Vanessa se candidataram a rei e rainha do baile, né?

Não penso antes de tocar no assunto. Ultimamente, estou tão nervoso e animado que tudo gira em torno do baile para mim.

— É – Brad hesita. – Você e o Carter também.

Tento não ficar tenso. Brad é um cara legal, e até os rapazes mais difíceis do time de futebol acabaram aceitando a ideia. Apoiando, até.

Além disso, Brad pode fingir para todo mundo, mas ele não é burro o bastante para tentar fingir para mim.

— É – concordo.

Há mais um instante de silêncio desconfortável, e, dessa vez, é Brad quem o interrompe:

— Eu só vim para dizer que, bem, desejo toda a sorte para vocês.

Procuro algum tipo de sarcasmo ou ironia na voz dele. Não há nada, apenas sinceridade. E uma pontada de melancolia, eu diria. Antes que eu possa responder, Brad continua:

— Isso... Bem, significa muito para mim, Jake. De verdade.

Por um momento, apenas olho para ele, sem resposta. Brad finaliza:

— Espero que vocês ganhem.

Ele já está saindo do ginásio quando meu cérebro volta a funcionar, e, mesmo assim, ainda não sei o que deveria ter respondido. E penso que talvez signifique tanto para Brad porque talvez ele se arrependa de não ter enfrentado a família. E talvez ele queira ter o que nós temos. E talvez o que nós temos o faça sentir que não precisa ter tanto medo.

Mentalmente, desejo toda a sorte para Brad, também. Toda a sorte do mundo.

***

As horas se transformam em dias, que se transformam em semanas, e, antes que eu perceba, estou me arrumando para o baile de outono.

 Denise escolheu para mim um terno preto simples. Segundo ela, a roupa precisa ser a mais sóbria possível...Porque a gravata é listrada com as cores da bandeira gay. Não sei onde diabos ela arrumou isso, mas adorei, do fundo do meu coração. Acho que dá pra dizer que não sou a pessoa mais discreta do mundo.

Na lapela, coloco uma flor amarela, clara e delicada. É como ela disse: vamos deixar a parte do exagero só na gravata. Além disso, a flor precisa combinar com a de Carter, e é difícil convencê-lo a usar algo extravagante. Como já o convenci a fazer uma coisa particularmente absurda como nossa campanha, Denise e eu concordamos em não forçar a barra.

Quando desço as escadas até a sala, minha mãe bate palmas, como se eu estivesse desfilando. Minha irmã mais velha, Annelise, sorri e diz a ela para se acalmar.

— É só um baile – ressalta ela. – Não é como se ele fosse se casar ou algo do tipo.

Dou uma piscadela para ela.

— Eu vou com o Carter. Talvez a gente fuja e se case em Las Vegas.

— Mas aí você teria que abrir mão da coroa – rebate ela, sem hesitar. – E você não se atreveria.

Rio, e decido deixá-la vencer a discussão. Minha mãe insiste em tirar fotos, e eu não protesto muito. Estou nervoso demais para isso. Nas últimas semanas, Carter e eu recebemos bem mais reações positivas do que negativas, mas é difícil dizer se os alunos estão realmente nos apoiando mais ou se os homofóbicos de plantão simplesmente arrumaram outra pessoa para importunar, e nada garante que vamos ganhar a competição. Nem que não vamos levar uma surra caso ganhemos.

Não tenho dinheiro para um carro, mas minha irmã deixa que eu pegue o dela emprestado. Noite especial, diz ela.

— Além disso, não quero ficar acordada esperando para ir te buscar – acrescenta, com uma piscadela. – Talvez vocês queiram sair depois.

Tento não ficar vermelho. Claro, todo mundo presume coisas sobre casais depois de bailes da escola, mas meu namorado é Carter, pelo amor de Deus.

— Eu tenho toque de recolher – lembro a ela. Annelise encara nossa mãe longamente, até que ela diz:

— Você tem até as duas hoje. Mas, pelo amor de Deus, tenha cuidado.

Sorrio. E penso em todo mundo que disse à minha mãe que eu precisava de uma influência masculina, e em como eles nem imaginam quanto tenho sorte de ter essas duas mulheres maravilhosas na minha vida.

— Vou voltar cedo – prometo. Então, sinto meu celular vibrar no bolso; é uma mensagem de Maureen. – Acho que eu deveria ir agora.

Dou um beijo na testa de cada uma, mando uma mensagem para Carter, pego as chaves e saio.

Quando chego à casa de Carter, dou um toque para o celular dele e espero dentro do carro, porque não sei se os pais dele querem me ver. Eu os conheci algum tempo atrás, e os vi umas poucas vezes depois, mas, embora eles não reneguem completamente o filho por sua orientação sexual, dá para ver que eles se sentem desconfortáveis com isso. Carter diz que eles estão se esforçando, e que isso é tudo que ele poderia querer.

Portanto, fico mais do que surpreso quando Carter, ao invés de descer as escadas e entrar no carro, me manda uma mensagem: Toque a campainha.

Começo a suar. Aparentemente, a coroação no baile não é meu único teste do dia.

Tem certeza?, digito.

Apenas vá, é a resposta. Vai ser rápido e indolor, prometo.

E, no fim das contas, é mesmo. É Carter quem abre a porta, adorável em um terno escuro, gravata borboleta (não da cor do arco-íris, porque, bem, ainda é Carter) e o cabelo penteado de um jeito esquisito, mas fofo. Nosso cumprimento é sem jeito, já que ambos temos medo de sequer nos abraçarmos.

Os pais dele estão no sofá, e se levantam para me cumprimentar. O pai, que é enorme, me dá um aperto de mão quase fraco para os padrões dele e me pergunta como vai o futebol. A mãe, uma mulher miúda, mais parecida com o filho, me oferece uma bebida e pergunta sobre minha mãe, que ela conhece dos encontros de pais na escola. Respondo às perguntas, um pouco tonto, então Carter diz:

— Bem, está na hora de ir.

Despeço-me dos pais deles o mais cordialmente possível, e eles nos desejam um bom baile. Por fim, sigo Carter até o carro, que estacionei um pouco mais abaixo na rua. Ele ocupa o banco do passageiro, e eu dou a partida.

— Rápido e indolor, ele disse – digo, com um sorriso. Carter sorri de volta, acanhado.

— Não foi?

— Na verdade, foi. Você contou a eles sobre a candidatura?

O semblante de Carter se fecha um pouco, e ele morde o lábio inferior.

— Não. Desculpe, Jake. Não tive coragem. Desculpe mesmo.

Pego a mão dele, pendurada entre nossos bancos, e aperto.

— Ei, tudo bem. Está tudo bem.

Ele aperta minha mão em resposta, e acho que consegui acalmá-lo até ele voltar a falar:

— Você realmente acha que nós podemos vencer esse negócio, Jake?

A voz é baixa, e ele soa quase assustado. E eu entendo, porque também me assusta.

— Eu não sei – respondo. – Eu espero que sim.

Estamos tratando algo que nós dois achávamos fútil até algumas semanas atrás como se fosse os Jogos Vorazes, e algum de nós deveria fazer piada sobre isso e dizer a verdade: é só uma tradição boba de baile da escola. Mas nós só ficamos em silêncio, segurando a mão um do outro, porque sentimos que isso é importante. Nós somos adolescentes, nós temos prioridades bagunçadas e talvez isso seja a coisa mais importante do nosso ensino médio.

 Encontramos Maureen e Denise no estacionamento, sentadas no capô do carro velho de Denise.

— Olha só quem chegou na hora – comenta Maureen. Ela está usando um vestido vermelho que me faz ter vontade de poder ficar bonito usando um vestido e saltos. Dou de ombros.

— Carter ia me matar se eu me atrasasse.

Denise estende os braços e forma uma moldura com os dedos, como se estivesse me medindo. Ela também está de vestido, mas o dela é curto e roxo, e ela está de All Star azul. Clássico.

— Tudo bem deixar os súditos esperando uns minutinhos – Ela pula de cima do capô e agarra Carter pela mão. – Vamos entrar!

Carter dá o braço a ela e eles seguem juntos para o ginásio, deixando-me sozinho com Maureen. Olho para ela e vejo que ela está sorrindo.

— Posso acompanhá-la, senhorita? – pergunto, oferecendo meu braço.

Maureen foi meu par em todos os bailes da escola antes de eu conhecer Carter. Ela aceita sem hesitar.

— Seria uma honra, gentil cavalheiro.

Lá dentro, Carter e Denise estão dançando. Bem, Denise está dançando, enquanto Carter balança desajeitadamente ao ritmo da música. Ao nos ver, Carter me puxa para baixo para poder gritar no meu ouvido:

— Você e Maureen com certeza ganhariam a eleição.

Entendo isso como um teste. Carter acha que é só mais um nerd, ou algo do tipo. Eu não aceito essas definições simples.

— Mas eu quero ganhar com você – grito de volta. Então, o tiro para dançar.

No início, ele apenas ri, sacudindo a cabeça. Demora algum tempo para que eu consiga deixá-lo à vontade, mas, quando isso acontece, é um Carter que eu não conhecia, e eu absolutamente o adoro. Denise e Maureen dançam uma com a outra, e às vezes conosco também, mas minha atenção quase toda está em Carter, em como ele parece tranquilo. E me pergunto se é disso que ele sempre teve tanto medo.

Ficamos assim por algum tempo, nos revezando para ir buscar bebidas uns para os outros – mantendo o acordo que fizemos na oitava série de checar se elas estão batizadas – e para girar uns aos outros. Em alguns momentos, é como se Carter e eu estivéssemos sozinhos. Em outros, estou plenamente ciente da presença de Denise e Maureen, e agradeço por isso, por esse relacionamento que não exige obliteração total do resto.

Como nas semanas antes do baile, o tempo passa rápido demais, e logo a Sra. Rodriguez, a diretora da escola, sobe ao palco em que uma banda estava tocando minutos atrás e pega o microfone. Quando ela diz que vai anunciar o rei e a rainha do baile, damos as mãos, todos nós: Denise a Maureen, Maureen a mim e eu a Carter. Vejo que Carter está cruzando os dedos da mão livre.

Como sempre, o rei é anunciado primeiro. Há um rufar de tambores, então a Sra. Rodriguez anuncia:

— Jacob Matthews!

As pessoas aplaudem. Aperto a mão de Carter mais uma vez antes de me juntar a ela no palco. Mal consigo sorrir, de tão nervoso que estou. Se Maureen ou Vanessa, a ex-não-tão-ex de Brad, ganhar a coroa, eu ter vencido a eleição para rei não significará nada.

A Sra. Rodriguez faz um suspense ainda maior para abrir o segundo envelope, e, quando o abre, demora ainda mais para anunciar o nome em voz alta. Ela lê uma vez, então de novo, como se temesse ter lido errado; consigo ver os lábios dela formando as palavras, mas não consigo decifrar quais são e isso está me matando. Estou convencido de que vou vomitar quando ela finalmente diz, em voz surpreendentemente baixa, com uma interrogação no final:

— Carter Raymonds?

Silêncio absoluto no ginásio; ninguém sabe como reagir, incluindo eu mesmo. A princípio, sinto uma onda de empolgação, então penso: a rainha. Quando bolei esse plano, não tinha parado para pensar na heteronormatividade da coisa. E me pergunto se Carter vai terminar ofendido porque não passou pela cabeça de ninguém que ele pudesse ser o rei, e eu, a rainha. Ele nem se aproximou do palco; posso vê-lo parado ao lado de Maureen, em choque. Sinto que vou desmaiar, ou começar a chorar.

Então, alguém na plateia decide se pronunciar.

— Ele não é a rainha – grita uma voz. Por um instante, penso que começaram os ataques, mas a voz termina: - Temos dois reis esse ano!

Finalmente, reconheço a voz: é o Sr. Thompson. Meu queixo cai.

— É – berra mais alguém. Brad Miller, ex-estrela do time de futebol e ex-quase namorado de Jacob Matthews. – Dois reis!

Em dois segundos, mais vozes se juntam a eles. Maureen e Denise. O casal de lésbicas que falou comigo no corredor. Meu ex-namorado e outros amigos do time. Mais professores. Alunos com quem nunca falei, e em quem nunca reparei, mas a quem sou infinitamente grato nesse momento.

Olho para Carter no instante que Maureen o empurra para a frente, na direção do palco. A Sra. Rodriguez abre espaço para ele, embora ainda tenha a expressão de quem acabou de ser atropelado por um caminhão. Pergunto-me se vamos arranjar problemas com a diretoria depois. Concluo que não me importo.

Carter recebe a coroa, mas não a coloca. Trocamos um olhar, então sorrimos e trocamos de coroa, de modo que eu tenha a tiara pequena e delicada da rainha e ele, a coroa firme do rei. E isso é uma afirmação. É uma mensagem a respeito de quem nós somos, e de por que as pessoas não deveriam presumir tantas coisas.

Como a Sra. Ramirez perdeu completamente o controle da situação, o vocalista da banda retoma o microfone e anuncia a dança “do rei e da rainha, quer dizer, dos reis”. Carter e eu descemos do palco para isso. Torço para eles não tentarem ser engraçadinhos e tocar algo como “I Will Survive”, mas isso não acontece. Denise namorou com o vocalista por um tempo, então suponho que eu deveria dar mais crédito a ele.

A música é lenta, e, portanto, me aproximo mais de Carter. Sorrio, e ele sorri de volta. Há um brilho no fundo dos olhos dele, quase como se ele fosse chorar, mas não há lágrimas; ele põe uma mão no meu ombro e segura minha mão com a outra, e começamos a nos mover junto com a música, girando com o universo.

Dessa vez, não me preocupo com o que está acontecendo ao nosso redor. Dessa vez, somos só Carter e eu.

— Você está bem? – pergunto, me inclinando para falar perto do ouvido dele. Ele também se inclina na minha direção, e murmura:

— Estou orgulhoso de você.

Sorrio.

— De nós – corrijo. – Você está orgulhoso de nós.

***

Depois da dança e dos cumprimentos, consigo roubar um tempo sozinho com Carter, e nos escondemos no corredor do terceiro andar, que está vazio.

Carter parece mais do que aliviado em deixar o centro das atenções, mas percebo, pela forma como ele olha em volta, que ele está nervoso. E faz sentido ele estar nervoso, porque, se alguém for nos atacar, esse corredor é o lugar perfeito.

— Ei – digo, para distraí-lo. – Olha para mim.

Ele olha. E eu olho para ele. E, por um instante, não consigo pensar em nada para dizer além de:

— Eu te amo.

E ele responde:

— Eu te amo.

Penso em me aproximar, ou melhor, em puxá-lo para perto. Mas então lembro que, baile ou não, ainda estamos na escola, e imagino a cena: eu me inclinando, Carter se afastando, olhando para os lados para ver se ninguém está olhando. Ele ainda tem medo.

Para minha surpresa, é Carter quem se aproxima. Ele dá um passo à frente, segura minha mão e se estica para pôr a mão livre no meu rosto.

— Carter? – chamo, inseguro. A expressão dele é algo que nunca vi antes; é como se ele estivesse sonhando acordado, ou se movendo dormindo.

— Jake – responde ele.

Então ele me beija. Sem olhar para os lados, sem hesitar; ele simplesmente me beija, como se não fosse nada de mais. Porque não é, e ao mesmo tempo é.

E é aí que eu percebo: o porquê de termos feito tudo isso.

Brad Miller disse que nossa candidatura significava muito para ele. O casal de meninas que falou comigo disse que significava muito para elas.

Mas, até agora, eu acho que não tinha percebido o quanto significava para nós.

Carter e eu nos afastamos um pouco, e sorrimos. Ele ainda está com a coroa, e eu sei que ainda estou ridículo com minha tiara. É uma sensação boa.

— Quer voltar lá para baixo? – pergunto, referindo-me ao ginásio. Carter nega com a cabeça.

— Vamos ficar aqui mais um pouco – diz. – É silencioso.

Então nós ficamos.

A resposta não me surpreende, porque, corajoso ou não, esse ainda é Carter, afinal. Tudo bem; é o bastante para mim. Ele é o bastante para mim; sempre foi.

A diferença é que, agora, finalmente sinto que ele sabe disso.

E isso é importante, também.


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Notas finais do capítulo

Então? É longa, eu sei, e eu demorei um tempão pra escrever, mas gostei muito do resultado, e espero que vocês também tenham gostado. Alguma opinião? Algum erro? Eu revisei por cima, então pode ser que tenha deixado passar alguma coisa. Se tiver, por favor me avisem.
Até mais, eu acho o/



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