Diva escrita por dskhaos


Capítulo 1
Song of Solitude


Notas iniciais do capítulo

Há uma playlist no Spotify com todas as músicas: https://open.spotify.com/user/12152703551/playlist/51cxmrCD7VehYkOizU24ZJ
Boa leitura ♥



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O grave do violoncelo da canção tocada enchia a sala com seus acordes melancólicos que davam ao alvo cômodo um clima contraditório ao que suas cores transmitiam, a imagética angelical do ambiente com ar renascentista escondia a mórbida solidão presente no olhar do único homem presente na sala, enormes janelas permitiriam a entrada da luz do dia, cujo qual desenharia no gélido mármore a silhueta viva do homem de alma morta. Permitiriam, porém as mesmas se encontravam lacradas, escondidas por duas longas cortinas vermelhas que rompiam a atmosfera branda do ambiente. A face preocupada do homem denunciava o precoce rumo que aquela canção que entoava a solidão o levaria. Sob o piano branco o qual podíamos observá-lo meditar, se via um copo de uísque Scott, já em seu fim e ao seu lado um revólver.

Conforme a música chegava ao seu ápice, lágrimas escorriam pelo seu rosto. Ele estava prestes a abdicar tudo em troca de sua paz, por fim o pacto que fizera com o diabo em sua juventude havia chegado a sua rescisão. Sua maior certeza entre todas suas crenças religiosas, por muitas vezes contestadas ao longo de sua vida, fez com que concluísse que se o céu e o inferno existissem certamente ele iria para a dimensão calorosa.

Sem direito a paradas.

Os olhos negros contemplavam o quadro de uma mulher que ria de forma irônica para a situação, logo após, pendeu seu olhar para todo o ambiente analisando as diversas fotografias de duas mulheres espalhadas por todo o cômodo. Sua falecida esposa Ana e sua adorada filha Daiana.

Juan estava prestes a completar seis décadas, seis décadas de erros que aprisionaram diversas almas sucumbidas ao eterno desespero.

Ele fechou seus olhos, o cansaço fez com que ele se apoiasse no piano. O tédio fez com que o fardo de segredos que carregara durante toda sua vida adquirisse um peso inumano. Por fim, concluiu que a decisão que havia tomado libertaria todas as almas que mantinha presas a si, libertaria principalmente a pessoa que ele mais amava. Sua filha, a garota que viu crescer, florescer e se perder dentro de suas próprias mentiras.

A imagem de Daiana dominou suas lembranças. O crescimento da pequena garota mimada de cabelos castanhos ora lisos ora encaracolado, o amadurecimento precoce da mesma por inconseqüências do destino, inconsequências do egoísmo de seu pai...

As notas finais eram ecoadas, Juan Perez levou suas mãos às suas têmporas e as abaixou, como se, em vão, fizesse uma prece interna para o que viria a seguir.

Levantando-se, caminhou até uma das enormes janelas e avistou a festa que acontecia na área externa de suas dependências. Uma união que ele desconhecia o motivo, a veracidade. Perez fitou cada rosto conhecido e desconhecido, porém pairou seus negros olhos no olhar melancólico da filha, mesmo sentimento que entorpecia seu ser. Daiana tinha seus longos cabelos presos o que evidenciava cada traço exuberante de seu corpo dentro de um singelo vestido da cor que dividia o amor com seu pai, o vermelho. Com um triste sorriso, o olhar de ambos se cruzou. Sem pestanejar, o homem voltou sua atenção para o cômodo e mirou novamente o rosto risonho do quadro de sua falecida esposa, e conclui que sua pequena garota era tão bela quanto à própria mãe.

Juan, então, inspirou ferozmente e expirou lentamente enquanto caminhava até o piano. Levantou seu olhar ao fitar de perto os melados olhos de sua mulher.

— Ana, você sabe que eu tentei. – sussurrou ao pegar o revolver com sua mão direita. – Eu tentei manter nosso castelo longe de intrusos, usted provavelmente diria para eu ter fé...

Ele cessa suas palavras ao fitar o negro revolver, e gargalha com escárnio apontando o objeto para o quadro.

— PORÉM DEUS NÃO É PIEDOSO COM UM MEDIOCRE CEIFADOR DE ALMAS! EU DANCEI COM MILHÕES DE DEMONIOS, ANA! MILHÕES...

Perez cai de joelhos aos prantos, murmurando:

— Morrerei em uma vida de pecado, longe dos teus anjos.

Em silêncio, ele desabotoa seu blazer e evidencia a camisa de mesma cor, preta, e então, direciona o revolver para seu peito. De olhos fechados ele vira sua cabeça para o quadro de sua filha, ainda criança, ao lado de sua mãe.

— Perdóname, siempre te amarei, mi dulce niña.

O homem fechou seus olhos e se concentrou no último acorde da canção, e se recordou da festa que acontecia externamente.

A felicidade alheia não o incomodaria naquele instante.

Não havia nada, somente Juan e seus pecados, pecados esses que ele estava apto a encarar. Seu desejo era uma nova direção, um novo caminho, um renascimento. Com sua impotente fé, seus dedos apertaram o gatilho.

O revolver foi-se ao chão, no mesmo instante em que o mármore alvo era tingido pela tonalidade preferida de seu dono.

Perez havia posto um fim a sua era.

Naquele instante não havia ninguém superior ou inferior ao onipotente.

Juan era simplesmente mais um nada no meio do turbilhão de problemas que surgiriam. Ele, por fim, havia encontrado sua paz.


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Notas finais do capítulo

Agradeço por lerem ♥ e saibam que qualquer comentário sempre será bem vindo e agradecido.
beijinhos



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